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4 ANÁLISE SÓCIO-HISTÓRICA DA DIVULGAÇÃO PELA DIFERENÇA ENTRE AS LINGUAGENS CIENTÍFICA E

COMUM

Entre as partes envolvidas direta ou indiretamente na comunicação de Divulgação, a constante é a ciência, na forma de conhecimento científico previamente validado pelos pares. Kuhn constata, no posfácio da 2a edição das Estrutura das revoluções científicas, publicado em 1970: “Temos ainda muito a aprender sobre todas essas características da ciência. Iniciei este posfácio enfatizando a necessidade de estudar-se a estrutura comunitária da ciência […]” (KUHN, 2009[1970], p. 258)

Após levantar uma série de perguntas sobre as características sociais dos cientistas, ele aborda a linguagem científica: “O conhecimento científico, como a linguagem, é

intrinsecamente a propriedade comum de um grupo ou então não é nada. Para entendê-lo, precisamos conhecer as características essenciais dos grupos que o criam e o utilizam.” (KUHN, 2009[1970], p. 258-259)

É o caminho da linguagem apontado por Kuhn que escolhemos para aprofundar a comunicação científica intragrupal, que, por sua vez, deverá nos auxiliar na compreensão do que é Divulgação. Salientemos que, no estudo da ciência, Kuhn coloca a linguagem científica no mesmo patamar que as dimensões social e cognitiva. Essas duas últimas são o foco

declarado de Meadows (1999, p. 54) em sua obra clássica sobre CC, em detrimento da primeira. Ora é justamente a linguagem que privilegiamos aqui, até porque, por se tratar de uma problemática constante da DC, não poderia ser eludida.

Para Kuhn (1987), a linguagem científica emergiria, na História da Ciência, como um meio de manter uma certa coesão social entre cientistas, de formação semelhante, mesmo quando não partilham mais o mesmo conhecimento do mundo, nas fases de desenvolvimento não cumulativo ou “revolucionárias”. Mas seria passando pela linguagem comum que os cientistas manifestariam, arbitrariam e superariam os problemas de partilha de conhecimentos novos, para depois voltarem à forma cumulativa, após a vitória de um dos campos em luta pela verdade (2009, p. 210). Ao fim e ao cabo, para Kuhn, é pela via da linguagem científica que a História da Ciência se torna concebível. Daí nossa sugestão que também seria pela via

(embora não exclusiva) da linguagem que se poderia identificar e explicar certas

continuidades e descontinuidades no desenvolvimento da Comunicação Científica, e até mesmo a própria possibilidade de evolução desta, no decorrer da história. Em suma, Kuhn não conceberia a comunicação restrita aos pares fora da problemática específica da linguagem científica e tampouco da linguagem em geral.

Nosso trabalho pretende portanto abordar a Divulgação, tomando como foco da diferenciação entre cientistas e não cientistas a linguagem científica, embora não

isoladamente, i.e. sempre em relação a outras dimensões envolvidas na comunicação, como as social e cognitiva.

Apreenderemos essas diversas dimensões da DC através de seu surgimento na história, guiados por José Reis, conforme o anunciamos em nossos preliminares. A trama histórica será completada com obras de historiadores, sociólogos e filósofos das ciências.

No que diz respeito ao enfoque específico da CI, recorremos em nossa análise às definições da informação de Tefko Saracevic (1995), da mais estrita à mais ampla, e aos paradigmas da Ciência da Informação identificados por Rafael Capurro (CAPURRO, 2003). Como um e outro tratam da RI, podem ser utilizados ao longo de toda a pesquisa. No que diz respeito à Comunicação Científica, seguiremos usando os “clássicos” Meadows, Garvey e Ziman.

* * *

Para conhecer o cientista, como o fez próprio Kuhn em sua obra “The Copernican Revolution” (KUHN, 1957), é preciso voltar aos séculos 16-17, quando suas práticas sociais, cognitivas e linguísticas distintivas começam a se fixar até serem socialmente reconhecidas.

O fechamento institucional da comunidade científica sobre si é crucial (BOURDIEU, 2001, p. 96): no plano social, opera uma diferenciação, que cria, oficial, simultânea e reciprocamente, o par de categorias cientista e não cientista, e, por aí, as diferentes partes envolvidas na DC.

É nesta mesma época que teria surgido a Divulgação como gênero textual, algumas décadas antes do sistema periodizado da Comunicação Científica e seus gêneros específicos (artigo e revista), que datam da publicação do “Journal des Sçavants” e da “Philosophical Transactions” em 1665, tal como o concebe a Ciência da Informação. Acrescentamos as essas duas revistas citadas por Meadows (1999, p. 6) as “Mémoires de l'Académie Royale des

Sciences” criadas em 1666168, no mínimo tão importantes segundo afirmam (GROSS; HARMON; REIDY, 2002, p. 32), fundados nos trabalhos de Gascoigne (1985)169.

