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Ambiente de Circulação de Pedestres: Calçadas e Passeios Públicos

CAPÍTULO 3. OS DESLOCAMENTOS PELO MODO A PÉ: O PEDESTRE E SEU

3.3 O ESPAÇO DO PEDESTRE

3.3.1 Ambiente de Circulação de Pedestres: Calçadas e Passeios Públicos

Segundo Amâncio e Sanches (2005), pesquisas realizadas em diversos países concluíram que a forma urbana tem relação direta com a realização de viagens a pé (Handy, 1996; Shriver, 1997); ou seja, em áreas urbanas, onde existam características favoráveis aos pedestres (como boa infra-estrutura nas calçadas, arborização, menores distâncias entre as atividades urbanas, etc.), verifica-se uma maior porcentagem de viagens realizadas a pé.

No entanto, para possibilitar e estimular a locomoção a pé é necessário prover as cidades de uma infra-estrutura compatível com as necessidades de locomoção de seus pedestres.

Em relação aos espaços de circulação dos pedestres, observa-se, na literatura, que esses espaços perderam importância com o processo de industrialização e urbanização das cidades. De acordo com Moudon et al (sd), até a IIa. Guerra Mundial, as instalações para pedestres na forma de calçadas, passeios e faixas de travessia normalmente acompanharam o desenvolvimento de áreas residenciais e comerciais em distritos urbanos e suburbanos. No entanto, a partir de então, a importância de prover essas instalações diminuíram à medida que o uso do automóvel tornou-se comum e a maioria dos códigos urbanos não mais exigia que fossem providas instalações para a circulação de pedestres. Assim, as ruas passaram a ser projetadas prioritariamente para os automóveis, deixando em segundo plano as estruturas destinadas para a circulação de pessoas.

O que se verifica é que, essa situação da falta de prioridade para a circulação de pedestres foi se agravando, a medida que as cidades foram se desenvolvendo, principalmente no fim da segunda metade do século XX, período em que ocorreu um aumento acelerado no processo de urbanização e industrialização das cidades em todo o mundo, como também no aumento na taxa de motorização nas mesmas.

Assim, as vias, após o desenvolvimento do automóvel e sua extensa industrialização, passaram a ser projetadas para receber o tráfego de veículos motorizados e sua constante demanda por mais espaço. Contudo, como afirmam Leiva e Barbosa (2003), esse tipo de enfoque trouxe diversas perdas em termos de qualidade ambiental e social para as cidades. As

ruas deixaram de ser utilizadas pelos seus habitantes como um local de trocas culturais e de lazer, transformando-se em espaços de passagem de veículos motorizados.

Como exemplo dessa situação do uso inadequado dos espaços destinados a circulação de pessoas nas cidades tem-se:

ƒ O relatório Cidades em Movimento do Banco Mundial (2003), mostra que em muitas cidades da Índia, menos da metade de suas maiores vias possuem calçadas e quando essas existem são freqüentemente ocupadas por vendedores informais ou mesmo por veículos estacionados, sejam eles carros, motocicletas e bicicletas, bloqueando muitas vezes a circulação dos pedestres; e

ƒ O Ministério das Cidades (Brasil, MC, 2004a), afirma que as calçadas da maioria das cidades brasileiras apresentam características inadequadas, com larguras insuficientes, mobiliário urbano mal projetado, péssima manutenção do piso, pouca iluminação e constantes riscos de assaltos, que desestimulam o pedestre a trafegar por elas. E ainda, os passeios públicos e as áreas de uso compartilhado vão cedendo espaço para ampliações do sistema viário, construção de estacionamentos ou são simplesmente invadidos por veículos e pelas atividades do comércio informal.

No entanto, não se pode deixar que essa situação de condições precárias de circulação de pessoas nas cidades se agrave, sendo, portanto necessário reconquistar o uso desse espaço para dar maior mobilidade e conforto para os que caminham.

De acordo com Tolley (2003b), há um movimento crescente no mundo intencionado em melhorar o ambiente para circulação de pedestres e dessa forma, as viagens realizadas a pé passarão a ser realizadas com mais segurança e prazer pelos seus usuários. Contudo, como ressalta Aguiar (1999), para que isso ocorra, é necessário que os espaços urbanos destinados ao uso de pedestres, principalmente as calçadas, apresentem um nível de qualidade adequado proporcionando conforto e segurança para todos os seus usuários, ou seja, pessoas com ou sem deficiência, idosos, crianças, etc.

Para a ANTP (2002a), reconquistar o sistema viário, ruas, calçadas e passeios para o uso e deslocamento seguro e confortável dos pedestres implica em dar atenção redobrada as áreas de circulação de pessoas, fazendo com que esses espaços sejam considerados bens públicos, com ações de proteção efetiva ao pedestre.

