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2. O DIREITO À EDUCAÇÃO

2.3. Os Pilares dos Direitos Humanos na Educação

2.3.2. Accessibility (Acessibilidade)

A Acessibilidade, ou Acesso, significa que os governos devem visar a eliminação de práticas discriminatórias sobre o género, a raça, a língua, a religião, o portador de deficiência, a situação económica e social, ou outras, e assegurar o gozo igual de todos os direitos humanos, e não apenas satisfazer-se com a mera proibição formal.

Por outro lado, acessibilidade refere-se aos níveis primário, secundário e terciário da educação, em diferentes sentidos; os governos estão também obrigados a promover o acesso gratuito e obrigatório para todas as crianças em idade escolar. A acessibilidade implica, também, que o direito à educação pode ser materializado progressivamente, isto é, o seu acesso pode ser postergado para o momento em que as condições e as circunstâncias o permitirem.

A Constituição da República de Angola, de 2010, no seu artigo 22.º, n.º 1, dispõe que todos os cidad~os angolanos “gozam dos direitos, das liberdades e das garantias constitucionalmente consagrados e estão sujeitos aos deveres estabelecidos na Constituiç~o e na Lei”.

Estando considerado nos, já anteriormente citados, artigos 78.º, 80º, 81.º e 21.º da Constituição de 2010, o acesso à educação não está directamente consagrado, como

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vimos afirmando, nem na Constituição nem na LBSEE. O artigo 9.º da LBSEE, que diz respeito à universalidade do ensino, refere-se à igualdade de todos no acesso e frequência e não, propriamente, ao direito de acesso e frequência, embora a referência a “iguais direitos de acesso e frequência…”, prescrita nesse artigo, possa erroneamente induzir a interpretação diversa. Aqui, trata-se simplesmente de submeter todas as pessoas aos mesmos critérios de acesso, frequência e sucesso escolar. Nisso consiste a universalidade de ensino, segundo a qual, e em harmonia com a norma superior que rege o princípio da igualdade, “todos s~o iguais perante a constituiç~o e a lei”. O princípio da Universalidade, prescrito na LBSEE, aplica o princípio da Igualdade previsto no artigo 23.º da Constituição de 2010.

A isenção pelo pagamento da inscrição, assistência às aulas, material escolar e merenda escolar estão assegurados, pelo artigo 11º da LBSEE, a todos os indivíduos que frequentem o ensino primário, que corresponde, nos termos da Lei, aos seis primeiros anos de escolaridade, de acordo com o consignado no artigo 27.º, n.º 2.

A classe e Iniciação, que integra o Subsistema da Educação Pré-escolar, está condicionada à criação de condições para que se mantenha gratuita, nos casos em que é, não se comprometedo o Estado, pelo menos nos termos da lei, em garantir a extensão da gratuitidade às restantes. Pelo menos, é uma das leituras que se pode fazer da interpretação do artigo 11.º, n.º 2 da LBSEE.

Já anteriormente, a LBSE parecia acolher o acesso e a frequência à educação como um direito, induzindo estar subjacente no artigo 6.º, e a gratuitidade e a obrigatoriedade do ensino garantidas pelos artigos 7.º e 8.º, da mesma lei.

Dizemos “parecia” porque a disposiç~o legal n~o referia, expressamente, o direito de todo o cidadão ao acesso e frequência do ensino primário, mas submetia a obrigatoriedade da frequência do ensino primário a quem pretendesse frequentar o ensino secundário.

Por enquanto, a gratuitidade está prescrita para o ensino primário, que vai da 1.ª até à 6.ª classe, com a perspectiva de alargamento às Classes de Iniciação e ao I Ciclo do Ensino Secundário, sujeito à criação de condições pelo Estado, nos termos do artigo 11.º, n.º 2, dessa Lei, abrangendo parcialmente dois subsistemas de ensino. Nos termos da alínea a) do artigo 3.º, do Decreto Presidencial n.º 16/11, de 11 de Janeiro, “o ensino prim|rio é obrigatório para os indivíduos que frequentam o ensino geral”. Um dos efeitos imediatos desta disposição legal prende-se com a restrição deste direito aos

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cidadãos que, ultrapassadas as barreiras sociais e económicas (barreiras sociais e económicas e não situação social e económica), tais como a consciência dos pais e encarregados de educação de reconhecerem a importância do papel da escola nas suas vidas ou a exeguidade das infra-estruturas educacionais, conseguem aceder à escola.150

No que se refere à obrigatoriedade de ensino, a LBSEE veio fixar o dever do Estado, da Sociedade, das famílias e das empresas de assegurar e promover o acesso e a frequência à escola de todos os indivíduos em idade escolar. Esta disposição clarificou o sentido da obrigatoriedade do ensino que a redacção do artigo 8.º da LBSE induzia, ao considerar a obrigatoriedade como “particularidades do ensino prim|rio”, reforçando o sentido da sua aplicação àqueles que frequentem o ensino primário.

