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CAPÍTULO III – ASPECTOS GEOGRÁFICOS DA ESTRADA REAL

3.2 A urbis mineira

A extensão das zonas de mineração se deu a partir de Sabará, do Serro, do Tijuco e de Itacambira e foi se alastrando pelas Minas Gerais. Disseminados pelas montanhas e vales, os lavradores e mineradores erguiam casas junto às capelas e aos sábados vinham pernoitar com as suas famílias para participar da missa aos domingos e fazer compras.

Figura 06 – Vilas de Minas Gerais em 1800

Fonte: FARIA, R. G. (2009. p. 54)

Os primeiros aglomerados humanos que deram origem aos arraiais e depois às vilas, inicialmente localizavam-se nas bordas dos ribeiros onde era explorado o ouro de aluvião. Depois, após o esgotamento desse tipo de ouro, passou-se à busca do ouro dos barrancos e aos veios subterrâneos. Nessa fase foi que começaram a surgir aglomerados humanos nas encostas das montanhas. Por isso, em Minas Gerais, algumas das mais típicas cidades de montanha são justamente aquelas que se criaram em torno de arraiais de extração do ouro. Nas palavras de Garschagen: “Antigas corruptelas das áreas diamantíferas, caracterizando-se por seus sítios urbanos atormentados, instalados no fundo de vales, nas

encostas dos morros, em esporões montanhosos, com o seu plano irregular, ladeiras íngremes e ruas em sobe-desce.”(1978, p.240).

Quadro 05 – Fundação e Nomes das Primeiras Vilas Mineiras

NOMES ORIGINAIS NOMES ATUAIS CRIAÇÃO

Real Vila de N. Senhora do Carmo Mariana 1711

Vila Rica de Albuquerque Ouro Preto 1711

Vila Real de N. Senhora da Conceição Sabará 1711

Vila de São Joao del Rei São Joao del Rei 1713

Vila Nova da Rainha Caeté 1714

Vila do Príncipe Serro 1714

Vila de Pitangui Pitangui 1715

Vila de São José del Rei Tiradentes 1718

Vila de N. S. do Bom Sucesso de Minas Novas Minas Novas 1730

Vila de Tamanduá Itapecerica 1789

Vila de Barbacena Barbacena 1791

Vila de Queluz Conselheiro Lafaiete 1791

Vila de Campanha da Beira Campanha 1798

Vila de Santa Maria do Baependi Baependi 1814

Vila de São Carlos do Jacuí Jacuí 1814

Vila de Aiuruoca Aiuruoca 1834

De acordo com Fonseca (2003) foi no ano de 1710, no rastro da pacificação emboaba, que a Coroa criou a Capitania de São Paulo e Minas do Ouro e dividiu a área do sertão de Cataguases em duas Comarcas: a do Ouro Preto, com sede em Vila Rica e a do Rio das Velhas (Sabará), com seus Ouvidores-gerais. Mais tarde, pelos idos de 1711 a 1720, foram criadas as primeiras Vilas e mais duas Comarcas, a do Rio das Mortes (São João d’El Rei) e a do Serro Frio, sediada na Vila do Príncipe (hoje Serro). Essa divisão administrativa em quatro Comarcas vigorou por todo o século XVIII, até 1815, quando foi criada a Comarca de Paracatu, com área desmembrada da Comarca do Rio das Velhas.

O objetivo maior da criação das vilas e comarcas foi o de melhor ordenar e controlar a população das minas de ouro para evitar conflitos. A população assim organizada tornava a vigilância da Coroa mais atuante e possibilitava a aplicação eficaz de medidas punitivas quando estas se fizessem necessárias.

O vertiginoso progresso das comarcas componentes das regiões auríferas determinou em breve o desmembramento delas da Capitania de São Paulo, para formarem à parte, em 1720, a Capitania de Minas Gerais. Tal medida visou a criação de um melhor sistema de administração das minas pela Coroa Portuguesa.

