• Nenhum resultado encontrado

4 O SAÚDE DA FAMÍLIA NOS 12 MUNICÍPIOS PIONEIROS

4.1 Além Paraíba (MG)

4.1.1 O município como ele é: Além Paraíba (MG)

Abrigo de tropas e tropeiros, que descansavam em paragens antes de atravessarem o Rio Paraíba, surgia no final do século XVIII um povoado na Zona da Mata de Minas Gerais, região Sudeste do Brasil, conhecido primeiramente como freguesia de São José d’Além Paraíba. Com a chegada da estrada de ferro e da ponte, o arraial de São José recebeu grande impulso e o crescente desenvolvimento da localidade fez com que fosse elevada, em 1880, à categoria de vila, e três anos mais tarde, em 28 de setembro de 1883, à cidade, passando então à comarca, isto em virtude da Lei Provincial no 3.100. Pela lei da divisão administrativa do

Estado de Minas Gerais, em 1924, mudou-se o nome do município para Além Paraíba.

O atual município possui uma população de 35.588 habitantes (IBGE, Censos e Estimativas para 2006), distribuídos numa área de 511 km2, entre as zonas urbana e rural, situa-se às

margens do Rio Paraíba do Sul e ainda tem localização privilegiada, próxima aos municípios cariocas de Nova Friburgo, Teresópolis, Petrópolis e Rio de Janeiro, e Juiz de Fora, em Minas, distante apenas 336 km da capital do Estado.

Considerada como uma cidade de pequeno porte, com 1% de taxa de crescimento populacional, Além Paraíba possui uma economia com base na agricultura, extração vegetal e mineral e com uma população cuja taxa de alfabetização é de 88% e 12% não alfabetizados, entre os seus 12.244 jovens até 19 anos, 18.937 adultos, dos 20 aos 60 anos e 4.407 idosos, acima dos 60 anos. O índice de urbanização do município é de 92,3%, e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH59) é de 0,77 segundo dados do PNUD/2000.

Em se tratando de saneamento básico, a rede de esgoto da cidade atende a 60% da população. Outros 35% lançam seus dejetos diretamente nas águas do rio Paraíba do Sul e os restantes 5% servem-se de fossas sépticas. A coleta de lixo do município atinge os 86,9% e quanto ao abastecimento de água, o sistema é operado e mantido pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais - COPASA, através de um sistema operacional local subordinado ao Distrito Operacional de Ubá que, por sua vez é ligado à Superintendência do Sudeste.

4.1.2 A saúde no município: preliminares históricas - Além Paraíba (MG)

59 O Índice de Desenvolvimento Humano foi proposto pelo Programa das Nações Unidas (PNUD) para medir o

nível de desenvolvimento humano dos países a partir de indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). O índice varia de 0 (nenhum desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano total). Países com IDH até 0,499 têm desenvolvimento humano considerado baixo; os países com índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de médio desenvolvimento humano; países com IDH maior que 0,800 têm desenvolvimento humano considerado alto.

No quesito saúde, dados do SIA/SUS apontam que o município de Além Paraíba obteve em 2004 uma despesa total de R$ 5.068.789,29 com a saúde de sua população, que contava em dezembro de 2006 em sua rede assistencial com o total de 43 estabelecimentos, sendo sete Postos de Saúde, sete Centros de Saúde, um Hospital Geral, seis Ambulatórios Especializados, um Pronto-socorro Geral, nove Unidades de Apoio Diagnose e Terapia, uma Unidade de Vigilância em Saúde e 11 Consultórios Isolados.

