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Acreditar nos sinais, acreditar nos instrumentos e nas estrelas – Peças curtas para desesquecer: compor com a vibração dos corpos

CAPÍTULO 2. TUDO DIGERIDO 149 Secreções e vibrações: sensações como estados de criação em arte

1. A MAGIA E A VIDA:

1.1 O espírito recusa-se a conceber o espírito sem o corpo – Sensorimemórias, um modo de criar em dança

1.1.5 Acreditar nos sinais, acreditar nos instrumentos e nas estrelas – Peças curtas para desesquecer: compor com a vibração dos corpos

Corpos como protagonistas. Ênfase na fisicalidade das bailarinas. Estudos em dança que transitam entre sensações, memórias, emoções, imagens e situações, a comporem

texturas e estados de presença poética que se fazem e se desfazem continuamente.

Corpo sutil, intimidade. Corpos que insistem em se movimentar de uma determinada maneira. Sensação de estar e de respirar fora de si mesmo, de que partículas saltitam e ossos enrolam por debaixo da pele, de nunca ter se movido daquela maneira, do corpo mover-se por si próprio, de que é preciso deixá-lo encontrar os caminhos, de não ter necessidade do movimento, de acionar memórias sem nome – táteis, atemporais, em estado bruto de existência –, memórias conhecidas, memórias em déjà-vu, memórias que não são localizáveis pela mente e que simplesmente emergem como uma vaga impressão ou intuição de algo vivido. Ser pulsado para outro tempo e espaço. Forças e moveres até então desconhecidos em si e no outro, acesso a lugares misteriosos do corpo. Dissolver-se na energia matérica de um objeto relacional, acessar um campo de energia na relação corpo-objeto56, abrir os corpos, atravessar uma experiência. Um corpo que não quer ser ou fazer algo, mas que simplesmente é, no tempo presente das

56 Os objetos também são corpos na perspectiva do pensamento de Spinoza, o qual prefere tratar da afetação entre

corpos, sejam eles humanos e/ou não-humanos (Deleuze, 2002). Parece possível inferir que nas relações entre corpos está aberta a possibilidade de misturas de energias matéricas, pois por esse prisma são forças que se encontram e não superfícies que se pretendem distintas e separadas umas das outras. Talvez por isso os objetos relacionais de Lygia Clark, na medida em que não têm apelo semiótico, sejam favoráveis às dissoluções de um corpo no outro, tal como descrevem

sensações. Corpo como extensão do movimento do mundo. Quebra de rotinas perceptivas.

Modos de se mover potentes, fortes, indomáveis. Catatonia, risco de adoecer emocionalmente, sensação de estar num trabalho físico que desfaz a própria fisicalidade. Um dedo do pé quebrado numa experimentação descontrolada, necessidade de recorrer à yoga e à musculação para retornar a si. Dançar por 30 minutos e não se lembrar do que fez, ver-se em vídeo e não se reconhecer. Desafiar as alterações fisiológicas de estados do corpo para descobrir uma gestualidade artística com combinações cinéticas e motoras inusitadas. Perceber-se por vibrações, pulsações, dimensões sensíveis.

Invenção, surpresa, existência palpável da vida: vetores de força e de energia

percorrendo as multidimensões de corpos em sobressaltos, a configurarem modos inusitados de se mover. Contiguidade entre estados e sensações. Manter uma latência viva. Não saber o que vai acontecer, mas ter a certeza de que, se houver espera e se o corpo pensar por si, algo já apreendido por alguma camada de sensação se concretizará. Permitir-se esquecer, desesquecer.

Descoberta de outras lógicas musculares, ósseas, coreográficas e dramatúrgicas.

Texturas, estados de presença poética, brilhos, olhar investigativo. Uma dança que se

desapaixona das repetições vazias de sentidos e de sensações, que não reencena, que abre os corpos para a concretude da experiência de serem tomados pelas

sensorimemórias, as quais têm motor próprio e se revelam de maneiras impensáveis.

Uma experiência que se mantém viva, conectada ao mover, a negociar com uma tentativa de estabilizar uma textura, e esta a escapar da lógica de fixar passos e sequências numa contagem determinada de tempo. A atenção como uma dimensão coreográfica e dramatúrgica. Ação entendida como resultado dos estados do corpo. Sons guturais, ruídos. Fantasmática do corpo. Atravessar a materialidade da voz e da respiração da mesma maneira que se atravessou a experiência com os objetos relacionais. Corpo subjétil. Caverna, monstros, bicho ancestral. Estar sem pele. Sensação de criar como quem está numa noite de insônia. Um cozinhar de sensações e intuições.

