• Nenhum resultado encontrado

3. ARQUITETURA DA CIDADE COLONIAL ROMANA DE EMERITA

3.4 EDIFÍCIOS PARA ESPETÁCULOS PÚBLICOS

3.4.2 Anfiteatro

O anfiteatro foi construído junto ao teatro, ambos aproveitando o declive do terreno para suas construções, desta forma o anfiteatro utilizava-se da encosta da colina de San Albín para apoiar sua arquibancada. Para sua construção reservou-se duas insulae ou quadras no esquema geral urbano da colônia, situando o edifício a noroeste de Emerita Augusta (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995). O anfiteatro se encontra localizado ao lado sul do teatro, onde se separavam e se comunicavam por um pequeno trecho de calçada (ALMAGRO, 1961; GUITIAN, 1977). O anfiteatro de Emerita Augusta foi construído em 8 a.C. (ALGABA, 2009). Neste monumento aconteciam as populares lutas entre gladiadores, animais, ou entre ambos, muito apreciadas pelo povo (GUITIAN, 1977).

O anfiteatro romano de Emerita Augusta possuía consideráveis dimensões, sua elipse apresenta diâmetro de mais de 126 metros de comprimento pelo eixo maior, e 102 metros por 65 metros de largura pelo eixo menor da planta. A forma elíptica do anfiteatro se apresentava como habitual nesse tipo de edifício. Estimativas apontam que a arena medisse entre 54 metros a 64 metros de comprimento por 41,15 metros de largura, um pouco menor que o anfiteatro da cidade romana Itálica (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995; Idem, 1977). O monumento tinha sua estrutura construída em concreto e alvenaria, e o restante em pedras. Embora o edifício também fosse revestido em mármore não seria mais suntuoso que o teatro. As portas do anfiteatro eram de arcos em forma de semicírculos ou adintelados, as escadarias de acesso possuíam janelas para maior iluminação. Uma de suas características originais consiste na ausência de galerias interiores (Ibidem, 1977).

Nos dois extremos do eixo maior do anfiteatro, que seguem aproximadamente de norte a sul, existem dois amplos corredores de 4,65 metros de largura na porta exterior e 4,10 metros em sua porta interior, que acedem o interior do monumento,

visto que a arena e parte da arquibancada permanecem escavadas no solo para evitar o aumento de estruturas livres. Os gladiadores seguiam para a arena através de ambos os grandes corredores de saída, em cujos lados se abriam caminhos para quatro ambientes abobadados que não sabemos suas funções – acredita-se ser talvez uma área para culto da deusa Némesis, protetora dos gladiadores, ou também poderia ser o spoliaria, local onde os gladiadores se preparavam para ir a arena, e/ou carceres, espaços em que permaneciam as feras até o espetáculo, com reduzidas dimensões e pequenas janelas que permitiam alimentá-las com segurança – e que apoiam os terraços da ima cávea. A comunicação destes locais com a arena se fazia por uma porta ao fundo do anfiteatro, as paredes ofereciam janelas para comunicação com os gladiadores e/ou também para introduzir alimento para os animais sem risco (ALMAGRO, 1961; GUITIAN, 1977).

O anfiteatro emeritense oferecia, dentro do traçado clássico deste gênero de construção, duas tribunas que se erguiam nos dois extremos de seu eixo central para seu eixo menor. O eixo menor do anfiteatro segue em direção leste a oeste e possui 41,5 metros. No extremo meridional deste eixo, em direção à calçada do teatro, se abria uma ampla porta e sobre ela estava uma tribuna, considerada como tribuna

principalis, que se combinava emparelhada com outra, denominada de editoris tribunal, que se erguia no outro extremo na porta de entrada e que mantinha abaixo

talvez uma capela, para os serviços desta tribuna ou dos espetáculos (Idem, 1961). Nos extremos do eixo menor estavam tribunas, o lado oriental destinava-se ao presidente, a tribuna principalis, e no lado ocidental à pessoa que custeava o espetáculo, o editoris tribunal (GUITIAN, 1977). Igual acontecia com os outros edifícios para espetáculos, os mais altos dignitários que presidiam os jogos contavam com lugares de exceção para maior comodidade e visão dos jogos (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995). Cada tribuna possuía em seu parapeito uma inscrição monumental – encontraram-se fragmentos – com menções honoríficas ao imperador governante consignadas nos longos dintéis graníticos, que permitem datar a obra como de Augusto, nos indicando a data de inauguração do teatro em 8 a.C. Escavações arqueológicas encontraram inscrições que apontam a existência de outras tribunas, no lado norte e sul do anfiteatro (Idem, 1995; GUITIAN, 1977).

O desenho do anfiteatro de Emerita Augusta constituía-se como habitual nos anfiteatros romanos: uma arquibancada com ima, media e summa cavea, e uma arena central. O anfiteatro de Emerita Augusta possuía capacidade para acomodar 15000

espectadores em assentos, além de possuir coberturas e toldos para a proteção e abrigo dos mesmos. Desta forma, percebemos que os jogos gladiatórios eram bem recebidos pelo grande público. O edifício de forma oval e com arquibancadas dispostas ao redor do espaço central, a arena, podia ser preparado para o espetáculo com ornamentos de cenário ou recriações paisagísticas (ALGABA, 2009).

