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Análise funcional do comportamento

No documento DE A N Á L I S E DO COMPORTAMENTO (páginas 136-141)

Os eixos fundam entais de um a análise funcional são os paradigm as respondente e, principalm ente, o operante. A análise funcional nada m ais é do que a busca dos determ inantes da ocorrência do com portam ento. Sob um a perspectiva beha- viorista radical, esses determ inantes estão na interação do organism o com o meio. Skinner defende a existência de três níveis de causalidade do com porta­ m ento, que, em maior ou m enor medida, estarão sempre atuando em confluência na ocorrência ou não de u m a resposta de um com portam ento. São eles: a) Filo- g ê n e s e - a nossa interação com o meio advém da evolução de nossa espécie. Nossas características fisiológicas e alguns traços com portam entais (com porta­ m entos reflexos e padrões fixos de ação) são determ inados pela filogênese. Nes­ se sentido, certos com portam entos podem ser aprendidos por hum anos, outros não (como respirar embaixo d'água, por exemplo). Além disso, determ inantes filogenéticos podem se dar no indivíduo, e não apenas na espécie. Pessoas altas podem aprender certos com portam entos que pessoas baixas provavelmente não aprenderiam (como enterrar um a bola de basquete na cesta), ou mesmo o contrá­ rio (dificilmente alguém de 1,90 m conseguiria aprender o duplo m ortal carpado da Dayane dos Santos). b ) O n to g ên ese in d ividu al - esse nível de análise aborda a modificação do com portam ento pela interação direta com o meio durante a vida do organismo. Em outras palavras, trata-se da aprendizagem por experiên­ cias individuais com o meio. Na realidade, Skinner defende que esse seria o nível de análise ao qual a psicologia deveria concentrar os seus esforços, um a vez que são os determ inantes do com portam ento mais relacionados à subjetivida­ de e à individualidade de cada ser. Ao observarmos os campos de atuação do psicólogo, veremos que eles estão constantem ente m anipulando os determinantes ontogenéticos do comportamento. Na ontogênese, o com portamento é modificado pelas suas conseqüências, ou seja, dependendo da conseqüência de um a resposta, essa tende ou não a se repetir, c) O n to gên ese S ociocultural - por fim, o nosso com portam ento será determ inado por variáveis grupais, como moda, estilo de vida, preconceitos, valores, etc. Nosso contato com a cultura estabelecerá a função reforçadora ou aversiva da maioria dos eventos. Além disso, podemos aprender pela observação de modelos ou por instruções, o que compreende a aprendizagem social responsável pela emissão de grande parte dos com portamentos humanos.

Segundo Skinner, se realm ente insistirmos em utilizar a palavra "causa” em psicologia, devemos levar em consideração os três níveis de análise do com porta­ m ento. Mas um ponto que deve ficar claro na abordagem com portam ental radical da determinação do com portam ento é a sua ênfase na relação de troca do organis­ m o com o am biente. Skinner negou com veemência a atribuição de causa do com portam ento aos eventos m entais hipotéticos, como traços de personalidade, emoções, vontade, desejo, impulso, etc. (esses dizem respeito aos com portam en­ tos e devem ser explicados em seu próprio direito, e não serem colocados como

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causas de outros com portam entos). Portanto, se quisermos explicar, predizer e controlar o com portam ento, precisamos analisá-lo funcionalm ente, buscando no am biente externo e interno os seus determ inantes.

