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Capítulo 3 A jornada do próximo humano

3. Amplificadores de corpos

Na última década, vários experimentos vêm tentando unir homem e máquina, principalmente por meio de implantes de chips, próteses de braços e pernas, e eletrodos cerebrais para comandar o corpo ou equipamentos externos, como um carro ou uma casa. São artefatos desenvolvidos por artistas e cientistas na tentativa de amplificar seus corpos, e servem de exercício de futurologia para as possibilidades do que há de vir. Acredita-se que existam hoje cerca de 20 mil pessoas23 com implantes que lhes permitem abrir portas ou acessar ambientes trancados com senhas, como ilustram os experimentos a seguir.

Em 2002, o cientista britânico Kevin Warwick (Figura 17), especialista em cibernética, assumiu uma identidade que almejava há anos: tornar-se um ciborgue. Ele implantou um chip no braço pelo qual pode receber e transmitir sinais elétricos com simples gestos dos dedos e da palma da mão24.

Figura 17 – Kevin Warwick e sua mão mecânica

Fonte: <https://alchetron.com/Kevin-Warwick-894775-W>. Acesso em: 10 ago. 2017.

23 Cf. MAIS que humano. National Geographic Brasil, No. 205, abril de 2017, p. 48.

24 Cf. SCHIVARTCHE, Fábio. Kevin Warwick, o ciborgue número 1. Superinteressante, São Paulo, 31 out. 2016. Disponível em: <http://super.abril.com.br/tecnologia/kevin-warwick-o-ciborgue-numero- 1/>. Acesso em 17 jul. 2017.

Em 2004, o artista audiovisual britânico Neil Harbisson25 (Figura 18) implantou uma antena com um dispositivo ligado ao cérebro para “escutar” as cores. Nascido com uma doença rara, chamada acromatopsia, ele só enxerga em preto e branco. Com o olho eletrônico, denominado eyeborg, por meio de vibrações sonoras, ele é capaz de identificar as cores. Em 2010, ele criou a Fundação Cyborg26, uma organização com a pretensão de ajudar as pessoas a serem ciborgues e a defender seus interesses.

Figura 18 – Neil Harbisson e sua antena que “escuta” cores

Fonte: <https://alchetron.com/Neil-Harbisson-598845-W>. Acesso em 10 ago. 2017

Em 2007, o norte-americano Chris Dancy27 (Figura 19) começou a monitorar seus batimentos cardíacos, respiração, alimentação que ingere, temperatura ambiente e tudo o que observa ao seu redor por meio de um implante e um software. Ele se considera “um ciborgue consciente” porque usa a tecnologia a seu

25 Cf. BARTOLO, Pedro. Neil Harbisson é o primeiro humano oficialmente reconhecido como

“cyborg”. P3, Porto, 27 mar. 2012. Disponível em: <http://p3.publico.pt/vicios/hightech/ 2605/neil-harbisson-e-o-primeiro-humano-oficialmente-reconhecido-como-quotcyborgquot>. Acesso em 17 jul. 2017.

26 Cf. Site Cyborg Project. Disponível em: <http://cyborgproject.com>. Acesso em 17 jul. 2017. 27 Cf. BLASCO, Lúcia. Como é a vida do ciborgue americano. BBC Brasil, 24 abr. 2017. Disponível

favor. Hoje ele tem 11 dispositivos em seu corpo e centenas de aparatos em sua casa e em seu carro, uma espécie de laboratório tecnológico, uma fonte de coleta de dados. Esse montante de informações é guardado e analisado em um computador que serve para monitorar sua vida e, assim, prevenir doenças e dissabores futuros.

Figura 19 – Chris Dancy, o ciborgue americano

Fonte: <http://www.bbc.com/portuguese/curiosidades-39696585>. Acesso em: 10 ago. 2017.

Dentro dessa categoria de pessoas que se autodenominam ciborgues, espalham-se pelo mundo vários exemplos de implantes de braços e pernas mecanizados que substituem membro amputados. Dois exemplos atendem essa categoria: a prótese feita de fibra de carbono, ao custo de R$ 245 mil, de James Young (Figura 20), que perdeu um braço em acidente de trem, e o braço mecânico adaptado para fazer tatuagens de Sheitan Tenet (Figura 21). Ele instalou um motor e agulha usando partes de próteses comuns e peças de uma máquina de escrever depois que perdeu a mão em um acidente de carro28.

28 Cf. FARINACCIO, Rafael. Ciborgues da vida real usam implantes para melhorar suas vidas.

TECMUNDO, São Paulo, 12 ago. 2016. Disponível em: <https://www.tecmundo.com.br

/biotecnologia/108391-ciborgues-vida-real-usam-implantes-tecnologicos-melhoras-vidas.htm>. Acesso em 17 jul. 2017.

Figura 20 – James Young e sua prótese de fibra de carbono

Fonte: <http://www.dailymail.co.uk/health/article-3593535/The-man-amazing-arm-Britain- chargephone.html>. Acesso em 10 ago. 2017.