São diversas as camadas e dimensões do corpo que as criadoras-intérpretes da Companhia Perdida acessaram ao longo do processo de investigação das

sensorimemórias e de criação de uma obra coreográfica. Dançar a partir dessa qualidade

de vivências tornou-se também uma experiência subjétil, tal como proposto por Antonin Artaud (Ferracini, 2013). Quando Juliana Moraes tensionou aventurar-se por uma complexidade coreográfica focada nas sensações, com suas possibilidades cinéticas e motoras, para descobrir a constituição de uma outra gestualidade artística, ela acabou por propiciar que as artistas atingissem suas crenças e conceitos acerca da dança e,

simultaneamente, se auto-atingissem, pela intimidade das vivências. Processo e produto estiveram implicados, tal qual as próprias bailarinas, que se colocaram abertas, disponíveis e expostas a outras lógicas de pesquisa de uma corporeidade que se organizasse por uma radical desorganização de si da linguagem da dança que conheciam. Seguiam dúvidas a respeito da maneira de elaborar coreograficamente esse material sensível.

Diante da constelação cartografada nas linhas acima, parecia ser este o momento de acreditar nos sinais, nos instrumentos e nas estrelas, talvez dissesse Oswald de Andrade. Com Ana Terra e Gustavo Sol, a estranheza dos corpos disformes, trêmulos, descontrolados, caóticos, irregulares e desarmônicos foram assumidos como matérias de criação, ao mesmo tempo em que se procurava desenvolver meios de não se deixar a vibração, o calor e a energia das texturas esfriarem. Com Antonio Januzelli a estética foi se definindo e o corpo foi entendido como protagonista da cena. Para evidenciá-lo, simplicidade e até mesmo ausência de cenário, figurino, iluminação e trilha sonora passam a ser cogitados, num intenso diálogo com profissionais das respectivas áreas que integraram o Projeto Sensorimemórias.

Enquanto o formato de exibição ao público começava a se definir, diferentes estratégias de manipulação dos materiais seguiram em experimentação. Cada criadora-intérprete tinha entre 3 e 6 texturas desenvolvidas, as quais, ao longo do processo, foram identificadas em suas especificidades qualitativas. A partir de improvisações semi- estruturadas, as quais incorporavam à obra o próprio caráter de provisoriedade dos estados corporais, evidenciados e estudados no processo de pesquisa, a Companhia Perdida passou pelos seguintes dispositivos de organização coreográfica (Moraes, 2012a; Moraes, 2012d):

• Encadeamento simples de uma textura para outra;

• Encadeamento com mistura das qualidades das texturas na passagem entre uma e outra (cross fading);

• Acumulação randômica de texturas em diferentes partes do corpo (assemblage); • Encadeamento com reiterações;

• Aumento gradativo de intensidade e mudança de textura no pico mais alto; • Mudança de uma textura para outra após explosão de intensidade e resultante cansaço (mudança no cansaço);

• Tomada repentina do corpo por uma textura de qualidade bastante diferente da anterior;

• Repetição em coro (trio) de uma única textura; e

• Construção de traçados simples no espaço pela insistência de uma textura em se deslocar.

A coreógrafa Juliana Moraes já havia constatado que as texturas se expandiam no espaço, mas não se organizavam temporalmente. Manipular as texturas no eixo do tempo implicava correr o risco de reduzir o seu grau de energia. Com a proximidade da finalização do projeto, bailarinas e coreógrafa discordavam sobre a direção a ser tomada no sentido da composição de um espetáculo. Elas perceberam que “as escolhas de organização do material influenciaram sua interpretação e vice-versa” (Moraes, 2012d, p. 61). O trabalho de lapidação avançou no sentido de articular o aprimoramento técnico e interpretativo às decisões narrativas, dramatúrgicas e coreográficas. Portanto, tratava-se de investigar como manter a sensação, compreender tecnicamente as texturas em suas qualidades dinâmicas, desenhos espaciais, relação com peso, as tensões, respiração, níveis, imagens, para que se pudesse retomar os materiais e ser capaz de explorá-lo objetivamente, pela identificação dos eixos principais e suas possibilidades de variação, o que incluía a exploração temporal e espacial (Moraes, 2012b). Essa lapidação e esse esmiuçar de texturas são reconhecidos pelas bailarinas como característicos de todas as criações de Juliana Moraes.

