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3.3 Economia

3.3.1 Agricultura, comércio interno e externo

Em Portugal, aconteceu a mesma coisa e, durante todo o medievo, o mundo rural deteve sempre a primazia em todos os setores da vida histórica portuguesa59. A sociedade rural estava organizada para atender às necessidades de um grupo social que a dominava, os senhores guerreiros. A agricultura era a principal actividade económica do reino. Alguns monarcas, para facilitar o escoamento e a comercialização dos produtos agrícolas criaram feiras. Dessa forma, também se estabeleceu uma relação económico-social entre o campo e a cidade; as especificidades do campo complementavam as necessidades da cidade e podemos dizer que o contrário também ocorria. Porém, no fim do século XIII, cristalizou-se na paisagem portuguesa certa diversidade entre o mundo rural e o mundo citadino. Os antigos centros urbanos haviam se expandido, ocasionando o surgimento de outros, periféricos.

É evidente, portanto, que havia uma relação bastante forte entre o campo e a cidade, em particular porque estabeleceram contatos de mútua dependência. Graças a essa relação, o homem da cidade foi obrigado a estreitar o contacto com o homem do campo, para que pudesse chegar aos rincões e adquirir o que desejasse. Assim, os habitantes da cidade preocupavam-se em estabelecer vias de

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Saul António GOMES – Mundo Rural e Mundo Urbano. In: Maria Helena da Cruz COELHO e A. L. Carvalho HOMEM - Op. cit., p. 386.

comunicação, velando os moradores [os das cidades] pela edificação de boas

pontes, pela criação de albergarias ao longo desses caminhos que facilitassem as jornadas a almocreves e viajantes, fazendo o escoamento de produtos ou permitindo o abastecimento dos mercados citadinos60.

No tocante especificamente à produção agrícola em geral, esta não era muito variada; predominavam, nas terras de semeadura, os vinhais e os linhares (linho ou sobreiro), bem como o cultivo do trigo, do milho-miúdo, do painço. As condições climáticas levaram, muitas vezes, às oscilações da produção cerealífera e, assim, a adaptação da cultura de determinado produto a uma região específica.

De fato, conforme afirma Oliveira Marques61, podemos localizar o predomínio da cultura do milho na comarca de Entre-Douro e Minho, do trigo no Ribatejo e da aveia por todo o país, mas adaptando-se melhor nas regiões centrais e meridionais. A comarca de Entre-Douro e Minho sempre foi, em todo o reino, a mais intensamente cultivada.

A terra para produção agrícola do norte interior, lugar onde predominavam as montanhas e havia poucos homens para o trabalho, era de pouca fertilidade e necessitava de longo repouso entre uma semeadura e outra, além de que, geralmente, a faina agrícola era compartilhada por todos os vizinhos.

O Algarve não permitia o cultivo de cereais em larga escala, devido às condições físicas naturais, pois é entrecortado por serras de médias altitudes e tem subsolo predominantemente pedregoso e pouco fértil, interrompidos por afloramentos de calcário.

A cevada e o centeio predominavam nas regiões do interior, mais especificamente a nordeste, embora a primeira, por ser usada para forragem do gado, existisse praticamente em todo o país. Outros produtos, todavia, há que

registrar. É o caso dos legumes, em especial das favas, substituto frequente do pão. Das culturas arborícolas, com predomínio da figueira, do castanheiro, […]62.

O vinho era visto como complemento alimentar, e sua produção era abundante, havendo uma proliferação de adegas por toda parte, tanto nas cidades quanto no campo. Os fabricantes de vinho eram chamados de tanoeiros, por causa,

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Saul António GOMES - Mundo rural e mundo urbano. In: M. H. da Cruz COELHO e A. L. de Carvalho HOMEM, Op. cit., p. 387.

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A. H. de Oliveira MARQUES – Introdução à História da Agricultura em Portugal. A questão Cerealífera durante a Idade Média, 3ª edição. Lisboa: Cosmos, 1978.

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muito provavelmente, do facto de os vinhos serem guardados em tonéis, barris e outros vasilhames. Somava-se, também, ao vinho, outro produto líquido, que se armazenava em adegas: o azeite, utilizado não só na alimentação, mas também na iluminação, na medicina, na perfumaria e na religião.

