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O DESIGN DE MODA SUSTENTÁVEL

No documento A sustentabilidade no design de vestuário (páginas 82-85)

CAPÍTULO II ESTADO DE ARTE

VESTUÁRIO

2.6 O DESIGN DE MODA SUSTENTÁVEL

O Design de Moda possui um processo criativo semelhante ao do Design de Produto, embora com especificidades diferentes (tais como a modelagem em vez da modelação).

Optimizar a durabilidade dos produtos de moda e prever a sua reutilização e reciclagem é um requisito imediato não só estudado em trabalhos de investigação (Pereira, 2008, p.50)148 como já defendido por algumas empresas que colaboram com estratégias de trabalho ético, justo e ecológico. O benefício económico é um fator que tem resultado desses códigos de conduta que são visíveis em inúmeras soluções que englobam metodologias inovadoras, materiais biodegradáveis, produtos e serviços I-D repensados com um elevado nível de Design para um mercado cada vez mais consciente. Isto porque, independentemente de um produto ser concebido para um mercado de massa ou para um mercado de elite, o nosso corpo é a base de sustentação desses objetos criados, sendo eles mais artísticos (alta-costura) ou mais industriais (pronto-a-vestir). Por isso, o ser humano não deixa de ser o ator principal da sua utilização, cuja aquisição (dos produtos concebidos) está, como já foi referido anteriormente, dependente dos valores psicológicos, sociais e culturais dos indivíduos, valores que perspectivam, cada vez mais, os conceitos da justiça e de integridade.

2.6.1 DESIGN SUSTENTÁVEL / DESIGN DO CICLO DE VIDA DO PRODUTO

"A transição para a sustentabilidade necessita de mudanças radicais na forma como produzimos, consumimos e (...) vivemos" (Vezzoli, 2010, p.13)149.

Dir-se-ia mesmo que essa transição necessita da alteração de “como pensamos” porque para seguir o princípio da equidade é necessário mudar os valores de uma sociedade onde o bem-estar e a riqueza são medidos pela produção e consumo de bens para uma sociedade onde a qualidade de vida é medida pela valorização pessoal dos indivíduos e pela redução de produtos materiais. Há quem defenda que o consumo não

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Pereira, A. R. A. s., & (2008). Multi-look: Vestuário Multifuncional, Metodologia de Criacção em

Design. Unpublished Master, Universidade do Minho, Guimarães.

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possa reduzir, mas com certeza que pode ser alterado e com graus de despesa de acordo com o tipo de bens. Dada a natureza e dimensão dessa transformação, a abordagem ao Design deve operar ao nível da inovação do sistema global promovendo e desenvolvendo ações em rede, onde sejam considerados todos os atores envolvidos, integrando, então, os conceitos de “Ciclo de Vida”, “Funcionalidade” e “Ecoeficiência” (Vezzoli, 2010, p.15).

O Design já não é mais entendido como Tomás Maldonado o descrevia: “… (…) definido como o projeto e desenvolvimento de objetos industrializados”. Assim o confirma a nova definição, caracterizada em 2005 no International Council of Society in Industrial Design que descrevia: “O Design é uma atividade criativa cujo objetivo é estabelecer as qualidades multifacetadas de objetos, serviços e seus sistemas, compreendendo todo o seu ciclo de vida.

Dessa forma, o Design procura identificar e avaliar as relações estruturais, organizacionais, funcionais, expressivas e económicas” (Vezzoli, 2010, p.37)150 cujo objectivo é conceber produtos-serviços por intermédio de uma rede de agentes eco eficiente e socialmente justa, não só para satisfazer as necessidades dos indivíduos mas contribuindo, também, para a alteração de valores. Uma linha de pensamento onde Jelena Milovic151 acrescenta mais um “R” aos conhecidos “3Rs”, apresentando Reduce, Reuse, Recycle and Raise (Reduzir, reutilizar, reciclar e rogar) onde o “Rogar” (mais especificamente “Levantar a voz”) é fundamental no papel do designer em tentar modificar os valores. Como Papanek (2005, p.8)152 defendia há duas décadas atrás, desenhar sustentável é planear satisfações necessárias com o mínimo de recursos e impactos possíveis, cujas finalidades dependem das capacidades e da consciência do designer.

Portanto, projetar é considerar a sustentabilidade global, incluindo a proteção ambiental (Eco-Design), a economia, a equidade e a coesão social, mudando o foco de “projeto de produto” para “projeto de uma função e respetiva satisfação”. O Design de Moda não foge à regra, tendo que planear racionalmente todos os recursos implícitos no ciclo de vida de um produto (de Moda), desde o recurso das matérias-primas, produção de matérias têxteis, passando pela distribuição (embalagem, acondicionamento, fornecimento,

150 Vezzoli, C. (2010) – cit.149, p.37

151 Designer em comunicação no IV evento sobre sustentabilidade, “GREENFEST 2011”, Estoril, Portugal, dia 29 de Setembro de 2011 em “Sustainable Events Seminar 2011”

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“a sabedoria para antecipar as consequências ambientais, ecológicas, económicas e políticas da intervenção do projeto” e “ a capacidade de trabalhar com pessoas de muitas culturas diferentes e diferentes disciplinas” em: Papanek, V. (1995) – cit.106

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transporte), retalho (exposição e venda do produto) uso (manutenção e utilização dos objetos) até ao seu descarte.

