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PAR – TER: uma ligação importante para o desenvolvimento rural

Capítulo 4. Ligar os Produtos Agro-alimentares Regionais e o Turismo em Espaço Rural:

4.2. PAR – TER: uma ligação importante para o desenvolvimento rural

A ligação entre o turismo em espaço rural e os PAR tem ganho importância em termos académicos e políticos como estratégia de desenvolvimento rural (Boyne et al., 2003). Como referem Boyne, Hall e Williams (2003), “a junção política do turismo e da produção alimentar representa a mudança na governança do desenvolvimento rural – de uma abordagem sectorial para uma abordagem territorial” (Boyne et al., 2003: 132). Esta abordagem vai assim no sentido das novas políticas de desenvolvimento rural europeias e, em geral, das diversas correntes teóricas de desenvolvimento propostas nas últimas décadas79, já que:

ƒ constitui uma abordagem multi-sectorial: incluindo os sectores agro-alimentares e turismo e sectores complementares;

ƒ assenta na valorização dos recursos endógenos das zonas rurais: promovendo a gastronomia, os produtos transformados tradicionais, as sementes e produtos agrícolas regionais, as técnicas tradicionais e locais de produção e transformação, bem como, a riqueza cultural associada ao modo de vida e às artes tradicionais, numa integração perfeita com o território enquanto destino turístico;

ƒ estabelece uma relação com o espaço simultaneamente utilitária e protectora do ambiente: as técnicas de produção empregues nos PAR não são intensivas, assentam na qualidade e não na quantidade, recorrendo por isso a métodos produtivos não invasivos e apresentando externalidades positivas decorrentes da manutenção da paisagem e da biodiversidade, logo numa lógica de sustentabilidade.

ƒ é favorecedora uma perspectiva participada (“bottom-up”) por agentes geralmente não favorecidos por lógicas “economicistas” (mulheres, agricultores e artesãos de zonas marginalizadas), mas detentores de um património culturalmente importante, constituído pelos saberes de experiência feitos, sendo a valorização das suas competências uma forma de os tornar em actores centrais no processo de desenvolvimento;

ƒ pode ser uma forma efectiva de redistribuição do rendimento gerado pelo turismo, permitindo às gentes locais participarem dos benefícios das novas procuras urbanas.

Importa destacar ainda que nesta perspectiva a atracção do rural deixa de residir num espaço idealizado, estático e teatralizado, para se basear num rural vivo onde é bom viver, logo que é bom visitar. Efectivamente, a gastronomia e os PAR possibilitam o enriquecimento da experiência turística de diversas formas: indirectamente, pelo contacto com espaços esteticamente interessantes e pelo vivenciar de uma cultura rural viva e dinâmica; e, claro, directamente, pelo degustar de novos sabores, com a possibilidade de levar para casa o prolongamento de um momento de prazer e ligação à terra.

Todos aqueles factores podem então reflectir-se no aumento da despesa turística na região e na consolidação de um lobby de defesa pró-PAR, essencial para conseguir integrar estes nos canais modernos de distribuição e permitir-lhes ultrapassar as suas fronteiras de origem. “Quando os mercados locais e nacionais são limitados na escala, o desenvolvimento efectivo de produtos de nicho requer a capacidade de interacção com mercados exteriores e, potencialmente, sistemas internacionais.”80 (in Cawley, Gaffey, & Gillmor, 2002: 65). Ou como referem Murdoch e Miele (1999), “os produtos de qualidade devem ser capazes de viajar (…) para fora de casa” (in Cawley et al., 2002: 66). Portanto, uma forma de defesa do local pode passar pelo movimento de globalização originado pelo turismo.

No entanto, como vimos, aquela ligação não é imediata e carece de estudos que a permitam aprofundar, de modo a facilitar abordagens que tornem aquelas possibilidades em realidades. Apesar de ainda escassos, já vai sendo possível confirmar aquelas assumpções através de alguns exemplos bem sucedidos de abordagens fortalecedoras da relação TER – PAR. Para esta nossa análise chamámos dois desses exemplos.

Telfer (2000) descreve uma experiência no sul do Ontário (Canadá) que consistiu numa “aliança de qualidade alimentar” entre produtores alimentares, transformadores, distribuidores, hotéis, restaurantes, produtores vitivinícolas e chefs (in Boyne et al., 2003: 138). Esta abordagem de integração numa rede de cooperação conseguiu diversas conquistas em termos de desenvolvimento para a região (in Boyne et al., 2003):

ƒ uma melhoria no perfil gastronómico local;

ƒ a melhoria da comunicação entre os membros da aliança e dos consumidores (através de acções de marketing);

ƒ a melhoria da confiança na produção local;

ƒ a ultrapassagem de barreiras comerciais por parte dos pequenos negócios, ajudando-os na sua competitividade;

ƒ e, finalmente, a criação de novos mercados para os produtos locais.

Boyne, Williams e Hall (2001, 2002) examinaram uma outra experiência de sucesso ocorrida na Escócia, na Ilha de Arran, que consistiu no desenvolvimento de um guia gastronómico e turístico denominado “Isle of Arran Taste Trail” (in Boyne et al., 2003: 138). Uma pesquisa conduzida junto dos visitantes que haviam lido o guia permitiu concluir81 (in Boyne et al., 2003: 138):

ƒ que estes ficaram mais disponíveis para aumentar a sua despesa em refeições que integrassem produtos locais;

ƒ que tinham aumentado a sua propensão a comer fora;

ƒ que estavam mais disponíveis para futuras compras de produtos agro-alimentares locais; ƒ finalmente, que a qualidade gastronómica de Arran era um factor positivo para a sua decisão de futuras visitas à região.

80 Expressão traduzida. 81 Traduzido e adaptado.

Uma nova pesquisa realizada junto de algumas empresas turísticas de Arran permitiu ainda concluir82 (in Boyne et al., 2003: 138):

ƒ que a iniciativa tinha ajudado a melhorar o seu volume de vendas e lucro;

ƒ que tinha contribuído para aumentar o volume de refeições preparadas e vendidas; ƒ que a despesa média por refeição tinha aumentado;

ƒ e que tinha contribuído para aumentar a época alta de turismo na região.

Estes são apenas alguns exemplos em como uma estratégia assente no reforço da ligação entre o turismo rural e os produtos agro-alimentares regionais pode ser bem sucedida do ponto de vista do desenvolvimento regional. Partindo desta assunção, chegámos assim ao argumento central da presente investigação: a maximização do consumo de PAR locais pela indústria turística constitui um mecanismo de desenvolvimento em regiões predominantemente rurais. Este constituiu assim o ponto de partida para a investigação empírica que se descreve na Parte II da presente dissertação.

Capítulo 5. Hipóteses da investigação, objecto de análise e