As actividades comerciais desenvolvidas pelos mesteirais nos centros urbanos eram sustentadas pelas matérias-primas que o campo fornecia: as madeiras, fontes de energia encontradas nas terras dos concelhos e dos senhorios; as peles de animais; os couros. Por todo o país,

[...] e com maior desenvolvimento e especialização nas principais cidades, extraíam-se, curtiam-se, tingiam-se e confeccionavam-se couros de animais corpulentos e peles de bichos pequenos, com as mais diversas utilizações: vestuário, alfaias, mobiliário, equipamento, armamento, etc.63.

Era ainda nos principais centros urbanos que havia vários mesteirais ligados à diversas práticas económicas, e tinham um peso socioprofissional bastante destacado, sobretudo na produção artesanal.

A economia portuguesa desse período girou, basicamente, como já o dissemos, em torno da agricultura, mas havia a prática da pecuária em determinadas áreas, em particular onde o terreno não era propício a essa atividade.

No norte interior, por exemplo, a principal actividade desenvolvida era a criação de gado miúdo: o ovino, o suíno e o caprino. Criava-se ainda o gado bovino nos vales do Minho e da Beira setentrional. O cavalo, necessário tanto na guerra quanto como meio de transporte, apesar das dificuldades, era criado por todo o país. Ainda como derivados do trabalho de criação de gado e do pastoreio, havia a produção de lã e de couro, produtos que eram vendidos para os artesãos especializados.

Assim, ao constatarmos a importância das actividades económicas, sobretudo da produção agrícola, e a dependência da cidade em relação ao campo, fica mais evidente o valor das cartas forais que instituíram as feiras: ao instituí-las, o monarca acreditava que poderia dinamizar as relações económicas e sociais do reino. Entretanto, para ter a certeza disso, foi necessário aumentar o corpo de funcionários que possuía, para que, juntos, pudessem fiscalizar e exigir o respeito às regras impostas pelo monarca, juntamente com a Corte régia.

63 A. H. de Oliveira MARQUES e Joel SERRÃO - Portugal na Crise dos Séculos XIV e XV. Volume IV. Lisboa. 1987, p. 121.

Conforme acentuamos, o estabelecimento das feiras sazonais – parte dos mecanismos usados pelos monarcas para promover uma proximidade entre os homens da cidade e do campo -, possibilitou a dinamização da circulação da produção interna, chegando a atrair compradores estrangeiros, em especial os castelhanos. Os monarcas, particularmente, D. Afonso III e D. Dinis, usaram esse mecanismo para promover o povoamento e aumentar o comércio. Assim, a região transmontana recebeu autorização para organizar 17 feiras64. Encontramos Cartas de Foral de autorização para o funcionamento de algumas feiras outorgadas pelo monarca D. Dinis e destacamos algumas para que esse processo fique mais claro ao leitor. São elas: a Carta da Feira do Concelho de Moncorvo, a Carta do Concelho de Valença65, a Carta do Concelho de Borba66 e a Carta do Concelho de Olivença67.

O Concelho de Moncorvo, localizado no norte Interior, solicitou a D. Dinis que autorizasse a realização da feira mensal, por um período mais longo, uma vez que a feira só podia ocorrer uma vez ao mês e, dessa forma, os moradores não conseguiam vender toda a produção rapidamente. Não podiam também vender em outra feira próxima, pois já tinham sua própria feira. No documento infra, o monarca aborda essas questões, ressaltando que a situação que lhe foi apresentada pelos habitantes do Conselho, impõe-lhe, na condição de rei que tem o dever ético precípuo de zelar pelo bem de seus súditos, tomar uma medida para resolver aquele problema:

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Segundo Virginia RAU, há noticias de Feiras desde o ano 1125, ou seja, desde D. Teresa, todavia das primeiras feiras sabe-se pouco sobre a sua Organização. Temos com D. Afonso III o conhecimento da existencia de 15 feiras, sendo que duas – (Ferrarias-1258, Porto, 1258) não se conhece a organização. Sendo elas realizadas nas seguintes cidades: Guarda-1255; Guimarães- 1258;Covilhã-160; Beja-1261; Penamacor-1262; Elvas-1262; Vila Real-1272: Bragança-1272; Trancoso-1273; Montalegre-1273; Évora-1275; Monforte de Rio Livre-1273; Torres Novas-1273 e Anciães-1277. No reinado de D. Dinis funcionavam, com autorização régia, 42 feiras, sendo 11 que não se conhecia a organização e 31 constituidas no reinado deste monarca, a saber: Miranda do Douro-1290; Castelo Mendo-1281; Celorico-1287; Arronches-1289; Mesão Frio-1289; Cernancelhe- 1295; Alvio-1295; Moura-1302; Terena-1323; Gaia-1302; Santarém-1302; Vouzela-1307; Aguiar da Beira-1308; Monsanto-1308; Borba-1315; Olivença-1316; Marialva-1286; Murça-1304; Ourique.1288; Torres de Vedras-1293; Alfândega da fé-1295; Viana-1286; Caminha-1291; São João da Pesqueria- 1281; Valença do Minho-1282; Vila Flor-1294; Ranhados- 1299; Trevões-1304; Prado-1307; Freixo de Espada a Cinta -1307. Ferias que não se conheciam a organização: Moncorvo-1284-85; Leiria-1284- 85; Chaves-1289; Mogadouro-1295; Mirandela-1295; Sabugal-1296; Vila Boa de Montenegreo-1301; Monção-1305; Braga-1307; Ourém-1367; Pinhel-1386. In: Subsidios para o Estudo das Feiras Medievais Portuguesas. Lisboa: Bertrand, 1943, consultar principalmente pp. 37-111.

