• Nenhum resultado encontrado

PARTE II – O CHÃO

2.8 Tributos e Impostos

O rei era o senhor do solo e do subsolo nos domínios de sua Coroa. Não podendo trabalhar diretamente na colônia, o rei oferecia a terra para que fosse explorada, desde que se pagasse a ele um imposto chamado quinto. A cobrança deste sempre foi vista pelos mineradores como um abuso fiscal, o que resultava em freqüentes tentativas de sonegação, fazendo com que a metrópole criasse novas formas de cobrança.

Recordemos que, em 1702, o Estado português editou o Regimento das

Terras Minerais, disciplinando a exploração aurífera estabelecida pela Carta Régia de 1602,

56 Em seu estudo sobre as elites mineiras setecentistas, Valadares (2004, p. 513) mostra que em Minas Gerais, a

riqueza conferida pelo ouro proporcionará o surgimento de uma elite econômica, contrastando com o número expressivo de escravos, vadios e pobres. Essa “nobreza da terra” era constituída, em sua maioria por portugueses que, ao formarem as suas famílias, empenhavam-se em mandar os seus filhos para junto da Corte para que pudessem receber uma educação que lhes proporcionasse um emprego junto à Coroa e exercer no futuro o poder. Essas crianças eram levadas para Portugal e lá aprendiam o estilo de vida da Corte lusa e não eram educadas para uma sociedade libertária, nem para mudar o sistema escravagista ou colonial. Muitos não voltavam e, quando voltavam, estavam impregnadas da ideologia e dos hábitos da corte.

57 Os historiadores são unânimes em afirmar que ele foi um dos principais ideólogos do movimento inconfidente

de 1789, encarregado de elaborar as leis do novo Estado a ser criado em Minas Gerais. O poeta foi encontrado enforcado em 4 de julho de 1789, no quarto da casa do contratador João Rodrigues de Macedo, local designado para sua prisão. Souza (2011, p. 193), inclui que “a causa da morte é um dos objetos mais controvertidos da historiografia brasileira, havendo verdadeiras facções, uma a defender com unhas e dentes a tese do assassinato, outra, a do suicídio”.

58 Este foi indicado em 1781 para ocupar o cargo de Ouvidor Geral na comarca de Vila Rica. Em 1789 quando

escrevia as Cartas chilenas foi detido e levado ao Rio de Janeiro acusado de estar associado ao grupo conspiratório separatista da Inconfidência Mineira. Na prisão se dedicou às liras a Marília de Dirceu, e em 1792 foi condenado a dez anos de degredo em Moçambique. Em 1809 adoeceu, vindo a falecer no início de 1810. Perdurou por longo tempo a polêmica sobre a autoria das Cartas Chilenas, mas após estudos comparativos da obra com possíveis autores, concluiu-se que o verdadeiro autor é Gonzaga. (VALADARES, 2004).

que declarava a livre exploração, mediante o pagamento do quinto, em outras palavras, a quinta parte do que se extraía (20%) era o imposto devido à metrópole.

Para a cobrança desse tributo régio, assegurado em lei, a máquina burocrática tinha que ser eficiente, estendendo-se a toda região mineradora e era imprescindível o combate ao contrabando para aumentar a arrecadação. Em um primeiro momento, o controle social foi organizado com a criação das vilas e divisões administrativas. Depois, o governo estabeleceu a Intendência de Minas a todas as capitanias em que houvesse mineração, implantando rígidas medidas para evitar a sonegação dos impostos.

Em 1701, o governador Artur de Sá e Menezes criou os registros de entradas para fiscalizar o transporte e a cobrança do quinto. Estes eram localizados em locais estratégicos com a intenção de dificultar a passagem dos contribuintes e, geralmente, próximos a um curso de água.

Conforme Matos (1981) e Barbosa (1995) destacamos os seguintes postos de controle e casas de registro nas regiões ligadas à Estrada Real:

Quadro 04 – Registros das Regiões da Estrada Real

AGUASSU Em Nova Iguaçu/RJ. É mencionado em 17 de janeiro de 1721. AIURUOCA

Mencionado em 1776 com a grafia de “Iorooca”, situava-se, certamente, nas proximidades da cidade mineira de Aiuruoca, o “destacamento da picada da

Juruoca” era encarregado de reprimir o contrabando de ouro para o Rio de

Janeiro.

