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A CONTRIBUIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PARA O ENTENDIMENTO DA NORMA CONSTITUCIONAL

1. os servidores estatutários, sujeitos ao regime estatutário e ocupantes de cargos públicos; 2 os empregados públicos, contratados sob o regime

2.9 A CONTRIBUIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PARA O ENTENDIMENTO DA NORMA CONSTITUCIONAL

Há uma controvérsia acerca da possibilidade de contratação por tempo determinado de servidores para o exercício de funções permanentes.

Durante muito tempo, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a contratação por tempo determinado não poderia ser feita para o exercício de funções permanentes, conforme Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.º 2.125-7, de 1999 (INPI), n.º 2.380-2, de 2000 (INPI), n.º 2.229-6, de 2000 (contratação temporária de defensores públicos).

A partir do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.068-0 (CADE), em 25 de agosto de 2004, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a possibilidade de contratação temporária para o exercício de atividades permanentes da administração pública259. Em um julgamento apertado, o relator Ministro Eros Grau afirmou:

257 MAIA; QUEIROZ, 2007, p. 64. 258 ESTORNINHO, 2009, p. 17.

O inciso IX do artigo 37 da Constituição do Brasil não separa, de um lado, atividades a serem desempenhadas em caráter eventual, temporário ou excepcional e, de outro, atividades de caráter regular e permanente. Não autoriza exclusivamente a contratação por tempo determinado de pessoal que desempenhe atividades em caráter eventual, temporário ou excepcional. Amplamente, autoriza contratações para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público em uma e outra hipótese. Seja para o desempenho das primeiras, seja para o desempenho de atividades de caráter regular e permanente, desde que a contratação seja indispensável ao atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público.

Ocorre que, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.700, em 15 de outubro de 2008, o Supremo Tribunal Federal adotou a posição vencedora no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 2.229-6, sobre a contratação temporária de advogados para o exercício de função de defensor público, no âmbito da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte. Considerou-se que, em razão de desempenhar uma atividade estatal permanente e essencial à jurisdição, a Defensoria Pública não convive com a possibilidade de que seus agentes sejam recrutados em caráter precário.

Em razão de abusos cometidos no passado, para os denominados “extranumerários” e “interinos”, é que se pode entender a posição restritiva do Supremo Tribunal Federal. Todavia, não se pode condenar o instituto da contratação temporária.

Realmente, como argumenta o Ministro Eros Grau, não há na Constituição Federal distinção entre atividades permanentes e atividades temporárias quando se trata da contratação temporária do artigo 37, IX.

Enfatiza Florivaldo Dutra de Araújo, ao tratar do dispositivo 37, IX, da Constituição Federal:

Com efeito, esse dispositivo prevê “contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária” e não “contratação para atividades temporárias”. Uma atividade pode ser permanente, mas a quantidade de pessoal necessário para exercê-la poderá ser excepcionalmente maior por determinado período de tempo, o que justifica a contratação temporária, e

Pinheiro de Queiroz pelo fato de que o CADE já existe há dez longos anos! Por mais incrível que possa parecer, foi mais fácil para o Governo, nesse longo período, aprovar diplomas legislativos autorizadores de contratações temporárias do que promover os competentes concursos públicos a fim de regularizar a situação de seu pessoal. Mesmo indagado sobre tal dado da realidade, o ilustre Ministro Eros Grau, condutor da votação majoritária, afirmou que “esse Tribunal não pode punir a inércia da administração. É um Tribunal que deve considerar fundamentalmente o que está escrito na Constituição”. Salvo engano, acima do inciso IX do artigo 37 dessa mesma Constituição, aparece o inciso II, que estabelece a obrigatoriedade de concurso público. Um pouco mais acima, mais precisamente no caput do artigo 37, o enunciado proclama que a Administração reger-se-á pelo princípio da moralidade. Mais apropriadas, isso sim, são as palavras do eminente Ministro Sepúlveda Pertence: “estamos abrindo uma porta à fraude sistemática do concurso público” (MAIA; QUEIROZ, 2007, p. 63-64).

não a admissão em caráter permanente. Suponha-se a ocorrência de uma epidemia, a exigir, por certo tempo, maior número de servidores da área da saúde. As atividades desse setor são permanentes para a administração pública, mas uma necessidade temporária obriga à contratação por tempo determinado260.

