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As Exposições Universais, parte importante do processo para a

4 A ANTESSALA DA EDUCAÇÃO NA COMUNA DE PARIS

4.3 O FÉRTIL TERRENO PEDAGÓGICO: ELEMENTOS IMPORTANTES QUE

4.3.3 As Exposições Universais, parte importante do processo para a

A síntese apresentada pela classe trabalhadora ao final dos anos de 1870 pode ser melhor compreendida a partir de uma análise das discussões e disputas presentes nas Exposições Universais, na Associação Internacional dos Trabalhadores e nos debates realizados pelas reuniões públicas (1868-1871). Espaços estes forjadas pela vanguarda da classe trabalhadora.

As exposições universais surgiram a partir dos anos de 1851. Até então, foi possível perceber, em países como Inglaterra e França, experiências de exposições de caráter nacional, regional, com o objetivo de expor os avanços técnicos e estéticos da produção industrial dos respectivos países. Apenas em 1851, as exposições assumem um caráter mundial. Apesar da supremacia inglesa no que se refere ao desenvolvimento industrial, a exposição contatava com a participação de muitos países, inclusive para além do continente europeu, como os da América Latina, com a participação de Chile, Argentina e Brasil, mas era totalmente controlada por países europeus.

Uma questão colocada por Édouard Vasseur (2005) em seu artigo Pourquoi

organiser des Expositions Universelles? Le succès de l’exposition universelle de 1867

evidencia o debate a respeito da função destas Exposições

“(...) as manifestações são um reflexo fiel da situação econômica e social de um país economicamente avançado ou constituem uma gigantesca mise en scène orquestrada em função de uma mensagem desejada pelo Estado organizador e participante e seus atores econômicos?” (VASSEUR, 2005, p. 575)58.

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“(...) ces manifestations ont-elles été un reflet fidèle de la situation économique et sociale des pays économiquement avances où ont-elles constitué une gigantesque mise en scène orchestrée en fonction d’un message voulu par les États organisateurs et participants et leurs acteur économiques?”

Vasseur (2005) de modo bem interessante apresenta uma problemática cuja resposta já consta em seu seio. É possível identificar que as Exposições representaram de modo articulado as duas posições narradas, que não são contraditórias e excludentes. As Exposições objetivavam expressar o desenvolvimento industrial existente em cada país, no entanto, haviam elementos políticos propagandísticos em relação a imagem a ser projetada para o mundo, de modo a externar e espalhar a sua pretensa posição sobre o mercado econômico mundial.

Em 1851, a Exposição ocorreu em Londres pela iniciativa da Sociedade das Artes, Manufatura e Comércio. Contou com 17 mil expositores e 6 milhões de visitantes. No ano de 1855, aconteceu em Paris, onde havia 24 mil expositores e 5 milhões de visitantes. Em 1862, a exposição ocorreu novamente em Londres, com 27 mil expositores e 6 milhões de visitantes. A última, que antecedeu a Comuna de Paris, ocorreu em 1867 em Paris, teve 52 mil expositores e 11 milhões de visitantes59.

É possível constatar um aumento significativo em relação à quantidade de expositores ao longo dos anos, todavia, é possível identificar, no ano de 1867, um salto grande em relação aos expositores e visitantes. Isso se explica pelo contexto histórico que representa um determinado estágio do capital, e coincide com “(...) a fase liberal de desregulamentação do sistema alfandegário protecionista criado pelos governos a fim de promover o desenvolvimento industrial nos países” (VASSEUR, 2005, p. 575)60. Nesse sentido, estudar a exposição de 1867 possibilita aglutinar mais elementos para a compressão do que foi o Segundo Império, e o desejo de liberalização do regime por Napoleão III.

Esta política de imprimir um caráter liberal ao Império, levou Napoleão a fazer concessões aos trabalhadores e movimentos sindicais, ampliando sua participação nas

59 «Expositions Universelles (1851, 1855, 1862, 1867…)», in: Correspondance familiale, vie économique, [En

ligne]. URL : http://correspondancefamiliale.ehess.fr/document.php?id=4370. .

60 “ (..) la phrase Libérale de déréglementation du système douanier protectionniste mis en place par les

Exposições Universais. Afinal, a principal mercadoria, a força de trabalho, seria objeto de julgamento, uma vez que a produção depende diretamente destes sujeitos que garantem a sua existência e sua ampliação, no que se refere ao processo de valorização ou, ainda, de criação de Capital. A presença dos operários obrigou, de certa forma, as Exposições a debaterem a formação da mão de obra. A tese do capital humano, ainda em germe, já estava presente no sentido de compreender a necessidade objetiva de garantir a formação de um setor fundamental para o desenvolvimento e crescimento do poderio industrial das Nações em questão.

