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DA ALICIAÇÃO E DO INCITAMENTO

No documento Direito Penal Militar Prof. Rodolfo Souza (páginas 93-98)

DOS CRIMES CONTRA A AUTORIDADE OU DISCIPLINA MILITAR

2. DA ALICIAÇÃO E DO INCITAMENTO

2.1. Aliciação para motim ou revolta

• Tipo legal

Art. 154. Aliciar militar ou assemelhado para a prática de qualquer dos crimes previstos no capítulo

anterior:

Pena – reclusão, de dois a quatro anos.

• Objetividade jurídica: aqui o bem jurídico protegido é, especialmente, a disciplina militar, pois o autor, ao tentar convencer terceiros para o motim ou a revolta, fere a estrutura ins- titucional, a ordem castrense.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do aliciador seja militar estadual, a tipifica- ção seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, no art. 286 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: aliciar é atrair, seduzir, envolver, convencer o militar a praticar um dos crimes previstos no Capítulo I do Título II do CPM (“Do Motim e da Revolta”). Entende- mos que aqui está também a geração da ideia, o induzimento para a prática de delitos enu- merados. Façamos, pois, a propósito dessa discussão, a diferenciação entre induzir, incitar e aliciar, o que aproveitará a outras figuras delitivas.

Induzir, pela significação léxica, deve ser compreendido como “persuadir à prática de alguma

coisa” ou “ser causa ou motivo de (sensação, impressão) em (alguém); inspirar, provocar”. Por vezes, a palavra aparece como sinônima de incitar, porém a compreensão jurídica deve restrin- gir-se à geração de uma ideia. Nesse sentido, ao comentar o delito de induzimento, instigação

ideia, tomar a iniciativa intelectual, fazer surgir no pensamento de alguém uma ideia até então inexistente”.

Incitar, também na compreensão dos dicionários, significa “impelir, mover, instigar” ou “esti-

mular (alguém) [a realizar algo]; instigar, impelir, encorajar”. Buscando a compreensão jurídica do termo, instigar, na visão de Bitencourt, deve compreender o ato de “animar, estimular, refor- çar uma ideia existente. Ocorre instigação quando o instigador atua sobre a vontade do autor, no caso, do instigado”.

Aliciar, como exigido pelo tipo em estudo, significa “atrair, chamar a si, convidar, seduzir” ou,

ainda, “atrair a si; tornar (alguém) seu sequaz ou cúmplice; seduzir, envolver”. Nesse sentido, Mirabete, ao comentar o núcleo do tipo do art. 206 do CP, explica que, anteriormente, era gra- fado como aliciar e, hoje, é grafado como recrutar. Para o saudoso mestre, recrutar, que tem sentido semelhante a aliciar, “exige a iniciativa do agente para atrair, seduzir ou angariar”, no caso do tipo por ele comentado, trabalhadores.

Pelas compreensões expostas, fica claro que o induzimento, ou seja, a geração da ideia de se amotinar, aproxima-se mais da ideia de aliciar que da de incitar. Tradicionalmente, na doutrina, mormente quando se comentam as ações afetas ao suicídio que são criminalizadas, distingue- -se com muita veemência a instigação (incitamento) do induzimento, tornando claro que não são termos correspondentes no plano jurídico.

Partindo da premissa de que seduzir significa previamente gerar a ideia (induzimento), não coincidindo, pois, com o ato de incitar, mas com o de aliciar. Nessa toada, se houver uma sequ- ência lógico-temporal, primeiro se seduz, aliciando os suscetíveis de convencimento e, poste- riormente, se insufla, se instiga, ou seja, há o incitamento. É preciso lembrar, no entanto, que é perfeitamente possível haver o incitamento sem que o sujeito ativo tenha, primeiro, cooptado (aliciado) aqueles que estavam propensos a praticar o motim (a revolta, etc.).