Florivaldo Dutra de Araújo adverte:

O posicionamento rígido, de se condenar qualquer hipótese de contratação temporária para o exercício de atividades permanentes, poderá ter o perverso efeito de induzir a administração pública a admitir, em cargos de provimento efetivo, maior número de servidores do que o normalmente necessário, apenas para se precaver contra eventuais situações de necessidade temporária. Tal situação ofenderia, no mínimo, os princípios da eficiência e da economicidade, previstos na CF, artigos 37 e 70. A administração pública somente deve admitir, em caráter permanente, o quantitativo de servidores normalmente necessário ao cumprimento de suas atribuições. Caso se apresente qualquer situação transitória, que leve ao acréscimo excepcional dessas atribuições, estaremos diante de necessidade temporária prevista no art. 37, IX, CF261.

Cármen Lúcia Antunes Rocha entende que, mesmo para o desempenho de funções inerentes a cargos públicos, pode ser configurada situação prevista na norma constitucional do artigo 37, IX, mas assinala:

Duas observações, contudo, devem ser relevadas: a primeira, no sentido de que quando sobrevier hipótese como aquela acima figurada, qual seja, a de contratação para suprir necessidade temporária de funções permanentes e enfeixadas em cargo, somente se pode dar a contratação enquanto não se chegar à realização do concurso que se torna obrigatório. A contratação impõe, obriga, determina o início e a continuidade de providências para o aperfeiçoamento do certame, o qual, conduzirá à extinção da condição criada mediante o contrato transitório; a segunda respeita à natureza do cargo que, desprovido, pode determinar a contratação temporária em face da urgência e imprescindibilidade do exercício de suas funções. Somente para cargo público cujo provimento seja de natureza efetiva pode vir a ser objeto da contratação aqui prevista, pois poder-se-ia cogitar da hipótese de vacância e necessidade de um tempo para a realização do certame correspondente262.

Registre-se, inclusive, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADIN n.º 2.380-2, declarou inconstitucional a alínea “c” do inciso VI do artigo 2.º da Lei n.º 9.849/99 e sua menção no § 2.º do artigo 3.º e no inciso III do artigo 4.º também da Lei n.º 9.849/99, que alterou a redação da Lei n.º 8.745/93, uma vez que as atividades relativas à implementação, ao acompanhamento e à avaliação de atividades, projetos e programas de área de competência do INPI ostentam natureza permanente, não se

260 ARAÚJO, 2009, p. 122-123, grifo do autor. 261 ARAÚJO, 2009, p. 123.

enquadrando nas hipóteses previstas no inciso IX do artigo 37 da Constituição da República263.

Quanto ao regime jurídico aplicado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e os Tribunais Regionais Federais assim se pronunciaram:

Ementa:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO

DE COMPETÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL.

CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. CONTINUIDADE DA

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. VÍNCULO JURÍDICO-

ADMINISTRATIVO INAFASTÁVEL. CONFLITO CONHECIDO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. 1. A Suprema Corte adotou o entendimento de que a mera prorrogação do prazo de contratação de servidor temporário não tem o condão de transmudar o vínculo administrativo que este mantinha com o Estado em relação de natureza trabalhista (RE 573.202/AM, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 2. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito do Distrito de Monte Alegre – Poço Redondo/SE, o suscitado264.

Ementa:

FGTS. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES POR AGÊNCIA REGULADORA EM RELAÇÃO A CONTRATO TEMPORÁRIO FIRMADO PELAS DISPOSIÇÕES DA LEI N.º 8.745/93. RELAÇÃO

SUJEITA AO REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO.

INEXIGIBILIDADE. 1. A Lei n.º 8.745/93 disciplinou a norma constante do art. 37, IX, da Constituição Federal, dispondo sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. 2. O contrato firmado pelas disposições da Lei n.º 8.745/93 vincula-se ao regime jurídico administrativo, de forma que o contratado não pode ser, sequer, equiparado ao trabalhador conceituado na CLT, mais se assemelhando ao servidor estatutário, especialmente porque o art. 11 da referida Lei determina a aplicação de disposições da Lei n.º 8.112/90 ao pessoal contratado por tempo determinado. 3. O § 2.º do art. 15 da Lei n.º 8.036/90 exclui a obrigatoriedade de recolhimento de FGTS quanto aos eventuais, os autônomos e os servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio. Os contratados em regime excepcional temporário da Lei n.º 8.745/93, por seu regime especial, estão excluídos do FGTS, assim como os servidores públicos civis regidos pela Lei n.º 8.112/90. Precedentes. 4. Não prospera a pretensão da parte apelante em obter condenação da ANEEL ao recolhimento de contribuições ao FGTS em decorrência de contrato temporário firmado pelas disposições da Lei n.º 8.745/93. 5. Apelação da parte autora improvida265.

263 MAIA, Márcio Barbosa e QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de. O regime jurídico do concurso público e o

seu controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 63.