A fachada do edifício apresenta dezesseis portas grandes e ornadas, das quais iniciam os vomitoria ou galerias que desembocam nos diferentes setores da arquibancada (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995). Dos dezesseis vomitórios, quatro constituíam-se como principais que formam galerias abobadadas em arcos de semicírculos, localizados nos quatro eixos da construção, dividindo assim cada um dos quatro setores em outros tantos cuneis ou arquibancadas (GUITIAN, 1977).

A cavea ou arquibancada do anfiteatro se articulava com seus três setores. As três ordens de arquibancadas ou cáveas se dividiam em: ima cavea ou galeria inferior, setor mais próximo da arena, contava com assentos de granito – com apenas alguns conservados –, uma fileira reservada aos magistrados que presidiam os jogos, e 10 fileiras se destinavam aos cavalheiros. As arquibancadas da media e da summa cavea acolhiam ao público mais heterogêneo. A media cavea ou galeria ao meio contava com 10 fileiras para os cidadãos juridicamente livres, e summa cavea ou galeria superior abrigava 10 fileiras reservadas à plebe (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995; Idem, 1977).

Só se conservam a ima cavea – a mais preservada – e a media cavea, já toda a summa cavea encontra-se destruída, apenas um trecho se conserva inteira, caída entre as arquibancadas inferiores. A arena do anfiteatro estava limitada por um

podium de granito ricamente adornado com grandes placas de mármore, coroado com

uma cornija e um parapeito de blocos decorados com pinturas alusivas aos jogos, que protegia os espectadores na arquibancada do perigo dos jogos – parte dos blocos encontram-se expostos atualmente no Museu Nacional de Arte Romano (ALMAGRO, 1961; Idem, 1995). Sobre o podium se erguia a ima cavea, depois de sua décima primeira fileira existia um corredor, praecintio, que a separava a media cavea; o corredor com as escadas, scalaria, acessava os espectadores às arquibancadas em forma de setores ou cunei, como no teatro, e separava as arquibancadas. Em seguida erguia-se um muro, balteus, de ladrilhos que levantava a media cavea, atualmente

sem arquibancadas, mas com umas aglomerações em opus concretum quebrado que encontram-se em sua posição original (ALMAGRO, 1961).

Na zona da arena, em seu interior foi escavada uma grande fossa que constituía-se por um retângulo central maior e outros menores lateralmente, de planta cruciforme. A fossa arenaria servia para armazenar os adereços do espetáculo e as jaulas dos animais ferozes. A fossa ficava oculta por um tablado de madeira e se conectava com a arena através de uma plataforma. As paredes da fossa possuíam uma camada de argamassa hidráulica, opus siginum, e se utilizava como depósito de água (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995). Alguns autores atribuem como sua função, possivelmente, a de tanque para batalhas aquáticas, as naumáquicas, e que poderiam ser tapados com madeiras quando não utilizados (GUITIAN, 1977).

Figura 8. Planta reconstruída do Anfiteatro de Emerita Augusta. Disponível em: <http://www.spanisharts.com/arquitectura/imagenes/roma/merida_anfiteatro_plano.jpg>.

Os gladiadores que participavam dos jogos eram em grande parte de condição servil, embora existissem os que se vendessem, auctorati, como o caso de soldados veteranos familiarizados com o manejo de armas. A condição dos gladiadores se revelava muito diferente entre eles na arena, os gladiadores que se enfrentassem contrapunham armamentos e técnicas distintas com a finalidade de tornar mais atraente o combate. O gladiador que lutava como retiarius, possuía uma rede e um tridente, o secutor era pesadamente armado, o venator enfrentava as feras. O comércio de animais exóticos para os espetáculos, procedente da Ásia e África, se expandiu rapidamente pelo Império e gerou grandes fortunas para os empresários (ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995).

O anfiteatro de Emerita Augusta apresenta em sua configuração estrutural resultados de reformas e ampliações ocorridas posteriormente à sua inauguração, como a sucedida em I d.C. que praticamente refez o edifício (ALGABA, 2009). No século V d.C., após o declínio do esplendor da colônia, o anfiteatro foi abandonado e passou, a partir de então, a ser utilizado como canteira para novas edificações. A história do anfiteatro torna-se muito parecida com o destino enfrentado pelo teatro da cidade emeritense. Em época moderna, no século XVIII o anfiteatro foi vítima de explosões com pólvora, que atingiram principalmente sua arquibancada da summa

cavea, para utilizar de seus materiais dinamitados em construções a baixos preços

(ÁLVAREZ MARTÍNEZ; ANTÓN; JIMÉNEZ, 1995; GUITIAN, 1977). Também neste período se acreditou que o edifício se destinava à naumaquia, hoje se supõe que tais espetáculos fossem apenas ocasionais (Idem, 1977).

Depois de sucessivos saques e destruições, hoje o monumento do anfiteatro da antiga cidade de Emerita Augusta se encontra parcialmente restaurado, deixando à mostra suas ruínas em estado natural. O anfiteatro atualmente encontra-se bem conservado, sendo utilizado somente para eventos ocasionais, permitindo-se na maior parte do tempo demonstrar apenas sua monumentalidade (ALMAGRO, 1961; Ibidem, 1977).