Esse convencimento pode ser exercido de qualquer forma, mas a verbal e a escrita são as mais usuais, especialmente a primeira, por não deixar a prova material da mensagem difundida. A atitude de convencimento do sujeito ativo deve recair sobre militar ou sobre assemelhado, o qual, segundo nossa compreensão, não mais existe nas forças militares.

Note que a exigência típica não recai sobre o convencimento de dois ou mais militares, mas apenas de um. Dessa forma, ainda que o sujeito ativo interaja apenas com um militar, indepen- dentemente da adesão posterior de outro(s), estaria caracterizado o delito.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de cooptar alguém para a prática de delitos capitulados nos arts. 149 a 152 do CPM.

• Consumação: o delito se consuma quando o receptor do chamamento para os delitos do capítulo de motim e revolta (militar) se deixa seduzir e concorda com o autor. Com efeito, o verbo nuclear, “aliciar”, exige que haja a anuência do destinatário do convite, não bastando que seja proposta meramente propalada, quando poderá ocorrer a forma tentada. Caso o legislador desejasse antecipar mais ainda a tutela penal, utilizaria, em vez de “aliciar”, ou- tro verbo nuclear que dispensasse a anuência do interlocutor, formando expressões como “convidar militar” ou “sugerir a militar”.

Não é necessário que o militar aliciado pratique qualquer conduta, pois o mero acatamento do discurso que visa a atrair militares para o ato delituoso já perturba a disciplina e consuma

o presente delito. Trata-se, portanto, de crime formal, significando a execução do motim, por exemplo, por parte daquele que foi aliciado, o mero exaurimento do delito.

• Tentativa: é discutível pela doutrina, mas entendemos ser possível quando o autor discur- sa, escreve ou de qualquer forma envia mensagem ao militar, mas não o convence. Inclui- -se aqui o caso do militar que tenta distribuir panfleto concitando militares à paralisação – contrariando ordem expressa e precedente em sentido contrário – e é preso antes de distribuir seu material.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve- -se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafa- dos no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o já citado “incitação ao crime” (art. 286 do CP) e também a “apologia de crime ou de criminoso” (art. 287 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

2.2. Incitamento

• Tipo legal

Art. 155. Incitar à desobediência, à indisciplina ou à prática de crime militar: Pena – reclusão, de dois a quatro anos.

Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem introduz, afixa ou distribui, em lugar sujeito à

administração militar, impressos, manuscritos ou material mimeografado, fotocopiado ou gra- vado, em que se contenha incitamento à prática dos atos previstos no artigo.

• Objetividade jurídica: tutela-se a disciplina militar, pois o autor, ao buscar levar terceiros à prática de crime militar, de atos de indisciplina ou de desobediência em geral, fere, igual- mente, a estrutura, a ordem castrense; atinge também a autoridade quando se prega a desobediência.

• Sujeitos do delito: aqui também o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de sujeição ativa de um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do incitador seja militar estadual, a tipifica- ção seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, o art. 286 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: como já mencionamos acima, incitar significa “impelir, mover, insti- gar” ou “estimular (alguém) [a realizar algo]; instigar, impelir, encorajar”, empurrar à prá-

nossa visão e respeitando as notáveis opiniões em sentido oposto, o induzimento, a gera- ção da ideia. A ideia é preexistente, sendo reforçada, encorajada pelo agente.

Em verdade, o crime militar abrange a indisciplina e a desobediência, do que se depreende que o legislador quis aqui tutelar o incitamento não só de atitudes que caracterizem crime castren- se, como também de infrações administrativas disciplinares de desobediência e de indisciplina que não chegam a configurar crime, mas cuja instigação, sim, é de tutela penal militar.

É pertinente lembrar que, se o delito que se está incitando for comum, não resvalando em de- sobediência ou em indisciplina, o incitamento configurará crime comum capitulado no art. 286 do CP comum. Ocorre que será impossível que alguém insufle um militar à prática de ilícito pe- nal comum sem que isso importe em ato de indisciplina, porquanto, em regra, os regulamentos disciplinares militares consideram o respeito e o acatamento às leis manifestações essenciais da disciplina.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente.