Figura 21 – Braço mecânico do tatuador Sheitan Tenet

Fonte: <http://www.tattoaria.com.br/blog/jc-sheitan-tenet-a-arte-da-superacao/>. Acesso em: 10 ago. 2017.

Outra forma de amplificar corpos são os exoesqueletos artificiais. O exoesqueleto refere-se aos esqueletos externos, muito comuns em insetos e

répteis, servindo de proteção para seus órgãos. Nas últimas décadas, contudo, o termo tem sido aplicado para ampliar a capacidade humana29.

Os exoesqueletos artificiais para humanos consistem em armaduras de metal desenvolvidas tanto para fins militares quanto para pacientes com dificuldades de locomoção, como idosos, pessoas que tenham sofrido acidentes com lesões sérias na coluna cervical ou um Acidente Cerebral Vascular (AVC).

Dentre as várias experiências realizadas no mundo com o uso de exoesqueletos, uma das mais polêmicas é o projeto Andar de Novo da Duke University, na Carolina do Norte (EUA), liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis30. O projeto funda-se no uso de um exoesqueleto artificial conectado ao cérebro humano e a um computador, que dá movimento a braços e pernas de pacientes paraplégicos (Figura 22).

Os pacientes que vêm testando o equipamento, segundo dados da pesquisa, têm evoluído com o uso desse artefato robótico, havendo restauração do movimento muscular e da sensação tátil. Embora nenhum deles ainda consiga andar, eles conseguem, por exemplo, chutar uma bola ou pegar um copo.

Uma exibição pública do experimento foi realizada na cerimônia de abertura da Copa do Mundo de Futebol da FIFA, em 2014, no Brasil, na Arena Corinthians, quando um paraplégico chutou uma bola (Figura 23) e conseguiu erguer o braço direito para comemorar seu feito31. Infelizmente, a rede de TV credenciada pela FIFA, responsável pela transmissão internacional do evento, não fez o registro de imagens ao vivo, e apenas os espectadores que estavam no estádio viram o feito.

29 Cf. EXOESQUELETOS humanos: amplificadores de gente. Superinteressante, São Paulo, 31

out. 2016. Disponível em: <http://super.abril.com.br/tecnologia/exoesqueleto-humano- amplificadores-de-gente/>. Acesso em: 17 jan. 2017 e EXOESQUELETOS auxiliam indivíduos a caminharem com mais eficiência. Jornal da USP, São Paulo, 14 fev. 2017. Disponível em: <http://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-da-saude/exoesqueleto-textil-auxilia-individuos-a-caminharem- com-mais-eficiencia/>. Acesso em 17 jul. 2017.

30 Cf. PARAPLÉGICOS recuperam movimentos em projeto de Miguel Nicolelis. Revista Brasileiros,

São Paulo, 10 ago. 2016. Disponível em: <http://brasileiros.com.br/2016/08/paraplegicos-recuperam- movimentos-em-projeto-de-miguel-nicolelis/>. Acesso em 17 jul. 2017.

31 Cf. JOVEM paraplégico usa exoesqueleto e chuta bola na abertura da Copa. Globo, São Paulo,

12 jun. 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2014/06/jovem- paraplegico-usa-exoesqueleto-chuta-bola-na-abertura-da-copa.html>. Acesso em 17 jul. 2017.

Figura 22 – Exoesqueleto criado por Miguel Nicolelis

Fonte: <http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2014/06/jovem-paraplegico-usa-exoesqueleto- chuta-bola-na-abertura-da-copa.html>. Acesso em: 10 ago. 2017.

Figura 23 – Paraplégico usa exoesqueleto de Nicolelis para chutar uma bola na abertura da Copa Fifa 2014

Fonte: <https://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-noticias/redacao/2014/06/12/paraplegico-anda- com-exoesqueleto-de-nicolelis-e-da-chute-na-copa.htm>. Acesso em 10 ago. 2017.

Ao “religar” os nervos inferiores aos estímulos cerebrais da interface cérebro- máquina, espera-se que, no futuro, a restauração da mobilidade possa ser feita com exoesqueletos mais compactos e eficientes. Vale mencionar que outras experiências têm sido testadas nesse âmbito, como o uso de carros por tetraplégicos por meio de ligações cerebrais, e o acesso a outros equipamentos domésticos com o uso de implantes de chips.

As experiências ciborgues têm aproximado o humano e a máquina, como figurado nos filmes e na literatura de ficção, tornando tal simbiose mais eficiente do que as funções naturais dos humanos. Esses experimentos devem ser estendidos no futuro e adaptados ao corpo, podendo levar a “loucuras” ou esquisitices capazes de insuflar o humano a desejar esses aparatos maquínicos ou tentar trocar membros humanos por implantes bem mais eficientes ‒ o que não deixa de ser assustador.