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Laura Oliva Correia LEMOS – Aspectos do reinado de D. Dinis segundo o estudo de alguns documentos da sua chancelaria. Livro III. F. 81v.-102v. Coimbra: Dissertação de licenciatura em História apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1973, pp. 122-123.

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Idem, pp. 200-201. 67

[...] Dom Denis pela graça de Deus rej de Portugal e de Algarve. A quantos esta carta virem faço saber que o concelho de Torre de Meen Corvo mj enuyou dizer que eles am feira em cada huum mees assu come conteudo em huma carta que dizem que de mjm teem e que por os seos vezinhos darredor am feyras assi come eles em cada huum mes que nom podem vender o seu pam e gaados e sas merchandias tam azinha. E pediram mj por merce que lijs perlongasse essa fejra em outro tempo que seia meu servico e preveito des da terra. E eu querendo fazer graça e mercee ao dito Concçelho. Tenho por bem e mando que eles aiam feira em cada huum ano e comecesse a fazer quinze dias ante Pascoa e dure ata quinze dias de pos Pascoa. E que todos aqueles que veerem a essa feira por vender ou per comprar seiam seguros de hyde e de vynda que non seiam penhorados em meos regnos por nenhuma devida em em aqueles oyto dias que veerem a essa feyra e em aquele mes que essa feyra durar e em aqueles oito dias que primeyro veerem de pois que sayr a dita feyra senom por devida que for feitaem essa feyra. [...]. E todos aqueles que veerem a essa feyra com sas merchandias paguem a mjm a mha portagem e todolos meos dereitos que fevem pagar dessa feira. Em testemoyo desto dej ao dito Concelho esta carta68.

Com efeito, além de ter concedido a autorização, o monarca preocupou-se em criar condições que favorecessem o desenvolvimento da feira: deu garantias de ir e vir a todos que fossem comprar ou vender mercadorias na feira e isentou de penhora aqueles que tivessem dívidas no Concelho. Não se esqueceu de frisar que todos que fossem vender deviam pagar a portagem devida à Coroa. Dessa forma, cremos que o Concelho pôde vender sua produção mais agilmente, e o rei teve a promessa de pagamento de seu foro.

Semelhantemente, em 1315, na vila de Santarém, D. Dinis acolheu o pedido dos habitantes do Concelho de Valença, que solicitou que sua feira ocorresse às primeiras quartas-feiras de cada mês. Nesta Carta, consta somente a autorização do funcionamento na data escolhida pelo Concelho. Não diz nada a respeito dos valores que deveriam ser pagos ou, ainda, sobre como deveria ser sua organização, diferentemente da Carta de autorização enviada ao Concelho de Moncorvo, que é muito mais detalhada. A Carta Foral dada ao Concelho de Borba contém, no entanto, dados significativos e, em decorrência disso, vamos reproduzir parte dela:

A quanto esta carta virem faço saber que eu querendo fazer graça e merçee ao conçelho de Borva que m´envyou diser que seeria meu serviço e prol dos da terra d´avaren feira. Tenho por bem e mando que eles ajam feira daqui en deante en cada huum ano por Sancta

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Maria da Assunção CARQUEJA - Subsídios para uma monografia de Vila da Torre de Moncorvo. Dissertação de Licenciatura em Ciências Históricas e Filosóficas apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1955, p. IX-X, documento nº 05.