Quando se trata da questão da segurança para o pedestre no seu espaço de circulação é importante ressaltar que a segurança está ligada:

ƒ À manutenção desses espaços, que gera qualidade e conforto para os mesmos, o que vem evitar acidentes para os pedestres, tais como quedas, tropeços, etc;

ƒ Aos riscos que os pedestres correm de ser atropelados por veículos automotores, ou seja, de um acidente de trânsito, uma vez que a cultura da motorização nas cidades faz com que os motoristas desses veículos passem a não respeitar o pedestre, nem mesmo quando o pedestre está caminhando nos espaços destinados a sua circulação; e

ƒ A segurança pública, que também pode ser chamada de “Seguridade”, que quando existe em uma localidade vem evitar ou diminuir os riscos que os pedestres correm de serem assaltados nas vias públicas. A iluminação pública da via e dos espaços destinados à circulação de pedestres, por exemplo, é um fator redutor de riscos de assaltos e indutor para a caminhada.

ƒ O que são Calçadas e Passeios Públicos?

O espaço de circulação existe porque as pessoas precisam se deslocar entre os locais de realização de suas atividades. Com o objetivo de combater a incompatibilidade entre a circulação de veículos e de pedestres no espaço de circulação foi criado um espaço entre os edifícios lindeiros e a pista de veículos, denominado de calçada, alguns centímetros acima do nível dessa pista, e reservada para a circulação de pessoas a pé. A calçada deve oferecer aos pedestres a segurança de circular a pé, sem dividir o espaço com veículos motorizados que se deslocam em velocidade relativamente alta, quando comparada com a velocidade da caminhada (Gold, 2003).

Para Ferreira e Sanches (2005) as calçadas e espaços públicos urbanos devem garantir um ambiente adequado que atenda às necessidades dos usuários no que diz respeito à qualidade relacionada aos aspectos de segurança, conforto e autonomia, independentemente de suas limitações físicas, sejam elas permanentes ou temporárias.

Segundo Gondim (2001), de acordo com os preceitos apresentados pelo TRB - Transportation

Research Board, Highway Capacity Manual (HCM, 1994), a calçada é composta por três

ƒ Faixa de afastamento do meio-fio, ou faixa de mobiliário urbano; ƒ Faixa de passeio; e

ƒ Faixa de afastamento das edificações.

A faixa de afastamento do meio-fio ou faixa de mobiliário urbano e/ou arborização ladeia a guia da calçada, correspondendo ao distanciamento a ser observado do meio-fio. A faixa de passeio é a faixa central, destinada a passagem dos pedestres, devendo ser livre de obstáculos. A faixa de afastamento das edificações é vizinha ao alinhamento dos lotes, sendo decorrente do distanciamento dos passantes às edificações, devendo variar de 0,45m a 1,00m, conforme o padrão predominante de uso do solo. Estabelecimentos comerciais, por exemplo, requerem maiores larguras, pois tendem a provocar a parada de transeuntes para a observação de preços e produtos nas vitrines (ibid).

A distinção entre calçadas e passeio público pode ser observada na definição apresentada pelo Ministério das Cidades (Brasil, 2004b) como:

ƒ Calçada - parte integrante da via pública. Ela é o espaço reservado dentro da via,

destinado à circulação de pessoas e implantação de mobiliário urbano, entre outros, a vegetação urbana e as placas de sinalização. Normalmente se encontram em nível elevado em relação à faixa de rolamento de veículos e seu dimensionamento respeita as diretrizes municipais devendo, entretanto, reservar uma área mínima para circulação de pessoas. O material de revestimento de sua superfície deve ser regular, firme e estável e sua inclinação transversal deve respeitar 3%.

ƒ Passeio Público - é a área destinada exclusivamente à circulação de pessoas.

Normalmente localizado nas calçadas, mas podendo existir também em praças, parques e na própria pista de rolamento; neste último caso deve haver demarcação com pintura ou algum elemento separador: canteiro, por exemplo. O passeio público pode ser modelado conforme situação específica da calçada ou da área em questão, ampliando as condições de caminhabilidade e mobilidade de seus usuários. A área mínima de passeio deve ser de 1,20m embora se recomende 1,50m. Entretanto é possível que os municípios tenham normas específicas para o dimensionamento de calçadas.

O Ministério das Cidades (ibid) apresenta ainda as passarelas e túneis de pedestres definidos como infra-estruturas destinadas à travessia de pedestres em localidades das vias onde a

travessia não deve acontecer ao nível do deslocamento por questões de segurança. Nesses casos o pedestre é então obrigado a alterar sua circulação sobre ou sob a pista de veículos. O acesso às passarelas ou túneis deve ser feito combinando-se rampas, rampas e escadas, rampas e elevadores ou escadas e elevadores. Em qualquer um dos casos, devem ser respeitadas as considerações de acessibilidade e o que está estabelecido nas Normas Brasileiras, da ABNT - em especial a NBR 905010 e NBR 1399411.

