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4. TEORIA DOS EFEITOS

4.5. EFEITO DE LONGO PRAZO

4.5.1. AS FORMULAÇÕES DA AGENDA-SETTING

na sua Espiral do Silêncio destaca três características dos meios relevantes aos estudos de efeitos de longo prazo, a saber: acumulação, consonância e a onipresença. A acumulação é o conceito que faz referência à capacidade dos media de criar e sustentar a relevância de um tema por certo tempo. O excesso que o sistema dos meios de comunicação dá aos temas e as consequências da repetitividade dessa produção acabam por se refletir no resultado total da familiaridade do público em relação ao tema. A consonância, de certa forma homogeneíza as notícias, a partir da forma semelhante como elas são produzidas e veiculadas permitindo uma continuidade de todos os meios.

Por fim, na mudança dos efeitos de curto prazo para o longo prazo a onipresença dos media é significativa. Trata-se não apenas da difusão quantitativa, mas da ubiquidade dos meios que os situa em todos os lugares e aparentemente ao mesmo tempo. Juntos esses mecanismos determinam o poder que detêm sobre o público, no entanto, trata-se de um poder que não é mais como preconizava a teoria Hipodérmica, um poder de forma absoluta. Agora, trata-se de um poder que se afirma decisivamente intervindo em níveis diferenciados do conhecimento, como formador da nossa percepção da realidade. Em outros termos, é a plena ação educativa dos meios.

Maxwell McCombs e Donald L. Shaw são os responsáveis pela área de pesquisa conhecida como agenda-setting formulada a partir dos anos 60. Essa linha de pesquisa, segundo Antonio Hohlfeldt (2003:188) está bastante documentada no Brasil, tendo nas obras de Mauro Wolf e Melvin DeFleur e Sandra Ball-Rokeach suas principais referências. Embora, DeFleur e Ball-Rokeach (1993:219) reservem pequeno

192 espaço para a hipótese do agendamento e a mencionem “em pouco mais de uma página”, como cita Hohlfeldt, eles reconhecem a importância dessa perspectiva. Em suas próprias palavras: “Há razões para desconfiar que o verdadeiro significado das comunicações de massa na sociedade reside não nos seus efeitos imediatos sobre audiências específicas, mas nas influências indiretas, sutis e a longo prazo”.

A hipótese da agenda setting sustenta justamente que, “em conseqüência dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público é ciente ou ignora, dá atenção ou descuida, enfatiza ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos”. McCombs e Shaw, em 1972, ao darem início aos estudos dos efeitos dos meios considerando essa nova dimensão buscavam estabelecer um quadro cognitivo adequado às escolhas que o eleitor é chamado a fazer. Apontando que os meios influenciam na forma como as pessoas apreendem as informações e formam seu conhecimento sobre o mundo, os pesquisadores procuram explicar um tipo de efeitos cumulativos, ou estabelecimento de agendas mediáticas.

A hipótese não “sustenta que os meios tentam persuadir o público”, pelo contrário, o conjunto dos media, segundo a visão dos autores, simplesmente descrevem e apresentam as suas audiências uma lista de fatos selecionados, e a respeito dos quais, elas podem formar uma opinião que passa a ser discutida. Na verdade, conforme citação de Wolf (2008:143), Shaw 150

O excesso de informação que esse fluxo informacional tende a gerar nos receptores, McCombs chama de efeito enciclopédico. Um efeito criado pela

diz que a “asserção fundamental da agenda- setting é que a compreensão das pessoas em relação à grande parte da realidade social é modificada pelos meios de comunicação de massa”. Hohlfeldt explica que, desse ponto, os pressupostos da hipótese são claros ao considerar em primeiro lugar que as informações se dão num fluxo contínuo, um sistema aberto, o qual em franca oposição às teorias anteriores, não fragmenta a realidade. Numa verdadeira avalanche informacional, tal sistema pode levar a um processo de entropia, dispersão e desordem, provocado pelo excesso de informações que quando não trabalhadas devidamente pelos receptores, por vezes, se perdem ou até, criam situações equivocadas.

