• Nenhum resultado encontrado

Alianças e deslocamentos entre filosofia e ciências da vida.

A noção de indivíduo na modernidade é paradigmática no estabelecimento dos limites que definem o humano e os não humanos. O antropocentrismo se prolonga nas ciências da natureza concedendo ao humano seu lugar de privilégio ontológico. A base deste privilégio é articulada a partir de um modelo totalizador de explicação sobre a vida. O mecanicismo operado pela metafísica a partir do século XVII compôs uma articulação profunda o suficiente para marcar todos os referenciais da metafísica às ciências que se desenvolveram a partir deste modelo. Mesmo a diversidade de modelos teóricos em metafísica, nas ciências da natureza e mais tarde na psicologia, no fundo está comprometida com os mesmos parâmetros antropocêntricos e mecanicistas. Basicamente, as teorias mecanicistas sustentariam três postulados por onde se organizaram os conhecimentos disciplinares sobre o individuo: 1. Cada sistema material que compreende um ser vivo, se compõe de partículas distintas como os átomos, organizadas num sistema fechado; 2. Tais componentes são submetidos a causas elementares que nunca se alteram, ou seja, a forças elementares imutáveis; 3. Um processo material é uma sequência de estados que operam segundo configurações da matéria perfeitamente previsíveis, já que tais elementos obedecem tão somente a forças elementares invariáveis. Estes postulados supõem que o indivíduo considerado como um ser da natureza pode ser resolúvel logicamente ou analiticamente por meio de conceitos abstratos. Como consequência disso, se estabelece a compreensão do indivíduo a partir da estabilidade postulada nas leis da física. O positivismo evolucionista e o caso de Gobineau, por exemplo,

ilustram a “eficiência” do modelo mecanicista, prestando grandes honras a uma ciência que não apenas sub-representa o que não é humano, mas sub-representa também outros humanos.

No contexto contemporâneo, o estabelecimento das novas ciências da vida e a substituição das ciências da natureza foi fundamental para a construção de outras perspectivas sobre o humano, os não humanos, a natureza e toda a cadeia de relações que se estabelece entre tais categorias. Os seres vivos sobrevivem e perpetuam a vida graças a um fluxo incessante de matéria e de energia em movimento no tempo. Neste sentido, a revolução da mecânica quântica e da biologia genética levou adiante o que animava os debates desde e virada do século XIX, com Weismann248 e Hugo de Vries249, no campo da biologia e das teorias da evolução. Em outros termos, a noção de temporalidade implicada no processo de manutenção da vida teve que se aproximar de uma noção de tempo que ultrapassasse o tempo espacializado e o paradigma newtoniano que sustentava a ciência moderna. A convergência entre tempo e organização do vivo é um dos parâmetros mais caros às teorias da evolução. Não apenas porque a observação empírica mostra a regularidade de mudanças entre gerações, mas porque o tempo é o recurso filosófico que permite à biologia pensar a vida como um fluxo contínuo. A biologia pode ser considerada a ciência que inaugura uma ideia de humano deslocado do privilégio ontológico incutido na modernidade. A morfologia, a embriologia e, mais recentemente, a genética deflagram a multiplicação das abordagens sobre a natureza nas suas mais variadas formas. Neste sentido, a psicobiologia apresentada na obra de Ruyer aparece como uma vertente das ciências da vida que propiciou uma virada importante para a instauração de uma concepção deslocada do antropocentrismo 248A teoria do plasma germinativo de Weismann contribuiu para os estudos sobre hereditariedade que aparece em A Evolução Criadora como um aporte teórico para sustentar a continuidade da vida. Cf. BERGSON, EC, p. 24.

249 De Vries teria cunhado a noção de mutação para resolver o que as observações sobre a mudança de características que as gerações passam ao longo do processo de evolução.

dominante nos discursos científicos e filosóficos sobre a natureza. Em suma, a variedade dos discursos sobre os processos vitais proporcionou também uma interferência na abordagem dos discursos não científicos.