Georges Duveau (1948) centra sua análise nas Exposições Universais do Segundo Império, principalmente a partir de 1862, quando o debate sobre instrução e educação aparece com maior peso político no interior das Exposições. As delegações eram organizadas por ramos da indústria. Em 1862, o debate sobre instrução ainda era incipiente, resultando em apenas 3 delegações que pautaram a discussão sobre a instrução geral: caldeireiros, tipógrafos de fundição e torneiros; e 8 delegações pautaram o debate sobre instrução profissional: operários que trabalharam com bronze, ceramistas, carpinteiros, marceneiros, motoristas, encanadores, luveiros (alfaiates). Entretanto, em 1867 o debate sobre a instrução dos trabalhadores assumiu centralidade. Foram 26 delegações a defender a instrução geral e 19 a instrução profissional (1948, p. 103). Palavra de ordem da exposição universal de 1867 – “Sem educação, não há liberdade, sem

liberdade, não há progresso” (DUVEAU, 1948, p. 172),

Os operários delegados da Exposição de 1867 não fazem contato apenas com os camaradas que exercem a mesma profissão. Isso porque as diferentes vozes expressam a diversidade das delegações operárias, a eficácia dos grupos, acabaram por sorte na criação de um bureau central denominado O Bureau da Comissão Operária pertencente aos grupos profissionais mais diversos. Este bureau possui dezenove membros. (DUVEAU, 1948, p. 105)61.

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“Les ouvriers délègues à l’Exposition de 1867 ne prennent pas seulement contact avec ceux de leurs camarades qui exercent la même profession. Pour que les vœux exprimes par les diverses délégation ouvrières puissants être groupés, commentés, décantés en quelque sorte, un bureau central est crée, le

Em setembro de 1867, durante a Exposição, a questão da aprendizagem e da escola profissional aparece na ordem do dia. O debate foi aberto, segundo Duveau (1948), a partir de um discurso de Tartaret (um dos operários presentes) indicando que a aprendizagem é uma demanda anterior mesmo a entrada dos alunos na escola profissional. O que anuncia uma preocupação existente com a formação deste sujeito da classe trabalhadora para além da educação especificamente profissional, denotando a necessidade deste de se inserir de modo mais autônomo na sociedade vigente. O debate provocou posições contrárias dos setores dominantes, no sentido de questionar o direito dos trabalhadores de abortar esta temática. Nesse sentido, Duveau apresenta as posições de Eugené Varlin, operário presente e membro da Associação Internacional dos Trabalhadores:

Varlin, que desempenhava um papel central na construção da Internacional e na formação das salas sindicais, declarava-se cético sobre a importância de um ensino profissional nascido de um só golpe pela voz do legislativo, demanda que o problema da escola profissional não se apresenta de modo separado da escola primária. Varlin insiste, sobretudo, na necessidade da escola gratuita e obrigatória, a qual ele enxerga como instrumento essencial para o fortalecimento da classe trabalhadora. Varlin nos diz que todos os espaços contam para aqueles que desejam ampliar o horizonte do homem, apenas não quer que as preocupações profissionais assumam a centralidade, dando ao pensamento operário uma caráter de estagnação. (DUVEAU, 1948, p. 107).62

bureau de la Commission ouvriers appartenait aux groupes professionnel le plus divers. Ce bureau comprend dix-neuf membres”

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“Varlin, qui jouer dans l’Internationale et dans la formation des chambres syndicales un rôle de premier plan, tout en se déclarant sceptique sur la valeur d’un enseignement professionnel né d’un seul coup par voie législative demande, que le problème de l’école professionnelle ne soit pas sépare de celui de l’école primaire. Varlin insiste surtout sur le nécessite de l’école gratuite et obligatoire, dans laquelle. Il voit l’instrument essentiel de l’affranchissement de l’ouvrier. Varlin, nous le disions tout À l’heure, compte parme ceux qui souhait avant tout éloigner l’horizon de l’homme, qui ne veulent pas que des préoccupations professionnelles étoiles donnent à la pensée ouvrière un caractère stagnant”

Este debate entre os operários encontrou eco no Império Francês. Victor Duruy legitimou sua política apresentada em 1863, de construção de espaços que garantissem o ensino técnico especial. É evidente o interesse da classe dominante em qualificar os trabalhadores para aumentar a produção. Por isso, a preocupação central dele é o investimento no ensino profissional destinado aos setores médios da população, não atingindo a grande maioria da classe trabalhadora que ainda se localizava, em boa parte, fora da escola e da educação formal. Daí a preocupação de Varlin em ampliar o debate a respeito da educação primária e de reafirmar o seu caráter gratuito, de modo a democratizar e garantir o acesso aos trabalhadores.

