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A responsabilidade penal ambiental de pessoas jurídicas na jurisprudência

No documento DIREITO DOS DESASTRES (páginas 150-154)

2 DENÚNCIA CRIMINAL NO DESASTRE DE MARIANA

3 A RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DAS PESSOAS JURÍDICAS

3.1 A responsabilidade penal ambiental de pessoas jurídicas na jurisprudência

Para tratar da responsabilidade penal ambiental de pessoas jurídicas, este artigo empreendeu pesquisa jurisprudencial no Supremo Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça e no Tribunal Regional Federal da 4ª Região6. A escolha do último tribunal se justifica por ter sido o primeiro tribunal do País a condenar criminalmente uma pessoa jurídica (TRF4, 2002).

Cumpre ressaltar que não há qualquer processo em curso, ou com trânsito em julgado, de responsabilidade criminal que realce uma lide da magnitude do desastre de Mariana (MARTINS; FORMIGONI; MARTINS; ROSINI, 2017). A jurisprudência sobre essa responsabilidade das empresas em crime ambiental é escassa (KISHIDA, 2017, p. 99). Porém, o núcleo desta parte do artigo almeja demostrar que existe, sim, possibilidades de sancionar as pessoas jurídicas em desastres ambiental.

Passando aos resultados, a primeira condenação de uma pessoa jurídica, no Brasil, ocorreu em 2002, no julgamento da apelação criminal nº 2225 SC 2001.72.04.002225-0, da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, da relatoria do Desembargador Élcio Pinheiro de Castro (BRASIL, 2002a). A Corte analisou recurso de apelação de ente coletivo acusado e condenado em primeira instância pela degradação da flora nativa, entendeu que a imputação restou configurada. Neste caso, a empresa foi condenada a prestar serviços à comunidade, pagando R$ 10 mil para custear programas ambientais. Segundo o Juiz do caso, "a pena estabelecida é suficiente e necessária à reprovação da conduta, além do que reverterá em favor do meio ambiente, minimizando os efeitos do ato infracional"

(BRASIL, 2002a). Em outro julgado de 2003, do mesmo Tribunal, restou assentado no acórdão que : “1. Estando a responsabilidade penal das pessoas jurídicas prevista no art. 225, §3º da Constituição Federal e no art. 3º da Lei 9.605/98, descabe criar interpretações destinadas a reconhecer como inconstitucional o que a Constituição criou, pois é vedado ao Juiz substituir-se à vontade do constituinte e do legislador, ainda que dela possa discordar” (BRASIL, 2003a). Em síntese, o TRF 4º Região firmou posição contrária à jurisprudência da dupla imputação. Em outro

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A pesquisa jurisprudencial do TRF 4º Região se deu com base nas palavras crime, responsabilidade e pessoa jurídica. Foram localizados 14 acórdãos, mas abordados os julgados anteriores à mudança de posição do STF quanto à dupla imputação.

julgado, naquele ano, decidiu que “Em matéria ambiental, grandes danos somente podem ser reparados pelo poder econômico das empresas, que são suficientemente capitalizadas para cumprir a sanção”. Nele, o TRF defendeu a importância das penas aplicáveis à pessoa jurídica (BRASIL, 2003b).

No TRF 4º Região percebe-se um movimento de mudança da jurisprudência sobre a responsabilidade criminal ambiental da pessoa jurídica. Há, ainda, outro caso de imputação de penalidade à empresa Neste julgado, restou firmado que “1. Segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial predominante, a Constituição Federal (art. 225, § 3º) bem como a Lei nº 9.605/98 (art. 3º) inovaram o ordenamento penal pátrio, tornando possível a responsabilização criminal da pessoa jurídica (BRASIL, 2003).

Tais julgados foram inovadores, pois os doutrinadores, majoritariamente, eram contrários à responsabilização penal da pessoa jurídica. Isso reforçava que o judiciário só recebesse acusações contra pessoas jurídicas se houvesse dupla imputação. Ou seja, exigia que a denúncia fosse oferecida pelo Ministério Público contra a pessoa jurídica, entretanto, também, em face de seus dirigentes, ao mesmo tempo (GOMES, 2009). A ação penal era proibida de se dar somente em face daquele ente coletivo. Isso tornava morta a letra da lei de crimes ambientais. Caso não houvesse êxito em condenar os dirigentes responsáveis pela conduta destruidora do meio ambiente, impossível seria a propositura de ação penal contra a pessoa jurídica (KISHIDA, 2017, p. 100-102).

Sobre esse ponto, em agosto de 2013, o Supremo Tribunal Federal alterou a direção doutrinária e jurisprudencial que exigia a dupla imputação. No julgamento do Recurso Extraordinário nº 548181/PR, relatado pela Ministra Rosa Weber, em 06 de agosto de 2013, a 1ª Turma do STF decidiu que a dupla imputação corrompe o que estabelece o parágrafo 3º, do artigo 225 da Constituição Federal, o qual não determina que a pessoa moral e as pessoas físicas que a dirigem sejam responsabilizadas conjuntamente em uma ação penal (BRASIL, 2013) . De acordo com a Ministra, “tal interpretação, estaria restringindo sobremaneira sua eficácia e contrariando a intenção expressa do constituinte originário. Estaria, também, restringindo o alcance das sanções penais e da tutela do bem jurídico ambiental.

Ao final, Rosa Weber salientou que “o § 3º do art. 225 da Carta Política objetiva proteger um verdadeiro direito fundamental de terceira geração, de titularidade difusa, consistindo em comando ao legislador para a instituição de mecanismos de responsabilização civil, administrativa e penal de infratores da legislação ambiental, pessoas físicas ou jurídicas.” (BRASIL, 2013)

Diante da posição firmada no STF, o Superior Tribunal de Justiça, em 2015, mudou seu posicionamento sobre a necessidade da dupla imputação, ajustando-se à orientação. A mudança ocorreu no julgamento do Recurso em Mandado de Segurança 39.173/BA, da 5ª Turma, da relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (BRASIL, 2015). A turma entendeu pela possibilidade de propositura de ação penal em face de pessoa jurídica, em paralelo à apuração da conduta praticada pelas pessoas físicas que a dirigem. Tão logo, evidenciou-se desnecessária a dupla imputação. Desta forma, hoje está pacificado nos tribunais superiores que não se deve exigir a dupla imputação para responsabilizar penalmente um ente coletivo.

Os entendimentos do STF e STJ agora encontram-se alinhados ao que preceitua a Constituição Federal, em seu § 3º do art. 225 e na Lei nº 9.605/98 (BRASIL).

Em seguida, no TRF 4º Região, restou firmada posição de que a inépcia da denúncia em relação aos sócios não determina a finalização do feito, pelo contrário, designa o prosseguimento do processo no que concerne às pessoas jurídicas denunciadas (BRASIL, 2017). Esta informação é significativa para perceber que a exigência de dupla imputação, que prevalecia na doutrina e na jurisprudência, foi superada.

Esta parte do artigo reconhece a possibilidade de responsabilização penal das pessoas jurídicas, ante a posição do Supremo Tribunal Federal, em 2013 e, posteriormente, do Superior Tribunal de Justiça. Em seguida, passa-se a analisar a partir do caso concreto, que medidas melhor concretiza o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

4 A RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DE PESSOAS

No documento DIREITO DOS DESASTRES (páginas 150-154)