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MERCADO INTERNACIONAL

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Volumes em milhares de toneladas

9. ESTUDO DE CASO: TROPICAL SPICE

9.6. Além da exportação: o aprendizado e outros avanços obtidos da ABE

As análises e estudos disponíveis sobre os consórcios bem como outras formas de arranjo cooperativo entre empresas destacam com elevada freqüência o fato de que de tal configuração surgem oportunidades de ampliação aos horizontes de atuação aos associados, seja pelo aprendizado técnico que ganham acesso, pelo incentivo à adoção de práticas gerenciais e administrativas mais elaboradas, pelo adensamento que propiciam maior poder no encaminhamento de demandas similares ou mesmo por negócios que se desenvolvem do aprofundamento das relações que mantém com seus pares.

Marshall (1982) ressalta a especialização da mão-de-obra que se beneficia dos conhecimentos que estão “no ar”. Porter (1999) reconhece as melhorias na produtividade que são obtidas do diálogo entre empresas correlatas, seus fornecedores, governo e outras instituições de destaque. Sengerberger e Pike (1999) argumentam que entrelaçamento de relações econômicas e sociais, sustentado por valores compartilhados como, por exemplo, a orientação para o desenvolvimento de longo prazo, leva a um entendimento mais amplo do interesse próprio e permite que as pessoas aprendam através da experiência que a troca social.

Essa expansão de horizontes oferece condições para o equilíbrio entre funcionalidade de explotação e exploração segundo a proposição de March (1991). Como propõem Koza e Lewin (1998), o dinamismo do ambiente recomenda a formação de alinhamentos cooperativos que combinem intenções de explotação e exploração: a explotação como um instrumento para o domínio do comércio exterior como disciplina ou de contornar as condições locais que impõem limites ao pleno uso da capacidade de produção (sazonalidade das vendas em função das estações climáticas, por exemplo), e exploração no sentido de aprimorar competências que permitam acompanhar par-e-passo a vanguarda dos movimentos internacionais da moda em todas as suas variantes (estilos e design, tecidos e materiais, processos e equipamentos, entre outras).

Nesse ponto, os associados da ABEV reportam avanços que também decorrem em boa medida do envolvimento que têm com as atividades do consórcio, como se pode perceber em várias declarações das empresas ALFA, BETA e GAMA:

“[...]esse ano eu fiz uma participação solo; eu era um pequeno stand na feira de Lyon, que é uma das feiras mais importantes do meu segmento. Alguns

anos atrás eu nem sabia que essa feira existia e menos ainda que era a mais importante do meu segmento”.

“[...] eu tive uma oportunidade que outros não tiveram: a maioria das viagens que foram feitas no meu setor fui eu que fiz. Uma oportunidade ímpar em que eu aprendi muito”.

“[...] eu fui às duas últimas [feiras]: Lyon e Madrid. Com essas duas feiras eu só me animei [...] eu ainda não usei os resultados [de vendas conseguidas nas feiras] para adaptar a minha coleção, mas vou usar. Eu já sei o que eu não tenho e que vende e na próxima coleção eu já vou por um modelo desse tipo.

[...] eu vou incorporar mais essa parte de exportação nas coisas que eu já faço do que o contrário, porque eu acho que isso vai dar um upgrade para mim no varejo aqui”.

Estas citações resumem dois tipos de aprendizado. O primeiro deles é a experiência que se obtêm da participação nos eventos comerciais em representação da ABEV, os quais anteriormente eram desconhecidos e inalcançáveis aos associados sem uma atuação coletiva. Um outro tipo refere-se à expertise que se desenvolve em relação aos mercados externos com o acúmulo e a transmissão de experiências entre os elementos do grupo. Esses tipos de observações foram identificados nas três empresas entrevistadas, o que permite avançar na idéia de que há o reconhecimento deste potencial entre os membros do consórcio e qualificar este tipo de arranjo como sendo propício para viabilizar intenções estratégicas não circunstanciais. De fato, mesmo que as intenções iniciais em direção ao consórcio possam indicar um viés explotador no sentido de otimizar suas capacidades produtivas ao longo do ano para anular os efeitos da sazonalidade climática local, elas também incorporam o desejo de aprender a exportar e conhecer tudo o que precisa para isso. Isso se revela, por exemplo, quando as empresas BETA e GAMA declaram:

“[...] eu acho que tudo o que você faz em grupo, você tem mais oportunidade de aprender . [...] É outra coisa que eu tinha chance de aprender, estar trabalhando com outro tipo de mercado. Tivemos que trazer para a nossa empresa uma outra metodologia de trabalho.

“[...] na verdade eu me dei dois anos para que a coisa desse certo. Eu vou entrar, assumir um custo mensal e [...] tem que ter uma diferença de um ano para outro, como eu já senti. Tanto da minha parte, que eu tenho que agir para que isso dê certo, como da parte deles [...] Como você perguntou, você vai fazer coisa diferente? Vou, é claro que vou”.

