As hipóteses da pesquisa foram testadas por meio de análises de regressão com utilização de dados em painel, tendo como variável dependente o índice de qualidade da governança corporativa de cada empresa (IQGC). Foram realizadas estimações com utilização de modelagem dos mínimos quadrados ordinários, painel estático com modelagem de mínimos quadrados generalizados e painel estático com método generalizado de momentos sistêmico. A seção 3.7 traz uma pequena abordagem sobre os procedimentos estatísticos realizados.
A Equação 1 apresenta o modelo básico que relaciona as variáveis de estrutura de propriedade com o índice de qualidade da governança corporativa, em que: IQGC é o índice de qualidade da governança corporativa da empresa i no período j; PROP são as características da estrutura de propriedade da empresa i no período j; CONTR são as variáveis de controle do modelo econométrico, relativas à empresa i no período j; e ε é o termo de erro, que abrange as características específicas de cada empresa e a parcela do IQGC não explicada pelo modelo.
� ��, = + [ , ] + [ � � , ] + (1)
As variáveis de controle estão dispostas no Quadro 4. São forças internas e externas de controle e outras características da empresa que possivelmente contribuem para a melhoria dos mecanismos de governança. As variáveis financeiras foram extraídas da base de dados do Economática®, com data base de 31 de dezembro do ano anterior à observação. A emissão de
ADR’s foi verificada no Boletim diário de Informações da BM&FBovespa em 30 de abril do
ano da observação, data mais próxima à publicação do Formulário de Referência, principal fonte de dados sobre a qualidade da governança corporativa.
Quadro 4 – Variáveis de controle
Variável Proxy Operacionalização Fonte de dados
Tamanho Ativos da empresa (LNTOTALASSETS)
Logaritmo natural do total de ativos
da empresa Economática®
Cross-listing Emissão de ADR (ADR)
Dummy para as empresas que emitem ADR
Formulário cadastral e Formulário de Referência (item 18.7) Endividamento Dívida total da empresa
(TOTAL_DEBT_ASSETS)
Razão entre a dívida total da empresa
e seu ativo Economática® Rentabilidade Retorno sobre os ativos
(ROA_NETPROFIT)
Razão entre o lucro líquido e o total
de ativos da empresa Economática® Valor de
mercado
Q de Tobin (TOBINSQ)
Razão entre a soma do valor de mercado com o passivo exigível e o ativo total da empresa
Economática®
Tangibilidade Ativo imobilizado (PPE_ASSETS)
Razão entre o ativo imobilizado da
empresa e o total de seus ativos Economática® Período
Ano da observação (YEAR2010, YEAR2011,
YEAR2012, YEAR2013)
Dummy para o ano da observação Economática® Fonte: Elaborado pelo autor (2014)
Ressalta-se que o modelo da Equação 1 já inclui o intercepto e os efeitos fixos de cada companhia, estes últimos incluídos no termo de erro. O setor de atividade não foi incluído nas análises por se tratar de uma característica específica de cada companhia, já estando também inserida no termo de erro (SILVEIRA et al., 2010). Ademais, Roodman (2009) adverte que o uso de dummys com valor 0 ou 1 para quase todas as observações pode causar imprecisões, sobretudo quando o período analisado é pequeno.
O Quadro 5 apresenta o efeito esperado das variáveis de estrutura de propriedade sobre a qualidade da governança corporativa, considerando as hipóteses relacionadas ao efeito substituição e ao efeito expropriação.
