Neste item vamos efetuar cruzamentos entre os padrões de
recrutamento dos vários grupos e subgrupos de parlamentares representados na
ALEP e seu comportamento político, tal como indicado por sua atividade legislativa,
principalmente no que se refere à taxa de aprovação de seus projetos.
Tal análise nos possibilitará verificar se existem alguns atributos
individuais dos parlamentares que explicam a capacidade de fazer aprovar leis,
indicando uma eventual “lógica oculta” à organização do processo decisório da
ALEP. Nosso objetivo é verificar se existem certos atributos individuais dos
congressistas que se constituem em um diferencial extra na probabilidade de ver
aprovados seus projetos de lei. Isso também nos permitirá verificar se as
formulações do “Modelo de Segredo Ineficiente Revisto” (MSR), tal como proposto
em Braga (2006) sobre o comportamento parlamentar e, eventualmente, sobre o
comportamento do eleitor, são válidas, e em que medida, nas esferas subnacionais
de governo.
Conforme propõe o autor, duas são as questões centrais que
derivam da problemática analítica aberta pelos autores do “MSR” e que servem para
a testar a validade de suas proposições básicas para explicar o comportamento
parlamentar também nas esferas subnacionais de governo:
1) Existem diferenças significativas no comportamento parlamentar
dos vários partidos representados na ALEP?
2) Tais diferenças são, de alguma forma, percebidas pelo eleitor, ou
seja, as diferenças de comportamento dos partidos na arena legislativa são de
alguma forma percebidas pelo eleitor médio na arena eleitoral, que assim pune ou
recompensa os parlamentares em virtude de seu comportamento na arena
legislativa?
Procuraremos responder às duas perguntas sinteticamente,
efetuando alguns cruzamentos simples, visto que ainda não dominamos os
requisitos necessários para efetuar testes mais sofisticados como as estimativas
probabilísticas logit realizados por Amorim Neto & Santos (2002; 2003), ou
regressões logísticas tais como as efetuadas por Pereira e Müeller (2003). Ficamos,
portanto, devendo ao leitor testes estatísticos mais complexos para a confirmação do
MSR neste nível de governo.
Nossa suposição baseia-se em uma proposição simples: conseguem
aprovar seus projetos de lei aqueles deputados que possuem motivação e recursos
políticos para tanto (Amorim Neto & Santos, 2002). Fazer parte da base governista é
um recurso bastante importante para transformar um projeto em lei e é facilmente
perceptível. Aqueles partidos que apóiam o governo contam com um diferencial
extra na probabilidade de ver aprovados seus projetos de lei, já aqueles que optam
por não compactuar com o Executivo sofrem as duras penas de ver a maioria de
seus projetos vetados, arquivados ou rejeitados, é o preço que se paga por não
compactuar com o Executivo.
Tabela 14 – Taxa de aprovação versus alinhamento em relação ao governo
Alta Baixa Total N % N % N %
Fortemente governista 24 75,00% 8 25,00% 32 100,00%
Moderadamente governista 4 28,57% 10 71,43% 14 100,00%
Oposição 4 25,00% 12 75,00% 16 100,00%
Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Nota: Alinhamento em relação ao governo (Ver Anexo VI):
Fortemente governista: partidos que eram da base governista e que votaram à favor da privatização da Copel
Moderadamente governista:partidos que eram da base governista mas que votaram contra a privatização da Copel
Oposição: partidos oposicionistas e que votaram contra a privatização da Copel
Realmente, a tabela mostra que há uma forte correlação entre
pertencimento à base de sustentação do governo e a taxa de aprovação de projetos
de lei apresentados: 24 dos 32 deputados fortemente governistas tiveram altas taxas
de aprovação de seus projetos, enquanto que os deputados da oposição tiveram
taxas baixas de aprovação. Ou seja, ter pertencido à ala governista teve certa
influência na capacidade de fazer aprovar projetos de lei. Ao contrário do que ocorre
no Legislativo nacional, a serem corretos os experimentos e testes estatísticos
realizados por Amorim Neto & Santos, os partidos políticos e a clivagem governo X
oposição afetam significativamente a taxa de aprovação de proposições por parte
dos parlamentares no caso do legislativo paranaense. Ou seja: há uma lógica
“partidária” funcionando no legislativo paranaense, originando um padrão mais
complexo de comportamento parlamentar do que aquele tradicionalmente descrito
pela literatura.