O vitalismo ganha o relevo necessário para a filosofia esquadrinhar sua relação com o humano e com a ordem vital. Para isso, é necessário reaver a noção de indivíduo na era das revoluções científicas contemporâneas e na reordenação política e social. Redefinição tal modulada pela consolidação da antropologia, genética e psicanálise. A multiplicação de discursos a respeito dos problemas vitais sugere à epistemologia a necessidade de qualificar o debate entre ciência, filosofia e ideologia. Necessário, pois a revisão da história das ciências deve fazê-la coincidir com os problemas concretos que atiçam nas ciências da vida a insistência na solução de questões propriamente modernas sobre o humano e a natureza. Por isso, no século XX as ciências da vida retomam a maior parte dos problemas colocados no século XIX, cujas soluções foram encontradas ou organizadas em função de dois propósitos fundamentais: a mudança na escala do objeto de estudo e as novas maneiras de interpretá-lo. Esta interpretação da revolução da biologia e da genética contemporânea descrita por Canguilhem revela o audacioso projeto de revisão o estabelecimento de normas científicas, moldadas pela correlatividade com as normas sociais compreendidas pelo domínios da técnica, economia e juridicos; juntos estes domínios formulam a organização virtual250. “De Darwin aos nossos dias, e, mais precisamente, de 1900 até hoje, as ciências da vida apreenderam que a maioria dos problemas que elas se puseram no século XIX só poderiam encontrar solução por uma mudança da escala do objeto de estudo e por uma nova maneira de interrogar”251

250 Cf. CANGUILHEM, G. Le normal et le patologique. PUF, Paris, 1966, p. 239. Sobre os desdobramentos das teses de Conguilhem quanto as implicações da norma em face da noção de vida e biopolítica, ver. SAFATLE, V. Uma certa latitude: Georges Canguilhem,

biopolítica e vida como errância in scientiæ sudia, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 335-67,

2015

A mudança de escala do objeto se realiza pelo acúmulo científico sobre o estudo dos organismos, formas de desenvolvimento e relações que eles têm com o meio ou com a comunidade. O reconhecimento de fenômenos numa escala maior implica em identificar especificidades antes não registradas. Concomitantemente ao trabalho de identificação, a mudança de escala também colabora para que as soluções sejam mais facilmente encontradas devido a ocorrências similares em indivíduos distintos. A singularização e a particularidade do fenômeno coincidem para fazer valer a solução que beneficia a maior parte dos indivíduos semelhantes. Por isso, a interpretação do fenômeno também é fundamental para entender o que envolve as soluções dos problemas vitais que atravessam as mais variadas correntes científicas. Neste sentido, o evolucionismo teria consolidado as transformações científicas que estavam em curso por conta das ciências da vida modernas. Partindo da interpretação de fenômenos orgânicos explorados num grande espectro de casos, o evolucionismo sistematizaria o conhecimento sobre o vivo apresentando um quadro de soluções tão amplo como o espectro observado.

Todavia, ao mesmo tempo em que este método se apresentou eficaz para responder ao pragmatismo do século XIX, ele também sucumbia às facilidades dos modelos científicos oriundos da física. O evolucionismo abria-se a uma contradição inconciliável: como é possível a vida ser mensurada a partir dos mesmos modelos da física, para quem a matéria é algo previsível e cujos elementos se inscrevem pela mais rigorosa regularidade? Se vida é consciência, os fenômenos vitais não podem ser submetidos às leis de uma matéria imutável. Vimos que resolver este problema no bergsonismo implica em refazer a métrica das ciências da vida. Fora isso, o evolucionismo é também um modelo da ciência que se mostrou corruptível desde seus primeiros passos, como é o caso da consolidação do modelo evolucionista spenceriano. Canguilhem, cioso dos usos da ideologia científica, reconhece em Spencer o surgimento de um tipo de ciência que corrompe facilmente

seus propósitos para alcançar um fim muito suspeito. Facilmente, o evolucionismo se transformou em ideologia252 evolucionista. A explicação da totalidade dos fenômenos da vida pela lógica de uma mecânica do progresso universal, que pode ser aplicada dos elementos mais simples aos mais complexos, do indivíduo unicelular à sociedade, é a pedra de toque deste evolucionismo. Acontece que, a partir da propagação das teses defendidas em A Origem das Espécies, Spencer sustenta a suposta organicidade entre suas teses sobre a mecânica universal. Comprovação tal que sustentaria o prolongamento de tais teses para a engenhosidade do projeto da sociedade industrial e também colonial do século XIX, que para Canguilhem deflagra:

“a legitimação da livre concorrência, o individualismo político correspondente e a concorrência. A lei de diferenciação termina pela sustentação portada pelo indivíduo contra o estado. Porém, se ela se encerra explicitamente nisso, pode ser que ela tenha começado implicitamente por isso.”

O evolucionismo passa com isso a se transformar num modelo científico controverso, a ser combatido, pois se fundamenta numa ideologia científica que naturaliza os próprios fins estruturados a favor de um direcionamento cientifico e político. As disputas no seio de um modelo científico não os absorvem para o mundo da verdade insuspeita. A partir daí, abre-se um capítulo na história das ciências que leva ao centro da dinâmica científica o que antes era apenas um elemento 252 Por ideologia científica Canguilhem entende como o desconhecimento das exigências metodológicas e das possibilidades operatórias na esfera que uma ciência pretende se relacionar. Mas desconhecimento não é ignorância, tampouco uma falsa consciência como aparece na definição da ideologia política de classe. A ideologia científica é ao mesmo tempo o obstáculo à condição da ciência, que pode ser descrito a partir de alguns elementos sem os quais a história das ciências se limitaria aos fatos da verdade (faits de verité). Estes elementos são definidos nas seguintes sentenças: “a) As ideologias cientificas são sistemas explicativos nos quais o objeto é hiperbólico, relativamente à norma de cientificidade a qual é aplicado por empréstimo. b) Há sempre uma ideologia científica diante de uma ciência no campo onde a ciência vem se instituir; há sempre uma ciência diante de uma ideologia, num campo lateral que essa ideologia visa obliquamente; c) A ideologia científica não deve ser confundida com as falsas ciências nem com a magia, nem com a religião. Ela é mesmo como elas, muda por uma necessidade inconsciente de acesso direto à totalidade, mas ela é uma crença que oscila para o lado de uma ciência já instituída, do qual ela reconhece o prestígio e da qual ela procura imitar o estilo” CANGUILHEM, 1981, p 44

residual. As questões da normalidade nas ciências da vida não se limitam à observação das regularidades dos processos, mas também ao estabelecimento de uma dada ordem de fatos que serão mais ou menos aceitos. Sem que seja necessário adotar teses reducionistas dos usos políticos da ciência, Canguilhem faz apelo pelo reconhecimento das tendências associativas de uma ciência em seu contexto de utilização. Tais tendências podem se fortalecer ou se esvaziar como é o caso da ideologia evolucionista, que se tornou “um resíduo inoperante da história das ciências humanas”253; diferente da teoria darwinista que é exposta na história das ciências como como um momento integrado da ciência da evolução.

Desta perspectiva, o darwinismo é uma disciplina que favorece um tipo de abordagem – mas, não a única - sobre os fenômenos da vida, e que deve ser articulado dentro dos embates oriundos dos tensionamentos entre ciência e modo como sua história se articula com os domínios não científicos, sejam eles políticos, sociais, filosóficos entre outros. Este quadro impõe uma visão que ultrapassa a noção de neutralidade científica, em desuso desde os trabalhos de epistemólogos do século XX, como Bachelard254. Por isso, reconhecer que existe uma normalidade que promove a exclusão de outras soluções para os mesmos problemas científicos passa a ser fundamental se quisermos reintegrar as ciências da vida com os domínios da filosofia.