150

E. Shaw (1986:96-105). Agenda-setting and Mass Communication Theory. Gazette (International Journal for Communication Studies) Vol. XXV,

193 circularidade da informação, sempre que isso venha a interessar aos meios para atualizar o “leitor” em torno de determinado fato. Com o pressuposto de que o fluxo informacional antecedente o efeito de agenda, a hipótese de McCombs e Shaw descarta a concepção do efeito imediato das situações particulares recortadas pelas investigações anteriores e realça que os meios de comunicação influenciam o receptor a médio e longo prazo. Neste sentido, os efeitos provocados pelos meios de comunicação se posicionam em relação a duas variáveis, ao tempo de cobertura e lapso de tempo entre o “tornado público” e concretização em termos de ação consequente por parte do receptor (Hohlfeldt 2003:215).

Além desses, um terceiro elemento também circunscreve a base da hipótese do agendamento e preconiza que os meios de comunicação não impõem o que temos que pensar sobre um tema como pregava a teoria hipodérmica, mas influenciam o que pensar e o que falar sobre esse tema. Dessa forma, os assuntos agendados pelos meios de comunicação determinam, a médio e longo prazo as preocupações do público, tornando-se tanto agenda individual quanto social. É interessante verificar que o ciclo do agendamento se completa com o retorno da agenda dos receptores para os media.

Hohlfeldt (2003:192) ainda nos chama a atenção para o fato de que as bases teóricas dessa hipótese não são tão recentes, se desenvolveram ao longo de alguns séculos no conjunto das grandes transformações do mundo ocidental apoiadas no conceito de opinião pública. Por isso, destaca tanto a obra de Gabriel Tarde quanto a de Walter Lippmann, as quais centradas neste conceito fazem das formas de orientação pública os antecedentes do debate que a hipótese traz à tona. Em outros termos, ele nos diz que a nossa relação com a realidade é construída por opiniões debatidas publicamente, estabelecidas por consenso, que não ocorrem de maneira direta. Segundo a argumentação de Lippmann, “os meios informativos esboçam grande parte das imagens em nossas mentes e é a partir delas que construímos o nosso mundo”.

Segundo Lippmann, entre o mundo que “existe” e as nossas percepções, “quase” todas as nossas “imagens” são formadas pelos media.151

151 VerLeandro Colling. Op. Cit., 2001: 89. Revista Famecos, nº14.

Exigimos a intervenção dos meios técnicos de comunicação, senão por não podermos acessar a maioria dos acontecimentos diretamente, mas principalmente pela nossa condição de

194 integrantes das sociedades industriais e urbanas, sociedades complexas que nos impingem múltiplos papéis. Os meios de comunicação como a principal forma de ligação entre os acontecimentos e as imagens que formamos desses acontecimentos fazem do acesso ao fluxo informacional continuado, o nosso elemento de atualização. Um processo que nos condiciona cada vez mais a receber os diversos recortes das realidades produzidas em função mesmo da continuidade desse fluxo. Ainda como diz Hohlfeldt (2003:192-3) “dependendo da mídia, sofremos sua influência, não a curto prazo, mas a médio e a longo prazo, não nos impondo determinados conceitos, mas incluindo em nossas preocupações certos temas, que de outro modo, não chegariam a nosso conhecimento e, muito menos, tornar-se-iam temas de nossa agenda”

Bernard Cohen, em 1963, escreveu que “a imprensa pode, na maior parte das vezes, não conseguir dizer às pessoas o que pensar, mas tem, no entanto, uma capacidade espantosa para dizer aos próprios leitores sobre o que pensar”. Com essas observações, embora tratando especificamente do jornal, ele se junta a tantos outros que já evidenciavam as influências cumulativas dos meios de comunicação. A partir dessas colocações é que McCombs e Shaw tentam provar essa nova perspectiva da influência dos meios. Na concretização dessa proposta152

Após essa experiência muitos estudiosos testaram as hipóteses da agenda- setting e alguns trabalhos foram orientados pelos próprios McCombs e Shaw. Com o objetivo de refinar as ideias da hipótese McCombs e Shaw iniciaram nova pesquisa na localidade de Charlotte Ville. Essa cidade, também na Carolina do Norte com características diversas de Chapell Hill, serviu de cenário para as respostas aos seu

os autores realizaram uma pesquisa em 1968, na localidade de Chapell Hill, pequena cidade na Carolina do Norte visando verificar o impacto dos meios nos eleitores no cenário da eleição entre Hubert Humprey e Richard Nixon. Atendendo aos critérios de posição econômico-financeira, social e racial dentre os que ainda estavam indecisos quanto ao voto, nos 24 dias que antecederam as eleições foram aplicados cem questionários entre essa seleção de eleitores. O resultado da pesquisa nesse universo variado surpreendeu ao apresentar além do forte impacto que os meios causam nos eleitores, a influência dos próprios meios sobre os candidatos, fazendo com que eles incluíssem em suas agendas temas que inicialmente não eram parte das suas preocupações de campanha.