O Código de Trânsito Brasileiro - CTB (1997), por sua vez, estabelece os seguintes conceitos: ƒ Calçada é “parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada à

circulação de veículos, reservada ao trânsito de pedestres e, quando possível, à implantação de mobiliário urbano, sinalização, vegetação e outros fins”;

ƒ Passeio é a “parte da calçada ou da pista de rolamento, neste último caso, separada por

pintura ou elemento físico separador, livre de interferências, destinada à circulação exclusiva de pedestres e, excepcionalmente, de ciclistas”.

Os Artigos 68 a 71 do CBT (ibid) estabelecem normas de segurança para o pedestre no uso do espaço viário em áreas urbanas e rurais:

“Art. 68. É assegurada ao pedestre a utilização dos passeios ou passagens apropriadas

das vias urbanas e dos acostamentos das vias rurais para circulação, podendo a autoridade competente permitir a utilização de parte da calçada para outros fins, desde que não seja prejudicial ao fluxo de pedestres.

§ 2º Nas áreas urbanas, quando não houver passeios ou quando não for possível a utilização destes, a circulação de pedestres na pista de rolamento será feita com prioridade sobre os veículos, pelos bordos da pista, em fila única, exceto em locais proibidos pela sinalização e nas situações em que a segurança ficar comprometida. § 3º Nas vias rurais, quando não houver acostamento ou quando não for possível a utilização dele, a circulação de pedestres, na pista de rolamento, será feita com prioridade sobre os veículos, pelos bordos da pista, em fila única, em sentido contrário ao deslocamento de veículos, exceto em locais proibidos pela sinalização e nas situações em que a segurança ficar comprometida.

§4. vetado

10 NBR 9050 /2004: Trata da Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos.

11 NBR 13994 /2000: Trata dos Elevadores de passageiros, Elevadores para transporte de pessoa portadora de

§ 5º Nos trechos urbanos de vias rurais e nas obras de arte a serem construídas, deverá ser previsto passeio destinado à circulação dos pedestres, que não deverão, nessas condições, usar o acostamento.

§ 6º Onde houver obstrução da calçada ou da passagem para pedestres, o órgão ou entidade com circunscrição sobre a via deverá assegurar a devida sinalização e proteção para circulação de pedestres.

Art. 69. Para cruzar a pista de rolamento o pedestre tomará precauções de segurança,

levando em conta, principalmente, a visibilidade, a distância e a velocidade dos veículos, utilizando sempre as faixas ou passagens a ele destinadas sempre que estas existirem numa distância de até cinqüenta metros dele, observadas as seguintes disposições:

I - onde não houver faixa ou passagem, o cruzamento da via deverá ser feito em sentido perpendicular ao de seu eixo;

II - para atravessar uma passagem sinalizada para pedestres ou delimitada por marcas sobre a pista:

a) onde houver foco de pedestres, obedecer às indicações das luzes;

b) onde não houver foco de pedestres, aguardar que o semáforo ou o agente de trânsito interrompa o fluxo de veículos;

III - nas interseções e em suas proximidades, onde não existam faixas de travessia, os pedestres devem atravessar a via na continuação da calçada, observadas as seguintes normas:

a) não deverão adentrar na pista sem antes se certificar de que podem fazê-lo sem obstruir o trânsito de veículos;

b) uma vez iniciada a travessia de uma pista, os pedestres não deverão aumentar o seu percurso, demorar-se ou parar sobre ela sem necessidade.

Art. 70. Os pedestres que estiverem atravessando a via sobre as faixas delimitadas para

esse fim terão prioridade de passagem, exceto nos locais com sinalização semafórica, onde deverão ser respeitadas as disposições deste Código.

Parágrafo único. Nos locais em que houver sinalização semafórica de controle de passagem será dada preferência aos pedestres que não tenham concluído a travessia, mesmo em caso de mudança do semáforo liberando a passagem dos veículos.

Art. 71. O órgão ou entidade com circunscrição sobre a via manterá, obrigatoriamente,

as faixas e passagens de pedestres em boas condições de visibilidade, higiene, segurança e sinalização”.

Para Kutova e Souza (2003), a Legislação Federal apresentada pelo novo CTB (1997), sob a ótica “Veículos X Calçadas”, proporcionou uma maior atenção ao pedestre em relação ao código anterior destacando-se a intenção clara do legislador em diferenciar os conceitos de

Calçada e de Passeio e dos usos e atividades que se possa ocorrer sobre eles.