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A RESPONSABILIDADE DO SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO

3 RESPONSABILIDADE DO SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO 3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE RESPONSABILIDADE

3. relação de causalidade entre a ação ou omissão e o dano verificado; 4 ocorrência de um dano material ou moral 323

3.8 A RESPONSABILIDADE DO SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO

O servidor público temporário não escapa à regra, sendo-lhe aplicado tudo o que foi estudado anteriormente quanto às responsabilidades civil, penal, administrativa e também por ato de improbidade administrativa, de acordo com a transitoriedade da contratação temporária.

Diante da realidade dos servidores públicos temporários, poder-se-ia até pensar em um “princípio de equiparação”, ou seja, a responsabilidade dos servidores públicos temporários e a dos demais servidores públicos (“não temporários”) são iguais, pois eles preenchem todos os requisitos: são servidores públicos e há responsabilidade, mas, como o vínculo temporário é reduzido, o processo administrativo disciplinar destinado a apurar a falta cometida também é reduzido.

Todavia, esse chamado regime equiparável necessita de adaptações em razão das especificações do vínculo especial a que se submete o servidor público temporário, e são justamente essas especificações que se pretende demonstrar.

Como se tenta introduzir no regime jurídico do servidor público temporário uma espécie de “princípio de equiparação”, buscar-se-á, no capítulo sobre o processo administrativo disciplinar (Capítulos 4 e 5), construir um regime jurídico disciplinar a ser aplicado ao servidor público temporário, observando-se as suas peculiaridades, mas com base no processo de apuração do ilícito para os servidores públicos.

O ponto central deste trabalho reside na demonstração de que o servidor público temporário responde pelos atos ilícitos em todas as esferas: penal, civil, administrativa e por atos de improbidade. Não é porque está transitoriamente na função que será eximido de responsabilidade ou protegido pelo excepcional interesse público; pelo contrário, por ser um servidor público, está sujeito aos ônus e bônus do serviço público, ou seja, aos direitos e deveres, com as devidas adequações ao servidor temporário.

Assim, a responsabilidade do servidor público deverá ser apurada mediante um processo administrativo disciplinar especial (ou sindicância ou processo sumário), adaptado à realidade dos servidores públicos temporários, ou seja, por um instrumento processual pelo qual, respeitados o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, chegar-se-á, se for o caso de responsabilização, à aplicação de uma medida sancionatória para aquele servidor temporário que cometeu um ilícito.

Atentos às peculiaridades desse servidor público temporário, buscar-se-á compatibilizar as suas características com o procedimento mais adequado para a apuração

de suas faltas, garantindo a observância do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório durante todas as etapas do processo.

O presente trabalho abordará a responsabilidade do servidor público temporário pela prática de infrações disciplinares no âmbito administrativo, bem como o regime disciplinar aplicado ao temporário.

Sustenta-se que a regular apuração de eventuais infrações disciplinares cometidas por servidor temporário é medida imposta pelo interesse público, que reclama que o servidor faltoso, ainda que temporário, não seja pura e simplesmente “distratado”, como se o desligamento se desse por “mera conveniência e oportunidade” da Administração. Sem a apuração, pode-se chegar, por exemplo, à absurda situação de um servidor temporário que cometeu ato de corrupção e foi novamente contratado pela Administração um ano após a extinção do vínculo.

A natureza precaríssima da contratação temporária exige apuração simplificada e célere de faltas disciplinares porventura praticadas em seu âmbito. A Lei n.º 8.745/93 previu a utilização da sindicância com duração máxima de 30 (trinta) dias, que poderá, até mesmo, resultar na aplicação da pena de demissão. Não se concorda com a utilização da sindicância para aplicar uma penalidade de demissão ao servidor público temporário, mesmo em razão da natureza precária do vínculo. O mais adequado seria a previsão de um processo administrativo disciplinar adaptado, com prazos reduzidos, ou seja, um “miniprocesso administrativo disciplinar”. Em razão de ausência de um rito próprio, buscar-se-á demonstrar como seria desenvolvido o processo administrativo disciplinar na apuração de faltas do servidor público temporário, atendidos os preceitos legais e constitucionais e particularidades do servidor público temporário.