195 cinco pontos de concentração. Esse novo estudo se dirigiu para: a- definição do conceito; b - fontes de informação para a agenda pessoal; c - desenvolvimento temporal como variável maior; d - característica pessoal do eleitor; e - política e agendamento.

Em torno da própria conceituação da hipótese, a atenção dos eleitores passou a constituir um conjunto de informações comuns, que produziu a base para a formação de uma atitude ou mudança de atitude diante dos candidatos. Esta atitude sociabilizada entre os membros da comunidade traz à cena os líderes de opinião. Assim, o próprio McCombs153

Atestando que a influência da mídia advém da dinâmica organizacional com sua cultura própria e critérios de noticiabilidade,

enfatiza que as suas pesquisas atestam que os efeitos são limitados. A formação das agendas pessoais e as diferentes influências permitiram verificar o duplo fluxo informacional através dos chamados líderes de opinião. Quanto às características pessoais do receptor, a formação de uma agenda e a dependência aos graus de relevância do tema mostrou-se de fato bastante significativa quando os consumidores demonstraram tender a considerar mais importante os assuntos veiculados pela imprensa sugerindo que os meios de comunicação agendam nossas conversas. O agendamento do receptor, no entanto, só ocorre em condições de alto nível de percepção combinado com alto grau de incerteza em relação ao assunto. Assim, a influência do agendamento por parte dos meios depende do grau de exposição do receptor, ao tipo de mídia e a relevância do tema.

154

153 Maxwell McCombs (1996:20). Influencia de las noticias sobre nuestra imágenes del mundo.

154 Ver Mauro Wolf. Op Cit., 2008:93-201. Evento noticiável. O reconhecimento de acontecimentos significativos e interessantes na fonte das notícias, ou na “superabundância de acontecimentos”.

avança-se nas pesquisas do agendamento. Como as pessoas têm tendência para incluir ou excluir de seus próprios conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu próprio conteúdo, a ênfase constante em certos temas, aspectos e problemas formam uma moldura interpretativa, um esquema de conhecimentos, um “frame” que se aplica, de maneira mais ou menos consciente, e de forma a dar sentido ao que observamos. Ao que as pesquisas de Roberts (1972) citado por Wolf (2008:144), acrescentam “à medida que o destinatário não é mais capaz de controlar a exatidão da representação da realidade social, com base em algum padrão externo da mídia, a imagem que ele forma

196 para si mesmo mediante essa representação acaba por ser distorcida, estereotipada ou manipulada”.

Diante da mudança de uma perspectiva quantitativa para uma abordagem representativa dos efeitos, Wolf (2008: 143) destaca que o nível desse tipo de pesquisa, apesar de apresentar a agenda-setting como um conjunto integrado de assuntos e estratégias, guarda semelhança com as investigações anteriores, pois, trata-se também de um núcleo de ocasiões e conhecimentos parciais suscetíveis de serem articulados numa teoria geral sobre a mediação simbólica e sobre os efeitos de realidade praticados pelos meios. Contudo, independente das articulações que se possa propor, como o próprio Shaw (1979) declara, fica evidente que “os meios de comunicação de massa fornecem algo que é mais do que simplesmente um número de notícias. Eles fornecem também as categorias em que os destinatários podem facilmente situá-las de modo significativo”.

Desta forma, a sustentação da hipótese, o fato das pessoas agendarem seus assuntos e suas conversas em função do que os meios veiculam salienta, principalmente, que a quantidade de informações, conhecimentos e interpretações da realidade social ampliam a dependência cognitiva da audiência e a evolução desse paradigma como conceito teórico, será aqui sublinhado em dois aspectos: 1- a crescente amplitude e complexidade do conceito inicial; 2- o reconhecimento cada vez mais claro de um poder mediático, jornalístico muito superior ao inicialmente postulado.

