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A REUTILIZAÇÃO TÊXTIL

No documento A sustentabilidade no design de vestuário (páginas 76-79)

CAPÍTULO II ESTADO DE ARTE

VESTUÁRIO

2.5 A TRANSFORMAÇÃO DO DESPERDÍCIO TÊXTIL

2.5.1 A REUTILIZAÇÃO TÊXTIL

Quando o vestuário indesejado é colocado no caixote de lixo convencional ele vai acumular em Aterro sem qualquer possibilidade de recuperação, a não ser que a quantidade seja suficientemente elevada para passar pela valorização energética através da sua trituração e respectiva coincineração. Este método consiste em substituir parte do combustível fóssil utilizado em unidades industriais, como o carvão, por resíduos que tenham um poder calorífico significativo (Raposo et al, 2007)138. A destruição dos resíduos ocorre nos fornos das cimenteiras juntamente com as matérias-primas utilizadas para o fabrico do cimento e as vantagens do processo, em relação a outros de destruição térmica, devem-se às altas temperaturas dos fornos de cimento que possibilitam um elevado nível de destruição; os componentes orgânicos dos resíduos são totalmente destruídos e os metais são incorporados e fixos no produto final, o cimento. Contudo, como qualquer outro processo de tratamento térmico de resíduos, comporta riscos quer para o ambiente, quer para a saúde pública, como a libertação de poluentes atmosféricos. Por conseguinte, os riscos podem ser substancialmente reduzidos se foram tomadas algumas medidas (www.setubalnarede.pt)139

Se o vestuário for depositado em contentores específicos (figura 7a), esses resíduos serão separados e enviados para empresas de caridade que por sua vez as vendem para angariar fundos ou distribuem-nas por populações carenciadas. Grande parte do vestuário em segunda-mão é revendida para África, Ásia e Europa do Leste sendo alvo de distribuição em comerciantes de retalho de segunda-mão (figura 7b) ou noutros produtores (Thomson, 2006, p.12)140.

138 Raposo, H., Ana Delicado, Bastos, C., Rodrigues, M., & Gonçalves, M. E. (2007). Riscos da co-

incineração ou co-incineração dos riscos? Análise das controvérsias sobre resíduos industriais perigosos

(No. ISBN 978-972-671-205-3): Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. 139

Consultado em Maio de 2011, de

http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=detailFo&rec=1180 140 Thomson, R. (2006). Re-using & Recycling Clothes. London: Franklin Watts

59 7ª – Contentor da Ultripo

(Fonte:www.algarve-diario.com)

7b – Loja de vestuário em segunda-mão (Fonte: Thomson, R., 2006 – cit.136)

Figura 7 – Deposição do vestuário descartado e respectiva revenda.

A reutilização, nesses países, passa pela trituração dos têxteis para servirem de matéria-prima em isolamentos (figura 8a) ou pelo seu reaproveitamento para a concepção de peças de vestuário “novas” (figura 8b), acessórios ou objetos de artesanato (figura 8c). Neste caso são cortadas tiras de malhas para serem incorporadas na tecelagem de tapetes de trapo ou são cortados tecidos em formas geométricas para a elaboração de painéis decorativos, almofadas, bonecos, etc.

8ª – Reaproveitamento têxtil para isolamentos

8b – Produção de peças de vestuário novas

8c – Produção artesanal de tapetes de trapo (com restos de malha)

Figura 8- Reaproveitamento de vestuário descartado.

Em países industrializados, a reutilização de desperdício têxtil faz parte de uma ética de trabalho sustentável de projetos de Design onde se enquadram metodologias de trabalho de Upcycling e Refashion.