Entretanto, podemos verificar que outros fatores, além deste
anteriormente apontado, estão correlacionados com a taxa de aprovação de
projetos, ainda que numa relação mais fraca do que em relação ao alinhamento em
relação ao governo. Como por exemplo o tamanho da bancada:
Tabela 15 – Taxa de aprovação versus tamanho do partido
Alta Baixa Total
N % N % N % Grande 24 60,00% 16 40,00% 40 100,00% Médio 6 35,29% 11 64,71% 17 100,00% Pequeno 2 40,00% 3 60,00% 5 100,00% Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Nota – Tamanho do Partido Representação:
Grande: Bancada média acima de 12%: PFL, PTB, PMDB e PSDB.
Médio: Bancada média entre 7 e 12%: PPB, PDT e PT.
Pequeno:Bancada média abaixo de 7%: PSL, PSB e PSC.
Pode-se afirmar, a partir dos dados da tabela acima, que o tamanho
do partido influenciava a aprovação dos projetos de lei, ou seja, ter pertencido aos
grandes partidos da Assembléia fazia a diferença na capacidade de fazer aprovar
projetos de lei.
O cruzamento da variável ideologia com a taxa de aprovação dos
projetos pode nos dar uma outra informação a respeito da dinâmica partidária no
estado do Paraná. Assim como ter pertencido aos grandes partidos da Assembléia
alterava a capacidade de fazer aprovar projetos de lei, o mesmo pode se dito em
relação à posição ideológica do partido no espectro direita-centro-esquerda. Os
partidos de direita apresentam, proporcionalmente, uma taxa maior de aprovação de
seus projetos em relação aos partidos situados mais à esquerda.
Tabela 16 – Taxa de aprovação versus ideologia partidária
Alta Baixa Total
N % N % N % Esquerda 2 22,22% 7 77,78% 9 100,00% Centro 6 35,29% 11 64,71% 17 100,00% Direita 24 66,67% 12 33,33% 36 100,00% Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Os indicadores acima reforçam a caracterização daquilo que
poderíamos denominar de natureza de classe do presidencialismo pluripartidário
brasileiro, na medida em que este arranjo tende a dificultar a execução de agendas
de partidos mais à esquerda elaboradas em bases partidárias e programáticas,
embora não seja necessariamente incompatível com a eleição de candidatos
situados mais ao centro ou à esquerda do espectro ideológico.
Cruzamos também, a taxa de aprovação dos projetos com a
ocupação ou não nos postos no legislativo e executivo respectivamente. Para medir
essas variáveis, averiguamos se cada deputado havia ou não ocupado, pelo menos
uma vez, cargos nestes dois Poderes.
Tabela 17 – Taxa de aprovação versus ocupação em cargos no legislativo ou não
Alta Baixa Total
N % N % N %
Não ocupou 2 28,57% 5 71,43% 7 100,00%
Ocupou 30 54,55% 25 45,45% 55 100,00%
Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
A ocupação em cargos no legislativo, seja como vereador, deputado
estadual ou mesmo de deputado federal, afeta a capacidade em aprovar os projetos.
Quem ocupou esses cargos têm mais chances de verem aprovados seus projetos lei
do que aqueles que nunca ocuparam ao menos um destes cargos. Isso se dá
porque a experiência anterior em cargos legislativos oferece uma certa
especialização técnica aos deputados, o que lhes permite desenvolver uma
atividade legislativa mais eficiente.
Neste sentido, é plausível também conjeturar que aqueles
deputados que tenham tido alguma experiência no Executivo disponham de um
recurso escasso na Assembléia, recurso este que poderia ser de fundamental
utilidade na atividade legislativa (Amorim Neto e Santos, 2002). Realmente, como se
pode observar na tabela abaixo, o exercício de cargos no Executivo está associado
à capacidade que possuem os deputados de fazer aprovar seus projetos de lei.
Dentre aqueles que ocuparam algum cargo no Executivo, seja como prefeito ou
vice-prefeitos, aproximadamente 68% tiveram uma boa taxa de aprovação de projetos.
Essa mesma taxa cai para 44% entre aqueles que nunca ocuparam estes postos.
Tabela 18 – Taxa de aprovação versus ocupação em cargos no executivo ou não
Alta Baixa Total
N % N % N %
Não ocupou 19 44,19% 24 55,81% 43 100,00%
Ocupou 13 68,42% 6 31,58% 19 100,00%
Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Esses dados confirmam mais uma vez que ocorre na ALEP um
padrão bastante distinto de comportamento parlamentar e de relação entre os
poderes do que aquele observado pelos analistas citados em escala nacional.
Além dos recursos acima listados, poderíamos inferir que a
ocupação de cargos na estrutura burocrática da ALEP (cargos na Mesa, membro da
CCJ ou líder partidário), é também reveladora da influência e capacidade de
articulação política de um deputado. Um cargo fornece a seu ocupante recursos
adicionais para que obtenha o apoio de seus pares para suas propostas políticas
específicas, propostas, em geral, traduzidas em projetos de lei (Amorim Neto e
Santos, 2002). Ou seja, exercer um cargo na estrutura burocrática, em tese, deveria
estar positivamente associado à capacidade de fazer aprovar projetos de lei.