Mesmo para a empresa ALFA, que encara o consórcio como um canal adicional para a colocação de seus produtos no exterior, passa a seguinte percepção:

“[...] os associados sabem [...] fazer biquínis. Mas eles não entendem nada de comércio exterior. Não sabem o que é uma feira, não sabem como organizar, não sabem como chegar no cliente, não têm idéia do que é comércio exterior [...] você tem o feed-back da pessoa que viajou, do que foi pedido na feira, dos clientes que vêm pelo consórcio e pedem biquínis mais largos, mais finos, mais trabalhados, mais coloridos... Tudo aquilo você vai aprendendo na experiência do dia a dia; tanto eu aprendo aqui fazendo minha exportação sozinho, quanto lá dentro. Você vai trazendo conhecimento para a sua empresa”.

Mas, seguindo uma das proposições de estudo, é importante também analisar em que medida essa consciência se transpõe para iniciativas outras que não as diretamente ligadas aos aspectos de promoção e comercialização de produtos.

A legitimidade sugerida por Human e Provan (1997) encontra correspondência na percepção dos associados à ABEV, como explica a empresa ALFA:

“[...] eu já não sou mais aquele pequeno fabricante sem condições de atender o cliente lá fora. Somos vários pequenos fabricantes, 10, 20 pequenos

fabricantes que se tornam um fabricante grande

[...] o consórcio precisa se mostrar grande [...] Eu não vejo consórcio grande como consórcio ruim, mas dá a idéia de uma empresa grande. Você sente segurança e isso é muito importante numa exportação”.

Porém, sob o aspecto das vantagens “acessórias” do consorciamento, parece ser mais importante avaliar a questão do aprofundamento de relações entre parceiros/concorrentes, que podem adquirir uma conotação mais política de representação do grupo como se manter no âmbito da colaboração para assuntos mais operacionais. Quanto a isso, o entrevistado da empresa ALFA assim se manifesta:

“[...] todo mundo começa com um pé atrás. Depois, você começa a criar uma amizade, [...] começam a aparecer oportunidades de parceria mesmo no mercado interno. Se eu tenho um cliente que faz um pedido muito grande, eu sei que se eu juntar com dois ou três parceiros do consórcio, eu atendo esse cliente. Você começa a ver mais como parceiro e menos como concorrente. [...] só o fato de você conseguir juntar 20 empresários discutindo as próprias necessidades é um ponto super positivo. Você vai trocando experiências, dificuldades... ‘olha vamos reclamar junto com a ABIT que o pessoal não

está fazendo lycra mais fina para a gente exportar...’ isso é muito

importante”.

“[...] eu já apresentei fornecedores de tecido a outros consorciados. Outro dia apareceu um desfile na televisão e eu não tive capacidade de atender e eu liguei para um outro consorciado. Ele fez e gostou.

[...] é que eu não precisei ainda, mas se eu ligar para qualquer um deles e disser: estou precisando de alguém que faça silk -screen em lycra, você tem

alguém? Não vão me negar [...] Inclusive para uma outra consorciada que abriu uma loja, eu e outros consorciados demos de início uma mercadoria em consignação”.

É importante destacar que apenas a empresa BETA já conhecia alguns membros do consórcio antes de sua adesão ao grupo, mesmo assim superficialmente. Como se vê, as opiniões dos entrevistados podem ser consideradas positivas. As possibilidades decorrentes da interação são valorizadas pelos respondentes, embora declarem não terem conhecimento de ocorrências concretas de assuntos encaminhados coletivamente fora do escopo de atuação do consórcio. De qualquer forma, o que parece claro é que, neste momento, o âmbito de atuação do consórcio não comporta o encaminhamento de questões que envolvam assuntos de maior abrangência, como por exemplo, as questões com as oficinas de costura e de intensidade tecnológica da produção, que são mantidas no âmbito da administração individual de cada associado. Assim, como já identificado na seção anterior, a ABEV ainda não exemplifica um arranjo em consórcio que tenha evoluído nas suas possibilidades. O encaminhamento futuro da sua atuação é que poderá incorporar abraçar novos escopos. Mas nesse aspecto, hoje as empresas mantêm perspectivas diferentes restritas ao âmbito da promoção comercial externa, como se vê nas seguintes colocações das empresas ALFA e BETA:

“[...] a idéia é que o consórcio fique tão forte, que as empresas vendam tanto que [a] comissão vai eliminar o dinheiro do governo. [...] E outra idéia e que todo mundo depois possa fazer vôos solos, [...] eu já vou saber qual a documentação, como se trabalha, como se faz feira lá fora, como se atende um cliente, eu vou saber todo o suficiente para que eu possa ir com os meus próprios meios.

[...] eu acho que o consórcio pode se transformar facilmente em uma empresa comercial exportadora simplificada tendo os consorciados como sócios. [...] Nos vamos vender sem pagar o ICMS da mesma forma”.

“[...] a idéia é você continuar até ter uma estrutura, para dar chances a outro, [...] mas isso é uma coisa que demora, não é uma coisa muito fácil você ter essa estrutura e estar apto para ‘montar uma banda solo’. Falta muito? Eu acho que pelo menos uns 2 ou 3 anos. O maior impedimento ainda é o custo”.