Quadro 5 – Relação esperada entre estrutura de propriedade e qualidade da governança corporativa segundo o efeito substituição e o efeito expropriação
Aspecto da estrutura de propriedade Efeito substituição Efeito expropriação
Concentração acionária Concentração de direitos de voto (todas as companhias) Relação negativa (H2a) - Concentração de direitos de voto (até 25% e até
50%) - Relação negativa (H1a) Concentração de direitos de voto (mais de 25% e mais de 50%) - Relação negativa (H1a) Concentração de direitos de voto do segundo maior acionista - Relação positiva (H1d) Concentração de direitos
de fluxo de caixa Relação negativa (H2b) Relação positiva (H1c) Existência de um
acionista majoritário Relação negativa (H2a) -
Natureza dos principais acionistas
Identidade do principal
acionista votante -
Relação negativa para outra empresa, banco e família/pessoa física; relação
positiva para investidores institucionais; relação indefinida para governo
Direitos de voto de cada tipo de acionista
Relação negativa para todas as identidades de
acionista (H2d)
Relação negativa para outra empresa, banco e família/pessoa física; relação
positiva para investidores institucionais; relação indefinida para governo
Controle societário
Direitos de voto do
acionista controlador Relação negativa (H2a) Relação negativa (H1a) Direitos de fluxo de
caixa do acionista controlador
Relação negativa (H2b) Relação positiva (H1c)
Separação entre direitos de voto e de fluxo de
caixa do acionista controlador
- Relação negativa (H1b)
Controle disperso Relação positiva (H2c) -
Identidade do acionista controlador
Relação negativa, independentemente da
identidade (H2d)
Relação negativa para outra empresa e família/pessoa física; relação positiva para acordo de acionistas; relação
indefinida para governo (H1e) Nacionalidade do acionista controlador Relação negativa, independentemente da nacionalidade (H2e)
Relação positiva para estrangeiros; relação indefinida para nacionais
(H1f)
Segundo o efeito substituição, a maior concentração acionária e o maior percentual de direitos de voto e de fluxo de caixa nas mãos do acionista controlador estariam relacionados à menor qualidade da governança corporativa (BOZEC; BOZEC, 2007). Empresas com controle disperso tenderiam a ter qualidade de governança superior, haja vista que a inexistência de um acionista controlador aumentaria o risco de expropriação, tendo os acionistas a maior necessidade de formalizar mecanismos de monitoramento e controle da gestão. Por outro lado, quando há um acionista majoritário, espera-se que haja menor necessidade de mecanismos formais de governança, uma vez que o acionista majoritário tem maior controle sobre a gestão da empresa.
Com relação à natureza dos principais acionistas/controladores, sugere-se que sua identidade e nacionalidade não teria influência sobre a qualidade da governança corporativa para suportar a hipótese da substituição, uma vez que o que define o efeito substituição é o poder de controle, independentemente de quem seja o controlador. Apenas em casos em que o controle é partilhado poderia haver um incremento na governança da companhia.
Segundo o efeito expropriação, a concentração de controle teria uma relação quadrática com a qualidade da governança: em baixas concentrações, o efeito seria positivo; à medida que um acionista detém maior controle, este teria incentivos para reduzir a qualidade da governança para expropriar a riqueza dos acionistas minoritários (BOZEC; BOZEC, 2007). Por este motivo, os direitos de voto do acionista controlador estariam relacionados à qualidade da governança corporativa inferior. A alta concentração de direitos de fluxo de caixa, por outro lado, faria com que os benefícios privados do controle fossem mitigados, fazendo com que os principais acionistas não tivessem incentivo em expropriar a riqueza da companhia (LA PORTA et al., 2002). Deste modo, a concentração de direitos de fluxo de caixa e os direitos de fluxo de caixa dos controladores estariam relacionados à maior qualidade da governança. O excesso de direitos de voto sobre direitos de fluxo de caixa dos principais acionistas e dos acionistas controladores, por sua vez, é um incentivo para que estes expropriem a riqueza dos acionistas minoritários (ALDRIGHI; MAZZER NETO, 2005; 2007; CUETO, 2012; LA PORTA et al., 2002), o que pode motivar os controladores a reduzir a qualidade da governança para facilitar a expropriação (BOZEC; BOZEC, 2007). A presença de blockholders minoritários sugere maior monitoramento da gestão, estando relacionadas à qualidade superior da governança corporativa (DELGADO‐GARCÍA; QUEVEDO-PUENTE; FUENTE-SABATÉ, 2010; GOMES; NOVAES, 2005).
Quando se analisa a natureza dos principais acionistas e do acionista controlador, para suportar o argumento do efeito expropriação, a revisão de literatura indica que investidores institucionais e estrangeiros são aqueles detentores de maior profissionalismo em seus investimentos, e motivações para melhorar as práticas de governança das empresas investidas (AGGARWAL et al., 2011; ANANCHOTIKUL, 2007; OECD, 2011; ROSSETTI; ANDRADE, 2012), enquanto empresas e famílias podem motivar seus investimentos por interesses particulares, o que pode afetar negativamente a qualidade da governança (AGUILERA; DESENDER; CASTRO, 2011; AGUILERA; JACKSON, 2003; CLAESSENS; YURTOGLU, 2012; CONNELLY et al., 2012; SHLEIFER; VISHNY, 1997). Governos podem agir como investidores institucionais (BORISOVA et al., 2012) ou com interesses estratégicos (SHLEIFER; VISHNY, 1997), não tendo uma relação esperada definida, enquanto o acordo de acionistas pode contribuir para a melhora da governança (LA PORTA et al., 2000).