Não havia dúvidas de que o material surgia cheio de energia e de uma maneira considerada por elas “bonita de se ver”, apesar das estranhezas. Porém, ao mesmo tempo, Juliana Moraes encontrava dificuldade de trabalhá-lo coreograficamente, na perspectiva de uma direção. Com o desejo de tornar essa pesquisa pública, partilhada com outras pessoas, ela sentia ser preciso dar um ordenamento temporal a essa dança e enfrentar o caráter íntimo e voltado para si mesmo, no qual se encontrava o trabalho com as texturas, após os primeiros 9 meses de estudos. Em certos momentos, houve tentativas de alterar a ordem de uma movimentação e de criar relações entre os materiais de diferentes criadoras-intérpretes mas, depois dos primeiros esboços de composição, a resposta, em geral, passou a ser “eu não sinto assim”. Estavam dados os impasses e as questões a serem pensados, pois embora os estudos tenham sido colaborativos, haviam escolhas e definições que eram estritamente pessoais, ao mesmo tempo em que parte das escolhas, definições e encaminhamentos recaiam sobre a direção. Para a criadora,

Muitas das memórias relembradas emergiam de recantos profundamente esquecidos, e tocar tais traços de lembrança foi, ao mesmo tempo, recompensador pela vitalidade do material corporal, e frustrante pelas enormes barreiras que eles impunham. O material resistia a qualquer tentativa de objetificação para manipulação coreográfica, e foi necessária muita paciência para que cada intérprete fosse capaz de gerenciar sua própria criação durante o processo (Moraes, 2015a, p. 24).

A coreógrafa começou a ter a sensação de estar lidando com um monstro. Tal como o tipo de movimentação encontrada na pesquisa, a direção parecia desgovernada em relação a procedimentos e dispositivos coreográficos que melhor se afinassem com a realidade dos materiais. Essa tensão pode ser percebida no histórico dos nomes dos

arquivos em vídeo, que foram mudando de grafia conforme as alterações de estratégias na direção. Num dado momento, os arquivos eram “Dramaturgização”, “Improviso livre” e “Dramaturgia pianíssimo-fortíssimo”. Nessa fase, na lapidação das texturas, a diretora faz indicações e questionamentos às bailarinas como “ir pela sensação, pela escuta”, “é para você, para o espectador, ou para os dois?”, “qual a respiração?”, “constrói a vibração”, “não deixa a gente acostumar com a textura”, “não se acostume com a textura”, “potencializar a textura”, “o que está te levando?”, “é uma labareda que está aí”. Houve momentos em que Juliana Moraes parecia respirar junto com as criadoras-intérpretes enquanto as dirigia, como contaminada pela vibração de seus corpos, como a querer ajudar a encontrar e colaborar na definição dos eixos qualitativos em torno dos quais elas variavam; em outros momentos ela fazia indicações mais direcionadas e simultâneas, numa espécie de acumulação de provocações que resultassem em sustos e surpresas na movimentação, para que as texturas não se tornassem previsíveis para as próprias bailarinas e, consequentemente, nem para o público.

Um jeito de intervir que toma as sensações como disparador da experimentação do corpo. Uma maneira de dirigir que, embora menos incisiva do ponto de vista de uma interferência mais direta, se aproxima ao estilo do cineasta brasileiro Glauber Rocha (1939-1981), fundador do Cinema Novo, e também do ator Gustavo Sol ao longo dos laboratórios com a Companhia Perdida, na medida em que a ênfase dos três criadores está na provocação da sensorialidade. Ao que parece, eles acreditam que é no corpo e

por ele, com o mínimo de mediação e de decisão racional, que os estados cênicos se

configuram, expandem-se e abrem possibilidades poéticas. No DVD extra do filme Terra

em transe (1967), em versão restaurada, lançada em 2005, atores que participaram da

obra, como Paulo Autran, Hugo Carvana e Francisco Milani, são unânimes em afirmar essa linha de provocação sensorial. Paulo Autran conta que diversas cenas foram gravadas com Glauber Rocha falando ao mesmo tempo que os atores, por vezes gritando perto deles e quase não dando tempo de para perceberem o que ele queria. Era preciso apenas ser responsivo às orientações. Em fins da década de 1960, a inserção de voz e edição de som era feita em estúdio, posterior à gravação das imagens.