Tabela 19 – Taxa de aprovação versus ocupação em cargos burocráticos na ALEP ou não
Alta Baixa Total N % N % N % Não ocupou 16 48,48% 17 51,52% 33 100,00% Ocupou 16 55,17% 13 44,83% 29 100,00% Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Pela tabela acima não podemos perceber diferenças nas taxas de
aprovação entre aqueles deputados que foram ou membros da Mesa da
Assembléia, líderes partidários ou presidentes de comissões permanentes daqueles
que não exerceram nenhum desses papéis na ALEP: não há relação significativa
entre a ocupação de tais cargos e a taxa de aprovação de proposições.
Para que não restem dúvidas, inserimos também a variável
interveniente “alinhamento em relação ao governo”.
Tabela 20 – Posição de poder X taxa de aprovação de Projetos de lei
Alta Baixa Total
N % N % N % Situação 15 71,43% 6 28,57% 21 100,00% Ocupou Cargo Oposição 1 12,50% 7 87,50% 8 100,00% Situação 13 52,00% 12 48,00% 25 100,00% Não Ocupou Cargo
Oposição 3 37,50% 5 62,50% 8 100,00%
Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Quando efetuamos o cruzamento entre as duas variáveis podemos
perceber que os parlamentares da base governista e que ocuparam cargos na
estrutura de poder da casa tendem a apresentar uma taxa mais elevada de
aprovação de proposições legislativas, evidenciando que “os partidos contam” na
organização de poder da casa. No pólo simétrico, estão localizados os deputados
que não ocuparam cargos e pertenceram a partidos de oposição ao governo, que
tendem a apresentar taxas menores de aprovação de proposições legislativas.
Também aqui se verifica que o alinhamento com o governo afeta significativamente
a taxa de aprovação de proposições, com maior intensidade do que a ocupação de
cargos na estrutura de poder da Assembléia.
Um outro recurso fundamental que pode contar o deputado é a
longevidade de sua carreira na Assembléia. Quanto mais tempo um deputado tem
de Assembléia, mais tempo tem para: (i) acompanhar a tramitação de um projeto de
sua autoria; (ii) familiarizar-se com as regras formais e informais do processo
legislativo; (iii) especializar-se em algum tema de políticas públicas; (iv) conhecer as
preferências de outros deputados, partidos e correntes políticas; (v) aprender a fazer
acordos com seus colegas; (vi) adquirir prestígio e, portanto, influência perante os
seus pares (Amorim Neto & Santos, 2002, p.111). Portanto, podemos argumentar
que, quanto mais longeva for a carreira de um deputado, maiores as suas chances
de ver aprovado um projeto de lei de sua autoria.
Tabela 21 – Taxa de aprovação versus média de permanência na ALEP
Alta Baixa Total
N % N % N %
Abaixo da média 17 47,22% 19 52,78% 36 100,00%
Acima da média 15 57,69% 11 42,31% 26 100,00%
Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas Nota – Tempo de carreira na ALEP: média de 6,65 anos
A tabela acima revela que aqueles deputados que tinham carreira
política na ALEP acima da média, conseguiam taxas mais altas de aprovação
vis-à-vis àqueles que tiveram uma estada média abaixo de 6,65 anos, embora essa
diferença não seja tão significativa assim.
Por fim, um último recurso relevante levantado por nós deriva
também de uma variável apresentada por Amorim Neto e Fabiano Santos (2002), ou
seja, a força eleitoral do parlamentar. Como colocam os autores: “existe uma
convenção não escrita, no Congresso, que determina que os parlamentares com
maior peso eleitoral devam receber maior atenção e deferência dos seus pares.
Afinal de contas, como todos os deputados devem sua presença na Câmara aos
votos que receberam, é natural que o seu peso eleitoral se traduza em influência
política” (Amorim Neto & Santos, 2002, p. 112). Reproduzimos essa mesma idéia na
ALEP, sendo que para medir a força eleitoral de cada parlamentar, utilizamos como
medida o número total de votos obtido pelo deputado
50.
Tabela 22 – Taxa de aprovação versus média de votos
Alta Baixa Total N % N % N % Abaixo 14 40,00% 21 60,00% 35 100,00% Acima 18 66,67% 9 33,33% 27 100,00% Total 32 51,61% 30 48,39% 62 100,00%
Fonte: Núcleo de Pesquisa Democracia e Instituições Políticas
Nota – Total geral: média de 34.949,98 votos por cada deputado.