A emergência do gênero da DC é geralmente atribuída a obras de Modernos, em particular o “Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo, tolemaico e copernicano ” (“Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo, ptolemaico e copernicano”) de Galileu (1632), e os “Entretiens sur la pluralité des mondes” (“Diálogos sobre a pluralidade dos mundos”), de Fontenelle (1686). (PINHEIRO; VALÉRIO; SILVA, 2009, p. 1) reconhecem o pioneirismo na DC de ambos o italiano Galileo Galilei e o francês Bernard le Bovier de Fontenelle. Reis, Sanchez-Mora (2003, p. 15) e Laming creditam apenas o segundo, com ressalvas. Uma e outra obra envolvem um tipo de barreira diferente entre ciência e público, portanto critérios diferentes para se datar o início da DC. Barreira da língua, em Galileu, supostamente transposta ao escrever em romance (italiano no caso) em detrimento do latim. Barreira cognitiva, em Fontenelle, cuja obra encena a conversa com uma mulher que, apesar de nobre, não recebeu qualquer instrução científica, como as demais de seu sexo naquela época, porque era ausente dos currículos das escolas femininas (LAMING, 1952, p. 243).

Examinemos como essas obras ou seus autores são tratadas na Comunicação Científica. Do lado dos autores “clássicos” da CC estrita, Jack Meadows, em “A comunicação científica” (1999[1998]), não menciona nem Fontenelle nem Galileu. Tal ausência poderia se justificar por seu enfoque, que privilegia o artigo e a forma periodizada da revista, não fossem

publicações regulares as “Mémoires” da Academia de ciências francesa (a partir de 1666) e a história desta entre 1699 e 1740 por Fontenelle (CANGUILHEM, 1989, p. 51-59). O nome de Galileu é mencionado uma vez por William D. Garvey no início de “Communication: the essence of science” (GARVEY, 1979, p. 3), e em diversas ocasiões por John Ziman em “Conhecimento público” (ZIMAN, 1979), e consta inclusive do índice de ambos os livros. Mas nem um nem outro relacionam Galileu à DC. Quanto a Fontenelle, não é mencionado por eles. Nem mesmo Meadows menciona Fontenelle em seu artigo “The growth of science popularization: a historical sketch” (1997) dedicado às origens da Divulgação.

A linguagem, como prática ligada à Ciência institucionalizada, é objeto de normas 168Os sumários das primeiras edições das Mémoires (a partir de 1666) estão disponíveis em:

http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k3506n (Acesso em: 2013-11-05)

169No que diz respeito às Mémoires, (GROSS; HARMON; REIDY, 2002, p. 32) referem-se à obra “A Historical catalogue of the scientific periodicals 1665-1900 with a survey of their development” de Robert Mortimer Gascoigne (1985).

explícitas. Na França, a língua francesa, que é a da região de Paris, torna-se língua oficial da França por imposição legal (1539)170, portanto normativa desde o início. Já existia a Academia Francesa (1635), dirigida pelo escritor Corneille171, quando foi criada a de Ciências, cujo secretário, Fontenelle, era sobrinho do primeiro. O tio começou trabalhando no Dicionário da Academia francesa para normatizar a língua, continuou estabelecendo o Dicionário das Artes e Ciências, finalmente retomado pelo sobrinho.

Em 1694 foi publicado o Dicionário das artes e das ciências de Thomas Corneille. Fontenelle, que era sobrinho desse, tinha escrito, acrescentado ou revisado um grande número de artigos de matemática e física da obra. Mas foi sobretudo através de sua História da Academia de Ciências que Fontenelle conquistou a fama enquanto era vivo. Iniciou-a em 1699 e nela trabalhou só até 1739, o que representa 40 volumes, incluindo trechos de artigos não publicados, resumos e obituários de seus colegas falecidos.172 (LAMING,1952, p. 251) Como já o mencionamos, Fontenelle inaugurou o gênero da história das ciências periodizado173.

Na Inglaterra, Bacon já fustigava o uso da “obscura” metáfora, geralmente associada à linguagem leiga pelos cientistas.