Analisar o com portam ento funcionalm ente refere-se a um a busca da função do com portam ento, e não de sua estrutura ou forma (isto é, topografia). Compor­ tam entos de m esm a topografia podem ter funções m uito distintas. Por exemplo, um nam orado dizer "eu te am o" pode ser determ inado por diferentes variáveis no início e no final do nam oro. Em geral, no início do nam oro, ele pode dizer "eu te amo" sob controle discriminativo de seus estados internos e de quanto a presen­ ça da nam orada é reforçadora. Por outro lado, com o desgaste da relação, a presen­ ça da nam orada não é mais tão reforçadora assim, nem é acom panhada dos estados internos citados. Entretanto, caso o nam orado pare de dizer que a ama, ela começará a chorar, brigar, fazer chantagem emocional, etc., eventos que certa­ m ente são aversivos para o nam orado. Ele, nesse caso, pode dizer que a ama, não sob controle dos estímulos antecedentes, mas sob controle das conseqüências aversivas com as quais entrará em contato caso não diga o que sua nam orada quer ouvir. Sendo assim, o "dizer que am a” passa a ser controlado pela conseqüên­ cia reforçadora negativa, m esm o tendo a m esm a topografia da resposta anterior­ m ente analisada. Ainda temos o caso do nam orado que diz que am a como forma de apressar o ingresso na vida sexual do casal. Em resumo: temos a em issão de um a m esm a topografia de resposta com funções bem distintas.

Ainda temos os casos das respostas que possuem topografias bem distintas, mas que apresentam funções sem elhantes. Um exemplo m uito interessante é observado quando nam orados em item as respostas "não quero mais nam orá- la" e "Eu te amo, te adoro, não quero te perder, mas, por favor, m ude o seu jeito comigo porque eu não agüento mais". Essas respostas, em topografia, são bem diferentes. Uma parece dem onstrar que o nam orado não gosta mais de sua nam o­ rada, enquanto a segunda expressa justam ente o contrário. Entretanto, tais res­ postas p o d e m possuir a m esm a função: am bas são m antidas pela m udança no com portam ento da nam orada. Com efeito, é m uito comum observarmos nam ora­ dos que, ao estarem insatisfeitos com sua relação, não possuem repertório para discuti-la com a parceira. Nesse caso, em item a resposta verbal "não quero mais nam orar você", quando, na realidade, serão reforçados pela m udança no com ­ portam ento da nam orada, e não com o térm ino do namoro, conforme especifi­ cado pela topografia de sua resposta. Em geral, são reforçados, pelo m enos por algum tempo. Isto é, a nam orada, para não perdê-lo, começa a agir de form a que o agrade; entretanto, com o tempo, é provável que os padrões com portam entais que incom odam o nam orado retornem (nesse exemplos, é óbvio que as análises feitas para o nam orado valem tam bém para a nam orada). Chamamos de asser­ tivos os nam orados que conseguem em itir a segunda resposta verbal nessas m es­ mas circunstâncias. Ou seja, se o reforço é a m udança, o ideal é o nam orado em itir um a resposta que especifique a m udança como reforço. Em suma, temos respostas verbais de topografias distintas que possuem a m esm a função, ou seja, são determ inadas pelas m esm as variáveis.

Com esses exemplos (hipotéticos), tentam os dem onstrar que um a análise do com portam ento deve ser funcional, e não topográfica. Não encontrarem os na

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estrutura do com portam ento, na sua forma, e sim em sua função, seus determ i­ nantes. E é exatam ente isso que faz um a análise funcional: buscar relações fu n ­ cionais entre o com portam ento e o am biente, buscar as funções do com porta­ m ento.

A interação funcional do com portam ento com o seu am biente será descrita em conformidade com os paradigm as respondente e operante. São eles:

Par<rô#ma rrspnndmtr

Exemplo

S -*• R

S

R

o cisco elicia o lacrimejar

onde o S simboliza o estímulo, o R, a resposta, e a seta significa a relação de eliciação entre o estím ulo e a resposta. Em outras palavras, o estím ulo S elicia a resposta R. Podemos exemplificar esse paradigm a com o cisco no olho sendo o estím ulo S que elicia a resposta R de lacrimejar.

Estudar a relação entre u m cisco no olho e lacrimejar talvez não seja m uito de seu interesse, mas, provavelmente, estudar os aspectos emocionais do compor­ tam ento hum ano é. Com preender os com portam entos respondentes, e saber identificá-los, é fundam ental para o psicólogo entender como funcionam as emoções e os sentim entos. Para relem brar como reflexos, ou com portam entos respondentes, estão relacionados às emoções, releia os Capítulos 1 e 2.

