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Capítulo 6. Serra da Estrela: Pobre região rica

6.2 O turismo serrano

6.2.3 A procura turística na RTSE

A fim de avaliarmos a procura turística na RTSE procurámos, em primeiro lugar, um indicador que nos desse uma noção da importância dos fluxos turísticos na região, para além da já analisada taxa de ocupação hoteleira. Tendo em conta que por definição, um turista permanece pelo menos uma noite no destino turístico, entendemos que o indicador N.º de Hóspedes poderia fornecer-nos uma boa perspectiva de tais fluxos. O PETUR incluía uma análise bastante interessante a este indicador (baseada em dados do INE), já que permitia posicionar a Serra da Estrela contra outros destinos, nomeadamente, os já referidos: Douro, Trás-os-Montes, Alto Alentejo e Alentejo Central. Por esse motivo esta foi a fonte a que recorremos.

Assim, no período, 1996 a 2001, o número de hóspedes em estabelecimentos hoteleiros na Serra da Estrela passou de 149.326, para 175.590, portanto, uma taxa de variação média anual e 3,3% ao ano (Carvalho_(coord.) et al., 2006: 50). Em termos de ranking face àqueles outros destinos semelhantes, quanto ao número de hóspedes, a Serra da Estrela posicionou-se sempre em 2º lugar, perdendo apenas para o Alentejo Central. No entanto, em termos de taxa de variação média anual, passou para 4º lugar, perdendo, face a destinos que apresentavam taxas de crescimento muito mais dinâmicas, como por exemplo, o Douro, com 11,6% (Carvalho_(coord.) et al., 2006: 50).

Relativamente, ao país de origem dos hóspedes alojados nos estabelecimentos hoteleiros, para o mesmo período e a mesma comparação de destinos, no PETUR concluía-se que a Serra Estrela era a região onde o peso de estrangeiros era menor (Carvalho_(coord.) et al., 2006: 55). A região onde este indicador era superior era o Alentejo Central, onde em 2001, se atingia os 40% (Carvalho_(coord.) et al., 2006: 55).

Para uma análise mais recente, procurámos informação directamente junto do INE, mas apenas nos foi disponibilizada informação para os concelhos de Almeida, Guarda, Manteigas e Covilhã. Para estes concelhos, no período 2005 – 2006, o número de hóspedes em estabelecimentos hoteleiros passou de 141.379, para 150.009, ou seja crescendo cerca de 6%129, bastante acima

das taxas analisadas naquele estudo do PETUR (INE, 2005: 331, 332; , 2006: 337, 338). Em termos de representação de estrangeiros no total dos hóspedes, em 2005, a taxa era de 16%129, tendo caído para apenas 11%129, em 2006. Em 2006 e 2005, a nacionalidade com maior presença, a seguir à portuguesa era a espanhola, com 5% e 4% dos hóspedes, respectivamente em 2006 e 2005, o que poderá se explicado pela grande proximidade face à região, sendo até expectável que aquele peso fosse superior.

Pelos dados recebidos da RTSE, relativamente ao movimento nos postos de turismo da Covilhã, Belmonte, Gouveia, Guarda, Manteigas, Seia, Celorico da Beira, Oliveira do Hospital e Sabugueiro, no ano de 2007, a repartição entre estrangeiros e nacionais era um pouco diferente. Naquele ano, aqueles postos de turismo, receberam um total de 71.259 visitantes, sendo 65,8% nacionais e 34,2% estrangeiros. Ao nível das nacionalidades estrangeiras mais representadas, em primeiro lugar surgiam os espanhóis, com 34,3% dos turistas estrangeiros, em segundo lugar os franceses, com 17,9%, em terceiro lugar os ingleses, com 15,8% e em quarto lugar os holandeses, com 9,4%130.

Uma vez que a informação estatística disponível era pobre, para uma análise mais profunda da procura turística na região, baseámo-nos ainda nos dados primários recolhidos pelo PETUR e por Vaz (2003). Apesar das diferenças quer no objecto geográfico de análise, quer nas metodologias e informações procuradas. Há em ambos os estudos aspectos comuns, cujas conclusões para nós mais relevantes procurámos sintetizar de forma qualitativa131 na tabela seguinte.

Variáveis analisadas nas

amostras PETUR (2006) Vaz (2003)

Análise socioeconómica

Nacionalidade quase todos os turistas eram

nacionais a maioria dos turistas eram nacionais

Idade a grande maioria tinha mais de

30 anos a maior fatia tinha entre 35 a 49 anos

Habilitações a maioria tinha formação

superior

a maioria tinha formação superior

Profissão a maior fatia eram

especialistas de profissões intelectuais e científicas

a maior fatia eram professores

129 Calculado a partir dos dados do INE.

130 Os dados foram trabalhados de modo a obter a informação desejada.

131 Dado se tratarem de estudos diferentes, pareceu-nos mais adequado compará-los de forma qualitativa, traduzindo

Variáveis analisadas nas

amostras PETUR (2006) Vaz (2003)

Rendimento a maioria auferiam

rendimentos superiores a 1.500€ a maioria auferiam rendimentos superiores a 1.500€ Análise da viagem