Para ambos Bacon e Oldenburg, os filósofos naturais deviam ter um estilo de escrita o mais simples possível. A língua não devia ser usada para despertar emoções; devia apelar apenas para a razão e o bom senso. A linguagem devia ser literal, evitando empregos figurados como as metáforas, símiles ou

personificações. A escrita científica moderna segue empenhada em se conformar a esses preceitos, mas as técnicas de apresentação dos filósofos naturais nos séculos 17 e 18 exibiam variações de estilo consideráveis. 174(RUSSEL, 2010, p. 11-12)

Os preceitos de Bacon são retomados nas diretrizes sobre o “discurso [científico] à maneira inglesa” na história da Royal Society de Thomas Sprat (1667). Ao mesmo tempo que fustiga a metáfora, Sprat introduz o uso metafórico do ruído na comunicação:

De todos os estudos humanos, nada pode ser imediatamente obtido além dessa abundância viciosa da Frase, esse truque da Metáfora, essa volubilidade da

170Disp. em: http://www.assemblee-nationale.fr/histoire/villers-cotterets.asp (Acesso em: 2012-10-28) 171Disp. em: http://www.academie-francaise.fr/les-immortels/pierre-corneille (Acesso em: 2012-10-28)

172In 1694 appeared Thomas Corneille's Dictionnaire des arts et des sciences. Fontenelle, who was Corneille's nephew, had written, added to or revised a large number of the articles on mathematics and physics contained in it. But it was chiefly by his history of the Academy of Sciences that Fontenelle won fame in his own lifetime. He began it in 1699 and worked at it single-handed till 1739, which represents 40 volumes including extracts from unprinted papers, abstracts and obituary notices of his dead colleagues. 173 Dados do sítio Internet da Academia de ciências francesa, disponível em http://www.academie-sciences.fr/activite/archive/dossiers/Fontenelle/Font_biblio.htm (Acesso em: 2012-10-28)

174Bacon and Oldenburg both advocated that natural philosophers write as plainly as possible. Language was not to be used as a device to trigger emotion; appeal should be made only to reason and common-sense. Language was to be literal, figurative tropes like metaphors, similes or personifications were not to be used. Modern scientific writing makes every effort to conform to these precepts but the presentational techniques of natural philosophers in the seventeenth and eighteenth centuries showed considerable variations in style.

Língua, que causa um tão grande ruído no Mundo. […] aproxime-se o máximo possível da clareza da matemática, ... preferindo a linguagem dos artesões, camponeses [também: conterrâneos] e mercantes àquela dos homens de espírito ou de letras.(SPRAT, 1667)175.

Por trás do utilitarismo do revendo Sprat há um posicionamento favorável às classes desvalorizadas por não possuírem o conhecimento puramente livresco, metafísico, avesso à vida natural e terrestre.

Quanto à prática sócio-cognitiva, o que se convém chamar hoje de revisão pelos pares (ou “editorial peer review”) é um procedimento que, pelo que afirma (FITZPATRICK, 2009, p. 12), se estabeleceria formalmente a partir de 1731 na Royal Society of Edinburgh e depois em 1752 na Royal Society de Londres (KRONICK, 1990), para se tornar uma prática difundida apenas nos últimos cinquenta anos. A revisão pelos pares teria primeiro assumido um papel de censura mais que de controle de qualidade, ou então era o feito de um único par, o editor da revista.

4.1 DC, linguagens científica e comum durante a revolução astronômica,

antes das academias reais

Antes mais nada, uma observação sobre a expressão “Revolução científica”. Apesar de intitular sua obra “The Scientific Revolution”, o historiador Steven Shapin (1996) rejeita categoricamente a expressão: “Nunca aconteceu essa tal de Revolução científica, e esse é o propósito do livro”.176 Retraça a generalização de seu uso por Alexandre Koyré sem seus “Estudos galileanos” de 1939177 e comenta:

Nos anos 1930, o filósofo francês Gaston Bachelard referia-se a "mutações" (ou descontinuidades de grande escala) no desenvolvimento da estrutura conceitual da ciência, uso que Koyré não tardou a desenvolver: “A revolução científica do século 17 foi sem dúvida alguma uma mutação desse tipo.”178 (SHAPIN, 1996, p. 2)

É provável que Bachelard não teria aprovado a palavra “revolução” para se referir aos 175[O]f all the Studies of men, nothing may be sooner obtain’d, than this vicious abundance of Phrase, this trick of Metaphor, this volubility of Tongue, which makes so great a noise in the World. […] bringing all things as near the mathematical plainness as they can, preferring the language of Artizans Countrymen, and Merchants, before that, of Wits and Scholars. Disp. em: http://www.uiowa.edu/~c036090/spratt.htm (Acesso em: 2012-10-29)

176There was no such thing as the Scientific Revolution, and this is a book about it.

177Shapin só fornece a data da publicação, 1939, que coincide com a das “Études galiléennes” de Koyré. 178In the 1930 the French philosopher Gaston Bachelard referred to "mutations" (or large-scale discontinuities) in the development of the conceptual structure of science, a usage Koyre' soon developed: "The scientific revolution of the seventeenth century was without doubt such a mutation.”

Modernos, pois os situou entre os pré-científicos, junto com os Gregos Antigos, no recorte histórico da ciência que ele propõe no discurso preliminar à “Formação do espírito científico” (BACHELARD,1996[1934], p. 9). Notemos que “Revolução científica” já é usado por Annette Laming em seu artigo de 1952. Charles P. Snow usa a expressão em um sentido diferente, referindo-se à ciência do Pós-Guerra, na obra clássica de DC “The Two Cultures” (1961[1959], p. 31).

