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E m seus aspectos gerais, pode-se argum entar que as consequências de práticas culturais são aquelas que produzem algum efeito sobre o grupo que as pratica. Esses efeitos podem apresentar ou não um a contribuição para o fortalecim ento de u m a cultura. Skinner (1981) destacou que é o efeito no grupo, e não as consequências reforçadoras para membros individuais, o responsável pela evolução das culturas.

Q uando passamos a tratar das consequências de práticas culturais, a distinção entre um a contingência de reforça­ m ento e u m a contingência cultural deve ficar clara. O prim eiro tipo, p ertencente exclusivamente ao segundo nível de seleção, refere-se à relação de contingência esta­ belecida em um a classe de respostas e um a consequência com um — é o que entendem os com o contingências de reforçam ento. O segundo tipo, este sim pertencente ao terceiro nível de seleção, refere-se à relação de contingência estabelecida em u m a classe de operantes e, agora, um a consequência cultural com um . N o segundo caso, para prover explicações sobre as relações entre contingências que produzem consequências para a cultura, Glenn (1986) c u n h o u o conceito de m etacontingência, que seria um novo conceito, u m a unidade de análise, para descrever e, assim, explicar aquilo que Skinner (1971/2002, 1981) determ inou com o sendo as práticas de um a cultura e a seleção no terceiro nível.4

Posteriorm ente, G lenn (1988) denom inou as conse­ quências que produzem efeito sobre o fortalecim ento das culturas como sendo os produtos agregados de contingên­ cias entrelaçadas de reforçamento. Assim, para com preen­ dermos m elhor o conceito de metacontingência, Andery e Sério (1997/2005) ressaltaram três “aspectos” que devem ser compreendidos. Primeiro, o que seriam as contingên­ cias comportamentais entrelaçadas; segundo, o que seriam as práticas culturais; e terceiro, o que seriam os produtos de tais práticas. Vejamos mais de perto esses aspectos.

4Embora o conceito de metacontingência ainda seja incipiente na Análise do Comportam ento quando o foco é a análise da cultura e é um conceito que ainda provoca debates e controvérsias, trataremos no decorrer do capí­ tulo sobre esse conceito com o objetivo de ampliar nossa análise sobre os fenômenos com portam entais que perpassam o nível cultural. Detalhes sobre o conceito de metacontingência serão abordados no tópico 2 deste capítulo.

172 Temas Clássicos da Psicologia sob a Ótica da Análise do Comportamento

Ressalta-se que, ao tratar das relações em um a metacon- tingência, estamos no cam po do com portam ento social em que o reforço é m ediado pelo com po rtam ento de outros indivíduos. Skinner (1953/1965, p. 297) definiu o com portam ento social como “o com portam ento de duas ou mais pessoas em relação a um a outra ou em conjunto em relação a um ambiente comum”. Neste caso, o compor­ tamento de um indivíduo pode passar a ter a função de estí­ mulo discriminativo ou de consequência para o com por­ tam ento de outro indivíduo.

A p artir da definição de com po rtam en to social de Skinner (1953/1965), G lenn (1988, 1991) defendeu que, em contingências entrelaçadas de reforçamento, o compor­ tam ento do indivíduo teria tanto o papel de ação como o de am biente (para o com portam ento de outros). Esse “duplo papel” que o com portam ento de cada indivíduo desempenha nos processos sociais define as “contingências entrelaçadas de reforçamento”. Passando às práticas cultu­ rais, G lenn (1988, p. 167) as define como u m conjunto dessas contingências entrelaçadas:

“Em resumo, um a prática cultural é um conjunto de contingências entrelaçadas de reforçamento no qual o com portam ento e os p rodutos com por­ tam entais de cada participante funcionam como eventos am bientais com os quais os com porta­ m entos de outros indivíduos interagem .” Deste m odo, um a prática cultural envolve as contin­ gências entrelaçadas entre os com portam entos operantes de cada indivíduo; assim, produz consequências refor­ çadoras. Mas, além disso, um a prática cultural tam bém produz feitos agregados como produtos de práticas cultu­ rais e esses p rodutos terão um papel sobre o fortaleci­ m ento ou não de um a cultura (Glenn, 1988). É im por­ tante salientar que tais conceitos foram introduzidos por G lenn (1986, 1988, 1991) para m elhor se com preender os fenôm enos com portam entais no cam po da cultura, o que implica com preenderm os m elhor o terceiro nível de seleção e variação pelas consequências, proposto por Skinner (1981). Assim, quando a autora desenvolveu tais conceitos, ela os introduziu nesse modelo causal. Com isso, G lenn (1988) defendeu que no terceiro nível de variação e seleção são os produtos agregados que com o “conse­ quências de práticas culturais” selecionam tais práticas. Andery, M icheleto e Sério (2005, p. 135) esclarecem-nos: “(...) estaremos diante de um a m etacontingência se, de algum m odo, o pro d u to agregado - que é dependente destas contingências entrelaçadas - retroagir sobre elas

