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A sociedade mineira dos Setecentos

PARTE II – O CHÃO

2.7 A sociedade mineira dos Setecentos

A sociedade mineira desde o seu início era bastante heterogênea e estratificada, correspondendo à divisão dos grupos raciais e econômicos que eram variados.

A expulsão das ordens religiosas regulares pelo Marquês de Pombal, no segundo decênio do século XVIII, foi o elemento propulsor para a formação das Irmandades e

Ordens Terceiras em Minas Gerais, que tiveram uma função importante no que se refere aos

trabalhos comunitários da capitania. Nelas puderam negros e mulatos desenvolver as suas atividades e organizar-se nas fraternidades e associações, construindo igrejas, hospitais e sistemas de ajuda mútua. A demanda da construção de igrejas causará o surgimento de uma

p. 183). Dessa forma o autor ressalta que o capitalismo ibérico fundamentou exclusivamente o “predomínio de um grupo” que circulava em torno da coroa.

54 Uma crise de grande dimensão estava se instalando no El Dorado. Podemos ver essa preocupação em uma

carta do Intendente dos diamantes, João da Rocha Dantas e Mendonça, datada em 20 de dezembro de 1778, explicando ao Ministro a queda e as causas dos lucros dos diamantes: “Exmo. Sr. Martinho de Mello e Castro, Os Lucros, Excelentíssimo Senhor, reconheço diminutos; elles são, não porque tenha faltado a boa diligencia e cuidado; sim porque como eu tenho exposto a V. Exa. Os milhores, e os mais ricos Rios, e Corgos deste continente deixou escalados (sic), e exauridos a ambição desenfreada dos Contratadores...” (VALADARES,

arte original já que, a presença de patrocinadores ricos e leigos, que concorriam uns com os outros, conforme Maxwell (2010), “libertara a criatividade colonial em Minas Gerais de um modo desconhecido em qualquer outra parte do Brasil”.

Surgiu, dessa maneira, uma plêiade de artesãos, pintores, arquitetos e escultores de grande talento. Isso pode ser vislumbrado nas elegantes igrejas barrocas. Se o neoclássico era soberano em Lisboa, em Minas o barroco tornou-se supremo.

O barroco mineiro foi a primeira manifestação artística originalmente nacional, e não reprodução dos padrões culturais europeus (CALDEIRA, 1997, p. 96). Essa originalidade pode ser vista nas soluções arquitetônicas das Igrejas e nas formas elípticas e curvilíneas de seu traçado. O uso da pedra-sabão com seus belíssimos entalhamentos fez do barroco uma arte própria e inigualável55.

O barroco mineiro é a expressão de uma sociedade que se desenvolveu entre as montanhas, produzindo um pensamento autônomo que se manifestou em diversas formas artísticas, tais como: a pintura, a arquitetura, a escultura, a música e a literatura. A arte colonial mineira é, essencialmente, marcada pela religiosidade. No dizer de Martins (1992, p. 22) ela expressa um anseio de transcendência: “Como se os homens, com os pés mergulhados no barro de onde retiravam o ouro, compreendessem a transitoriedade da sua opulência e quisessem dedicar ao divino o melhor fruto de sua labuta.” Na expressão de Barbosa (1970,

p.32): “a riqueza trouxe a criatividade artística, uma nova mentalidade e novas ideias”.

Havia quem possuísse excelentes bibliotecas particulares e cabeças “pensantes” nas Minas Gerais.

Essa elite letrada se reunia em tertúlias intelectuais e articulava planos de emancipação. Isso talvez fosse em decorrência de que os mineiros ricos por mais de quarenta anos enviaram os seus filhos para estudar na Universidade de Coimbra. Na época colonial os brasileiros que quisessem estudar os filhos deviam enviá-los aos colégios jesuíticos e depois

55 A genialidade do mulato Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, extravasou na arquitetura das igrejas

barrocas mineiras. Nascido em Vila Rica, em 1730 e falecido em 18 de novembro de 1814. Era filho natural de Manuel Francisco da Costa Lisboa, distinto arquiteto português, e de uma escrava de nome Isabel, que somente foi libertada na ocasião de seu batismo. Escultor, arquiteto e entalhador, foi considerado o mais importante artista brasileiro do período colonial. Até a idade de 47 anos gozou de perfeita saúde, mas, de 1777 em diante, as moléstias, provocadas talvez, em grande parte, por excessos sexuais, começaram a maltratá-lo fortemente. O certo é que, ou por ter negligenciado a cura do mal no seu começo, ou pela força do mesmo, Antônio Francisco perdeu todos os dedos dos pés, do que resultou não poder andar senão de joelhos; os das mãos atrofiaram-se e curvaram, e mesmo chegaram a cair, e ainda assim quase sem movimento, costumava trabalhar às ocultas debaixo de uma tolda, ainda mesmo que houvesse de fazê-lo dentro dos templos. O cuidado de evitar os olhares de pessoas estranhas trouxe-lhe o hábito de ir de madrugada para o lugar em que tinha de trabalhar e voltar à casa depois de fechada a noite. (BARBOSA, 1988). No conjunto de sua obra destacam-se os projetos das igrejas de São Francisco de Assis, em Ouro Preto e em São João del-Rei; as 66 imagens de cedro dos Passos da Paixão e os 12 profetas de pedra-sabão, para o Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas do Campo. (BAZIN, 1963).

mandá-los para Portugal para os estudos superiores, na única universidade que havia, a

Universidade de Coimbra, fundada em 129056.

Vila Rica tinha orquestra e teatro. Os músicos eram convidados a se apresentar e a compor nas ocasiões solenes. Despontavam Academias e Círculos literários que apregoavam a escola literária do Arcadismo e as ideias iluministas. Essa elite vestia-se à maneira europeia, lia livros importados e recitava poesias, constituindo “uma aristocracia” que, agora, reconfigurava os sertões mineiros. Com muita riqueza à mão e com pretensão de nobreza, os ricos e seus filhos “doutores” gozavam de uma vida social emergente. (CALDEIRA, 1997, p. 99). Figurava dentro dessa elite o advogado e poeta Cláudio Manuel

da Costa57 e o também poeta Tomás Antônio Gonzaga58.