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Antecedentes da Educação colombiana: o período colonial e a pedagogia

2. CONTEXTO HISTÓRICO DA SOCIEDADE COLOMBIANA NA

2.10. Antecedentes da Educação colombiana: o período colonial e a pedagogia

O período colonial na América espanhola foi marcado pela atuação das ordens religiosas. No território então conhecido como Nova Granada19, começaram a chegar missões evangelizadoras a partir do ano de 1525, iniciando também uma atuação pedagógica pelo Real Patronato de Índias, a qual se tornaria exclusiva, tal tratado estipulava a submissão da Igreja à coroa da Espanha, desde que fosse autorizada a cristianização das terras conquistadas, confiando, por isso, à Igreja a educação, a administração dos hospitais e das casas de caridade.

Diante disso, viu-se no território a multiplicação de instituições escolares religiosas, divididas em níveis elementar, secundário e universitário. As escolas secundárias estavam a cargo, principalmente dos jesuítas, mas também podíamos encontrar, ainda que em menor proporção, instituições administradas pelos dominicanos e franciscanos. Estes estabelecimentos se situavam nas principais cidades e centros urbanos, como: Cartagena, Santa-fé de Bogotá e Tunja, Pamplona, Honda, Popayan, Mompox, Panama, Ocaña, Pasto, Santa-fé de Antioquia, Merida e Buga.

Os centros educacionais eram frequentados pelos filhos de espanhóis, dos grandes comerciantes e dos funcionários públicos. Segundo Helg (2001), as escolas

19 O Nova Granada refere-se a uma parte do território conquistado pelos espanhóis com capital em Santa

elementares enfatizavam o catecismo e a religião, porém também ofereciam aulas de leitura, escritura, e aritmética, dependendo da tarifa paga pelos pais dos alunos.

Segundo Ahern (1991), nas escolas secundárias se ensinava latim, filosofia e teologia e, ao final da época colonial, direito civil e direito canônico. Nas universidades, desde 1639, com a fundação da Universidade Santo Tomas e da Universidade Javeriana, podiam-se pleitear os cursos de direito, filosofia e teologia e, mais tarde, medicina, matemática e ciências naturais.

O plano de estudos das escolas jesuíticas se orientava pelos preceitos do Ratio

Studiorum, cujo conjunto de normas tinha a finalidade de ordenar as atividades, as

funções e os métodos de avaliação. Segundo Saviani (2005, p. 6), as ideias pedagógicas, presentes no Ratio Studiorum, correspondiam ao que passou a ser conhecido, na modernidade, como pedagogia tradicional. Além disso, segundo o autor, essa concepção pedagógica se caracterizava por uma visão essencialista, ou seja, o homem é constituído por uma essência imutável.

Ao mesmo tempo em que, paulatinamente, a educação passou a ser disseminada na Nova Granada, foi também instituída como um reflexo dessas sociedades religiosas, se caracterizando pela segregação e pela elitização de seu acesso.

Podemos observar nesse período que a educação feminina era quase inexistente, e aquelas mulheres que podiam se educar o faziam em conventos onde recebiam educação para a casa, formação religiosa e moral.

Outro grupo esquecido pela escola religiosa instituída foi a população pobre, predominantemente de crioulos e mestiços. O acesso para esse grupo era impossível, primeiramente pelo fato de que as crianças pertencentes às famílias pobres deviam ajudar seus pais nos trabalhos diários e, por consequência, com o sustento da família. Esse quadro era agravado, pois ainda que houvesse o desejo de se enviar um filho para escola, os custos para matricular-se, e a presença dos pais para isso, adicionavam obstáculos quase intransponíveis. Como outro importante impedimento para uma matrícula havia a necessidade da apresentação do certificado de pureza de sangue, um atestado que somente famílias tradicionais poderiam obter.

Um exemplo são as condições para se ingressar na Universidade Tomista, que exigia legitimidade de nascimento e pureza de sangue, para a emissão do certificado “vir

purus ab omni macula sanguinis atque legitimus et natalibus descendens”. (Homem de

Já para os indígenas, a lei obrigava aos encomenderos20 organizar e financiar

escolas, que lhes ensinariam o espanhol, a religião e algumas habilidades manuais. A instituição de escolas para as populações ameríndias incluía um plano de dominação e aculturação dos colonizadores. Como parte disso, as ordens religiosas instituíram uma política de doutrinamento, conhecida como doctrinas, que consistia em aglutinar sistematicamente as populações ameríndias em povoados.