A urbanização76 de Minas se deu por causa da exploração do ouro e das

76 Calcula-se que a população total de Minas tenha superado a margem de 30.000 pessoas, no início do século

pedras preciosas. Os arraiais nasceram e cresceram onde havia ouro e diamantes. É por isso que as vilas e cidades que se originaram nessa época situam-se em vales profundos, junto aos rios e córregos, onde o ouro se misturava ao cascalho e à areia, rodeadas de paredes montanhosas.

Figura 07 – Carta Geographica de Minas Geraes – Manuscrito elaborado em 1804 por

Caetano Luiz de Miranda. Documento importante para o conhecimento da Geografia Colonial de Minas Gerais.

Fonte: Projeto Resgate: Arquivo Histórico Ultramarino (Cartografia Manuscrita do Brasil).

1821, a Província de Minas Gerais contava com um total aproximado de 514.108 habitantes, “[...] espalhadas sobre hum terreno de 17.252 legoas quadradas que para cada legoa quadrada se contão 29,7 pessoas”.

(ESCHWEGE, 1979, p. 8 e 9). Dos quais, 332.226 eram pessoas livres (maioritariamente mulatos e brancos) e 181.882 negros escravos.

A sociedade mineira foi essencialmente marcada pelo trabalho escravo77 e a

superioridade quantitativa da população negra na Capitania das Minas do Ouro era motivo de temor e receios pela Coroa. Os negros, devido aos maus tratos, muitas vezes fugiam e se refugiavam nos quilombos78. A sociedade que se formou em Minas Gerais compunha-se de um grande número de escravos, um tanto de homens livres e pobres, geralmente pardos e uma pequena classe dominante branca constituída de portugueses, que ocupava os melhores cargos. Conforme Gancho e Toledo (1991, p. 28) é bastante complexo caracterizar a sociedade mineira do século XVIII. Para uma melhor compreensão elaboramos o quadro abaixo com a seguinte dinâmica: Fato X Consequência.

Quadro 06 – Características da Sociedade Mineira do Século XVIII

FATO CONSEQUÊNCIA

1 – Mobilidade social devido à extração do ouro e

das pedras preciosas. Era muito fácil enriquecer como também perder tudo, na medida em que toda a economia se fundamentava na busca do ouro e das pedras preciosas.

2 – Vida urbana e social nas vilas. O que proporcionava o surgimento de novas relações humanas e culturais.

3 – Comércio interno. O mercado mineiro precisava ser abastecido de víveres e produtos variados para a sua manutenção.

4 – Uma camada social média feita de homens livres.

A riqueza proporcionou o surgimento de uma camada de pessoas livres que tinha a maioria branca.

5 – Forte mestiçagem e falta de uma aristocracia. Havia poucas mulheres brancas na sociedade mineira e a mistura das raças foi preponderante. 6 – Manifestações artísticas: escultura, arquitetura,

música e literatura.

A riqueza do ouro e das pedras preciosas proporcionou o desenvolvimento de uma intelectualidade brasileira e o desenvolvimento de uma cultura própria e identitária.

7 – Irmandades leigas com grande expressão

religiosa, econômica e política. As Irmandades tiveram grande importância na assistência social e religiosa.

77 Estima-se que na época de apogeu da extração do ouro (1740-50) houve 100.000 escravos na região das

Minas. Conforme Vergueiro (1982), era numerosíssima a população negra nas Minas. Os escravos eram comercializados e trocados por cachaça na África e vinham para a região aurífera passando através dos portos do Rio de Janeiro e de Paraty. Por causa da dificuldade em transportá-los para o interior, eles se tornavam mais caros.

78 Em consonância com Moura (1993, p. 11), os quilombos eram aldeias que concentravam os escravos que

fugiam das fazendas, minas e casas de família, onde eram explorados e sofriam maus tratos, no período colonial brasileiro. Para o rei de Portugal, em carta-resposta ao Conselho Ultramarino, de 02/12/1740, Quilombo “é toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados nem se achem pilões neles”. Os escravos, para não serem encontrados, escondiam-se nas matas, nos