Nosso partido será analisar as continuidades e rupturas na acumulação do conhecimento, e a relação entre cientista e “leigo”, à luz das linguagens científicas, o que pode

eventualmente levar a uma periodização diferente da História das ciências.

4.1.1 Visão geral do período

A DC envolve uma diversidade de segmentos sociais e conhecimentos de várias áreas. Da mesma forma que nos empenhamos em situá-la tanto em particular, quanto em geral em relação a outras disciplinas e áreas, achamos necessário contextualizar seus primórdios na história e sociedades em que de desenvolveu, limitando-nos contudo à Europa.

O heliocentrismo, defendido por Copérnico em meados do século XVI, deflagra a Revolução científica, e triunfa com a lei universal de Newton cerca de 150 anos depois, passando por Galileu e Descartes, entre outros. Durante esses dois séculos, a Europa é destroçada por guerras entre Protestantes e Católicos. A unidade europeia tinha sido construída em torno da autoridade intelectual e religiosa da Igreja.

Estudiosos tinham começado a resgatar, desde o século X, através dos árabes instalados na Península Ibérica, o conhecimento dos Gregos antigos, abrindo o caminho para a filosofia escolástica e as universidades europeias (KUHN, 1957, p. 102). A Reforma Gregoriana opera, a partir de meados do século XI, um corte social fundamental para a DC: institucionaliza a separação entre clérigos e leigos na base da sociedade, segundo regras respectivas precisas (LE GOFF, 2005, p. 60). Nessa partilha, o conhecimento é mantido sob o controle do clérigo, que codifica e impõe a fé verdadeira, através da condenação das heresias, nos primeiros

inquisitio, tribunais religiosos. É o Papa, nos séculos XII-XIII, quem define os estatutos das primeiras universidades e institui a teologia como ciência suprema (2005, p. 123). Esta sobrepuja as duas subdivisões das chamadas artes liberais ensinadas na universidade

geometria, música e astronomia) (2005, p. 11).

Os escolásticos tentavam conciliar em um corpo de conhecimentos coerentes a “dupla verdade” da ciência da Antiguidade redescoberta e do Cristianismo: por um lado, cosmologia de Aristóteles e astronomia de Ptolomeu; por outro, dogmas teológicos fundados nos Padres da Igreja e na Vulgata, versão latina da Bíblia. Nessa concepção, o cosmo, com a terra fixa em seu centro, subdivide-se em duas qualidades físicas absolutamente distintas: celeste e

terrestre; o céu, associado à incorruptibilidade moral e ao divino, é uma abóboda finita; não existe vazio na Natureza (SHAPIN, 1996, p. 38).

Mas as contradições da ““dupla verdade”, que buscava conciliar a razão, incarnada pelo pensamento de Aristóteles, e as revelações da fé contidas nos textos sagrados” (HAROCHE, 2014), 179 seguiam insuperáveis, solapando a unificação do conhecimento que legitimava o poder pontifical.

A religião domina o conhecimento através do monopólio dos escolásticos sobre o ensino, em particular o universitário (KUHN, 1957, p. 109), dispensado quase exclusivamente em latim até o séc. XVII. Começam a ser questionadas desde o séc. XII a primazia da autoridade moral e a extensão das posses da Igreja, a qual reage por sucessivas ondas de repressão, as inquisições.

Nos países europeus reprimidos e empobrecidos da Renascença surgem movimentos alternativos de pensamento. O Humanismo amplia o estudo dos textos completos dos autores da antiguidade grega e romana, cujos valores racionais contestatários acaba escolhendo, contra a tradição dogmática da teologia. A política local emancipa-se, apoiada na economia mercantilista, levando a “uma verdadeira 'revolução comercial' e à ascensão da classe burguesa, que iria estimular o desenvolvimento das ciências e das técnicas”. (ALBAGLI, 1996, p. 396)

As Descobertas desencravam os espaços, favorecendo as trocas comerciais e as

conquistas em nível mundial (CHARTIER, 2009, p. 366). O crescimento da burguesia faz-se progressivamente contra a nobreza sacramentada por Roma. O movimento de oposição ao catolicismo culmina no séc. 16 com a Reforma de Lutero, condenada em 1521 pelos

escolásticos da Universidade da Sorbonne (BÜTTGEN, 2011, p. 163). A imprensa favorece a propagação das ideias reformistas, bem como do conhecimento em geral. As traduções em 179la thèse de la « double vérité », qui cherchait à concilier la raison, incarnée par la pensée d’Aristote, et les révélations de la foi contenues dans les textes sacrés.