Em conjunto com a organização interna (mecanismos institucionais
endógenos) dos legislativos estaduais, outro fator que pode modelar o
comportamento dos parlamentares e a relação entre o executivo e o legislativo é o
sistema partidário.
As regras eleitorais no Brasil geram uma relação entre partidos
fracos e deputados individualistas. Nos sistemas eleitorais majoritários, que elegem
um representante por distrito eleitoral (sistema do distrito uninominal), vale o
princípio da maioria (seja maioria simples, seja maioria absoluta): ganha o
candidato/partido que obtiver o maior número de votos. Já nos sistemas de
representação proporcional de lista existem diversas maneiras de definir quais
candidatos ocuparão as vagas obtidas pelo partido. No Brasil existe a lista aberta,
onde os partidos apresentam um conjunto de candidatos sem ordem de preferência
e os eleitores têm a opção de votar ou no candidato ou no partido. Este sistema de
lista aberta estimula a predominância da reputação individual do candidato em
detrimento do partido (Carey & Shugart, 1995).
Como em outras unidades da federação, no Paraná as eleições são
regidas pelo sistema eleitoral proporcional de lista aberta, sendo permitida a
coligação entre partidos. O distrito eleitoral é o próprio estado, que contava nas
eleições de 03 de outubro de 1998 com um total de 6.384.210 eleitores, dos quais
5.035.883 (78,88%) compareceram às urnas. Apresentaram-se nas eleições 411
candidatos para as 54 vagas de deputado estadual, o que configura um grau de
competitividade eleitoral de 7,6 candidatos por vaga
35.
O Governador de Estado, Jaime Lerner, reelegeu-se com 52,21%
dos votos válidos (40,34% do total do colégio eleitoral) por uma coligação integrada
por 14 partidos: PPB/ PTB/ PSL/ PST/ PTN/ PSC/ PL/ PPS/ PFL/ PRN/ PSB/ PSD/
PRP/ PTdoB, derrotando o governador Roberto Requião, da coligação PMDB/ PDT/
PT/ PCdoB além de outros partidos menores, que obteve 45,91 % dos votos válidos
(ou 35,47% do colégio eleitoral).
Dadas as características da legislação eleitoral brasileira, como já
havíamos ressaltado, há um forte estímulo para o desenvolvimento de um quadro
partidário fragmentado, que é ainda mais acentuado no caso dos parlamentos
estaduais. Em todo o país, os deputados estaduais são escolhidos pelo sistema de
representação proporcional com listas partidárias abertas, o que incentiva a
competição interna entre os partidos e reforça a idéia do personalismo.
A plena liberdade para a formação de coligações, por outro lado,
propicia a representação de legendas com pouca expressividade eleitoral, o que
fragmenta ainda mais o sistema partidário. A realização de eleições para o
Legislativo coincidente com as eleições para o Executivo, ao contrário do que pode
parecer, não parece minimizar esse efeito. Isso pode causar uma certa confusão
para o eleitor, que não recebe informações suficientes sobre coligações ou forma de
distribuição de cadeiras.
As trocas de legenda durante o mandato também dificultam a
identificação partidária. A mudança de partido no Brasil vem sendo comum desde a
redemocratização em 1985 (Melo, 2000). Tal prática atinge o conjunto de partidos
políticos, independentemente da ideologia ou composição social e afeta todos os
níveis do sistema representativo (federal, estadual e municipal)
36. Como se pode
verificar na tabela abaixo, a ALEP não fugiu a essa regra.
Tabela 1 – % de Cadeiras por Partido e Blocos Ideológicos, Assembléia Legislativa do Paraná (1998-2002) 1998* 1999 2000 2001 2002** Bloco Ideológico Governo X Oposição Partidos N % N % N % N % N % Bancada Média no Mandato PFL 12 22,22 9 16,67 9 16,67 9 16,67 8 14,8 9 PPB 8 14,81 7 12,96 4 7,41 6 11,11 6 11,11 5,75 PTB 11 20,37 11 20,37 11 20,37 6 11,11 5 9,26 8,25 PSC 1 1,85 1 1,85 1 1,85 ⎯ ⎯ 1 1,85 0,75 PL ⎯ ⎯ 2 3,7 2 3,7 2 3,7 3 5,56 2 PSL ⎯ ⎯ 1 1,85 4 7,41 3 5,56 3 5,56 2,75 Direita PST ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ 1 1,85 ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ 0,25 PSDB 6 11,11 7 12,96 6 11,11 8 14,81 8 14,81 7,25 PPS ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ 2 3,7 2 3,7 1 Bancada Governista PSB 2 3,7 2 3,7 3 5,56 ⎯ ⎯ ⎯ ⎯ 1,25 Centro PMDB 7 12,96 7 12,96 7 12,96 8 14,81 8 14,81 7,5 Oposição PT 4 7,41 4 7,41 4 7,41 4 7,41 4 7,41 4 Esquerda Independente PDT 3 5,56 3 5,56 2 3,7 6 11,11 6 11,11 4,25 TOTAL 54 100 54 100 54 100 54 100 54 100 54 Índice de Fracionalização Parlamentar*** 0,85 0,87 0,88 0,87 0,88 0,87 Nº Efetivo de Partidos Parlamentares*** 6,67 7,59 8,33 8,33 8,58 8,2
Fonte: Tabela adaptada e atualizada a partir de Cervi & Codato (2002). * Resultado das eleições de 4 de outubro de 1998.