O segundo paradigm a com portam ental e o principal que deve ser considerado em um a análise com portam ental é o paradigm a operante, cujo principal ponto refere-se ao papel que as conseqüências desem penham n a aprendizagem e na m anutenção do com portam ento.

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... àg|

SA - R -*• Sc

SA

-

R

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vitória do serve de pedir o carro produz empréstimo Flamengo ocasião para emprestado do carro

onde o SA simboliza a ocasião em que a resposta R ocorre, Sc simboliza o estímulo conseqüente à resposta, o travessão (-) significa serve de ocasião e a seta (—>) significa produz. Portanto, essa relação de contingência pode ser form ulada por extenso da seguinte forma: um a resposta R produzirá um determ inado estímulo conseqüente (Sc) na presença da ocasião SA. Por exemplo, a resposta de pedir o carro em prestado para o pai flam enguista será reforçada com o em préstim o do carro na presença da vitória do Flamengo.

É im portante notar que, no com portam ento respondente o principal deter­ m inante do com portam ento é o estímulo antecedente, isto é, o que vem antes da resposta, enquanto, no com portamento operante, o principal determ inante é o

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aquele produzido pela resposta. A função do estímulo anteceden­ te no com portam ento operante advém da sua relação com a con­ seqüência, sinalizando para o or­ ganismo que se com porta a dis­ ponibilidade ou não da conse­ qüência.

A tarefa, em um a análise fun­ cional, consiste basicam ente em encaixar o com portam ento em um dos paradigm as e encontrar os seus determ inantes. Uma vez que encontrem os os d eterm i­ nantes do com portam ento, po­ demos p red izê-lo (prever a sua ocorrência) e co n tro lá -lo (au­

m entar ou dim inuir deliberadam ente sua probabilidade de ocorrência). Esse é o objetivo da psicologia encarada como ciência do com portam ento ou mesmo A ná­ lise do Comportamento.

Entretanto, para que consigamos analisar funcionalm ente o com portam ento, precisaremos dom inar outros princípios com portam entais discutidos neste livro, como privação e saciação, esquemas de reforçamento, generalização, abstração, controle aversivo, etc., e conceitos que não são abordados, como controle por regras, aprendizagem por observação de modelos, metacontingências, com porta­ m ento verbal, etc.

Outro ponto fundam ental a se destacar é o de que a apresentação separada dos paradigmas operante e respondente é apenas didática. Uma análise mais compreensiva do com portam ento revelará que ambos estão em constante in te­ ração, e precisamos descrever como se dá essa interação se quisermos lidar com o com portam ento de um a forma mais abrangente.

Por fim, um a discussão que não pode ficar de fora de um a análise funcional gira em torno da relevância de se incluir a história de reforçamento. Diversos autores em análise do com portam ento defendem a irrelevância de se abordar a história de reforçam ento ao se conduzir um a análise funcional, um a vez que para um com portam ento estar ocorrendo, é necessário que existam contingências atuais que o m antenham . Seria possível identificar a contingência atual e modi- ficá-la sem fazer m enção à história de estabelecimento desse comportamento. E ntretanto, outros autores defendem a relevância de se abordar a história de reforçamento. Em primeiro lugar, a história de estabelecimento do com portam en­ to pode nos fornecer dicas de quais contingências atuais são responsáveis por sua m anutenção. Além disso, temos casos em que apenas as contingências atuais não são capazes de explicar um padrão com portam ental em um a análise mais ampla. Um exemplo clássico disso envolve o subproduto da punição cham ado de respostas incompatíveis. As respostas incompatíveis são negativam ente refor-

r f l [

C ontrolar com portam ento quer dizer apenas tor­ nar sua ocorrência mais ou menos provável. N ão sign ifica, n ece ssa r ia m en te , obrigar a lg u ém a fa zer algo con tra su a v on ta d e. Quando você faz um a pergunta, está controlando com portam en­ to; quando pára diante de um cruzam ento, seu com portam ento está sendo controlado. O tempo todo estamos controlando o com portam ento dos outros e os outros estão controlando o nosso. A Análise do Com portamento busca sim plesm ente entender melhor como funcionam essas relações de controle (relações funcionais).