selecionando-as”. Além disso, essas autoras salientaram que o conjunto das contingências entrelaçadas, no caso da m etacontingência, sugere que estas contingências consti­ tuem um a unidade, e é sobre esta unidade que retroage o efeito do produto agregado. Portanto, o produto agregado produz um efeito sobre o grupo, ou seja, sobre as contin­ gências entrelaçadas de reforçamento. Segundo G lenn e Malagodi (1991), o produto agregado, como consequência de um a prática cultural, causa mudanças ambientais que podem (im ediatam ente, gradualmente ou a longo prazo) fortalecer ou enfraquecer as contingências entrelaçadas de reforçamento (que envolvem necessariamente o com por­ tam ento social), e é nesse sentido que o produto agregado pode selecionar as práticas culturais.

Vejamos um exemplo da autora. U m a prática para a diminuição da poluição do ar implicaria com portam entos operantes de vários indivíduos, cada qual produzindo consequências imediatas de reforço. Assim, os engenheiros engajam-se em comportamentos operantes necessários para a construção de catalisadores para o escapamento de auto­ móveis; na linha de montagem, os trabalhadores constroem efetivamente tais catalisadores; consumidores com pram esses automóveis. C ada um desses com portam entos deve apresentar consequências reforçadoras, ou evitar conse­ quências aversivas; en tretanto, o efeito longínquo do conjunto desses operantes em conjunto pode ser a redução da poluição do ar. Estaríam os, agora, tratando de um a consequência que afeta o fortalecimento daquela cultura, ou seja, entramos no campo das metacontingências. Nesse caso, o produto agregado da prática cultural poderia ser a dim inuição da poluição do ar (Glenn, 1986).

Cabe ressaltar que, como salientou M artone (2008), o próprio conceito de m etacontingência sofreu m udanças a partir de sua primeira versão (Glenn, 1986), e a unidade de análise e seleção ficou mais clara. Três momentos no desen­ volvimento desse conceito são: primeiro, um a ênfase no processo seletivo do entrelaçamento de m uitos operantes que possibilita a transmissão de padrões comportamentais através do tem po (Glenn, 1988); segundo, a descrição das funções de diferentes efeitos ambientais produzidos pelo entrelaçam ento (Glenn, M alott, 2004); e terceiro, um a diferenciação mais clara entre os processos seletivos que ocorrem no nível do indivíduo e aqueles que ocorrem no nível da cultura, estabelecendo relações de m acrocontin- gências e m etacontingências, respectivam ente (M alott, G lenn, 2006). Assim, temos que na m acrocontingência diferentes indivíduos se com portam e emitem o mesmo com portam ento, entretanto, os com portam entos dos

indivíduos são “independentes” uns dos outros, embora produzam consequências que afetam a cultura. N a meta- contingência, os com portam entos dos indivíduos que participam de contingências entrelaçadas são “depen­ dentes” uns dos outros, e o que é selecionado e transm i­ tido entre gerações é a relação entre os indivíduos.

U m a questão interessante que Skinner (1953/1965; 1974/1976; 1989) levantou quando o foco é um a prática cultural e a seleção no terceiro nível, foi sobre as conse­ quências a longo prazo e consequências im ediatas do com portam ento.

O com portam ento operante dos indivíduos, que parti­ cipam dos diversos operantes para a constituição de um a prática cultural, pode produzir vários reforçadores indi­ viduais e consequências que interferem na sobrevivência da cultura. Esses efeitos, como consequências de práticas culturais, podem retroagir sobre o comportamento do indi­ víduo, selecionando operantes, ou pode nunca retroagir, e, assim, as consequências seriam tão longínquas que pode­ riam ultrapassar o tem po de vida do organismo. Vejamos Skinner (1971/2002, p. 135-136):

“Em um plano quinquenal ou em um program a de austeridade, as pessoas são induzidas a traba­ lhar duram ente e abandonar determ inados tipos de reforçadores em troca de promessas de outros reforçadores a serem recebidos posteriorm ente. (...) As honras concedidas aos heróis sobrevivem a eles sob a form a de m onum entos. A riqueza e o conhecimento acumulados sobrevivem a quem os acumula. (...) O indivíduo não é, naturalm ente, diretam ente afetado por tais coisas; ele apenas se beneficia dos reforços condicionados utilizados pelos demais m em bros de sua cultura que a ele sobrevivem e são por eles diretam ente afetados.” Nesse próxim o tópico, os conceitos de contingências e m etacontingências serão tratados com mais detalhes. As unidades de análises que descrevem cada um destes conceitos serão apresentadas no âm bito do terceiro nível de seleção pelas consequências - a cultura.

U N ID A D E S DE ANÁLISE N O