Vasseur (2005) em seus estudos sobre a exposição de 1867, evidenciou a preocupação de Napoleão III em garantir à França um importante papel no cenário nacional, assim como de reforçar seu poder, que já se mostrava fragilizado, diante da competitividade internacional e pelas lutas internas, conflitos gerados pelo crescimento e pela consolidação de uma classe que percebia de modo mais claro os antagonismo existentes e a necessidade de construção de um outro projeto de poder. Na Exposição de 1867, foi encomendada a construção de uma enquete operária, uma pesquisa para entender a demanda, a situação objetiva e subjetiva da principal mercadoria para os capitalistas. Para tanto, foi criado um grupo de economia social com o objetivo de garantir nas exposições precedentes uma sessão destinada a apresentação dos produtos a custos acessíveis, e de criar critérios de preço para os bens essenciais, contrariando, em grande medida, o restante da Exposição (VASSEUR, 2005, p. 587). O programa previsto para este grupo era composto:

(...) desenvolvimento do ensino, fornecendo produtos com preços acessíveis para os operários, construindo moradias que facilitem o acesso dos trabalhadores a propriedade, apresentando as atividades de pequenas empresas. A composição deste grupo responde perfeitamente ao

pensamento de Le Play63, como uma exposição de remédios que podem apaziguar o mal da população operária e facilitar a regeneração moral. (VASSEUR, 2005, p. 587).64

A exposição de 1867 acabou por expressar o importante debate sobre educação nos anos 60. A demanda da patronal, do Império e, portanto, da classe dominante, era garantir o desenvolvimento industrial. Para tanto, seria necessário garantir um aprimoramento na formação da mão de obra. De modo antitético, os trabalhadores respondem a esta pressão, ampliando o debate para a necessidade de uma educação para o conjunto da classe e não apenas para os trabalhadores especializados. Apesar de muitas contradições aparentes, a fala de Varlin externa o nível de consciência de parcela dos trabalhadores, o que evidencia o projeto burguês de mediação, de controle e de apaziguar os conflitos de classe gerados pelo desenvolvimento de parte importante das forças produtivas, a técnica.

As Exposições Universais, sobretudo a de 1867, acaba por expor a necessidade dos franceses de recuperar um poder de Nação já enfraquecido. O crescimento do setor industrial e, portanto da classe dominante, de caráter liberal, ao mesmo tempo que trouxe à tona as fissuras e os problemas gerados de modo contraditório pelo crescimento e pelo desenvolvimento do capital, gerou o avanço da consciência das classes que centralmente produzem a riqueza de todo este sistema social. É importante apontar que a Comissão operária eleita em Paris para participar da Exposição de 1867 foi eleita quase vinte anos depois da Revolução de 1848. Pela primeira vez, desde então, foram feitas assembleias operárias, antes proibidas, nas quais foram discutidas questões econômicas e

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Frédéric Le Play é um intelectual de meados do século XIX, escreve em 1855 a sua primeira grande obra chamada, Les ouvriers européens, e depois, em 1862, La reforme sociale. Apresenta uma visão ambígua, faz uma oposição à visão otimista de homem, herdada de Rosseau, contudo, é marcado por um liberalismo típico da época (liberdade de imprensa, consciência, a separação igreja e estado, o laisser-faire). Do ponto de vista social, assume posturas paternalistas para amenizar os conflitos da industrialização de massa.

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“(...) développement de l’enseignement, fourniture de produits à bon marché pour les ouvriers, établissement de logements qui facilitent l’accession de travailleurs à la propriété, présentation de activités de la petite entreprise. La composition de ce groupe répond en fait pleinement à la pensée de Le Play , comme une exposé des remèdes que peuvent apaiser les maux de la population ouvrière faciliter la régénération morale”

sociais, que acabaram por aparecer nos debates existentes na Exposição, revelando a demanda e a opinião dos principais interessados, os operários.

Segundo Vasseur (2005), a Comissão Operária eleita para a Exposição se radicalizava progressivamente com a influência crescente da Associação Internacional dos Trabalhadores dirigida por Eugené Varlin. A Comissão sem dúvida desempenhou um importante papel em levar as ideias da AIT para estes espaços.

4.3.4 O debate sobre o ensino público, laico, gratuito e obrigatório entre os