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2.1. Múltiplas perspetivas da inteligência

2.1.1. O conceito de Inteligência

2.1.1.1. Abordagem psicométrica

A abordagem psicométrica, também conhecida por fatorial ou diferencial, é a perspetiva mais clássica do estudo da inteligência. Esta abordagem, como referem Almeida, Guisande e Ferreira (2009), inclui diversas conceções teóricas em volta da definição de inteligência, todas elas de um modo geral tendo implicações diretas nas formas propostas para a sua avaliação. A maioria dos testes de inteligência, ainda usados atualmente, sustentam-se nesta abordagem. Mas, segundo estes autores, uma crítica que frequentemente se atribui aos modelos psicométricos tem a ver com o sentido restritivo como a inteligência e a cognição são considerados. A sua atenção prende-se nos aspetos intelectuais e não tem em consideração os conteúdos das situações do quotidiano com que cada um se tem de deparar nem as habilidades sociais e interpessoais ou talentos que cada um demostra nas diferentes áreas do deu dia a dia.

Para os defensores desta abordagem, a inteligência, como diz Machado (2013), é concebida como inata e estática que se mantém ao longo da vida e que pode ser medida. Inteligência, dizem Almeida, Guisande e Ferreira (2009), significa capacidade ou aptidão mental, podendo essa capacidade traduzir-se num potencial heterogéneo mas coerente de funções mentais, numa capacidade geral de aprender significados e de estabelecer e aplicar relações nas mais diversas situações de desempenho, fator g (depende de uma energia mental

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essencialmente inata), ou numa diversidade de aptidões ou funções cognitivas diferenciadas, podendo estas serem entendidas como autónomas entre si ou, então, correlacionadas e interdependentes segundo níveis hierárquicos de maior ou menor generalização.

A forma de explicitar a capacidade intelectual de um indivíduo através do cálculo do quociente de inteligência, QI, é bem tradicional na psicologia e, é facilmente entendida pela generalidade da população e, a teoria do fator g, é uma teoria que parte do pressuposto de que há um fator geral de capacidade intelectual. Os primeiros psicólogos, segundo Feldman (2001), que se interessaram pela inteligência assumiram que existia um fator geral de capacidade intelectual, chamado g ou fator g. Pensava-se que este era o fator subjacente a todos os aspetos da inteligência e que provavelmente seria aquele que era medido pelos testes de inteligência. A teoria do fator g é atribuída a Spearman mas, a honra de ter elaborado o primeiro teste de inteligência é geralmente atribuída a Alfred Binet.

Em 1904, altura de La Belle Époque, as autoridades municipais de Paris, interessadas no despiste de crianças com dificuldades de aprendizagem contactaram o psicólogo Alfred Binet com um pedido incomum: poderia ele desenvolver algum tipo de medida a qual permitisse prever que jovens teriam sucesso e quais fracassariam no ensino primário das escolas de Paris? Para este efeito, Alfred Binet, com a colaboração de Theodore Simon, publicaram a primeira escala métrica de inteligência, que tinha como finalidade medir o desenvolvimento da inteligência das crianças de acordo com a idade. Atuando de uma forma completamente empírica foram administrados centenas de testes àquelas crianças, uma vez que pretendiam identificar um conjunto de questões que, quando respondidas, seriam discriminatórias, de alcançar, ou não, sucesso na escola. Binet produziu um conjunto de testes de itens que poderiam predizer o sucesso ou o fracasso de uma criança na escola e, em pouco tempo, a descoberta veio a ser chamada de "teste de inteligência". Tal como outras modas parisienses esta também cruzou o oceano, tendo um modesto sucesso até à Primeira Guerra Mundial, mas foi evoluindo, uma vez que testes de inteligência já foram aplicados a milhões de americanos, sendo usado em muitos campos da sociedade americana (Gardner, 2006b).

Após a experiência inicial de organizar os testes e de os experimentar em crianças, algum tempo mais tarde, em 1908, Binet tentou relacionar o nível de capacidade com a idade, ordenando as trinta tarefas da sua escala segundo a idade em que a média das crianças as conseguia resolver com sucesso. Esta inovação veio permitir identificar o nível cognitivo da criança, mas ainda assim não indicava a qualidade deste.

Sem se aperceber, Binet tinha criado os primeiros testes de inteligência e uns anos mais tarde, em 1912, Stern, psicólogo alemão, surgiu com a proposta de dividir o nível mental da criança — idade mental — pela sua idade cronológica, para produzir um quociente de inteligência. Assim nascia o mais famoso e amplamente difundido conceito da psicologia, o quociente de inteligência — QI. A inteligência passou então a ser quantificável e a procura da medida perfeita de inteligência progrediu rapidamente. No entanto, como diz Brody (2000), sabemos como medir algo chamado inteligência mas não sabemos o que foi medido.

25 Desde o tempo de Binet, os testes de QI têm variado na sua dimensão: alguns envolvem o raciocínio, outros a memória; alguns o conhecimento, outros a aplicação de regras, testando o conhecimento de palavras, de números, de formas, de recordação e a capacidade de explicar ações concretas (Furnham, 2011). No entanto e, na opinião de Armstrong (2003), os testes de QI geralmente centram a sua atenção em se ser bom com as palavras e com os números, deixando de lado importantes aspetos como a música, a arte, a natureza e habilidades sociais. Para este autor ser inteligente não é somente obter boas notas ou alcançar bons resultados nos testes e memorizar matérias. De facto há muitas maneiras de mostrar ser inteligente — através da arte, da música, do atletismo, da natureza, das emoções, do convívio com os outros.

Segundo Gardner (1999) o conceito científico de inteligência tem raízes escolares sendo insensível à gama de papéis que se destacam nesta sociedade em que vivemos. A escolha do rendimento em matérias escolares como critério de inteligência é, para alguns críticos dos testes de inteligência, uma decisão subjetiva que não empresta legitimidade aos testes de inteligência. Na viragem do século XIX, Alfred Binet e seus colegas estavam interessados em ajudar os estudantes que eram propensos a ter dificuldades na escola, mas Gardner questiona-se como teriam sido diferentes as coisas se os primeiros testes de inteligência tivessem sido concebidos, por exemplo, por artistas ou empresários. Então, como diz Kendler (1985) porque não alargar o critério dos testes de inteligência de forma a englobar aptidões mecânicas, atléticas e artistas? E como questiona Kendler (1985), porque não incluir mesmo características de personalidade, como por exemplo, espontaneidade e sensibilidade social?