O “upcycling” de materiais não se trata apenas da conservação e reutilização de materiais mas de uma valorização que lhes é aplicada, possibilitando um novo “loop” no

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fluxo de vestuário e impedindo a sua “sepultura” (Murray, 2002)141

. Existem algumas marcas conceituadas que trabalham com o upcycling de materiais, como a marca australiana Romance was Born ou a inglesa Noki. A Romance was Born, fundada em 2005 por Anna Plunkett and Luke, produziu pontualmente (em 2010) uma coleção de vestuário feita com patchwork de materiais têxteis desperdiçados (figura 9a) mas na Noki-House of Sustainability essa matéria-prima faz parte da sua metodologia de trabalho, já que a sua filosofia de vida acompanha a ideologia do autor americano e anti-consumista convicto Kalle Lasn, também fundador da revista Adbusters (www.adbusters.org)142. Esta marca, dirigida pelo grande mestre da personalização, designer e ambientalista JJ Hudson, é um dos exemplos mais vanguardistas de vestuário criado a partir de peças de roupa descartadas e inutilizadas. Remendando peças através da aplicação de tachas, bordados, pinturas em manchas ou buracos que levaram as pessoas a descartarem-nas Hudson determina-se em provar que existe público-alvo interessado em peças únicas e que a moda pode ter sucesso de uma forma sustentável (figura 9b).

Em Portugal, segundo a revista Ginko (2008, s.d)143, Dino Alves foi o pioneiro português na arte de reutilizar roupas antigas. Começou por recolher roupas na Feira da Ladra conferindo-lhes estilos diferentes e originais e em 2001 concebeu o Hospital da Roupa, no Bairro Alto, em Lisboa, para reformular peças vintage, das quais ninguém se queria desfazer. Embora o seu objetivo não tenha sido fundamentado na causa ecológica, hoje, reconhece que faz sentido reaproveitar peças de vestuário.

O Refashion é outra técnica de reutilização de peças de vestuário mas de uma forma mais específica porque o reaproveitamento é essencialmente dos materiais com que elas são feitas e não das peças já feitas. Esta prática é milenar, remetendo ao tempo do

patchwork de tecidos preciosos, ainda visível no vestuário tradicional japonês (de seda).

Provas concretas da escassez de recursos foram presenciadas no Ocidente nas décadas de 40 e 50 com a reutilização de tecidos do vestuário de adultos para o redesenho de vestuário de crianças (figura 9c). Porém, esta prática pode ser uma oportunidade de negócio para pequenas e médias empresas que façam da reutilização de tecidos (que ainda estejam em boas condições de uso) o seu método de trabalho (Fraser, 2009, p.16)144, teoria defendida

141

Gwilt, A., & Rissanen, T. (2011). Shaping Sustainable Fashion – Changing The Way we Make and Use

Clothes. London, UK

142 Consultado em 16 Julho 2010. Obtido em http: www.adbusters.org

143 Ramos, A.R. & Silva, S.R. (2008, Março). Moda Sustentável. GINKO. Consultado em 16 Julho 2010. Obtido em http://revista.gingko.pt/#/20/?art=26.

144 Fraser, K. (2009). ReDress- Refashion as a Solution for Clothing as (Un) Sustainability. Unpublished Art and Design, AUT University, Auckland.

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na comunicação pessoal do Congresso Internacional DESIGNA 2011145 para o aproveitamento de tecidos corporative wear.

9a – “Romance was Born,

Renaissance Dinosaur, S/S 2010.” (Fonte: Gwilt, A. (2011). Producing Sustainable Fashion: The points for positive Intervention by Fashion Designer In A. Gwilt & T. Rissanen (Eds.),

Shaping Sustainable Fashion – Changing The Way we Make and Use Clothes (pp. 59-73). London:

Earthscan, p.34)

9b – Vestuário reutilizado e transformado por Noki-House of Sustainability (Fonte: http://testmag.co.uk/wp-

content/uploads/2009/12/JFC_FIN AL_REVISED1-1024x696.jpg)

9c – Exemplo de vestido de criança feito a partir de um vestido de adulto. (Fonte: Resek, E. & M., (1955) Successful dressmaking, Melbourne, Colorgravure Publications, citado em Fraser, K., 2009 –cit.141

Figura 9- Projetos com reaproveitamento de desperdício (Upcycling e Refashion)

Ainda com o reaproveitamento de restos de tecidos é exemplo o trabalho de Anne Anicete que trabalha o upcycling de sobras das confecções (dos colchões de corte) para design de superfície (Design Têxtil)146.

No documento A sustentabilidade no design de vestuário (páginas 76-79)