Que significado poderia sobressair do objectivo preconizado por esta norma, ao estabelecer, no número 3, in fine, a propósito da gratuitidade de ensino, “a igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolar”, sen~o o de reiterar o que atr|s ficou dito sobre o assunto?

A obrigatoriedade de acesso ao ensino não constitui um conceito vazio, desprovido de conteúdo. Tem de ser acompanhado de medidas que lhe dão corpo, nomeadamente que promovam o seu acesso sem restrições, quer no sentido de responsabilizar os pais e encarregados de educação em conduzir os filhos à escola, quer formando professores qualificados, quer estruturando-se o sistema de modo a assumir e a absorver toda a criança em idade escolar, ainda que de modo paulatino, “de acordo com as condições”, tendo como objectivo a universalizaç~o efectiva até 2015, conforme estabelece o compromisso 7.ii, do Marco de Acção de Dakar, também denominado “Educaç~o Para Todos”. Esta disposiç~o de Direito Internacional permite uma abordagem diferente da LBSE e do Decreto Presidencial n.º 16/11, argumentando-se que n~o é exigível, “ainda” que “todas” as crianças do ensino primário tenham acesso efectivo { escola, mas que se faça o esforço de que as crianças “tenham acesso { educaç~o prim|ria, obrigatória e de qualidade até ao ano 2015”. Seria, assim, entendido este compromisso como o dever do Estado face aos seus cidadãos, que se traduziria em

non facere até 2015, por parte do poder público. Nesse sentido, estaríamos perante um

direito negativo do Estado, um direito de defesa do próprio Estado face aos

150 O artigo 3.º do Decreto Presidencial n.º 16/11, que aprova o Estatuto do Subsistema do Ensino Geral,

dispõe que “O Subsistema do ensino geral consubstancia-se nos seguintes princípios: a) O Ensino Primário é obrigatório para todos os indivíduos que frequentam o subsistema do ensino geral; Gratuitidade – No ensino Primário é gratuita a inscrição, a assistência às aulas e o material escolar, em todas as instituições de ensino público”.

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administrados, e não já em face de um direito erga omnes do cidadão, em que o Estado se abstém de intervir na esfera jurídica do cidadão, como por exemplo no caso do direito de propriedade.

Ora, esse sentido não lhe pode ser conferido, por afastar, in limine, o princípio sagrado da dignidade do ser humano e o correspectivo direito de “aprender a aprender, a fazer, a conviver e a ser”, sublinhando “a ser” a qualidade, a essência intrínseca, indissoci|vel e inalien|vel da “pessoa humana”: o existir.

A Constituição da República de Angola assegura, expressamente no seu artigo 83.º, epigrafado “Cidad~os com deficiência”, o acesso dos cidad~os com deficiência em pé de igualdade com os demais, ao prescrever, no n.º 1, que “os cidad~os com deficiência gozam plenamente dos direitos e estão sujeitos aos deveres consagrados na Constituiç~o”, acautelando a especificidade da sua restriç~o física ou intelectual e, quando necessário, o acesso ao ensino especial e à formação profissional – n.º 4 da norma que vimos citando. No geral, o Estado, como se pode depreender desta regra jurídica, pugna pela inclusão social.

A igualdade de direitos entre todos os cidadãos está constitucionalmente consagrada e protegida nos artigos 22.º, n.º 1, ao estabelecer o Princípio da Universalidade, quando afirma que “Todos gozam dos direitos, das liberdades e das garantias constitucionalmente consagrados e estão sujeitos aos deveres estabelecidos na Constituiç~o e na Lei”, no artigo 23.º, n.º 1, que define o Princípio da Igualdade, ambos da Constituiç~o de 2010, ao dispor que “Todos s~o iguais perante a Constituiç~o e a lei”, e, ainda, mais explicitamente no n.º 2 desse preceito legal, que “Ninguém pode ser prejudicado, privilegiado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão da sua ascendência, sexo, raça, etnia, cor, deficiência, língua, local de nascimento, religião, convicções políticas, ideológicas ou filosóficas, grau de instrução, condição económica ou social ou profiss~o”, dando respaldo ao já consignado no artigo 10.º da LBSEE, que propala o carácter democrático do ensino e, como seu corol|rio, “a igualdade de direitos no acesso e na frequência aos diversos níveis de ensino”, conforme o artigo 9.º.151.

A igualdade de todos, na intenção da norma, significa a não exclusão de qualquer indivíduo por motivos de ascendência, sexo, raça, etnia, cor, deficiência, língua, local de nascimento, religião, convicções políticas, ideológicas ou filosóficas, grau de instrução,

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condição económica ou social, ou profissão, ou seja, a não discriminação do cidadão, não só no que se refere ao acesso e frequência à escola, mas também na participação na sua organização e gestão, através de órgãos próprios.