Apesar de tentar estabelecer roteiros mais definidos, Juliana Moraes apenas conseguiu estabelecer um encadeamento de texturas no qual as bailarinas dançassem juntas em duas situações: no trio e no quarteto. As artistas acreditam que talvez fosse possível encontrar um modo de todas se apropriarem dos materiais umas das outras. Mas que certamente isso solicitaria um tempo muito alargado de pesquisa e implicaria num outro processo de criação. Segundo Carolina Callegaro, houve essa tentativa quando a companhia usou as estratégias de improvisação de Janô para juntar os materiais, mas o resultado ficou estranho. Foi quando se assumiu finalmente que fariam pequenas peças.

Ainda que as relações entre elas tivessem sido experimentadas também com outros materiais, essa tentativa de composição se mostrou pouco eficaz.

Assim, depois desse bloco de pesquisa, em que já se tensionava para uma organização e formalização coreográfica, as gravações passaram a ser grafadas pelo nome que as

texturas ganharam, como “dirigindo fogo Cacá” e “dirigindo Bel caranguejo”; e,

finalmente, mais claramente como “estudos”. A partir de então, ficou definida como estratégia que cada uma criasse o seu próprio trabalho, com solos à volta de 10 a 20 minutos, uma vez que cada uma das texturas, em suas combinações pessoais, tinha uma lógica dramatúrgica própria. Segundo Juliana Moraes:

Trabalhar em estudos nos liberta da ideia de um único produto final, já que muitas das movimentações que criamos não dialogam necessariamente umas com as outras na simultaneidade da cena, e tentar forçar uma coerência dramatúrgica de espetáculo nos pareceu desnecessário (Moraes, 2012d, p. 61).

Com essa definição estratégica, a diretora entendeu que sua função nesse processo era a de agenciadora dos estudos, ao mesmo tempo em que cada bailarina tratou de agenciar a própria experiência57. Diante da configuração de estudos, pareceu coerente ao tipo de material coreográfico combinar dois dispositivos de criação: os apresentados por Gustavo Sol e os utilizados pela coreógrafa Ana Sanchéz-Colberg – com quem Juliana Moraes estudou no seu mestrado no Laban Centre, em Londres (Inglaterra) –, os quais são compostos por repetição, simetria, deslocamento, transposição, desenvolvimento, aumento, diminuição, variação, adição, subtração, substituição, reiteração, fragmentação, expansão, alongamento, desintegração, aceleração, desaceleração58. Diferente dos dispositivos coreográficos tradicionais, geralmente aliados à desenhos formais do movimento e às escolhas feitas em momento distinto ao da atuação, os caminhos de Sol e Sanchéz-Colberg mostraram-se pertinentes por serem mais direcionados às qualidades de movimento num tempo presente, com decisões que se fazem no calor da investigação dos corpos. Portanto, aproximam-se do modo de compor de Juliana Moraes a partir das

texturas, das frequências qualitativas de movimento (Moraes, 2013b).

Num sentido diferente dos solos, estavam os estudos considerados “mais coreográficos”, que resultaram no duo “corpo e metal” de Érica Tessarolo, posteriormente nominado como “corpo em metal”, no qual a bailarina incorporada as características do material em carne e ossos (que talvez até seja um trio, uma vez que Carolina Callegaro também está em cena manipulando as hastes metálicas); no trio, chamado de “lesminhas” durante os ensaios e depois “trio sobre o mesmo tema”, a partir de um estudo em torno da textura

57 Juliana Moraes, coreógrafa e bailarina. Entrevista realizada em 24 de Maio de 2014, em São Paulo (Brasil). Informação

verbal.