ARAÇUAÍ Próximo a Minas Novas. É referido em documentos datados de 1765 a 1767. ARREPENDIDOS Na divisa entre Goiás e Minas Gerais, próximo às nascentes do rio São Marcos. É mencionado por Saint-Hilaire.

BANDEIRINHA Mencionado a partir de 1738 e situado no caminho entre São Paulo e Goiás. Citado por Spix e Martius (1981). BICAS

Localizado entre São Paulo e Minas, nas proximidades de Itajubá, existia em 1804. Parece que era situado em lugar diverso da atual cidade mineira de Bicas. Ao que tudo indica, o registro ficava no atual Município de Wenceslau Brás, que, outrora, era o povoado de Bicas do Meio.

BOA VISTA Existia desde 1801 entre a capitania de São Paulo e a Vila de Parati. BOM JARDIM Em Serro Frio (MG). Criado em 1776 e citado por Matos (1981).

CAETÉ MIRIM Um dos registros da Demarcação Diamantina. É mencionado desde 1751 e ficava ao norte do Tejuco (Diamantina). CACONDE Existia em 1775 na cidade paulista do mesmo nome.

CAMANDUCAIA

Existia em 1769. Estava situado em Minas Gerais, nas proximidades da atual cidade do mesmo nome, provavelmente às margens do rio que tem a mesma denominação.

CAMPANHA DE

TOLEDO Entre 1776 e 1831. Situado nas proximidades da cidade de Toledo (MG).

CAPIVARI Existiu de 1751 a 1767, pelo menos, na antiga estrada entre Guaratinguetá e São João del-Rei, num afluente do Rio Verde, em local que corresponde ao “arraial de

Capivary na estrada do Picu”.

CONCEIÇÃO Situado a noroeste de Minas Novas e é mencionado no início do século XIX. GOUVEIA Fazia parte da Demarcação Diamantina e localizava-se à este-sudoeste do Tejuco (Diamantina), desde 1765. Originou a cidade de Gouveia – MG. INHACICA Existiu entre 1765 e 1795 e ficava a norte-nordeste do Tejuco (Diamantina). É

muito citado pelos viajantes.

ITACAMBIRA Localizado na serra de Santo Antônio e subordinado à comarca de Serro Frio. É mencionado desde 1765 e fazia parte do sistema de “entradas”. ITAJUBÁ

Existiu nos arredores de Itajubá-MG, a sudoeste da vila, numa latitude de 22 graus e 36 minutos, durante o período de 1765 a 1820, pelo menos. Integrava o sistema de fiscalização e arrecadação das “entradas” em Minas Gerais, mas também tinha a função de permutar o ouro em pó por moeda.

JACUÍ

Localizado na região fronteiriça entre Minas Gerais e São Paulo, no local onde se assenta hoje a cidade mineira de Jacuí, era subordinado ao governo da Capitania de Minas. Existiu entre 1789 e 1820, com certeza, embora ignoremos as datas da sua criação e extinção.

JAGUARA Desde 1751 é mencionado e se situava em Santa Luzia – MG.

LOURENÇO VELHO Situava-se na serra da Mantiqueira, pertencendo ao atual município de Itajubá. É mencionado dsde 1834 por Matos (1981). MALHADA Entre Minas e Bahia. É mencionado desde 1807 por Burton (1983) e Matos (1981).

MANDU

Registro ao qual estava anexo um quartel, integrante do sistema de arrecadação das “entradas” da capitania de Minas Gerais. Funcionou até 1770 quando foi transferido para Jaguari, atual Camanducaia. O registro já existia em Mandu, em 1764. Mandu é hoje a cidade mineira de Pouso Alegre.

MANTIQUEIRA

Um dos mais rendosos que integravam o sistema de arrecadação do contrato das entradas da capitania de Minas Gerais. Estava situado na divisa sul de Minas, a 22 graus e 44 minutos de latitude, entre Pouso Alto-MG e Cachoeira Paulista-SP, ao pé da serra do mesmo nome, do lado mineiro, não longe da Garganta do Embaú. É mencionado por vários viajantes e descrito minuciosamente por Saint-Hilaire. MATIAS BARBOSA Mais importante e o mais rendoso de todos os registros do Brasil. Situava-se na divisa entre as capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro, originando a atual

cidade de Matias Barbosa. Foi descrito com minúcias por Mawe em 1809 (1978). MILHO VERDE Fazia parte da demarcação Diamantina. Em 1809 foi mencionado por Mawe (1978) e Matos (1981). MINAS NOVAS Situado às margens do rio Fanado, na cidade mineira do mesmo nome. É mencionado desde 1765.