Isabelle Stengers nos ajuda a compreender porque os discursos científicos devem superar o reducionismo da neutralidade para fazer aparecer as trincheiras das disputas, o que torna a ciência tão objetiva como confiável. O possível acordo promovido pela veracidade científica pode ser explorado como uma maneira de expor os contrastes entre as práticas científicas e aquilo que se denomina como ciência. Tensões que emergem do reconhecimento de que as 253CANGUILHEM, 1981, p. 43

254BACHELARD, G. Le nouvel esprit scientifique. Paris, PUF, 2013, p. 108; 112-117. Sobre a necessidade de considerar elementos não hegemônicos na história das ciências e todo o esforço de consolidação de uma epistemologia não cartesiana.

práticas científicas são elas mesmas carregadas de predeterminações e paixões, as quais resvalam no próprio estabelecimento das ciências.

“É preciso abandonar o projeto que consiste em definir as práticas científicas a partir de alguma coisa que ninguém conhece - a Ciência - mas da qual sabemos para que serve: para dizer aos não cientistas que seus saberes estão cheios de preconceitos, de ilusões e de paixões que os impedem de aceder a uma realidade que os coloca em

acordo.”255

Esta proposição favorece uma abordagem das ciências da vida pela filosofia, pois se deve considerar que o estabelecimento de um conhecimento sobre a vida e os processos vitais está sob o juízo de preconceitos que não devem fazer parte das próprias definições científicas sobre os objetos em questão. Para que o acordo entre filosofia e as ciências da vida reconheça a diversidade de abordagens, assim como são diversos os fenômenos observados, deve-se, no mínimo, reconhecer que as pré-visões não anulam a validade das variadas abordagens. As querelas filosóficas em torno das ciências devem-se reconhecer partícipes de um campo em expansão e não limitar-se à disputa pelo juízo final da verdade; fosse assim, as contribuições da filosofia no estabelecimento de uma nova ideia de indivíduo teria o poder de estilhaçar os limites autocentrados do antropocentrismo filosófico, para o qual a racionalidade é o grande salto evolutivo da espécie humana. As propostas filosóficas que sinalizaram a quebra deste padrão levam a resultados que favorecem o reposicionamento do humano, desta vez inserido no mesmo lugar de todos os outros indivíduos. Livrar-se do discurso dominante do privilégio ontológico do humano sobre a vida, pode não ser um projeto explícito na obra de Bergson, todavia, suas teorias sobre a individuação e sobre a matéria difundem a necessidade da filosofia progredir em seu diálogo com as ciências da vida. A explosão de especialidades como a embriologia, a genética e a própria física quântica contribui para 255 STENGERS, Sciences et pouvoir. Faut-il avoir peur. Paris: Éditions Labor, 1997, p 12

estimular os entrelaçamentos e aproximações pulsando a realidade que não se mede exclusivamente pelo barômetro da física newtoniana.

Expomos estes comentários para situar o traçado que nos propomos ao investigar a trajetória das filosofias, que, sob as ressonâncias do bergsonismo, organizaram sistemas de interpretação de uma nova filosofia da vida, como é o caso de Raymond Ruyer, cuja dedicação exaustiva aos problemas vitais contribuiu para acentuar a importância da renovação da filosofia da vida.

2. A reorganização da filosofia da vida em Raymond Ruyer

Um quase desconhecido dos leitores de filosofia contemporânea, Raymond Ruyer é geralmente associado a um livro de 1970, que, aproveitando-se do clima new age, acirra a crítica, no tom do senso comum, sobre os equívocos do materialismo vulgar. O sucesso de

A Gnose de Princeton entre o público não especialista teria soterrado

qualquer boa intenção de restaurar as problemáticas desenvolvidas pelo filósofo ao longo de sua obra. Outro aspecto relevante que teria acentuado o ostracismo de Ruyer é sua trajetória acadêmica numa universidade no interior da França, em Nancy, onde se estabeleceu como professor durante mais de 30 anos. A distância dos círculos intelectuais parisienses não contribuía para a inserção definitiva de suas obras e ideias. O expediente acadêmico dos debates e conferências públicas populares entre normalistas e panteões não favoreceu seu reconhecimento. Isso, mesmo quando o assentimento de filósofos como Canguilhem, Merleau-Ponty e Deleuze se faze imediatamente com o uso das problemáticas propostas por Ruyer. De fato, seria preciso fazer uma análise sociológica do ambiente acadêmico francês no século XX para esmiuçar as razões desta negligência. Ao que se refere ao escopo desta tese abordaremos a obra de Ruyer a partir de três hipóteses: 1. o prolongamento das teses de Bergson sobre o enlaçamento entre filosofia e ciência da vida, a partir da reformulação de conceitos

