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1. HISTÓRIA DO ENSINO DA MÚSICA NAS ESCOLAS PÚBLICAS

1.3. Fontes, procedimentos e resultados esperados

A pesquisa realizada caracteriza-se como qualitativa, e a metodologia proposta é de análise documental e revisão bibliográfica. Como campo da pesquisa, elegemos momentos históricos-chave da escola pública colombiana para traçar um perfil do ensino de música nessas instituições. Devemos ressaltar, no entanto, que, por tratarmos de duas áreas do conhecimento (educação e música), nossa abordagem englobará as perspectivas históricas de ambas.

Diante disso, nossa pesquisa se mostra como fundamentalmente histórica e se embasará em fontes primárias. Sendo assim, estamos em consonância com tendências de pesquisas brasileiras que destacam a importância do uso e da organização de fontes primárias, como destaca Andreotti (2005, p. 7):

A realização de pesquisas que possam contribuir com a localização e sistematização de dados de fontes primárias e secundárias para a história da educação no Brasil é uma tarefa imprescindível para a pesquisa histórica, levando-se em conta que há ainda muito por fazer. Os trabalhos de levantamento de fontes que possam gerar bancos de dados, catálogos, inventários, coletâneas etc., facilitam a divulgação e o acesso às informações e são de grande valor para a pesquisa.

Antônio Joaquim Severino (2002, p. 145) enfatiza que o tema de pesquisa deve envolver uma problemática que diga respeito ao pesquisador, que lhe seja significativo.

Não, obviamente, num nível puramente sentimental, mas no nível da avaliação da relevância e da significação dos problemas abordados para o próprio pesquisador, em vista de sua relação com o universo que o envolve. A escolha de um tema de pesquisa, bem como a sua realização, necessariamente é um ato político. Também neste âmbito, não existe neutralidade.

Diante disso, nosso olhar se volta para o passado do meu país (Colômbia) e para o assunto – o ensino de música – que já considero parte de mim. Todavia esse nosso olhar para o ensino de música é crítico e não simplesmente descritivo e se faz importante, pois

a recuperação histórica do passado para entender problemas e interrogações postos no “agora” é importante para o pesquisador na

medida em que este passado contém muitos dos elementos constitutivos da realidade contemporânea. (NORONHA, 1998, p. 18, grifo do autor)

Nesse sentido, compreendo que, ao realizar uma pesquisa histórica, devemos ter consciência de que o objetivo da história é encontrar dados que expressem um significado do período estudado em diferentes aspectos: político, econômico e social. Ou como Del Priore (2001, p. 15) nos aponta:

Resgatar esse passado significa, primeiramente, dar voz aos documentos históricos, perquirindo-os nas suas menores marcas, exumando-os nas suas informações mais concretas ou mais modestas, iluminando as lembranças mais apagadas.

Assim, é importante a observação de diversos documentos que venham trazer informações sobre o tema específico bem como do contexto político, econômico, social do período pesquisado. Partindo dessa premissa é que, além dos documentos escolares e legislativos, buscamos, na coleta dos dados, analisar os livros didáticos, as partituras e os documentos sobre as instituições musicais que existiram na Colômbia, paralelamente às escolas, nos períodos abordados.

Isso porque por tratarmos de música não poderemos nos prender ao conteúdo específico abordado nas escolas, mas compreender como o ambiente musical local influenciou esse conteúdo, compondo assim um campo interconectado e fértil para a pesquisa.

Sobre as fontes musicais podemos destacar o livro Viva la Musica que foi criado como um guia de apoio para a disciplina de educação musical no nível primário. Em seu conteúdo, o livro traz uma coleção de canções infantis, tanto regionais como estrangeiras, propícias para crianças entre 5 e 10 anos de idade. As canções selecionadas exaltam aspectos do cotidiano, como: 1) a vida familiar; 2) a vida escolar; 3); o reino dos animais; 4) a bela natureza; 5) os campos de trabalho; 6) as canções patrióticas; 7) as canções de ninar; 8) e os villancicos.

O primeiro volume foi impresso no ano de 1971 e foi produzido até 1978, totalizando 144.000 exemplares. O segundo volume foi editado pela primeira vez em 1974 e alcançou também uma larga tiragem, totalizando até 1978, 39.000 exemplares, com a participação na confecção e na editoração do texto, de Cecilia Chaves, José Dueñas e Walter Dahl.

O formato deste texto pressupõe uma interessante proposta visual, que não era comum entre os livros da época. O formato de 24x16,5cm é preenchido com ilustrações

e partituras, indicando uma proposta visual clara para a composição gráfica de um livro didático.

Outra rica fonte consultada nesta pesquisa foi a coleção de partituras, contendo os cantos escolares, que se constituem pelos hinos patrióticos e canções que estimulavam o trabalho, a virtude, o ato de estudar, a família, os heróis pátrios e Deus, como por exemplo, os: canto a Bolívar, canto a Nariño, canto a los Héroes, canto saludo a Bolívar; Essa coleção foi publicada em 1934 pela biblioteca Aldeana, como um compêndio de 92 canções fáceis para os professores utilizarem em sala de aula, bem como conselhos sobre como proceder nas aulas de canto. A autoria das canções é atribuída a Carlos M. Torres (1833-1911), um músico boyacense, e remontaria aos anos de 1880, mas a coletânea teria sido realizada pelo catalão Marcelino de Castellví, um missionário capuchinho, que participou do ambicioso projeto colombiano do início do século XX, de catalogação folclórica.