NAZARÉ DE

PARACATU Localizado em Minas Gerais, ao sul da cidade de Paracatu. Mencionado desde 1765. OLHOS D’ÁGUA Ficava entre Paracatu a Santa Luzia (Luziânia desde 1757. É mencionado por Matos (1981). – GO). Há referências sobre ele ONÇA Localizado em Minas Gerais, na localidade ainda hoje chamada de Onça de Pitangui, à margem do rio São João.É mencionado desde 1764.

OURO FINO

Localizado a princípio na cidade mineira do mesmo nome, integrava o sistema de cobrança e arrecadação das “entradas” em Minas Gerais. Teria sido estabelecido em 1764, ocasião em que, logo a seguir, contribuintes revoltados lhe atearam fogo. Existiu até 1820, pelo menos. Em 1777, porém, sua sede foi transferida para a “Ponte Nova”, sobre o rio Jaguari, a uma légua de Bragança Paulista. Parece que lá não ficou, pois em 1778 se cogitava a sua mudança “para o fim da mata

chamada Tapera de João Dias”.

PARAÍBA Situado as margens do rio Paraíba, entre Minas Gerais e Rio de Janeiro. É mencionado por Matos (1981) e descrito por Mawe em 1809 (1978). PARAIBUNA

Situava-se na margem norte do rio Paraibuna entre os estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro e era um dos registros mais movimentados e mencionados pelos viajantes, desde 1726.

PICU Localizado em Minas Gerais, na divisa com São Paulo, nas imediações da montanha do mesmo nome (Itamonte – MG). É mencionado desde 1822. PITANGUI Situado na cidade mineira de igual nome, funcionou como integrante do sistema de arrecadação das “entradas”, no período de 1751 a 1754, pelo menos. PORTO DO CUNHA O lugar é hoje um bairro da cidade de Além Paraíba, na divisa entre Minas Gerais e Rio de Janeiro, e foi criado em 1784.

PORTO DO MEIRA Situado próximo a Lorena – SP e mencionado desde 1785.

desde 1816, segundo Matos (1981) e citado por Saint-Hilaire.

SANTA CRUZ Localizado em Minas Gerais, na região a oeste de Minas Novas. É citado por Matos (1981). SANTA MARIA Situado na fronteira entre Goiás e Minas Gerais, na serra de Santa Maria. É citado desde 1778. Spix e Martius, 1819 (1981); Matos (1981). SAPUCAÍ MIRIM Existia desde 1821 na intendência do Ouro do rio das Mortes, Minas Gerais.

SIMÃO VIEIRA É mencionado desde 1776 e ficava nas proximidades da cidade de Minas Novas – MG. TRÊS BARRAS Um dos postos de vigilância da Demarcação Diamantina. Com esse nome existe um arraial no município de Alvorada de Minas, conforme Matos (1981). ZABELÊ Localizado em Minas Gerais. Destinava-se à cobrança das desde 1776 e ficava situado sobre o riacho do Pau Grosso. “entradas”. É citado Fonte: http://www.receita.fazenda.gov.br/Memoria/administracao/reparticoes/colonia/registros.asp. Acesso em: 19/dez./2011.

Os Registros59 tinham um papel relevante na tarefa de controle. Eram fixados em pontos estratégicos ao longo dos caminhos, travessia de rios, desfiladeiros e cruzamentos, assim como em pontos de passagens obrigatórias. Após o apogeu minerador, estes registros tornaram-se, em sua maioria, em “barreiras” que se extinguiram somente no período republicano. Havia registros do ouro; de entradas; de demarcação diamantina e de contagem.

Em consequência disso, diversos caminhos paralelos foram criados, visando burlar a fiscalização e encontrar alternativas de passagem. Esses “descaminhos” corriam

paralelos à via oficial, sendo alguns hoje reconhecidos e outros ainda não conhecidos. Os

descaminhos surgiram para evitar os registros de fiscalização. Há referências e marcas

materiais que comprovam hoje a existência desses “caminhos escondidos”. Sobre isso muitas lendas surgiram. 60

O contrabando de ouro e diamantes era realizado por pobres e ricos. O ouro e as pedras preciosas eram mercadorias fáceis de serem escondidas. Os pobres ansiavam o enriquecimento fácil e a oportunidade de mudança social e os ricos, em sua maioria, conquistaram as suas riquezas utilizando-se deste artifício. Havia nas Minas Gerais, conforme aponta Vergueiro (1982, p. 62), “pequenos contrabandistas” que tinham atuação individual, e

59 Normalmente nesses Registros podia se encontrar um administrador que representava o contratador; um fiel

que representava a Fazenda Real; um contador e dois ou quatro soldados. As instalações constavam de uma casa habitada pelo administrador com alguns livros contábeis, balança com pesos, armas e utensílios domésticos; um quartel de soldados, um rancho para os tropeiros e um curral para os animais. (SANTOS, 1958).