Na rede hospitalar, a comunidade contava, até dezembro de 2006, com 117 leitos, em sua maioria destinados à clínica médica, com 50 leitos e 25 para a pediatria, 13 para a clínica obstétrica e 23 para a cirúrgica, ficando cinco para a UTI e um para a psiquiatria. De acordo com o SIA/SUS, entre os 243.470 procedimentos de Atenção Básica aprovados em 2005, 106.261 foram destinados às Ações Básicas em Odontologia, 74.229 foram Ações Enfermagem/Outros de Saúde Nível Médio, 51.337 Ações Médicas Básicas, 10.845 Ações executadas por outros profissionais de nível superior e 798 Procedimentos Básicos em Vigilância Sanitária. No mesmo ano, eram atendidas pelo PSF apenas 13.949 pessoas, representando 39,11% de cobertura da população do município. Em agosto de 2006, foram realizadas 5.455 consultas especializadas e 18.881 consultas do Programa Saúde da Família. 4.1.3 O PSF no município: Além Paraíba (MG)

O PSF foi implantado como uma ação focal, induzida pela Secretaria Estadual de Saúde e pelo Ministério da Saúde, com a finalidade de prevenir doenças, promover a saúde e trabalhar com educação em saúde. A implantação de suas primeiras equipes se deu na periferia, em 1994, com forma de aproximar os serviços das comunidades.

Esta aproximação cria vínculo de co-responsabilidade na organização dos serviços de saúde, conforme é verificado nos discursos durante a entrevista coletiva naquele município:

[...] a gente se torna íntimo das famílias, como se fosse um pedacinho delas,

e isso faz com que a gente seja uma pessoa importante para as famílias deles. Por exemplo, a gente desenvolve vários programas, desde o pré-natal até a puericultura, essas coisas todas [...], nós trabalhamos em uma

proximidade tão grande que as pessoas nos tratam como se fôssemos da família, então a gente consegue conversar tantas coisas com cada um deles, a gente ensina, mas, também aprende muito com eles.

Com afirmações desse tipo os 24 Agentes Comunitários de Saúde inseridos nas quatro equipes que hoje atuam nas quatro Unidades Básicas de Saúde da Família-UBSF, localizadas

na zona urbana e rural e que cuidam de 39,11% da população daqueles territórios, acham que suas ações vêm contribuindo para mudanças significativas na organização da atenção básica, e por conseqüência da consolidação do SUS.

Estas afirmações são expressas em vários trechos do conjunto das falas dos sujeitos que fazem o PSF no cotidiano:

[...] quando um de nós entra na casa ele se torna responsável por todos ali

dentro, não é como acontece na unidade de saúde tradicional que o médico vai lá atende, vai embora e acabou, nós não, somos responsáveis por tudo, desde o planejamento familiar, a gestação, o acompanhamento do parto, segue as primeiras vacinas das crianças, passa pelos cuidados aos idosos e até na hora da morte, a gente acompanha e sofre com a pedra [...] o PSF é

isso. Ele veio para mudar, e estamos contribuindo com isso tudo. [...]

acredito que o PSF veio para dar valor ao SUS, até mesmo para botar em prática os princípios do SUS, da gratuidade, da integralidade...então, o PSF, veio para reorganizar e quem tá dentro tem que dar conta disso senão vai ficar estacionado e não vai conseguir levar para frente o PSF nem o SUS. O modelo ainda está muito misturado, ainda não foi nem para lá nem pra cá. Mas a gente começa a ver que o modelo tradicional vem aceitando cada vez mais o nosso trabalho. A referência é o exemplo disso, os profissionais que ficam nos hospitais e em outras unidades têm muito preconceito e resistência ao nosso trabalho, isso já vem diminuindo já há uma conscientização maior a esse respeito, por causa das mudanças que estamos fazendo na atenção básica e por causa da divulgação maior do nosso trabalho.

Os profissionais entrevistados coletivamente desconhecem a influência de experiências nacionais e ou internacionais, em termos filosóficos e metodológicos, da implantação do PSF naquela cidade. Todavia, afirmam que os gestores (anteriores e atual) implantaram o PSF motivados pela necessidade de ampliar o acesso aos serviços básicos de saúde para as populações mais carentes e pela indução dos recursos financeiros previstos nos incentivos dos governos estadual e federal. Informam ainda que os critérios e prioridades adotados para definição das áreas de implantação do PSF foram áreas da periferia da cidade onde se concentra a maior população de baixa renda, população esta que tinha mais dificuldade de acesso a outras unidades de saúde centrais.