• Consumação: o delito se consuma, como no delito anterior, com a concordância do re- ceptor (militar) da mensagem que caracteriza o incitamento, a instigação para a prática de atitudes de indisciplina, desobediência ou crime militar. Da mesma forma, não é necessário que o militar pratique qualquer conduta, pois a mera aceitação já perturba a disciplina e consuma o presente delito. A prática de conduta afim por parte daquele que foi instigado é mero exaurimento.

• Tentativa: é possível quando o autor envia mensagem ao militar-alvo e ela é interceptada ou não surte o efeito de excitar a ideia preexistente.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve- -se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafados no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o já citado “incitação ao crime” (art. 286 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM. Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

2.3. Apologia de fato criminoso ou do seu autor

• Tipo legal

Art. 156. Fazer apologia de fato que a lei militar considera crime, ou do autor do mesmo, em lugar

sujeito à administração militar:

• Objetividade jurídica: perturba essencialmente a disciplina, pois se exalta o infrator da norma castrense ou o próprio delito militar, o que afeta a regularidade da atividade militar. • Sujeitos do delito: o sujeito ativo é qualquer pessoa, civil ou militar.

No caso de ser um civil, deve-se frisar que somente será possível a ocorrência do delito em âmbito federal. Do contrário, caso o alvo do apologista seja militar estadual, a tipificação seria buscada na legislação penal comum, por exemplo, o art. 287 do CP comum.

O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar.

• Elementos objetivos: fazer apologia é exaltar, elogiar, enaltecer, engrandecer fato delituoso (conduta tipificada como crime militar), o que pode fazer com que seja, para alguém, exemplo ou meta a ser seguida ou alcançada, explicando, pois, a nocividade da conduta. A apologia pode ainda ser de autor de delito militar, mas só haverá crime se for ele engrande- cido pelo seu desvio de conduta. O engrandecimento de qualquer qualidade pessoal do autor de delito, a solidariedade e a sua defesa não serão, por si só, delituosos. Se assim fosse, o autor de um crime militar nunca mais poderia ser elogiado por alguma virtude pessoal ou por algum bem que tivesse feito.

O elemento espacial “em lugar sujeito à administração militar” é exigido para as duas modali- dades, ou seja, o enaltecimento do crime militar ou de seu autor, para se configurarem delito, hão de ser em espaço sob a Administração Militar; fora desse limite, o delito será comum. • Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de enaltecer

o crime militar ou o seu autor pelo delito cometido.

• Consumação: o delito se consuma quando o autor promove o elogio, o enaltecimento, o destaque ao fato ou a seu autor.

• Tentativa: possível somente na modalidade escrita, quando interceptada antes de chegar a seu destino.

• Crime impropriamente militar.

• Tipicidade indireta: para se ter a completa compreensão da tipicidade desse delito, deve- -se verificar o inciso I do art. 9º do CPM, que trará ao intérprete o entendimento de que, para a subsunção do fato a esse delito, basta que sejam encontrados os elementos grafa- dos no tipo penal da Parte Especial. Ainda que o fato possa ser capitulado em delitos do Código Penal comum, como o de “apologia de crime ou criminoso” (art. 287 do CP), não há semelhança suficiente para justificar a complementação da tipicidade pelo inciso II do art. 9º do CPM, uma vez que aqui, além da necessária relação com o delito militar, exige-se que a conduta ocorra em lugar sujeito à Administração Militar.

Em caso do cometimento por civil (na esfera federal) ou por inativo, a complementação deve ser buscada nas alíneas do inciso III do mesmo artigo, lembrando que deve o agente, nesse caso, querer atentar contra a própria Instituição Militar.

No documento Direito Penal Militar Prof. Rodolfo Souza (páginas 93-98)