3.4. REPARTIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS ENTRE OS ENTES
4.1.1. ALGUMAS FALHAS ADMINISTRATIVAS ENCONTRADAS
Infindáveissão as fissuras havidas no sistema de tutela do ambiente no Brasil. Além da negativa da realidade que assola o ambiente, com incipiente conhecimento sobre a extensão e abrangência dos problemas ambientais, a exiguidade financeira e técnica de pessoal, coligados à escassez de interesse e empenho de indústrias, empresas e a população em zelar e gerir seus detritos, também os Estudos de Impactos Ambientais reclamam maior qualidade e integridade em sua elaboração.
321 VESCOVI DE ARAGÃO, Cecília. Burocracia, Eficiência e Modelos de Gestão Pública: um Ensaio. Revista do Serviço Público. Nº. 48. Dez 1997. Pp 104/132.
322 Vide WEBER, Max. Economía y Sociedad: Esbozo de Sociología Comprensiva. México DF: Fondo de Cultura Económica, 1964. O autor alerta para o risco de a burocracia estatal avançar em suas funções rumo à formulação de políticas, eis que dispõe do conhecimento técnico necessário para tanto. Contudo, carece ela de legitimidade para tomar decisões.
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A Resolução CONAMA nº. 001/86 define impacto ambiental como sendo qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população, bem como as atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a qualidade dos recursos ambientais323.
Desta maneira, deveriam tais avaliações fiel e incansavelmente atender aos anseios ambientais de proteção, com vistas à ampliação do alcance da vigilância e controle ambiental, consubstanciada no acompanhamento subsequente à autorização administrativa exarada e na averiguação de seu adimplemento. No entanto, tal supervisão “não tem utilizado todas as forças sociais. O comportamento estatal de prescrever regras e de ameaçar com sanções têm deixado de lado a avaliação metódica e constante dos resultados324”.
Outrossim, a concentração em Brasília das ferramentas de monitoramento do desmatamento por corte raso325 na Amazônia e queimadas, muitas vezes deixadas a cargo
de servidores públicos com insuficiente preparo e desatenção escorada na estabilidade garantida a cargos públicos326, vulneram a custódia ambiental, comprometem a veracidade dos dados obtidos e dão margem a confusão, transtornos administrativos e toda sorte de corrupção da atividade governamental327. E os danos vão além, fomentando e revigorando a indústria de multas ambientais e consequentes embargos, que são misteriosamente retirados de empreendimentos após algum tipo de acordo obscuro.
323 Resolução CONAMA Nº 001/1986 - "Dispõe sobre critérios básicos e diretrizes gerais para a avaliação de impacto ambiental." - Data da legislação: 23/01/1986 - Publicação DOU, de 17/02/1986. Pp. 2548/9 - Alterada pelas Resoluções nº 11, de 1986, nº 05, de 1987, e nº 237, de 1997.
324 LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 17ª. Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2009. P.1078.
325 É denominado corte raso a eliminação de toda e qualquer vegetação existente sobre uma área, para o plantio de outra cultura agrícola ou florestal, pelo que também é chamado de conversão, eis que a área que originariamente abarcava florestas foi convertida para o plantio ou reflorestamento.
326 Constituição Federal. Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público. O tema divide a população brasileira, acometida pela ineficiência dos serviços públicos e que motivaram iniciativas como o Projeto de Lei do Senado nº. 116, de 2017, de autoria da Senadora Maria do Carmo Alves (DEM/SE), que propõe a perda do cargo público por insuficiência de desempenho do servidor público estável.
327 No Brasil, é bastante utilizada a expressão “criar dificuldades para vender facilidades” e isso reflete em muito a realidade administrativa do país.
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Exemplo notório disto é a quantidade absurda dos chamados “falsos PRODES”, que é o Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, uma iniciativa internacionalmente reconhecida e que em 2009 elevou o Brasil à categoria de liderança no tema da redução de desmatamentos na Conferência das Nações Unidas para Mudança Climática em Copenhague e que motivou o Reino da Noruega a doar ao país até um bilhão de dólares para a redução das taxas de desmatamento328.
Ora, é mesmo ultrajante que um sistema em tal grau respeitado pela comunidade internacional seja tão mal gerido no Brasil, graças sobretudo à desatenção e descuido de seus operadores, incumbidos de realizar a mera transcrição ao papel das informações pelos satélites fornecidas. Os erros que produzem os falsos PRODES deveriam ser alvo de severas punições por parte da Administração Pública e mesmo do Poder Judiciário, pois, para além de turvar os resultados de tão importante trabalho e dificultar ainda mais a salvaguarda de tão valioso e universal bem, ocasionam complicações de todo tipo aos produtores rurais, desde proibições na comercialização de seus produtos, bloqueios nas matrículas dos imóveis, multas milionárias e embargos às atividades de sua subsistência e produção de alimentos para abastecimento do país.
Ademais, na realidade brasileira de insegurança jurídica e descarada afronta aos direitos fundamentais, dentre eles o direito à propriedade privada, inúmeras são as empresas de pequeno, médio e grande porte e propriedades urbanas e rurais invadidas e destruídas por grupos terroristas travestidos de movimentos sociais, que se aproveitam da controvérsia para espalhar o pânico na sociedade brasileira, na maioria das vezes se valendo da queimada de pastagens, florestas, maquinário e mesmo assassinatos de trabalhadores.
Desta maneira, a proteção ao ambiente resta absolutamente à mercê de todas estas variantes mencionadas, pelo que é mesmo difícil crer na sua eficácia e tentar auxiliar seu sucesso chega a parecer quase uma utopia. Contudo, afortunadamente os avanços na temática ambiental são inegáveis e devem mesmo ser perseguidos a todo custo, motivo
328 BRASIL. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Coordenadoria Geral de Observação da Terra.
Programa Amazônia – Projeto PRODES. Metodologia para o Cálculo da Taxa Anual de Desmatamento na Amazônia Legal. Documento produzido por Gilberto Camara, Dalton Valeriano e João Vianei em
setembro de 2006. Revisado por Marisa da Motta em abril de 2010 e por Luis Maurano em outubro de 2013. São José dos Campos, 2013.
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por que o modelo de descentralização das políticas públicas, das iniciativas de educação da sociedade quanto ao uso racional e sustentável dos recursos naturais e de fiscalização das atividades potencialmente poluidoras é apoiado neste trabalho.
Além do mais, o Licenciamento Ambiental Rural, previsto pela Constituição Federal329ao legislar sobre proteção ambiental e controle da poluição, cuja competência
é concorrente entre a União, estados e municípios, em geral resta desarranjado por carência de interesse de servidores públicos encarregados e, perpetuamente, pelo excesso de corrupção.
Também a irregularidade urbana, manifesta nos loteamentos clandestinos e irregulares e pelos assentamentos informais, “que não respeitam leis nem limites físicos, territoriais nem ecológicos, às custas de péssimas condições de vida para a população, traz em seu bojo verdadeiro passivo ambiental que precisa ser enfrentado com políticas de prevenção e regularização, observando a tutela ambiental impregnada no texto constitucional”330.