• Nenhum resultado encontrado

A Ilustração na Literatura Infantil

perfeitamente capaz de compreendê-las.

Assim sendo, entendemos que todos estes aspectos presentes nas histórias podem contribuir grandemente para o ensino de inglês como LE, pois mesmo que a criança entre em contato com determinadas estruturas lingüísticas, ainda por ela desconhecidas e não utilizadas corriqueiramente, as HIs podem apresentar uma língua nova em um contexto familiar. Estamos convencidos de que esta familiaridade fornecerá a segurança emocional que a criança necessita para lançar-se sem reservas a um mundo novo.

Entendemos que, no livro de histórias, o aluno encontra também outros recursos que podem auxiliá-lo a mobilizar todo o seu conhecimento prévio, sua capacidade de imaginar e sua criatividade para aprender, não apenas inglês, mas valores, conceitos de tamanho, proporção, horas, vida em comunidade, regras de comportamento e tantos outros aspectos importantes na formação do sujeito.

Isto posto, discutiremos, na próxima seção, como a ilustração pode ser uma aliada do texto na construção destes novos saberes.

3.4.1 A Ilustração na Literatura Infantil

Definida por Ramos e Panozzo (2004) como uma linguagem que dialoga com outras linguagens, pertencente ao código visual e constituinte de uma linguagem própria, tem como função produzir sentido, pelo diálogo que mantém com o leitor, não somente por si mesma, como também pela interação com a palavra escrita.

A importância das ilustrações nos textos literários voltados para o público infantil encontra-se dividida entre os autores que trabalham com o tema.

Citada por Dohme (2003, p.45), Schedlock (1951) acredita ser perigoso utilizar ilustrações durante a história, especialmente aquelas que contêm um apelo direto à imaginação. De acordo com a autora, tal tipo de recurso poderá forçar o leitor/ouvinte a ver somente tal ilustração em lugar de criar sua própria imagem em sua mente.

Em contrapartida, Tahan (1966) elege alguns requisitos necessários às ilustrações para que estas possam ser utilizadas com sucesso: devem apresentar atributos de arte e de beleza, ser coloridas e atraentes e ser facilmente compreensíveis pelas crianças.

No entanto, Cunha (1999) propõe que se considerem alguns equívocos na ilustração dos livros infantis, pois a ilustração de um livro é o encontro de pelo menos dois artistas, que buscam oferecer à criança o prazer da leitura. No entanto, menciona que o mais comum é encontramos uma ilustração estereotipada, facilitada, a fim de ser digerida rapidamente e sem problema e que se apóia no colorido como chamariz.

Na concepção da autora, “há ilustrações que nada dizem do texto, há outras que o traduzem exatamente, contêm o trecho” (CUNHA, 1999, p.75).

Nesse sentido, reitera as falhas das ilustrações e pontua que tanto aquela desvinculada quanto a detalhada não contribuem para o enriquecimento dos saberes do aluno. Enquanto a primeira é um elemento posto à parte da obra escrita, a segunda impede que algo fique a cargo da fantasia da própria criança.

Considera também que, para crianças muito pequenas, o desenho das palavras é um sinal incompreensível, não significa nada e, nesse sentido, a

imagem (desenho, fotografia, recorte, bonecos) é um sinal que elas traduzem facilmente, é um ícone. Este sinal (ou signo) mantém relações tão próximas, na aparência, com o objeto representado, que é imediatamente “entendido” pelo recebedor.

A palavra é um sinal mais complexo – um símbolo, que depende do domínio de convenções porque não há ligação entre a palavra e o ser a que se refere. Tanto que, se utilizarmos o exemplo de uma flor, o mesmo desenho da flor será “traduzido” por pessoas de diferentes culturas, mas através de símbolos (grifo da autora) diferentes: fleur, flower,etc.

No entender de Cunha (1999), para essas crianças pequenas, em quem queremos desenvolver o interesse pelas histórias, em geral lidas para elas, a gravura é importante e, nesse caso, deve prevalecer a ilustração, enquanto o texto deve ser pequeno para conduzir quase à observação das figuras. Para essa fase, os livros costumam ser maiores que o normal, e muitos ganham o formato da personagem principal: um animalzinho ou uma criança recortada.