metafísicos de tempo, espaço, memória em consonância com as alianças entre as disciplinas científicas. 2. a consolidação de uma teoria da atualização destaca por Deleuze em Diferença e Repetição, como resposta ao problema do presente da atualização dos potenciais na individuação. 3. a implicação das teses de Ruyer num campo filosófico que ancora a problemática vitalista e renova nos termos contemporâneos a noção de individuação, a partir do que o filósofo perseguirá ao longo de sua pesquisa como embriogênese. Não se trata, em nosso estudo, de esgotar a sistematicidade da obra de Ruyer. Apenas valorizamos, nesta investigação, as teses que corroboram para confirmar essas hipóteses. Por isso, propomos um recorte cuja maior pretensão é criar uma ambiência favorável à leitura de Ruyer entre os leitores da filosofia da vida, para além desta tese. Este trabalho não dispensa, de modo algum, a necessidade do leitor interessado encontrar nas tintas do próprio filósofo o que o animava em sua busca filosófica. Por fim, este estudo segue a letra de Fabrice Colonna, responsável pela edição de Ruyer na coleção Figures du Savoir e pela edição póstuma de

L’embriogenèse du monde. Lembramos ainda que não se trata de

comparar as teses dos filósofos que circundam Ruyer fazendo coincidir seus argumentos, mas sim de fazer um relevo dos momentos cruciais do vitalismo e da crítica ao antropocentrismo na história recente da filosofia francesa.

Escrita durante o cárcere num campo para prisioneiros franceses durante a segunda guerra256, Elementos da psicobiologia reinsere temáticas que enaltecem a necessidade da filosofia pensar os fenômenos da vida, para além do existencialismo objetivista257 e o 256 Ruyer foi prisioneiro de guerra entre os anos 42 e 44, numa prisão na Áustria. Muitos dos prisioneiros eram universitários, o que favoreceu a criação de uma universidade nas tendas da própria prisão. Ruyer acompanhou o curso de Étienne Wolff, um biologista que oferecia cursos sobre embriologia. Nos limites desumanos da vida numa prisão, o antigo aluno da École Normal Superior se dedica à criação de uma obra dedicada à expansão dos limites da vida. Cf, RUYER, R. Éléments de psycho-

biologie. Paris, PUF, 1946. Prefácio

257 Na referida tese, Ruyer acusa o modismo de Sartre de deslegitimar o vínculo necessário entre a atualização e o potencial, ou aquilo que está inscrito nas tendências do indivíduo. A crítica se baseia na ideia de que, da perspectiva absolutamente

ultrarracionalismo que dominava a filosofia com a popularização da escola de Viena258. Publicada em 1946, a obra pode ser interpretada como um modelo bem acabado das relações produtivas entre a filosofia e a problemática da vida que circundava os debates daquela época, e que são também articuladores de uma nova observação sobre o indivíduo. A tese afirma seu desconforto em relação à subordinação da ciência biológica ao enredo “neo-positivista”259, que insere a biologia numa classificação improdutiva e insignificante entre as ciências físico- químicas e o determinismo vulgar transposto da física. A psicobiologia se apresentava como uma alternativa capaz de promover um novo paradigma para a biologia e uma intersecção com limites fora dela. Diferente do que se apresentava, as teses panpsiquistas modernas de Leibniz e Schopenhauer260, as quais segundo Ruyer a grandiloquência ofuscava sua verdadeira eficácia, as proposições do filósofo perseguiam a construção de um domínio filosófico fundamentado e argumentado no espelhamento com as novas ciências da vida. Era necessário, portanto, escapar às facilidades de submeter toda sorte de indivíduos aos modelos de representação da consciência humana. Isso porque seria necessário estender a constituição da consciência para tudo o que é vida. A hipótese de superação da epistemologia antropocêntrica exigia