Defende-se a aplicação aos servidores públicos temporários de um regime especial. Assim, também haveria um meio especial de apuração de infrações assemelhado ao processo administrativo disciplinar, com as peculiaridades adaptadas aos servidores públicos temporários, sempre observando o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa em todos os casos de aplicação de penalidade, mesmo uma simples advertência.

Poder-se-ia até mesmo utilizar a sindicância para a aplicação de uma advertência ou de uma suspensão por até 30 dias ao servidor público temporário (semelhante ao meio de apuração dos servidores públicos em geral), mas obedecendo-se ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.

Serão analisadas algumas situações nas quais o servidor temporário responde por seus atos ilícitos. Suponha-se, por exemplo, que um servidor temporário tenha praticado irregularidades em operações bancárias na conta corrente de determinada entidade pública, visto que foram feitos depósitos de ordens bancárias em contas indevidas, diversas daquelas em que deveriam ter sido realizados. Foram encontradas guias de depósito em nome do referido servidor temporário, bem como em nome de seus parentes.

As irregularidades administrativas devem ser objeto de apuração mediante processo administrativo disciplinar, encontrando-se entre as condutas legais a pena máxima de demissão se comprovada a lesão aos cofres públicos.

Deve-se ressaltar que a infração administrativa apurada no competente processo administrativo disciplinar, punível com demissão, tem repercussões que vão além do simples afastamento do servidor. No caso de ser impossível, na aplicação da penalidade de demissão, afastar o servidor que não mais possui vínculo com a administração pública, nada obsta a que consequências jurídicas acessórias (impossibilidade de retorno ao serviço público, por exemplo) sejam registradas.

Não se pode demitir quem já foi demitido366. Caso seja aplicada a penalidade de demissão a um servidor já demitido, deve-se, no despacho final, registrar a pena, sem aplicá-la, porquanto o servidor já terá sido demitido, registrando-se no prontuário do servidor a demissão para eventuais futuros direitos. Tal medida resguardará o interesse público, legitimará o devido assentamento da pena nos registros funcionais do servidor, permitirá a produção, quando for o caso, das providências que decorrem da aplicação da pena demissória.

Além disso, cabe a responsabilidade civil por ato irregular, por improbidade, e a representação ao Ministério Público para fins de apuração dos ilícitos penais.

Os atos cometidos no exemplo acima citado caracterizam atos de improbidade administrativa, previstos no artigo 37, § 4.º, da Constituição Federal e disciplinados pela Lei Federal n.º 8.429/92. A conduta do servidor temporário pode ser enquadrada nas três espécies de atos de improbidade administrativa constantes na lei. Isso porque o servidor temporário beneficiou-se de verbas provenientes dos cofres públicos e destinadas a

366 Em sentido contrário, Léo da Silva Alves ressalta a possibilidade jurídica de demitir quem já foi demitido

e destaca a natureza do poder hierárquico da Administração, o efeito didático da pena e a eficiência do resultado, quanto à garantia de não reintegração, de penas acessórias e do registro em folhas funcionais (ALVES, Léo da Silva. Processo disciplinar em 50 questões. Brasília, DF: Brasília Jurídica, 2002, p.103- 104).

terceiros, o que caracteriza enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e ofensa aos princípios da administração pública.

Dessa forma, o servidor temporário poderá ser acionado judicialmente por ato de improbidade, nos termos do artigo 17 da Lei n.º 8.429/92, que atribui a competência processual para a propositura da ação ao Ministério Público, bem como à pessoa jurídica interessada, sem prejuízo da possibilidade de utilização das medidas cautelares de sequestro e indisponibilidade de bens.

O enquadramento da conduta do servidor temporário como ato de improbidade administrativa garante resultados e consequências jurídicas efetivas não só pelo fato de a lei adotar um conceito de agente público amplo e estender suas disposições inclusive a terceiros, como também pelas cominações estabelecidas nos incisos do artigo 12 da Lei de Improbidade, que vão desde o ressarcimento do dano, passando pela perda da função pública, até a suspensão de direitos políticos e a proibição de contratar com o Poder Público e receber benefícios ou incentivos fiscais.

