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CAPÍTULO 2 A RESPONSABILIDADE DO ESTADO

2.2 A Responsabilidade Civil

Responsabilidade origina-se de responder, “do latim respondere, tomado na significação de responsabilizar-se, visa garantir, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou ou do ato que praticou”.22 No sentido jurídico, divide-se, em um primeiro momento, em responsabilidade penal ou civil. A penal é derivada do crime. A civil é derivada do contrato ou do ato ilícito, inclusive o criminoso, cuja conseqüência é a obrigação de indenizar.23 Indenizar significa tornar indene (do latim indemnis), que quer dizer íntegro, livre de perdas,24 reparado, recompensado. Desse modo, a responsabilidade civil conduz imediatamente à necessidade de indenização. A obrigação de indenizar advém do ato ilícito. A distinção é importante em matéria probatória, pois, enquanto que na responsabilidade por ato ilícito (aquiliana) cabe à vítima demonstrar a culpa do agente causador do dano, na responsabilidade contratual, demonstrado pelo credor que a prestação foi inadimplida, “o onus probandi se transfere para o devedor faltoso, que terá que evidenciar a inexistência de culpa sua, ou a presença da força maior, ou outra excludente de responsabilidade capaz de eximi-lo do dever de indenizar.”25

A responsabilidade civil tem como pressupostos a ação ou omissão do agente, sua culpa, a relação de causalidade e o dano experimentado pela vítima. Pode-se, pois, dizer que a responsabilidade repousa sobre um fato ilícito civil, o qual tem como elementos ou requisitos uma conduta comissiva ou omissiva, a culpa do agente, um resultado danoso, relação de causalidade ou nexo causal, entre essa conduta e o resultado e tudo isso infringindo um dever legal, contratual ou social.

A conduta praticada por ação, portanto, comissiva, consiste no agir, no atuar positivamente no mundo exterior através de movimento perceptível pelos sentidos. Já a conduta omissiva pressupõe a ausência de movimento, a abstenção, o não-

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PIOVESAN, 2000, p.180. 22

SILVA, Plácido. Vocabulário Jurídico. Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1967, vol. IV. p. 1367. 23

RODRIGUES, Sílvio. Responsabilidade Civil. São Paulo : Saraiva, 1983, vol. IV, p. 5. 24

SILVA, op. cit., vol. II, p. 815. 25

agir, e não-fazer o que era devido. Tanto na ação quanto na omissão, o dever infringido pode ser legal, contratual, ou social, compreendendo o último caso, a hipótese de abuso de direito.

Essa conduta comissiva ou omissiva geradora da responsabilidade civil pode ser praticada pelo próprio agente ou por terceiro por quem o agente responde. Assim respondem os pais pelos filhos menores; o tutor e o curador pelos pupilos e curatelados; o patrão ou o comitente pelos empregados, serviçais e prespostos; os donos de hospedagens e estabelecimentos educacionais pelos seus hóspedes, moradores e educandos, etc.26 Após alguma dissensão doutrinária, entende-se hoje que a idéia do risco é a que mais se aproxima da realidade. Se o pai põe filhos no mundo, se o patrão utiliza os serviços de seus empregados, evidente que correm o risco de que da atividade daqueles surja dano a outrem, que se advier, devem por ele responder.

A idéia que justifica essa espécie de responsabilidade é o anseio de assegurar e garantir a reparação do dano, protegendo a vítima.

Sobre a responsabilidade por atos de terceiro, respondem as pessoas jurídicas de direito privado semelhantemente ao patrão, amo ou comitente, por atos de seus empregados, serviçais ou prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou por ocasião dele. Igualmente as pessoas jurídicas de direito público.

Como pressuposto para a responsabilidade civil há ainda a culpa do agente, aqui entendida no seu sentido lato, compreendendo dolo e culpa. O dolo consiste na vontade e na consciência quanto ao ato que dá causa a um dano previsto. A culpa consiste em proceder o agente sem tomar os cuidados objetivos recomendados no caso, vindo a causar um dano previsível. Ambos se equivalem.

Embora a idéia de que a responsabilidade civil derivada da culpa fosse de grande justificativa moral, com o progresso da ciência, da técnica e desenvolvimento dos maquinismos à disposição do homem, tal idéia tornou-se inadequada para atender ao anseio de ressarcimento do dano experimentado pelas vítimas. Impor a estas o ônus de provar a culpa do agente, equivale muitas vezes a deixá-los irressarcidos pela barreira intransponível que no mais das vezes isso representa. Para remediar o rigorismo dessa situação, a doutrina preconizou alguns

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expedientes, segundo Alvino Lima,27 que consistiam em propiciar maior facilidade à prova da culpa, na admissão do abuso de direito, na presunção de culpa, na admissão da responsabilidade contratual e na admissão em alguns casos da teoria do risco.

Desses mecanismos paliativos, dois merecem destaques: o reconhecimento da presunção da culpa e a admissão da teoria do risco.

A presunção de culpa ou presunção de responsabilidade, tem por finalidade principal a reversão do ônus da prova: ao invés da vítima ter que provar a culpa do agente, é este que tem que provar a sua não-culpa ou alguma excludente de responsabilidade.

Do mesmo modo, a admissão da teoria do risco facilita a situação da vítima porque se inspira na idéia de que o elemento culpa é desnecessário para caracterizar a responsabilidade. A obrigação de indenizar não se apóia em nenhum elemento subjetivo (dolo ou culpa), mas em elemento objetivo, representado pelo nexo causal entre o ato do agente e o dano. É a responsabilidade pela reparação do dano causado por uma atividade exercida no interesse do agente e sob seu controle.28

Para que emirja a responsabilidade civil é necessário que exista ainda a relação de causalidade, o nexo causal, entre a ação ou omissão do agente e o resultado danoso.

A relação de causalidade é o liame que existe entre a ação ou omissão do agente e o resultado danoso. É a relação entre causa e efeito. Causa é tudo que concorre para um resultado. É a conditio sine qua non para a existência do resultado. Não se distingue entre causas e concausas, principais ou secundárias. Tudo é causa desde que dela dependa um resultado.

Quando se examina a relação de causalidade, tem-se procurado na doutrina especificar os eventos que a excluem. É evidente, porém, que a responsabilidade civil pode ser afastada não só pela quebra do liame de causalidade, mas, também, pelos excludentes de culpabilidade e de ilicitude.

Por derradeiro, cabe mencionar quanto ao tema, a questão do resultado

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RODRIGUES, 1983, 5.º vol, p. 166. 28

SAVATIER. Traité, vol. I, n.º 274: “La responsabilité fondée sur le risque créé consiste dans l’obligation de réparer des faits dommageables produits par une activité qui s’exerçait dans votre intérêt et sous votre contrôle”. Citado por RODRIGUES, 1983, p. 170).

danoso. O dano pode ser material ou moral. Dano material é a lesão perceptível no mundo dos fatos que atinge o patrimônio de alguém. Dano moral é a lesão ocorrida no “patrimônio ideal” de outrem, entendendo-se como tal “o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico”.29 Em síntese, dano material é prejuízo patrimonial e dano moral é a dor, a mágoa, a tristeza infligida injustamente a alguém. Ocasionado o dano, qualquer que seja, por ele responde o causador, ressarcindo o prejuízo e tornando indene a vítima.