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çadas por evitar que um com portam ento anteriorm ente punido seja emitido. Esse tipo de com portam ento, claram ente determ inado por contingências prévias, im pede o contato com as contingências atuais e, por conseguinte, impede que elas exerçam o controle sobre o comportamento.

Por exemplo, um rapaz que apaga os núm eros de telefones de m ulheres que conheceu em danceterias pode estar em itindo um a resposta incompatível. Diga­ mos que, ao nam orar um a m ulher que conheceu em um a danceteria, ele fora traído e sofrera muito. Desde então, ele pode até trocar telefone com as m u lh e­ res que conhece em tais lugares, mas apaga os núm eros depois, como forma de im pedir que um a relação se estabeleça. De fato, apagar os núm eros de telefone é um a resposta incompatível ao im pedir que um com portam ento punido no passado ocorra. Entretanto, m uitas dessas m ulheres talvez não o traíssem em um a relação estável. Em outras palavras, as contingências atuais de nam orar algumas dessas m ulheres seriam de reforço, e não de punição, mas não exercem controle sobre o com portamento, pois a história de punição estabeleceu a resposta incompatível de apagar o núm ero dos telefones, que é incompatível à exposição às contingências atuais.

• Como visto em capítulos anteriores, o com portam ento pode pro- k duzir vários tipos de conseqüências diferentes. Vimos que os diferen- I ■ tes tipos de conseqüências produzem diferentes efeitos no comporta-

I I

m ento (Tabela 9.1).

M Em tais relações (com portam ento-conseqüência) está a explica- ção de por que os organismos fazem o que fazem e de como aprende- ram a fazê-lo. Portanto, é crucial para o psicólogo conhecê-las e saber identificá-las, pois só assim, caso necessário, saberá desfazê-las. A fim de identificar as relações, o psicólogo faz o que cham am os de a n á lise fu n cion al, que nada mais é do que a identificação das relações entre o indivíduo e seu m undo, ou seja, é observar um com portam ento e saber que tipo de conseqüência ele produz (reforço positivo, punição negativa, etc.). Para iden­ tificar estas relações você deve seguir os seguintes passos:

• A conseqüência do comportamento aum entou ou diminuiu sua freqüência? 1. Caso tenha aum entado, então verifica-se se:

a. Um estím ulo foi acrescentado ou retirado do am biente? - Se foi acrescentado, a conseqüência é um reforço p o sitiv o. - Se foi retirado, a conseqüência é um reforço n egativo.

a. O estím ulo estava presente ou ausente no m om ento em que o com portam ento foi emitido?

i. Se estava presente, trata-se de um co m p o rta m en to d e fuga.

ii. Se estava ausente, trata-se de um co m p o rta m e n to d e esq u iva.

2. Se dim inuiu, verifica-se se:

- O com portam ento parou de produzir um a conseqüência reforça- dora?

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Reforço positivo Reforço negativo Punição positiva Punição negativa

Extinção (ausência do reforço) Recuperação (ausência da punição)

T ipo da conse qüê ncia

Aumenta a freqüência Aumenta a freqüência Diminui a freqüência Diminui a freqüência Diminui a freqüência Aumenta a freqüência Efe it o n o com p or t a m e nt o Apresentação de um estímulo Retirada ou evitação de um estímulo Apresentação de um estímulo Retirada de um estímulo Suspensão do reforço Suspensão da punição

T ipo da ope r açã o

- Se sim, houve ex tin çã o op era n te. - Se não, houve um a p u n ição.

a. Um estímulo foi acrescentado ou retirado do am biente? i. Se foi acrescentado, trata-se de um a p u n içã o p ositiva. ii. Se foi retirado, trata-se de um a p u n içã o n eg a tiva

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