Para os alunos que começam a ler, ainda deve predominar a ilustração e o texto, também pequeno, deve apresentar-se em letras grandes e redondas. À medida que a criança evolui na leitura, vão-se reduzindo as ilustrações em favor do texto, cujas letras também diminuem até o formato e o tamanho normal, o mesmo acontecendo com o próprio livro.

No entanto, mesmo para crianças a partir dos nove, dez anos, que já dominam (ou deveriam dominar) o processo da leitura, o livro pode ser ilustrado.

Mas isso já não é fundamental. Nas palavras de Cunha (1999, p.77), “a criança dessa idade deve ser incentivada a ler também obras com pouca ou nenhuma ilustração”. Se o texto for suficientemente interessante e o livro possuir uma

diagramação adequada, a leitura não pesará à criança e, se isto acontecer, devemos tomar o fato como um alerta: talvez ela tenha sido exageradamente poupada, por meio de leituras muito fáceis e excessivamente cheias de gravuras e, nesse aspecto, a autora acredita que o excesso de ilustrações nessa fase é sinal do quanto subestimamos a criança, não a considerando capaz de qualquer esforço intelectual.

Assim, como o texto artístico permite muitas leituras (uma das quais, a da pessoa que o ilustrou), o mínimo que a ilustração tem de fazer é ser ela também tão conotativa, cheia de sugestões, que não impeça outras leituras do texto, mas sim dê às crianças a oportunidade de imaginar, recriar e ir além do próprio desenho.

Estudos feitos por Ramos e Panozzo (2004), sobre o papel da ilustração no livro infantil, revelam que a ilustração pode estabelecer uma relação com a palavra e com o leitor e, por isto, pode orientá-lo na compreensão do livro.

Elementos como encadernação, tipo de papel utilizado e o modo como os desenhos são efetuados, são considerados essenciais nos estudos das autoras, pois funcionam como elemento lúdico de interação, ajudando a criança na construção do sentido (RAMOS e PANOZZO, 2004, p.25).

Cunha (1999) corrobora tais considerações ao afirmar que a paginação, a diagramação, o tipo de papel e a capa devem ser avaliados, pois, ao se definir a relação texto/ilustração/espaço em branco em cada página, tipos de letras e todos os recursos gráficos utilizados na obra, é possível criar sentimentos diversos, surpresas e definir momentos da história. É importante ressaltar que estas características são levadas em conta ao se definir o que seja uma HI, pois a forma como o texto é visualmente composto compõe um dos requisitos para sua

classificação, dentro da perspectiva de análise de gêneros textuais desenvolvida pelo grupo de estudos de didática de línguas de Genebra26.

Outra questão abordada por Ramos e Panozzo (2004) é quanto às funções que as ilustrações podem assumir nas HIs. As autoras propõem a diferenciação entre o livro ilustrado do livro de imagem: enquanto o primeiro é considerado aquele em que os recursos visuais dialogam com o texto, o segundo é aquele em que a ilustração é a única forma de linguagem27.

Porém, independentemente de tal classificação, as autoras concluem que várias são as funções assumidas pela ilustração, a saber: “descrever, narrar, simbolizar, brincar, persuadir, normatizar e pontuar pela linguagem plástica”

(RAMOS e PANOZZO, 2004, p.20).

De acordo com as autoras, a ilustração desempenha o papel de pontuação ao destacar um aspecto da trama ou demarcar o início e término de uma parte do texto. Destacam ainda que tal função pode ser encontrada também marcando o início ou o final de um capítulo do livro. A função descritiva ocorre quando os objetos, animais e cenários são apresentados de maneira mais detalhada e, conforme lembram as autoras, embora seja mais comum encontrarmos tal tipo de ilustração em livros didáticos, também é possível encontrá-las em obras infantis.