** Situação no final da legislatura, em dezembro de 2002
*** A fórmula para mensurar a “fracionalização parlamentar” se expressa: F = 1 – Σ ( pe2 ), onde pe é a % de cadeiras ocupadas por partido. Tem por objetivo medir a dispersão partidária de um parlamento, e indica qual a probabilidade de dois parlamentares desse parlamento, tomados ao acaso, pertencerem a partidos diferentes. A fórmula para se obter o “número efetivo de partidos” = 1 / (Σpe2). As fórmulas se encontram em W. G. Santos, 2002, p. 14.
36
O número de deputados federais que abandonaram o partido pelo qual foram eleitos é
impressionante: entre 1985 e 1998, nada menos do que 686 dos 2329 deputados (29,5%), entre
titulares e suplentes, mudaram ao menos uma vez de partido na Câmara. Dentre os 686 migrantes,
diversos mudaram de partido mais de uma vez durante uma mesma legislatura. Noventa e cinco
congressistas trocaram de legenda pelo menos duas vezes; outros dezenove deputados pelo menos
três vezes, enquanto quatro congressistas migraram quatro vezes ou mais. Computadas todas as
mudanças realizadas pelos deputados na Câmara, nas quatro legislaturas analisadas, chega-se a um
total de 812 migrações (Melo, 2000).
Dos treze partidos que tiveram representação na Casa durante a
legislatura de 1999 a 2002, apenas o PT não apresentou variação na sua bancada
em toda a legislatura. As altas variações nas bancadas coincidem com o grande
número de parlamentares que migraram de partido na 14ª legislatura. Dos 62
deputados que passaram pela ALEP durante o período, nada mais nada menos que
27 deles (43,5%) trocaram de partido ao menos uma vez de legenda. A baixa
identidade partidária e independência dos candidatos geram condições favoráveis a
um comportamento individualista dos parlamentares, que optam pelas alternativas
de ação capazes de maximizar suas chances de sucesso na carreira política.
Como se pode verificar, ao longo da 14ª legislatura, é muito alto o
nível de fragmentação da ALEP: ficou em torno de 0,87. O número de partidos
efetivos no início da legislatura era de aproximadamente 6,67 e no final da
legislatura subiu para 8,58 (um número bastante alto ao qual Sartori denominaria um
sistema político de pluralismo fragmentado).
Foi o próprio partido do governador, o PFL, que conseguiu eleger a
maior bancada da Assembléia Legislativa em 1998. Foram 12 cadeiras ocupadas
contra 11 do PTB e 8 do PPB. Os três maiores partidos em número de deputados,
somando 31 deputados (57,5% do total), fizeram parte da coligação de apoio à
reeleição do governador Jaime Lerner
37. Portanto, somente com o apoio da
coligação foi possível garantir a maioria parlamentar, isolando os demais partidos de
oposição. A oposição ficou com apenas 26% das vagas depois da eleição,
distribuídas da seguinte forma: sete do PMDB, quatro do PT e três do PDT.
O partido do governador também ganhou outros poderes na esfera
governamental. Elegeu pela primeira vez o presidente da Assembléia Legislativa do
Paraná, Aníbal Khury
38, um cargo bastante estratégico. Também passou a contar
37
Os partidos que não fizeram parte da coligação mas que dão apoio ao Executivo são o PSB com
dois deputados eleitos, o PSC com uma cadeira e o PSDB com seis, somando mais 16,5% das
vagas. Vale ressaltar que um deputado do PSDB sempre se posicionou contrário à maioria da
bancada e vota contra o governo.
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