No tocante às ações de saúde, que passaram a ser ofertadas a partir da implantação do PSF, pode-se dizer que as mais destacadas foram as seguintes: planejamento familiar, grupos de

climatério, pré-natal, imunização, acompanhamento e crescimento da criança, controle de hipertensão, controle de diabetes e puericultura.

Na opinião dos médicos presentes durante a entrevista, as ações de puericultura, com a chegada do PSF, se fortaleceram, porque antes somente o pediatra poderia cuidar da saúde da criança. O exame das falas a seguir pode clarificar essa assertiva:

[...] hoje somos nós, médicos, enfermeiros, auxiliares e ACS, todos

aprendendo a ser generalistas que cuidamos da saúde das crianças, das mulheres, dos homens, seja jovem, idosos, todas as famílias que moram na nossa área de vinculação com nossa unidade de saúde [...] eles vêm a nós só

quando estão doentes, vêm muitas vezes para verificar a pressão, vêm para conversar, a gente explica se a pressão tá alta, porque ela tá alta, dá orientação[...] se alguém machucou a mão ou o pé a gente não faz apenas o

curativo, procura-se saber o motivo do corte, como ocorreu, se foi numa vala, conversamos tudo, porque entendemos que aquela vala mesmo longe da unidade de saúde pode estar no quintal da casa deles e causar alguns danos à saúde.

Entre as tentativas de mudanças na organização da atenção básica, quando perguntados dentre as ações ofertadas pelas unidades de saúde da família, quais são as mais utilizadas, eles se entreolham, e baixam a cabeça como estivesse diante dos seus maiores desafios, e respondem quase que em coro: “as consultas médicas, sim, as consultas médicas são ainda as mais procuradas e o maior número de serviços utilizados”. Seguem as consultas de orientação com os enfermeiros, sobre a diabete, hipertensão, aleitamento materno, pré-natal, vacinação e planejamento familiar.

As falas que emitem esses juízos sobre as ações mais utilizadas também afirmam desta vez as mudanças que consideram mais importantes na organização e na prestação da assistência (atenção à saúde) após a implantação do PSF. Estas mudanças são visíveis no conhecimento das famílias, por meio do trabalho dos ACS; estes são os olhos, braços e pernas das unidades básicas de saúde.

No que se refere às mudanças que o PSF trouxe para situação de saúde da população, os profissionais presentes na entrevista coletiva respondem:

[...] a procura por especialidade diminuiu...a internação hospitalar

também...o aumento pela procura ao pré-natal... estou com uma gestante, que é o primeiro pré-natal dela, ela nunca fez e de tanto o ACS ir na casa dela e falar que é importante, ela veio para a unidade de saúde e tava morrendo de medo porque ia ter que fazer ultra-som, e nunca tinha feito

ultra-som na vida dela...e busca do atendimento pelos idosos aumentou, eles

muitas vezes vêm para conversar e pedem ‘dá só uma olhadinha aqui na minha pressão’ e a gente diz: `o senhor verificou sua pressão ontem, vimos que está controlada, sinto que eles procuram atenção, acho que procura muito isso, a atenção[...].

Nos discursos dos profissionais mencionados anteriormente, também merece destaque a referência sobre se o PSF ampliou o acesso aos serviços de saúde. Esta questão é demasiadamente citada, quando informam que embora reconheçam que as famílias e comunidades da zona rural e da periferia da cidade hoje disponham dos serviços das equipes do PSF mais humanizados, acham limitado o acesso, ainda na atenção básica, porque consideram a cobertura populacional relativamente baixa, e fazem votos para que o município adote a política de universalização do PSF. E na visão de todos os respondentes, o PSF por si só não supera as desigualdades no acesso aos serviços de saúde, muito embora vejam nele um grande potencial para o enfrentamento das iniqüidades existentes na atenção básica à saúde.