60

Existem muitas histórias e lendas que são contadas oralmente ou que foram registradas pelos historiadores e viajantes, e se tornaram causos, tais como: a Toca do Ouro, onde os bandidos se escondiam para roubar os tropeiros no Caminho Velho e os relatos sobre temível bandido Boca de Ouro. Ou ainda o caso do Vira- Saia, que se refere a um oratório em Ouro Preto em que se virava a imagem de uma santa para mostrar a direção de uma mula que estava carregada de ouro; o Capão da Traição e o Rio das Mortes e o episódio da Guerra dos Emboabas; a história de Chico Rei, personagem lendário da tradição oral de Minas Gerais que, tendo sido rei de uma tribo no reino do Congo foi trazido como escravo para o Brasil, comprando sua alforria e de outros conterrâneos com seu trabalho e tornou-se "rei" em Ouro Preto. (Nota do autor).

“quadrilhas” comandadas por poderosos. As negras de tabuleiro escondiam as pepitas em

seus quitutes; e as vendas e tavernas eram lugares de contrabando e “negociação.”61

Com o intuito de efetivar sua cobrança e evitar o contrabando, em 1720, foram criadas as Casas de Fundição62 – que só vieram a funcionar em 1725, em Vila Rica – com a finalidade de transformar o ouro em barras timbradas e quintadas.

Posteriormente foi criada a taxa de capitação63, esta era um imposto fixo, cobrado por cada escravo que o minerador possuísse.

Em 1750, época do apogeu do ouro, foi instituído o quinto por estimativa, conhecido como finta, ou seja, a fixação de uma cota fixa de 100 arrobas que incidia sobre toda a região aurífera. Como o ouro era facilmente escondido, graças ao seu alto valor, em pequenos volumes, criou-se a finta, sob pena de ser decretada a derrama, isto é, o confisco dos bens do devedor para que a soma de 100 arrobas fosse completada. A partir daí, já com o prenúncio da decadência da mineração, essa cota não era alcançada, gerando-se o déficit que se avolumava a cada ano. Com isso, em 1765, instituiu-se a derrama64. A derrama foi um mecanismo imposto pela Coroa à população mineira que devia cobrir a diferença que faltava para completar as 100 arrobas. Era uma forma arbitrária de cobrança do quinto atrasado, que devia ser pago por toda a população da região, inclusive com bens pessoais. Qualquer processo era lícito, contanto que se completassem as 100 arrobas do tributo. Pode-se imaginar o que significava isso de violência e abusos.

Esse quadro marcado por uma extorsiva tributação aumentou o descontentamento contra a metrópole. A Coroa experimentava um grande descontrole na

61 Boxer (1969, p. 76) ressalta que não eram apenas os leigos que se deixavam perverter pela auri sacra fames

(sagrada fome do ouro), mas, também os clérigos que contrabandeavam de maneira generosa, já que a imunidade eclesiástica possibilitava a entrada e a saída pelos caminhos sem a revista oficial da guarda. Assim, eles escondiam ouro em pó e pedras preciosas em imagens de santos. O ouro e as pedras preciosas eram contrabandeados nos famosos santos de pau oco: imagens de santos rústicas, esculpidas em madeira oca, que eram utilizadas para esconder ouro e pedras preciosas, na tentativa de se driblar a cobrança do “quinto”. Os santos de pau oco funcionavam também para os mineiros e os fazendeiros como um cofre onde eles guardavam algumas preciosidades, sem delas pagar o imposto à Coroa.

62 Estas constituíam-se de estabelecimentos controlados pela Fazenda Real, que recebiam todo ouro extraído,

transformando-o em barras timbradas e devidamente quintadas com o selo real (chamava-se isto de “quintar o ouro”) para somente depois, devolvê-las ao proprietário. Era somente nestas barras quintadas que o ouro podia circular. A tentativa de utilizar o ouro sob outra forma – em pó, em pepitas ou em barras não marcadas – era rigorosamente punida, com penas que iam do confisco dos bens do infrator, até seu degredo perpétuo para as colônias portuguesas. (BOXER, 1969).