Companhia a maior fatia viajou só com o

cônjuge e a grande maioria viajou sem crianças

a maior fatia viajou só com o cônjuge e a grande maioria viajou sem crianças

Meio de transporte a grande maioria utilizou

automóvel próprio a grande maioria utilizou automóvel próprio Organização de viagem a grande maioria organizou a

viagem directamente a grande maioria organizou a viagem directamente Tipo de alojamento a maior fatia escolheu ficar

alojada num hotel

a maior fatia escolheu ficar alojada num hotel

Tempo de permanência a maior fatia permanecia na

região 2 a 3 dias a maior fatia permanecia na região 3 a 4 dias Motivação de viagem a grande maioria viajava em

férias/ lazer a grande maioria viajava em férias Despesas em (alimentação e

compras) a maior fatia é afecta a gastos em restaurantes; a compra de produtos regionais representa uma despesa pequena para a maioria

não analisado

Visitas anteriores a grande maioria já tinha

visitado antes a grande maioria já tinha visitado antes Visitas/ permanência a grande dos turistas visitou

locais geográficos associados aos concelhos de Seia, Covilhã e Manteigas

a maior fatia ficou alojada na Covilhã, a seguir em Seia e a seguir em Manteigas

Análise da apreciação da viagem Aspectos mais agradáveis a maior fatia valorizou mais as

condições naturais da região e a seguinte da identidade regional (história, ruralidade, gastronomia…) e a qualidade do acolhimento

a maior fatia valorizou mais a paisagem natural e a seguinte o património e as aldeias históricas, a que se seguiu a hospitalidade

Aspectos mais desagradáveis

os aspectos mais focados foram as acessibilidades e a deficiente informação turística,

seguindo-se questões relacionadas com a oferta turística (restauração e animação)

a maior fatia focou a poluição e degradação dos espaços, seguida da deficiente valorização dos recursos naturais e, em terceiro lugar, as dificuldades no acesso a informação turística

Aspectos em falta melhores acessibilidades,

informação turística, marketing e organização, entretenimento

informação relativa a percursos pedestres, informação sobre o parque

natural, acesso à internet

Intenção de regresso não analisado quase a totalidade dos turistas

declararam intenção de regressar

Tabela 3 – Comparação de estudos sobre a procura turística na Serra da Estrela

Da comparação dos estudos anteriores ressalta uma grande sintonia nas características da procura turística na região, não só em termos socioeconómicos, mas também nos aspectos mais práticos da viagem e na apreciação que era feita pelos turistas à região.

Contrariamente à leitura anteriormente realizada a partir de dados estatísticos, nas amostras estudadas, predominavam turistas de extractos socioeconómicos elevados e com um elevado nível cultural, aspectos que podem justificar a valorização de aspectos relacionados com a natureza, a cultura e as exigências de mais informação e melhor preservação do ambiente. Na sua maioria, eram casais sós, aspecto coincidente com as tendências demográficas dos nossos tempos e que em termos turísticos pode levar a uma maior atenção ao desfrute de um tempo de qualidade e prazer, potenciando a atenção ao detalhe, logo uma maior exigência perante a oferta turística.

Chamou-nos ainda à atenção a grande concentração do turismo nos concelhos da Serra da Estrela, questão coincidente com os dados estatísticos anteriormente analisados ao nível das taxas de ocupação hoteleira. Este aspecto é indiciador de que os restantes concelhos retirarão poucos benefícios do turismo.

Uma vez que quase a totalidade dos turistas viajavam de automóvel, a questão das acessibilidades assumia uma importância vital, aspecto que parece manchar a imagem da região, coincidindo com a análise efectuada no anterior ponto relativo à oferta turística. Outro aspecto coincidente com a anterior análise prendia-se com a informação turística, que estava longe de satisfazer os turistas, possivelmente fruto das falhas de funcionamento ao nível dos postos turísticos.

No que respeita às despesas turísticas, excluindo o alojamento, a maior fatia da despesa turística era captada pelos restaurantes, parecendo existir alguma incapacidade da região em captar o rendimento turístico para aspectos como a animação e os produtos regionais. Dada a sua importância para a nossa investigação, este nível de despesa em produtos regionais será aprofundado no ponto seguinte e nos capítulos relativos à nossa investigação empírica.

Relacionando aquele perfil de turistas que visita a região e o verificado em outros destinos de turismo rural em Portugal parecem existir algumas coincidências relevantes. Como as verificáveis no estudo realizado por Kastenholz (2000) para a Comissão de Coordenação da Região Norte relativamente às áreas rurais do Norte de Portugal, onde como refere Kastenholz, os traços mais comuns eram os turistas “com níveis educacionais mais elevados (…) viajando geralmente em casal ou pequenos grupos”, apreciando fundamentalmente aspectos que “dizem respeito à natureza e paisagem, à cultura e à simpatia das pessoas”, sendo objecto das maiores críticas “as condições de tráfego (…), alguma degradação ambiental e falta (…) de informação” (in Kastenholz, 2003: 212). Aspectos que parecem corresponder a um padrão na procura turística em destinos rurais em Portugal.

Em suma, parece-nos que a região está a viver turisticamente dos seus recursos turísticos, que de facto são valorizados pela procura turística, mas encontra-se ainda distante da sua adequada rentabilização e utilização para um desenvolvimento regional efectivo e equilibrado. No entanto, através daquelas amostras parece-nos existir a capacidade de atrair públicos interessantes do ponto de vista económico, que, em contrapartida, também serão mais exigentes perante a oferta, obrigando a uma maior organização e a uma maior qualidade.