Esse projeto viria a se chamar Campanha da Cultura Aldeã (ou Biblioteca

Aldeana), cujo objetivo era disseminar conhecimentos que permitissem transformar a

mentalidade da população colombiana e, ao mesmo tempo, levá-la a conhecer a realidade social.

Alguns autores analisam o movimento Biblioteca Aldeana como parte, dentro do contexto social e cultural da primeira metade do século XX na Colômbia, de uma rede articulada ao processo de modernização social e política, em linha com o surgimento da Estado-nação, que propunha modelar indivíduos e grupos sociais sob novos parâmetros culturais. Por meio dessa teia, disseminou-se uma rede de representações em que as elites legitimavam a hierarquia social e a política; a ideia de que os setores populares, como menores, exigiam a tutela das elites; e, que, em geral, as expectativas de vida deveriam estar em consonância com os modelos da Europa Ocidental.

Para finalizarmos os destaques sobre as fontes, citaremos os registros pedagógicos sobre o ensino de música, que são os programas para as aulas de canto das escolas elementares e primárias superior, de Alberto Bluhme, um dos mais notáveis pedagogos da primeira missão alemã, que também aparece em nosso trabalho como uma importante fonte, tanto pela época que foi escrita (1889), quanto pela quantidade de informações a respeito da disciplina.

Esse programa foi publicado na revista escolar El maestro de Escuela, como parte integrante do vasto conteúdo da edição, que era publicada a cada dois meses pela Secretaria de Instrução Pública, em Bogotá.

O documento traz detalhes acerca da prática do canto e conselhos a respeito da organização das aulas, como por exemplo: “aproveite o efeito possível de uma melodia, ou canção, já conhecida pelo aluno”, ou “escolha canções simples, de preferência em modo maior, com uma tessitura confortável para as crianças” (BLUME, 1889, p. 133). Além disso, o documento está dividido por subtítulo para indicar ao leitor aspectos destacáveis sobre o ensino de canto, como: “o que se aprende nos primeiros momentos nas escolas elementares? ”; “convêm cantar duetos nas escolas elementares? ”; “que condições a canção escolhida pelo professor deve seguir, para se cantar nas escolas elementares? ”.

Esses exemplos de títulos mostram a preocupação do autor sobre como o canto deveria ser abordado em sala de aula, e suas orientações são mais bem detalhadas ao longo do conteúdo relativo ao título. Além disso, do ponto de vista pedagógico, alguns títulos nos indicam posturas pedagógicas marcantes do escolanovismo e das correntes de ensino ativo de música, quando, por exemplo, recomenda aproveitar “o efeito possível de uma melodia, ou canção, já conhecida pelo aluno” (BLUME, 1889, p. 133). Por outro lado, a preocupação externada com aspectos técnicos nos mostra também a influência da música acadêmica, cultivada na Academia Nacional de Música.

A principal diferença entre as indicações para a escola elementar e a primária superior é a profundidade com que o assunto seria abordado em sala de aula. Enquanto para as escolas elementares, as canções a duas vozes eram as estruturas de maior complexidade recomendadas para os estudantes, para as escolas primárias superiores as atividades podiam ser realizadas com canções de três vozes.

O autor faz, no entanto, uma ressalva sobre a utilização de músicas com essa complexidade, pois “é difícil encontrar meninos cantores capazes de realizar a terceira voz” além também de “a música a três vozes não tem características da música popular, pois o canto a duas vozes é comum no mundo e por isso, é o canto das massas sociais” (BLUME, 1889, p. 135).

Essa explicação do autor acerca das canções a duas ou três vozes nos diz muito sobre o pensamento da época e o que poderíamos esperar do conteúdo e das práticas pedagógicas nas escolas públicas colombianas. Ficam claros o objetivo de dominação e doutrinação das classes populares nas escolas e o atestado de que não é possível trabalhar a verdadeira música nas escolas, apenas a música das “massas sociais”.

Diante disso, notamos a importância das fontes primárias para a pesquisa e como podemos extrair informações acerca não somente de nosso objeto, mas da visão de mundo presente na construção daquele conhecimento, ou como diz Saviani (2004, p. 29-30):

As fontes estão na origem, constituem o ponto de partida, a base, o ponto de apoio da construção historiográfica que é a reconstrução, no plano do conhecimento do objeto histórico estudado. Assim as fontes históricas não são a fonte da história, ou seja, não é delas que brota e flui a história. Elas, enquanto registros, enquanto testemunhos dos atos históricos, são as fontes do nosso conhecimento histórico, isto é, é delas que brota, é nelas que se apoia o conhecimento que produzimos a respeito da história.

Considerando as palavras de Saviani (2004), partimos das fontes com o intuito de construir um discurso histórico-pedagógico inspirado no método dialético que, segundo Gamboa (2003), assume a matriz filosófica do materialismo histórico, em que as pesquisas baseadas em seus pressupostos manifestam interesse de transformar. Esta postura epistemológica da pesquisa vai possibilitar o acesso ao conjunto de informação (fonte e pesquisas prévias) para, então, propor as reflexões e as ações em torno das mudanças desejadas. Ao buscarmos compreender as visões de mundo presentes nas fontes primárias, estamos, conforme nos orienta o método dialético, buscando reconstituir as relações para chegar a totalidade. Por isso investigamos os elementos da fundação da escola pública colombiana para compreender como se deu a relação entre o ensino de música e a educação no período estabelecido neste trabalho.

CAPITULO II

2. CONTEXTO HISTÓRICO DA SOCIEDADE COLOMBIANA NA