63 O imposto de capitação era referente ao número de escravos utilizados nas lavras. “A capitação era um imposto odioso em Minas, porque onerava mais a classe pobre dos mineiros”. (SANTOS, 1958, p. 579). Nas

palavras de Vergueiro (1982, p. 33), “o problema dos impostos e os protestos constituem um dos capítulos mais dolorosos da história das Minas”.

64 Todas as vezes em que era decretada a derrama, a capitania entrava em situação de pânico e agitação. Era

preciso mobilizar as forças armadas e havia medo e terror: as casas particulares eram assaltadas e muitas pessoas eram aprisionadas. Não havia garantia pessoal. “Todo mundo estava sujeito a perder de uma hora para outra os seus bens, sua liberdade e sua vida”. (PRADO JÚNIOR, 1980, p. 59).

arrecadação do quinto que era desviado e contrabandeado ilegalmente, ainda que se empenhasse muito para acompanhar as atividades mineradoras. De acordo com Cardoso (1938, p. 26), “os desencaminhadores utilizavam artifícios variados para não entregar o ouro nas oficinas reais”. Fundiam-no falsamente, entregando-o nas casas da moeda do Rio,

Bahia e Lisboa; desviavam-no dos registros por picadas de mato; levavam-no escondido para a Guiana Francesa ou para Buenos Aires, onde o trocavam por patacas; ou também para os Açores; na negociação de escravos na Costa da Guiné, levavam grandes quantias que eram negociadas com outros fins; carregavam ouro clandestino nas frotas que partiam do Rio para Lisboa, em barras e em caixas; escondiam-no em imagens de santos; transportavam-no em embarcações fingindo pesca; formavam quadrilhas e companhias de negócio em torno do roubo e do contrabando. A Corte, em resposta, impunha penas severas aos transgressores, apreendendo ouro onde podia e fortalecendo os registros e vigiando os caminhos.

Dois fatos se fazem importantes para a compreensão do espiral de exigências que sugiram nesse período: o primeiro se refere à subida ao poder do Marquês de

Pombal65. O poderoso ministro precisava de ouro e tomou todas as medidas possíveis para melhor captá-lo, tendo em vista a manutenção do luxo da Corte Portuguesa; o segundo é agravante do primeiro e deve-se ao terremoto66 pavoroso que quase destruiu Lisboa em 1755. Na urgência de reedificar a cidade, as riquezas brasileiras foram a única solução. Por isso, a situação na colônia ficou muito apertada em relação a tudo aquilo que se referia à cobrança dos impostos. O que causou grandes proibições e tumultos. Além do quinto foi instituído os subsídios voluntários para a reconstrução de Lisboa. A insatisfação gerada por esse mecanismo tributário ocasionará de forma decisiva a articulação da Inconfidência Mineira de 1789.

65 O Marquês de Pombal dirigiu Portugal durante o reinado de José I, o Reformador. Nasceu em Lisboa em 1699

e estudou na Universidade de Coimbra. Exerceu o cargo de embaixador de Portugal em Londres e em Viena. Em 1750, o rei José nomeou-o secretário de Estado (ministro) para Assuntos Exteriores. O seu trabalho notabilizou- se desde o terremoto que destruiu Lisboa em 1755, quando, nomeado primeiro-ministro, Pombal organizou as forças de auxílio e planejou a reconstrução da cidade. A partir de 1756, seu poder foi quase absoluto e realizou um programa político de acordo com os princípios do Iluminismo. Na visão de Pombal a administração da colônia devia ter sempre como meta a geração de riquezas para o reino. (FIGUEIREDO, 2011).

66 Este terremoto é narrado de maneira dramática pelos historiadores. Ele aconteceu no dia primeiro de

novembro de 1755, quando a partir das nove horas da manhã iniciou-se um tremor de terra que durou sete minutos fazendo ruir milhares de casas e edifícios. Depois, pelas onze horas da manhã, enquanto os sobreviventes assustados corriam para todos os lados, houve um maremoto que causou ainda mais destruição. Em seguida, houve diversos focos de incêndio que fez a cidade arder, ainda acometida por leves tremores de terra. A esse quadro de terror, os historiadores acrescentam abusos, estupros e roubos que causou a morte de mais de 15 mil pessoas. (CALDEIRA 1997).