Uma outra função é a narrativa. Esta busca situar, orientar o leitor ao mostrar transformações ou ações realizadas pelos personagens. No entender de Faria (2004), quando o texto dos livros para crianças é formado apenas por algumas frases, a ilustração adquire um papel relevante na estrutura da narrativa. Segundo a autora, a articulação entre o texto e a imagem é ainda mais acentuada. Em alguns

26 Abordaremos esta perspectiva no Capítulo 2.

27 Faria (2004) concorda com tal classificação e enfatiza que as imagens, nestes livros, têm um papel fundamentalmente narrativo.

casos, esta chega a ser tão completa que se pode ler a história pelas palavras como pelas imagens28. A autora acredita que, quando se trata de livros com textos menores que a ilustração, esta tem um papel fundamental na leitura da história e deve ser trabalhada com todos os seus detalhes básicos para a compreensão da narrativa.

As ilustrações podem ainda assumir a função de caráter simbólico, o que, segundo Ramos e Panozzo (2004), ocorre quando as imagens podem ser investidas de significados convencionais que representam uma idéia convencionalizada, como por exemplo, sinais de trânsito. A ilustração com função expressiva ou ética mostra emoções, sentimentos e valores, por meio de gestos, expressões faciais ou ainda cor, espaço e luz. Estas podem também possibilitar abordagens sociais, culturais e psicológicas.

Ainda seguindo a classificação proposta pelas mesmas autoras, a ilustração tem função estética quando chama a atenção para a forma ou configuração visual. Pode ser representada por efeitos plásticos evocados por cor, mancha, sobreposição de pinceladas, luz, brilho, transparência e contrastes. No entanto, não se pode confundir esta função com a ornamentação. Seu papel é, sim, sensibilizar o leitor por meio de efeitos estéticos intensificando a linguagem textual.

Outra finalidade possível apontada pelas autoras é a lúdica, na qual a imagem orienta-se para o jogo. Manifesta-se, por exemplo, por efeitos sonoros, táteis em livros móveis, feitos de materiais diversos ou que possuem recortes diferenciados. Nesse caso, Ramos e Panozzo (2004) acreditam que a criança apreende a obra também por meio da visualidade que tal tipo de ilustração

28

proporciona. Sendo assim, a ilustração atuaria também como um mediador auxiliando a criança na compreensão dos sinais gráficos, ou seja, do texto.

A ilustração desempenha uma função metalingüística, quando orientada para o código, na qual ocorram situações de produção e recepção de mensagens visuais que remetem ao universo visual da arte.

Importante ressaltar que, de acordo com o discutido pelas autoras, as funções para a ilustração devem ser sistematizadas a partir do papel que elas desempenham no livro. Desta forma, a classificação das funções é realizada com base na função que ela desempenha no ato da recepção do livro infantil. Na opinião das autoras, a função desempenhada pode orientar a concretização do livro, atuar como um enigma a ser decifrado ou ainda revelar a interação entre as linguagens.

Tais aspectos “implicam a leitura como compreensão e apropriação do texto para a produção de sentido pelo leitor” (RAMOS e PANOZZO, 2004, p.22).

No conceber das autoras, na estrutura do texto literário infantil, percebe-se que, em algumas ocasiões, a imagem antecipa sentidos revelados pela palavra; em outros, mostra sentidos paralelamente, tratando de aspectos não explicitados pelo sistema escrito; por vezes, apenas confirma as palavras ou orienta a leitura. Nesta perspectiva, a significação vai se construindo em uma relação de reciprocidade entre elementos do significante (plano da expressão) e do significado (plano do conteúdo) na qual participam tanto as dimensões da cor e da forma como também dos materiais utilizados, além das combinações das unidades da língua escrita, seleção e organização vocabular das estruturas que compõem o texto.

Todos esses componentes são articulados a fim de produzir o sentido desejado.

À guisa de conclusão, retomamos as palavras de Cunha (op. cit.) que afirma: “tudo o que escrevemos até aqui sobre ilustração só é válido a partir de

um pressuposto: seu valor artístico. Não podemos esquecer que a ilustração apresenta a leitura que um artista fez do texto feito por outro artista – o escritor”

(p.75).