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MERCADO INTERNACIONAL

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Volumes em milhares de toneladas

10. CONSIDERAÇÕES FINAIS

10.1. Considerações micro-institucionais

A análise do caso ABEV oferece subsídios importantes para o entendimento das questões implícitas ao comportamento cooperativo entre empresas no Brasil. Em primeiro lugar, a formatação contratual assume papel fundamental na consolidação do grupo como entidade. Essa formatação responde a praticamente a toda caracterização presente em estudos constantes da literatura sobre esta forma específica de alinhamento cooperativo entre empresas, e que em sua massiva maioria foram desenvolvidos em outros países, culturas e condições ambientais.

Nesse sentido, os instrumentos de formalização do arranjo cumprem – e bem – as funções disciplinares que normatizam as condutas segundo um conjunto de regras que são claras, pré- estabelecidas e, democráticas, desde a própria limitação de escopo do consórcio, até o conjunto de direitos, obrigações e penalidades que se orientam as condutas dos associados sempre e principalmente visando assistir os associados nas dificuldades que lhes são comuns e genéricas, promovendo o equilíbrio das partes e o bom funcionamento da ABEV como um todo.

Outro ponto importante na forma de organização do arranjo e de distribuição das responsabilidades diz respeito ao profissionalismo com que as atividades do consórcio são conduzidas. O staff alocado ao consórcio têm formação específica na área de comércio exterior, experiência consolidada na exportação e mantém posição eqüidistante a todos os membros, ou seja, não guardam nenhuma relação de interesse particular com o desempenho de um ou mais associados específicos. Por esses atributos todos, a ABEV se constitui em um foco de segurança e assume essa função, tanto para os clientes como igualmente para os associados.

Mas, mesmo sendo um consórcio bem sucedido, a ABEV esbarra em dificuldades decorrentes da natureza dos seus membros. Ela é uma organização enxuta, com recursos financeiros escassos, depende de subvenções da APEX e conta com apenas nove profissionais para tratarem dos assuntos de exportação – técnicos, administrativos e comerciais – de todos os associados. Em razão disso, evidencia-se que aquele consórcio ainda não desenvolveu todo o seu potencial, fato sobre o qual os entrevistados da ABEV mostram ter plena consciência. Sua estrutura não suporta a elaboração de instrumentos gerenciais mais sofisticados e é baixo o

uso de recursos tecnológicos nas suas atividades. Por exemplo, a sua página na Internet que está bastante desatualizada e permite a visualização apenas de uma parcela muito reduzida dos produtos com os quais o consórcio trabalha – apenas produtos da linha praia pode ser visualizada. Não existe prática sistemática de distribuição das informações de desempenho do consórcio que possam subsidiar as avaliações de cada membro sobre o desempenho conjunto e, a partir daí, formular idéias, sugestões e propostas estratégicas.

As limitações de recursos da ABEV trazem à tona uma outra dificuldade observada que corresponde à percepção de baixo comprometimento dos associados em relação às atividades e decisões do consórcio. Ainda que os 38% de inatividade identificados na ABEV só adquirem significação completa se comparados às médias de outros consórcios ou mesmo outros tipos de empreendimentos coletivos e cooperativos, parece lógico que uma participação maior só tem a melhorar o nível de serviço desenvolvido pela associação, seja na forma de contribuições com idéias e sugestões criativas para tratar os problemas do grupo, ou mesmo no grau de compreensão desses problemas que poderia justificar novas formas de obtenção de recursos. O que aqui se afirma é que essas decisões requerem a presença e o comprometimento do grupo completo, sem o que o grupo se vê prejudicado no conhecimento de suas reais potencialidades e limitações. Além disso, é importante que cada um possa observar mais proximamente a problemática geral e daí formar uma avaliação objetiva da relação custo-benefício que justificaria ou não um investimento mais significativo. Atualmente, consórcio com base no apoio de 62% dos seus membros tem que decidir sobre assuntos que vão afetar a totalidade deles. Em linhas gerais, o que aqui o estudo do caso ABEV parece mostrar é que a inatividade dos associados é prejudicial à gestão do grupo, na medida em que priva o consórcio do pleno uso dos seus recursos mais importantes, que são os próprios associados.

O percentual de inatividade identificado na ABEV também suscitou a necessidade de que o conceito de cooperação traçado a partir do levantamento bibliográfico incorporasse uma dimensão intangível à contribuição espontânea que se oferece para elevação de condições coletivas de competitividade. Na verdade, isso de certa forma já estava implícito na observação de que o comportamento cooperativo deve ser reconhecido como tal: quando “A” coopera com “B”, ambos precisam ter uma interpretação convergente sobre o valor dessa ação para a superação do problema que lhes é comum.

A cooperação surge intrinsecamente associada à participação. Para os associados, suas motivações originais de adesão ao consórcio também continham a disposição para participar intelectualmente da construção de um grupo de ação e discussão. No entanto, é importante também levar em conta que as opiniões aqui descritas representam uma parcela de associados que avaliam positivamente os resultados conseguidos pela associação. Olk e Young (1997) observaram que o vínculo ao consórcio é uma decisão que, dependendo dos resultados oferecidos pelo arranjo, envolve variáveis diferentes. Os resultados, por definição, são incertos e não necessariamente os mesmos para todos os associados. Se houvesse garantia de resultados, a adesão ao consórcio equivaleria a uma compra de serviços; se os resultados conseguidos fossem divididos eqüitativamente entre os membros, o consórcio seria uma sociedade. Além disso, os objetivos e expectativas em relação ao arranjo também podem ser divergentes, como se vê na ABEV em que para a empresa ALFA o consórcio é apenas um meio adicional de acesso ao mercado externo, enquanto que BETA e GAMA o têm como canal quase que exclusivo.

Assim, é importante que se saiba as avaliações particulares daqueles membros que, embora mantendo sua filiação ao consórcio, não participam ativamente das suas atividades. Mas, independentemente das razões para a ausência dos associados inativos, o caso ABEV expõe a importância de que a motivação para o trabalho cooperativo em grupo seja desenvolvida mesmo antes da adesão a um consórcio ou outro tipo de organização cooperativa qualquer. O desenvolvimento de uma cultura associativa participativa dentro do consórcio exige que o empresário ou seu representante seja presente no arranjo, o que é menos provável de acontecer quando ele não apresenta disposição anterior para isso. Portanto, o caso ABEV parece indicar que o consórcio é um instrumento orgânico mais efetivo para consolidar e aprimorar a prática da ação coletiva, do que seria para gerar um espírito associativista.

Por outro lado, a funcionalidade do consórcio é mais propícia ao desenvolvimento de uma cultura exportadora em razão de que é dependente de uma prática que, com algumas exceções, os associados não têm como empreender isoladamente. Sendo a cultura exportadora a composição entre sensibilidade estratégica e competência técnica que torna possível incorporar eficientemente os mercados internacionais às atividades regulares das empresas brasileiras, a associação em consórcio possibilita aos pequenos empresários a chance de terem vivências no trato direto com o conjunto de variáveis e conhecimentos intrínsecos à atividade exportadora. Ressalta-se, no entanto, que também neste ponto, sendo a cultura exportadora

passível de aprendizado, uma pré-disposição para assimilar e compartilhar informações e experiências entre os associados contribui para acentuar a efetividade do arranjo nessa disseminação de conhecimentos.