264 STJ. CC 200901364585. CC – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – 106643. TERCEIRA SEÇÃO.

Relator: JORGE MUSSI. Data da decisão: 28/04/2010. Data da publicação: 02/08/2010.

265 TRF1. AC 200834000132451. AC – APELAÇÃO CIVEL – 200834000132451. QUINTA TURMA.

Relator: JUIZ FEDERAL PAULO ERNANE MOREIRA BARROS (CONV.). Data da decisão: 20/02/2013. Data da publicação: 07/03/2013.

Ementa:

FGTS. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. LEI 8.745/95.

IMPOSSIBILIDADE. CONTRATO REGIDO PELO DIREITO

PÚBLICO. VALIDADE DO CONCURSO PÚBLICO.

INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 363 DO TST. 1. A Lei n.º 8.745/93 disciplinou a norma constante do art. 37, IX, da Constituição Federal, sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. 2. O contrato firmado pelas disposições da Lei n.º 8.745/93 vincula-se ao regime estatutário dado pela Lei n.º 8.112/90, de forma que o contratado não se equipara ao trabalhador conceituado na CLT, mas sim servidor estatutário, especialmente porque o art. 11 da referida lei determina a aplicação de disposições da Lei n.º 8.112/90 ao pessoal contratado por tempo determinado. 3. Constata-se que o seu § 2.º do art. 15 da Lei n.º 8.036/90 exclui a obrigatoriedade de recolhimento quanto aos eventuais, os autônomos e os servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio. 4. Resta clara a validade do concurso público, não se aplicando a Súmula 363 do TST ao caso, pois, conforme processo administrativo, a apelante foi contratada mediante concurso público de rito simplificado nos termos da Lei n.º 8.112/90 com as alterações da Lei n.º 8.745/93, Lei n.º 9.849/99 e Lei n.º 10.667/03 para exercer a função de professora substituta de forma temporária para atendimento de excepcional interesse público. 5. Apelação a que se nega provimento266.

Os requisitos constitucionais constantes do artigo 37, IX, da Constituição Federal devem estar presentes, sob pena de serem declaradas inconstitucionais as leis que preveem a contratação de servidores temporários, como aconteceu com leis municipais que previam contratações sem concurso público.

O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade de leis nos municípios mineiros de Bertópolis, Estrela do Sul e Congonhal. As normas previam a contratação temporária de servidores públicos de forma genérica.

Os requisitos constitucionais devem estar presentes nas hipóteses de contratação temporária. Caso não sejam respeitados, configura-se um “salvo conduto para contratações que violem de pronto o princípio republicano do concurso público”.

Para o plenário do Supremo Trbunal Federal, ficou evidente, no caso das três leis impugnadas, a previsão genérica de contratação temporária, o que desrespeita a norma geral do concurso público.

Os casos de contratação temporária devem estar expressamente definidos em lei, a contratação deve ser temporária e deve haver excepcional interesse público. As regras estão expressamente definidas no artigo 37 da Constituição Federal, em seus incisos II e IX.

266 TRF3. AC 00008852620134036115. AC – APELAÇÃO CÍVEL – 1902802. PRIMEIRA TURMA.

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI. Data da decisão: 10/12/2013. Data da publicação: 15/01/2014.

O Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, analisando o caso de Bertópolis, ressaltou a generalidade da lei municipal. A lei não prevê as hipóteses em que possa ocorrer a contratação temporária, prevê de forma genérica e abrangente os casos de contratação e tampouco fixa prazo para as contratações excepcionais.

O recurso extraordinário (RE 658026) impugnou dispositivo da Lei n.º 509/1999 do município de Bertópolis. A norma permitia a contratação temporária de servidores públicos para cargos no magistério. Os ministros aplicaram modulação de efeitos para manter a eficácia de contratos celebrados até a data do julgamento (9 de abril de 2014) e assentaram que tais vínculos não podem exceder o prazo de 12 meses.

Também foram declarados inconstitucionais dispositivos da Lei Municipal n.º 731/2003, de Estrela do Sul, e da Lei Complementar n.º 1120/2003, de Congonhal, que trata do estatuto dos servidores municipais. Esses dois últimos casos – RE 556311 e RE 527109, respectivamente – receberam o mesmo tratamento pelo plenário, o provimento do recurso extraordinário com declaração de inconstitucionalidade das normas e modulação de efeitos.

O Supremo Tribunal Federal, em diversas ações267, deixa claro que é imprescindível para a contratação temporária a comprovação da necessidade temporária de excepcional interesse público.

267 Nesse sentido, os seguintes precedentes: ADIN2.380-2/DF; ADIN 1.500-1/ES; RE 168.566-RS; ADIN

3 RESPONSABILIDADE DO SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO

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