No que tange ao ressarcimento do dano civil, considera-se o disposto no artigo 37, § 5.º, da Constituição Federal.

Em relação ao ilícito penal, deve haver representação ao Ministério Público para fins de apuração dos ilícitos penais, pois a conduta do servidor temporário poderá ser enquadrada nos tipos penais contidos nos artigos do Código Penal n.º 312 (peculato) e n.º 324 (exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado).

Entende-se que deve ser instaurado processo administrativo disciplinar contra o servidor temporário, ainda que ele não mantenha mais vínculo com a Administração Pública, considerando-se que a irregularidade administrativa causadora de lesão aos cofres públicos foi praticada à época do vínculo existente.

Mesmo tratando-se de servidor temporário e sendo o vínculo mantido com a Administração considerado precário, o servidor temporário deverá responder pelos atos praticados na vigência do contrato, pois está sujeito aos princípios e regras do direito administrativo aplicável a todo e qualquer servidor.

Outra situação em que o servidor temporário responde civilmente, penalmente, administrativamente e por atos de improbidade: um servidor público temporário não prestou contas nem ressarciu o erário dos valores recebidos e supostamente não aplicados devidamente. Houve repasse ao servidor de determinado valor relativo às diárias que lhe permitiam a participação em um determinado curso de formação de professores, mas não houve prestação de contas. Cabe a instauração de processo administrativo disciplinar para

apuração de faltas, independentemente da responsabilidade penal, civil e por improbidade administrativa.

Mais um caso que caracteriza a independência das instâncias: um servidor público temporário, ao ser preso em flagrante, requereu licença sem vencimentos pelo prazo de 30 (trinta) dias. Tal licença não é cabível no âmbito da contratação temporária. Se, em virtude de prisão em flagrante, o servidor não mais pode comparecer ao serviço, a providência que a Administração deve tomar é, em princípio, a rescisão unilateral do contrato temporário, além da apuração das demais responsabilidades.

É sabido que a contratação temporária só é permitida para o atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público (artigo 37, IX, da Constituição Federal) e, nessa medida, não se pode admitir que, estando o servidor impedido de comparecer ao serviço em razão de prisão em flagrante e, consequentemente, de dar atendimento à necessidade ensejadora da contratação, seja o contrato mantido em vigor em flagrante prejuízo ao interesse público.

Além disso, há necessidade de instauração de processo administrativo disciplinar, que viabilize a regular apuração da suposta falta funcional cometida pelo interessado, sendo oportunizada a ampla defesa e o contraditório que lhe são constitucionalmente assegurados (artigo 5.º, LV, da Constituição Federal). Sem esquecer que tal servidor responde criminalmente pelos seus atos.

Outro caso: um servidor temporário incorreu em inassiduidade habitual, tendo faltado ao serviço, sem causa justificada, por 60(sessenta) dias interpolados durante um ano. Tal servidor descumpriu os deveres elementares. Tal situação deve ser apurada em procedimento sumário em que lhe seja assegurada a ampla defesa e o contraditório. Da mesma forma, nos casos de descumprimento de obrigação imputável ao servidor temporário (como no caso de inassiduidade habitual), a extinção deve ser formalizada em procedimento sumário, no qual seja oportunizada ao servidor a ampla defesa e o contraditório, antes da extinção do vínculo.

Ao lado da responsabilidade do servidor público temporário, nos casos de contratação temporária irregular, poderia ser incluída na legislação brasileira, a exemplo da legislação portuguesa (artigo 92, n.º 3, da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro), a responsabilidade civil, disciplinar e financeira da pessoa (dirigente máximo dos órgãos ou serviços) que permitiu (celebrou) ou renovou a contratação (irregular). E ainda deve ser declarado nulo o contrato.

Como se pode constatar, o servidor público temporário responde civilmente, penalmente, administrativamente e por atos de improbidade pela prática de um ilícito, como qualquer outro servidor público (princípio de equiparação).

4 REGIME DISCIPLINAR DO SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO

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