Maria de Setembro, VIII dias ante da festa e VIII dias depoys da festa. E mando que todos aqueles que veerem a essa feira per razom de vender ou de conprar que sejam seguros d´ida e de viinda e que nem sejam penhorados nos meus reynos por nenhua divida que devam en aqueles tres dias que veerem a essa feira nem nos XV dias que durar nem aaqueles <tres dias> que se forem depois que sair essa feira. E ponho tal encouto que quem quer que mal fezer aaqueles que veerem aa dita feira que peite a mim sex mil soldos. E darem aquele que filhar en dobro a seu dono e mando a todos aqueles que veerem a essa feira com sãs merchandias que paguem os dereitos que ouverem de pagar da dita feira e que esse conçelho de Borva faça logo apregoar en como na a dita feira no dito tenpo, de guisa que seja sabudo e pobricada per toda a terra69.

Como se nota no documento supra, os aspectos relevantes a destacar são que, no discurso legislativo político-administrativo, os monarcas quase sempre ressaltavam que possuíam autoridade e legitimidade exclusivas para poderem fazer um bem, conceder uma graça, dado o poder régio que detinham e exerciam, o que, mais ninguém tinha competência para tal. Por outra parte, as medidas a serem tomadas pelo rei e seus oficiais decorriam dum pedido que os homens do Concelho lhe apresentaram, os quais, apesar de súditos, ganhavam papel ativo na consecussão do bem comum daquela comunidade sociopolítica, explicitado e confirmado pelo diploma legal.

Dessa forma, conforme vimos páginas atrás e no capítulo anterior, visto que a sociedade estava organizada de modo hierarquizado e essa ideia também é sempre reforçada em tais documentos, o rei, na condição de cabeça daquele corpo, é, indiscutivelmente, o mais responsável pela bom ordenamento e pelo bem comum dos súbditos, mas, estes, na condição de membros ativos e úteis desse mesmo corpo, igualmente, tinham a obrigação de sempre agir corretamente e em proveito dele.

A propósito, aliás, também se nota que, para o bom funcionamento da feira, o rei estabeleceu normas disciplinares que deviam ser divulgadas por todo o Concelho e, obviamente, acolhidas e respeitadas por todos, no tocante às garantias de segurança que produtores e comerciantes tinham de gozar, a fim de bem poderem desempenhar seu proveitoso mister àqueles que acorressem a ela e proibiu que devedores às pessoas do Concelho ou a este, não fossem penhoradas durante o

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Laura Oliva Correia LEMOS – Aspectos do reinado de D. Dinis segundo o estudo de alguns documentos da sua chancelaria. Livro III. F. 81v.-102v. Coimbra: Dissertação de licenciatura em História apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1973, p. 200.

período de funcionamento da feira. Em troca disso tudo, porém, os habitantes do Conselho deviam pagar-lhe os impostos devidos.

Outra Carta Foral de constituição da feira do Concelho de Olivença, dada em 1316, para além dos aspectos comuns, enfatiza-se a garantia régia, mediante aquele diploma legal, regulador e disciplinador do comportamento socio-económico, que, quem tivesse dívidas não seria penhorado tanto nos três primeiros dias de seu funcionamento, quanto no período de sua duração, e ainda três dias após seu término.

No reinado de D. Dinis, havia mais de 40 feiras a funcionar, o que não sucedeu tanto nos reinados posteriores. Isso decorreu do facto de esses monarcas enfrentarem outra conjuntura e outros problemas, particularmente crises agrícolas e, ainda, as inquietações causadas por causa da Peste Negra. Todavia, o comércio externo manteve-se, mesmo tendo sofrido uma retracção por causa dessa epidemia, sobretudo nas cidades localizadas no litoral, como Lisboa, Porto, Setúbal.

Nas relações comerciais internas, além das trocas nas feiras, as vendas das mercadorias ocorriam nas tendas, nas adegas, nas próprias oficinas dos artesãos, em quintais de algumas casas, nos mosteiros e também por meio dos ambulantes, que percorriam os vários espaços urbanos e rurais, levando suas mercadorias. Os ambulantes eram geralmente multados, pois não respeitavam as leis dos mercados. Contribuíam, para dinâmica da circulação da mercadoria dentro do reino, os almocreves. Estes, que eram especializados no transporte de mercadorias, podiam ser também mercadores, todavia especializaram-se, em transportar as mercadorias do mercador fixo que possuía uma tenda: Os almocreves existiam em todo o País e

deslocavam-se, sempre que possível, em grupo, a fim de minimizarem os perigos do trânsito70.

