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Parte II – Fundamentação epistemológica – Informação, Comunicação e Tecnologia

Capítulo 2 – Informação

2.3. Competências para um mundo multimodal

2.3.2. Alfabetização em mídia e informação

Ainda no campo das multialfabetizações, no documento Media and information

literacy curriculum for teachers (WILSON et al, 2011) – produzido sob coordenação da Unesco – especialistas reunidos pelo organismo da ONU para debater e apresentar propostas envolvendo o tema29 afirmam que há no mundo uma proliferação de meios de comunicação e de outros provedores de informação, guiados pelos avanços da tecnologia nas telecomunicações, que oferecem grande quantidade de informação e conhecimento para

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No livro Aprendizagem ubíqua, Bill Cope e Mary Kalantzis (2009) observam que o conhecimento, no desenvolvimento

atual das tecnologias, se dissemina de forma multimodal: oral, escrito, visual, sonoro.<http://www.slideshare.net/Toni_Rod/ cope-kalantzisaprendizaje-ubicuo>.

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O trabalho que resultou neste documento foi organizado por grupo internacional de especialistas para assessorar a Unesco. Iniciado em 2008, teve o seguinte desenvolvimento: mapeamento mundial dos recursos de capacitação em MIL; nomeação de quatro pessoas para executar o projeto; reunião com segundo grupo de especialistas, para revisar o trabalho; conjunto de testes de campo com oficinas de capacitação e consultoria. Participaram especialistas da África do Sul, América Latina e Caribe e sul da Ásia; foi elaborado o segundo projeto e houve uma rodada final, para a edição de conteúdo e linguagem. <http://unesdoc.unesco.org/images/0021/002160/216099S.pdf>.

acesso e compartilhamento dos cidadãos. Neste quadro, defendem, há necessidade de avaliar a relevância e a confiabilidade dessa informação, e de garantir que cidadãos não tenham obstáculos para o uso dos direitos à liberdade de expressão e à informação. Neste contexto, os especialistas da Unesco consideram necessário haver o que denominam Alfabetização em Media e Informação (AMI, em português e espanhol, mas em geral denominado MIL, de

Media and Information Literacy, em inglês) para expandir o movimento da educação para a cidadania. A proposta deste modelo de multialfabetização é mesclar as alfabetizações em informação e em media, e desta forma prover aos cidadãos as competências de que necessitam para buscar e gozar de todos os benefícios do artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

Assim como as relações na rede refletem as desigualdades sociais, o direito à liberdade de opinião e à de expressão também são exercidos de modo desigual. Para Martins e Dutra (2014), o direito de ser informado, nos dias atuais, se sobrepõe ao direito de informar, reflexo da hegemonia do pólo emissor sobre o receptor, especialmente por conta da comunicação de massa no século XX. O desenvolvimento das tecnologias de comunicação – a internet de alta velocidade, o advento das mídias sociais, por exemplo – têm promovido uma transformação deste quadro da comunicação de massa para a relação de comunicação de muitos para muitos (até o máximo de todos/todos).

…os novos cenários de interatividade funcionam como fatores gerativos não somente do direito de informar, como também da sua consequência civil mais eloquente: o exercício de uma cidadania ativa e discursiva. (MARTINS; DUTRA, 2014).

Esta proposta de arranjo entre as duas alfabetizações vem se construindo a partir dos encontros e debates promovidos pela Unesco e pela Ifla. Um desses resultados de parceria é a

Declaração de Grünwald30 (1982), um dos primeiros documentos a tratar da questão da alfabetização para o uso dos meios de comunicação. Esta declaração reconheceu a necessidade de sistemas políticos e educativos promoverem o entendimento crítico dos cidadãos sobre o fenômeno da comunicação e a participação desses cidadãos nos meios novos e velhos. A alfabetização em informação e aprendizagem ao longo da vida é a contribuição do Manifesto de Alexandria31 (2005), a partir do colóquio elaborado pela IFLA e que apontou a necessidade de os governos (em todos os níveis), organizações não-governamentais e organismos institucionais apoiarem o acesso irrestrito à informação e à liberdade de expressão. A união de informação e media em um modelo combinado de alfabetização se consolida em Moscou32 (2012) e põe a MIL no centro da aprendizagem ao longo da vida. Neste documento elaborado pelos especialistas para a Unesco, MIL é definida como a forma de dar poder às pessoas, em todos os âmbitos da vida, para buscar, avaliar, utilizar e criar a informação de forma eficaz, para alcançar metas pessoais, sociais, ocupacionais e educativas. É direito básico em um mundo digital. Promove a inclusão social.

Pelo documento da Unesco (2002), os meios de comunicação somados aos provedores de informação são ferramentas essenciais para ajudar o cidadão a tomar decisões conscientes; também são canais pelos quais as sociedades aprendem sobre si mesmas, mantêm discursos públicos e constroem o sentido de comunidade; têm importante impacto na aprendizagem ao longo da vida. Neste sentido, justifica-se a MIL porque os cidadãos necessitam ter o conhecimento básico das funções desses meios e provedores para ter a capacidade de avaliá- los e à informação que oferecem. Também pesa na decisão do indivíduo o nível de conhecimento que ele possui sobre o funcionamento e contexto em que se produz/armazena a informação em determinado meio/provedor.

O modelo e desenho pedagógico do currículo da Unesco (WILSON et al, 2011), com o qual se alinhou a Conferência de Moscou (2012), aborda três áreas temáticas interrelacionadas: de conhecimento e entendimento dos meios e provedores para os discursos democráticos e participação social; de avaliação dos textos midiáticos e de informação; e de produção e uso dos meios e da informação. Estas áreas são desenvolvidas a partir dos seguintes pontos: função dos meios e provedores – como operam e quais as condições ideais 30 <http://www.unesco.org/education/pdf/MEDIA_E.PDF>. 31 <http://www.ifla.org/publications/alexandria-manifesto-on-libraries-the-information-society-in-action>. 32

Conferência organizada em 2012 pelo Ministério da Cultura da Federação Russa, a Agência Federal de Imprensa e Comunicação de Massa, a Comissão da Federação Russa para a Unesco, Unesco e IFLA informação em:

para o desempenho dessas funções; avaliação crítica da informação apresentada – no contexto específico e amplo de sua produção; conceito de independência editorial e jornalismo como disciplina de verificação; como meios e provedores podem contribuir para promover liberdades fundamentais e aprendizagem ao longo da vida; ética nos meios e provedores; as capacidades, os direitos e as responsabilidades dos indivíduos em relação aos meios e aos provedores; Declaração Universal dos Direitos Humanos; pluralismo e diversidade como norma dos meios e provedores; fontes de informação e sistemas de organização e armazenamento; processos de acesso, pesquisa e determinação de necessidades da informação; como entender, organizar e avaliar a informação, com veracidade das fontes; criação e apresentação da informação em formatos variados; preservação, armazenamento, reutilização, arquivamento e apresentação da informação em formatos utilizáveis; ferramentas de localização e recuperação da informação; informação para resolver problemas e decidir nos campos pessoal, econômico, social e político.

Em geral, a abordagem do tema da comunicação refere-se à mídia – jornais, emissoras de rádio, televisão e assemelhados – e mais recentemente inclui os provedores – como as bibliotecas, os arquivos e a própria internet. Como observa Wolton (2010), há três razões para comunicar, para a relação com o outro: compartilhar, seduzir, convencer. Esta dimensão da relação com o outro é transversal na alfabetização. Alfabetizar para a cidadania significa oferecer formação permanente em comunicação para a relação com o outro, para além da formação, necessária, claro, para lidar com mídia e provedores.