58

Anotações da palestra Sensorimemórias: por uma dramaturgia do desesquecimento, ministrada pela coreógrafa e bailarina Juliana Moraes, no âmbito do Seminário Terceira Margem/Bienal Internacional de Dança do Ceará De Par Em Par, com o tema Dramaturgias do Corpo, no dia 24 de outubro de 2012, no Auditório do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), em Fortaleza (Ceará/Brasil).

arrastada pelo chão de Flávia Scheye, que surgiu da experimentação com a espuma de estofado, e que foi apresentado com Carolina Callegaro e Isabel Monteiro, com diferentes desenhos espaciais mais tradicionais, ao estilo, por exemplo, do pas de quatre do balé

Lago dos Cisnes, muito embora com uma corporeidade bastante diferenciada – Juliana

Moraes diz que essa sequência foi uma brincadeira com o modo de compor quando ela era professora de turmas de baby class –; e o quarteto, apelidado como “caranguejo” e divulgado como “grupo em chão” e cujas qualidades emergiram das sensações de Isabel Monteiro com os pregadores/molas. Para a diretora, as três peças eram mais coreográficas porque

você pegava o material, tirava da fonte, fazia esse deslocamento, outras pessoas aprendiam. No que eu aprendo o material do outro, eu já esfrio esse material, por mais que eu queira fazer da forma correta e tentar descobrir em mim aquilo que reverbera. Não é meu, não é minha memória, não é o meu corpo que vibrou, não é o meu corpo que está. Então, dá para trabalhar coreograficamente, dá para trabalhar combinação, repetição, todos esses dispositivos mais tradicionais. Fora isso, você tem que lidar mesmo com um tempo mais maleável, com uma estrutura mais maleável, com aceitação do que vai dar certo e do que não vai dar certo no dia, com um encadeamento muito suave de coisas. Mas há abertura para que às vezes elas aconteçam de outro jeito59.

Dramaturgia do desesquecimento é como a coreógrafa nominou o conjunto de elementos

que passaram a orientar esse modo de compor coreograficamente, no qual “não há nem encenação nem ficção, mas, sim, a concretude da experiência de relembrar pelo corpo”

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. São eles:

• Roteiros gerais preenchidos pela experiência no momento da cena (ao invés de sequências fixas);

• Paleta de texturas com eixos e variações;

• Dispositivos para modulações de fluxos/dinâmicas;

• Estado de presença: nublar os limites entre indivíduo e figura que se apresenta na cena; e

• Lembrar de esquecer.

Todos os estudos seguiram essa orientação e, assim, definiu-se que os solos e as sequências do duo e do trio seriam apresentados nos Ensaios Abertos Estudos para

sensorimemórias, realizado nos dias 11, 17, 18, 24 e 25 de março de 2012, no Estúdio

Guiará, sala de ensaio usada no processo de pesquisa pela Companhia Perdida, no bairro de Pompéia, em São Paulo. As apresentações aconteceram em dois programas de aproximadamente 45 minutos cada, com um intervalo de 15 minutos entre eles. A ordem

59 Juliana Moraes, coreógrafa e bailarina. Entrevista realizada em 24 de Maio de 2014, em São Paulo (Brasil). Informação

verbal.

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Anotações da palestra Sensorimemórias: por uma dramaturgia do desesquecimento, ministrada pela coreógrafa e bailarina Juliana Moraes, no âmbito do Seminário Terceira Margem/Bienal Internacional de Dança do Ceará De Par Em Par, com o tema Dramaturgias do Corpo, no dia 24 de outubro de 2012, no Auditório do Centro Dragão do Mar de Arte e

Mídia 5. Músicas de Laércio Resende para a Companhia Perdida. Disponível em

http://bit.ly/audiopecascurtas

dos estudos foi modificada ao longo dos dias, assim como algumas de suas estruturas, conforme o tipo de feedback recebido.

Não houve um projeto de iluminação, apenas a luz da sala de ensaio. O figurino foi o mais próximo às roupas usadas pelas bailarinas nos ensaios, pois Juliana Moraes deu-se conta de que as escolhas do figurinista pareciam ainda fechar uma interpretação e uma leitura, quando o material coreográfico se evidenciava aberto, reforçando o desejo de que “cada espectador pudesse preenchê-lo com suas próprias leituras, sensações e interpretações” (Moraes, 2012b, p. 4). O silêncio predominou em grande parte dos estudos. Houve inserções pontuais de som, a partir de uma investigação sonora ainda em fase de experimentação, com a manipulação da voz das bailarinas, gravadas em um laboratório realizado com o músico Laércio Resende. Considerando que o material coreográfico era abstrato e estranho, ele optou por criar texturas sonoras desenvolvidas temporalmente a partir de repetição e de pequenas variações, aproximando-se do modo de trabalhar as texturas de movimento. Os sons foram isolados de seus significados, assemelhando-se a ruídos e criando um universo sonoro que de algum modo ligasse os estudos das bailarinas. Não há melodia e