O mercado congregava várias tendas com designações específicas. O

açougue era um mercado diário. Esse tipo de mercado instalava-se em várias

tendas fixas. O responsável por ele era o almotacé, geralmente eleito pela própria comunidade. A fanga era uma derivação do açougue e vendia geralmente cereais, farinha, frutas71. Com esses espaços para comercializar os produtos destinados ao consumo interno, a população conseguia adquirir os bens de que necessitava.

70 A. H. de Oliveira MARQUES e Joel SERRÃO - Op. cit., p.148.

71 A. H. de Oliveira MARQUES - A circulação e a troca de produtos. In: Maria H. da Cruz COELHO e A. L. de Carvalho HOMEM, Op. cit., pp. 506 a 511.

Portugal estabeleceu o comércio exterior, de além-mar, com várias praças, economicamente importantes naquela época. Era costumeira a presença de mercadores estrangeiros nos portos portugueses, sobretudo em Lisboa e Porto. De Castela, importavam-se artigos têxteis, cereais, couros e metais. Da Itália, vinham tecidos de seda, armaduras e demais material bélico.

O comércio português com a região de Flandres visava à compra de tecidos, armas, munições e outros produtos. D. Dinis autorizou que um grupo de mercadores72 portugueses, que quase sempre mantiveram boas relações com o poder régio, criassem uma bolsa de comércio em Flandres, demonstrando como era importante e, de certa forma, intensa a relação económica entre o reino e aquele condado. Da Inglaterra importavam-se lãs, cereais, peixe e outras mercadorias. Com a França, estabeleceram-se trocas de géneros alimentícios (trigo e legumes), produtos têxteis, tecidos, peças de vestuários, toalhas. A Alemanha fornecia aos portugueses madeira, ferro, cobre, alguns produtos florestais, trigo e centeio. Do

mundo islâmico importavam-se peças de vestuário, alfaias domésticas e cereais também73. O comércio com o mundo islâmico foi decorrência da ocupação moura na

Península Ibérica.

No reinado de D. Fernando, avultavam, particularmente, os importadores de tecidos, que eram os mais ricos e mais respeitados entre todos. Distinguiam-se os mercadores dos panos de cor (importados do estrangeiro) dos mercadores de panos de linho, dos mercadores de seda, dos marceneiros e dos fanqueiros. Esses mercadores foram os que mais exerceram pressão para receber privilégios e isenções fiscais da parte do rei74. Nesse período, a exportação lusitana para toda a Europa resumia-se em alguns produtos: couro, peles, mel, cera, azeite, gorduras, frutas secas, vinho e outros.

Convém ressaltar que todas as actividades que eram desenvolvidas tinham seu imposto regulamentado. Como exemplo, citamos a Carta de Aforamento de Alter do Chão, em que o Monarca D. Dinis estabeleceu o foro que os moradores deviam

72 Segundo António Borges COELHO – Clérigos, Mercadores, Judeus e Fidalgos. Lisboa: Caminho, Colecção Universitária, 1984, p. 39. As ligações mercadores poder régio passavam por estruturas organizadas: feiras, mercados, alfândega, portagem, juizes próprios, leis gerais que proporcionaram o desenvolvimento mercantil. O poder régio garantia aos mercadores protecção e segurança; os mercadores com a carga e venda das suas mercadorias aumentavam as receitas do Estasdo e, portanto também o seu poder.

73

A. H. de Oliveira MARQUES - Ensaios da História Medieval Portuguesa. Lisboa: Editorial Veiga, 1980, pp. 40 e 41.

74

A.H. de Oliveira MARQUES – A Sociedade Medieval Portuguesa. Lisboa: Editora Sá da Costa, 1981, p.148.

pagar do pescado, da barca do pescado, dos couros dos cervos e das peles dos coelhos, bem assim da carga do azeite e dos couros de bois:

[...] dem de foro da vaca. J. dinheiro e do zeuro hüu dinheiro e do çerruo hüu dinheiro e de besta de pescado hüu dinheiro e de barca de pescado, J. dinheiro [...]. [...] da carrega do azeyte ou dos coyros dos boys ou dos zeuros ou dos ceruos dem meo morabitino. [...] o coelheyro que for a soieura e ala ficar de hüu fole de coelho e que ficar ala per oyto dias ou mays de hüu coelho com sa pele e os coelheyros de fora de dizima quantas vezes veer75.

Os camponeses eram obrigados a pagar impostos por tudo o que cultivavam, porque as terras onde trabalham ou pertenciam ao rei, ou à nobreza ou ao clero. De