A ideia de paradigma centrada na capacidade de influência dos meios, na projeção dos acontecimentos na opinião pública, confirma o seu papel na configuração na nossa realidade social ou na construção de um pseudo-ambiente montado quase que completamente pelos eles. No entanto, como nos diz Wolf (2008:147), a pesquisa de McClure e Petterson (1976) traz a evidência de diferentes níveis de poder de agendamento dos meios, “(...) Há uma confirmação limitada à hipótese da agenda- setting. Em alguns temas, mas não todos, os níveis de exposição aos meios de comunicação de massa mostram uma influência direta exercida pela agenda-setting. De todo modo, normalmente o efeito direto correlaciona-se com o consumo de jornais locais, e não com os noticiários televisivos”.

197 Em relação aos efeitos cognitivos, desde a primeira pesquisa Shaw (1976), vem enfatizando que os atributos psicológicos e sociais dos eleitores determinam o uso político que eles dão aos meios de comunicação. McClure e Patterson por sua vez, afirmam que “a agenda-setting é verossimilmente um efeito indireto, mediado pelas disposições precedentes dos eleitores destinatários das mensagens”. O reconhecimento dos contatos interpessoais, diz Shaw (1979), no impacto dos conteúdos dos meios no público explica as condições nas quais os efeitos da agenda são mais pronunciados. A hipótese do agendamento sustenta que os media são eficazes na construção da imagem da realidade que o indivíduo estrutura. A imagem como metáfora representativa de toda a informação sobre o mundo que cada indivíduo organizou e acumulou para construir seu repertório interior. Este, entendido como a matriz na qual ele vai confrontar toda e qualquer informação nova. Este padrão, diz Roberts (1972), inclui o “quadro de referência e as necessidades, valores, crenças e expectativas que influenciam o que o destinatário extrai de uma situação de comunicação” (Mauro Wolf, 2008:153).

De um lado, destaca-se a vontade de inserir a problemática mais tradicional sobre os efeitos na hipótese de agendamento explicitando a sua complementaridade, do outro, enfatiza-se a dificuldade de construir uma teoria dos efeitos puramente cognitivos distinto dos componentes de valor. No entanto, as relações entre efeitos cognitivos e estruturas de valores aparecem como componentes das diversas pesquisas se delineando como uma tendência da persuasão temperada pela persistência. As opiniões dos destinatários parecem agir no sentido de integrar a agenda subjetiva com a proposta dos meios. Com essa asserção implícita, avança-se na perspectiva de uma maior articulação interna ao efeito de agenda: a capacidade de influência dos meios sobre o conhecimento do que é importante e relevante varia com os temas tratados. “Quanto menor for a experiência direta das pessoas em relação a uma determinada área temática, mais ela dependerá da mídia para obter as informações e os quadros interpretativos relativos aquela área” (Mauro Wolf, 2008:155).

Ao contrário da longa tradição dos efeitos que estudam a mudança de atitudes e opiniões, os trabalhos iniciados por McCombs e Shaw procuravam analisar o papel dos media na formação e modificação dos processos de cognição. A passagem para os efeitos cumulativos ao substituir o modelo transmissivo da comunicação, a teoria

198 hipodérmica, por um modelo centrado no processo de significação aponta para efeitos que não parecem tão deterministas a partir de certa consciência do público. Além disso, como paradigma da acumulação, é preciso longo tempo para saber da influência dos meios no modo como as pessoas agendam os assuntos e suas concepções sobre eles.

Com referência à publicidade, a hipótese do agendamento coloca em debate a proximidade do tema, o qual incorporado pela audiência, como agenda pessoal ao se fazer presente na mensagem publicitária, passa a ser entendido como fator de acentuada credibilidade. Como conteúdo atualizado, relaciona-se a proposta do anunciante como elemento de distinção, como por exemplo, o tema de responsabilidade social presente especialmente nos anúncios de empresas do sistema financeiro, que até pouco tempo eram consideradas as fiéis representantes do capitalismo mais feroz. Além disso, a hipótese do agendamento ao articular mudanças através de efeitos cognitivos fortalece os processos persuasivos da publicidade, como veremos no capítulo a seguir, uma vez que ao alterar o fator cognitivo, modela comportamentos ostensivos e de forma sequencial, muda a direção dos comportamentos dos consumidores e agrega significado ao processo publicitário para além da simples proposta de venda.

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Capítulo 5