A inovação interativa (não só tecnológica) proporciona parcerias e fomenta a participação ativa de todos os agentes do ciclo do produto sendo o “condimento” essencial na conceção de produtos e serviços. Todavia, criar bens ou serviços com essas características não é tarefa fácil porque pode originar divergências económicas entre os diferentes intervenientes, para além de não ser compatível com a forma de trabalhar que um designer exerce na maior parte dos sectores industriais. No caso do vestuário pronto-a- vestir, o designer trabalha, geralmente, numa equipa isolada da produção, da modelagem, e das vendas, onde os clientes decidem e selecionam os produtos que serão colocados dentro de suas lojas. Esse sistema exclui a oportunidade de o designer interagir com outros colaboradores e supervisionar o produto desde o inicio ao fim de produção tal como comporta o “Life Cycle Design” (Vezzoli; Manzini, 2008)153

, deixando que o sistema de Moda continue a gerar desperdício não reutilizável na ordem dos 15% (McQuillan, 2011, p.85; Rissanen, 2005; Feyrebend, 2004; Abernathy, 1999; Cooklin, 1997)154. Um desperdício que poderá ser minimizado com maior integração entre as partes num “sistema holístico de produção-consumo” com zero resíduos (McQuillan, 2011, Chapman e Gant, 2007)155.

2.6.1.1 Avaliação do Ciclo de Vida do Produto

A “AVC” ou o acrónimo em Inglês LCA (Life Cicle Assessment) é a técnica de estimativa dos impactos ambientais, de saúde pública e de consumo de recursos naturais, causados pelos processos do ciclo de vida dos produtos ou serviços. Foi creditada e reconhecida internacionalmente pela SETAC (Society for Environmental Technology and Chemistry) e introduzida nas normalizações da ISO156 (ISSO 14040). A AVC envolve a troca de imputs e outputs entre o ambiente e os diferentes processos de produção que estejam a ser avaliados, interpretando as diferentes fases de acordo com os objetivos pretendidos. Todavia, ela não abrange os aspetos económicos dos produtos e serviços

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Vezzoli, C., & Manzini, E. (2008). Design for Environmental Sustainability (K. Pruul, Trans.): Springer- Verlag London Limited.

154 McQuillan, H. (2011). Zero-Waste Design Practice: Strategies and Risk Taking for Garment Design In A. Gwilt & T. Rissanen (Eds.), Shaping Sustainable Fashion – Changing The Way we Make and Use Clothes (pp. 83-97). London: Earthscan.

155 idem

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projetados, tendo o Design que incorporar os critérios de eficiência para conseguir produzir mais e melhor, com menos recursos e menos resíduos.

A tomada de consciência em projetos de vestuário sustentável, abrangendo as várias fases do Ciclo de Vestuário é uma metodologia aceite e desenvolvida em sectores públicos ou privados. Mas a sua criação nem sempre é fácil porque exige uma logística bem planeada. A título de exemplo lista-se a DEFRA (Department for Environment, Food and Rural Affairs)157, um organismo público britânico que funciona e se preocupa com a maximização do final da vida do vestuário. As suas atividades abrangem inúmeros sectores que vão desde a coordenação de organizações, comportamento do consumidor até às parcerias externas, com o objetivo de influenciar a política internacional e tornar pública a aquisição de vestuário sustentável (Morley et al, 2009, 10)158. O seu plano de ação para a melhoria do desempenho do vestuário no Reino Unido, o Sustainable Clothing Roadmap (www.defra.gov.uk)159 apoia a ideia de que o Design deve mediar o Circuito do Vestuário, abordando o Life Cycle Design nesta área. Este, por sua vez, conta com vários estágios como mostra a figura 11, tendo eles todos impactos ambientais e/ou sociais.

Figura 11- Impactos Ambientais e Sociais ao longo do circuito do vestuário

(Alterado e traduzido da Fonte original: Department for Environment, Food and Rural Affairs, [DEFRA] – cit. 125, pg.5/ Figura original em Figura 2 de Anexos 3 do Capírulo II)

157 DEPARTMENT FOR ENVIRONMENT, FOOD AND RURAL AFFAIRS, [DEFRA] (2008) – cit.125 158 Morley, N. J., C. Bartlett, et al. (2009). cit.2, p.10

159DEPARTMENT FOR ENVIRONMENT, [DEFRA] (2011). Sustainable Clothing Roadmap - Progress

Report 2011. Obtido de https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/69299/pb13461-clothing- actionplan-110518.pdf. .Resíduos sólidos e perigosos .Consumo Recursos; .Emissões GEE .Poluição Ar/Agua e Toxicidade .Degradação solo /contaminação .Biodiversidade/ Utilização da terra .Resíduos sólidos eperigosos IMP A C TO S A MB IE N TA IS .Emissões GEE .Poluição Ar/Agua e Toxicidade .Degradação solo /contaminação .Biodiversidade/ Utilização da terra .Emissões GEE .Poluição Ar/Agua e Toxicidade .Degradação solo /contaminação .Biodiversidade/ Utilização da terra .Resíduos sólidos e perigosos .Consumo Recursos; .Emissões GEE .Emissões GEE .Resíduos sólidos e perigosos .Emissões GEE MATÉRIAS- PRIMAS (Cultivo, crescimento e processo natural, sintético) ES G IO S D O C IC LO D E VI D A PRODUÇÃO

FIBRAS PRODUÇÃO E MONTAGEM

DE ROUPA

EMBALAGEM RETALHO UTILIZAÇÃO FIM DO

CICLO DE

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