Segundo Duran Peña (2013), os colonizadores espanhóis achavam que com a condição nômade dos ameríndios se tornava impossível sua sujeição a uma vida “política e humana”, condições, segundo eles, necessárias para sua conversão à fé e à vida cristã. Assim sendo, criaram-se povoamentos com caraterísticas espaciais bem definidas, onde os indígenas passaram a ser aglomerados (Figura 4)

Figura 4: Planta baixa de um povoamento

Fonte: Duran Peña, 2013, p. 38

20 A encomienda era um sistema de trabalho utilizado pelos espanhóis, caraterizado por deixar comunidades

indígenas inteiras sob os cuidados de uma encomendero, que poderia utilizar a mão de obra dos índigenas para o desenvolvimento de atividades agrícolas ou a extração de metais preciosos. Em troca, o encomedero deveria assegurar o oferecimento da educação religiosa cristã para “seus” índios.

A Figura 4 apresenta a planta da Doctrina, de Fontivon, em que podemos observar algumas das caraterísticas de uma das mais importantes doutrinas do território de Nova Granada.

Os elementos urbanísticos dos povoados de ameríndios jesuíticos eram organizados da seguinte maneira: uma praça central e a igreja construída num canto dela. Bem perto, se levantavam o colégio e as oficinas. As moradias indígenas formavam longas séries ininterruptas de ruas que rodeavam a praça, os jesuítas adotaram o sistema de “manzana-isla”. Muito própria das missões. Todas as casas tinham as mesmas dimensões, com as portas abertas para a praça a fim de controlar os ameríndios e evitar as fugas. Num canto da praça se levantava o cabildo com as armas reais colocadas nas portas. Junto do cabildo ou no colégio funcionava a escola de primeiras letras. O hospital e o cimenteiro completavam a estrutura urbana do povoado. (DURAN PEÑA, 2013, p. 37)

Nas igrejas e nas escolas destes povoados, os missionários da Companhia de Jesus ensinavam às crianças indígenas a ler, escrever, cantar e tocar um instrumento musical. Isso se dava assim pela eficácia e pela velocidade com que as crianças absorviam os costumes da tradição católica.

Não se tinha visto índio nenhum em este reino que soubera que coisa era o solfejo, não se tinha ouvido a nenhum que cantara em igreja quando os padres da companhia de jesus em caxica empreenderam que seus indiozinhos fossem os primeiros cantores do Reino para oficiar as missas e cantar os ofícios divinos. Colocaram escola de ler e escrever, e atraíram os meninos lhes foram mostrando a letras para que as conheceram por seus nomes, e logo as foram formando com a pluma por suas figuras. Depois de conseguir isso lhes foram ensinando o canto chão e o órgão, lhes foram instruindo na música de flautas, chirimias, violones e outros instrumentos de harmonia sonora. (MERCADO, 1957, p. 101, tradução da autora)

Segundo Duran Peña (2013), os métodos utilizados pelos missionários para a catequese e a alfabetização foram o ideográfico21 e o fonético e, quanto à escrita, mesclavam hieróglifos22 e figuras que correspondiam às frases escritas.

O ensino de música, por sua vez, foi de caráter vocal e instrumental, destacando- se a instrução em órgão, flautas, chirimias, violones, harpa e outros variados instrumentos de corda, com o objetivo de interpretar o repertório religioso.

Os missionários jesuítas, para a realização de seu trabalho pedagógico, segundo Pacheco (1959), também utilizaram amplamente a língua chibcha ou muisca, a qual eles,

21 Representação de ideias por meio de sinais que reproduzem objetos concretos. 22 Ideograma figurativo que constitui a notação de certas escritas analíticas.

cientes da necessidade de evangelizar os indígenas, passaram a estudar com o objetivo de traduzir e imprimir algumas orações, o catecismo e até uma gramatica.

Foram produzidas peças de teatro em língua muisca, que eram apresentadas nas celebrações religiosas nos diversos povoados. Estas celebrações públicas eram utilizadas como uma estratégia de evangelização e foi amplamente empregada pelos missionários para atrair os adultos ao cristianismo.

Esses e outros registros históricos acerca da utilização da música no processo de conversão ao cristianismo nos demonstram que o ensino dessa arte foi parte importantíssima da educação implementada pelos missionários. No entanto, como veremos adiante com mais detalhes, essa estratégia também esteve presente em outros períodos pós- independência.

Diante disso, considerar a influência da Igreja Católica na constituição do sistema escolar colombiano e a utilização da música pelos missionários é fundamental para nossa argumentação sobre o ensino de música na escola pública colombiana.

Veremos nos próximos capítulos, após essa breve abordagem contextual, que inicialmente a constituição da escola pública colombiana foi amplamente inspirada nas práticas dos missionários e se desenvolveu graças aos convênios com pedagogos alemães. Enquanto o capítulo 3 tratará especificamente da escola e as práticas pedagógicas empregadas ao longo do nosso recorte histórico, o capítulo 4 se debruçará sobre o papel da música nessa escola, partindo da diferenciação entre manifestação artística e conteúdo escolar, paradigmas estabelecidos ao longo do tempo, principalmente pelo desenvolvimento da própria área musical.

CAPITULO III

3. CORRENTES PEDAGÓGICAS PREDOMINANTES NA