• Nenhum resultado encontrado

As Múltiplas Exigências no Trabalho do Professor em Ambiente Virtual

O CUSTO HUMANO DO TRABALHO

O conjunto dos resultados quantitativos e qualitativos comprova que o

7.2 As Múltiplas Exigências no Trabalho do Professor em Ambiente Virtual

O retrato apresentado do custo humano do trabalho (CHT) dos professores pesquisados permite inferir que, de modo geral, estes profissionais vivenciam múltiplas exigências (física, cognitiva e emocional), que são originadas das

contradições do contexto de trabalho, fundamentalmente, nas dimensões de organização e das condições de trabalho.

O presente estudo se coaduna com as pesquisas de Ferreira e Freire (2001) e Rasia (2004), que identificaram múltiplas evidências de exigências (físicas, cognitivas e emocional), as quais expressam a existência de custo humano do trabalho. Nessa ótica, as múltiplas exigências relacionam-se entre si. No entanto, a depender do contexto de trabalho, uma determinada exigência poderá ser mais evidente, ou ainda, todas sobressairão. Na presente pesquisa, percebe-se que as três exigências se destacam na ocorrência do custo humano negativo do trabalho, sendo que a exigência física, conforme ilustram os dados qualitativos, apresenta-se de maneira mais acentuada, visto que a intensa comunicação escrita e a impossibilidade de os equipamentos darem conta das necessidades dos professores, mesmo com a utilização de estratégias operatórias, já revela indícios de adoecimento físico dos docentes.

A pesquisa de Ferreira e Mendes (2003) com auditores-fiscais da Previdência Social brasileira evidenciou alto custo cognitivo presente na atividade desses trabalhadores, nos aspectos uso intensivo da memória, quantidade significativa de informações, o erro como fator de tensão e a diversidade de situações. Identificou-se que, em função da sobrecarga de trabalho, do cansaço físico e mental e do estresse, há uma expressiva existência de custo afetivo negativo. O custo físico não foi tão evidente quanto os demais.

Os estudos de Freire (2001), Ferreira e Mendes (2003) e Rasia (2004) sobre custo humano do trabalho revelam que a quantidade de informações a serem tratadas, bem como a duração do processo de trabalho em função do esforço cognitivo são elementos que denotam índices de complexidade significativos. Assim, identifica-se que o trabalho dos professores em ambiente virtual é um trabalho de natureza complexa (Weill-Fassina, 1990), em função de se ter que trabalhar por demanda e pela não identificação física do aluno, o que produz alto custo cognitivo.

Em síntese, a análise do custo humano do trabalho dos professores que atuam em ambiente virtual revela que há um custo humano negativo nas três esferas: física, cognitiva e afetiva. Tal custo advém das peculiaridades do contexto de trabalho, o qual é marcado por uma organização de trabalho que intensificou o trabalho docente. Isto é percebido nas novas demandas incorporadas ao fazer do

professor, tais como manuseio técnico e pedagógico de novas tecnologias da informação e comunicação, a intensa comunicação escrita, o atendimento individual aos alunos, o trabalho por demanda, e ainda, o controle permanente da participação dos alunos no ambiente virtual.

Essas novas demandas, que foram descritas com maior detalhamento no capítulo anterior, apontam para uma produção do custo humano negativo do trabalho. Neste sentido, diante do atual contexto do mundo do trabalho que direciona para a incorporação das novas tecnologias da comunicação e informação em vários setores da economia, e que, conseqüentemente, mudará (e já está mudando) a natureza do trabalho de várias categorias profissionais, requer-se a atenção dos pesquisadores no campo da saúde no trabalho, bem como do movimento sindical, para que se construam formas de minimizar o dispêndio negativo que esses processos de transformação no trabalho geram na vida dos trabalhadores.

Os sofrimentos dos professores presenciais, apresentados no capítulo 2, por meio da análise de várias pesquisas sobre o processo de saúde-doença desses profissionais, indicam que os docentes que trabalham nos contextos presenciais adoecem em função da profissão, tendo em vista as péssimas condições de trabalho, a organização do trabalho e as relações com pais, alunos e chefias. Os estudos com esses trabalhadores (Esteve, 1999; Fonseca, 2001; Sobrinho, 2002; Gomes, 2002; Araújo et al., 2005) demonstram a existência de condições impróprias para o exercício do magistério, sobrecarga de trabalho extraclasse, exigência de manter a disciplina entre os alunos, pressão dos pais e da direção das escolas pela aprendizagem dos alunos, dificuldades em acompanhar as transformações sociais, que mudam constantemente o discurso educacional. Tais condições são impostas externamente aos docentes e geram custo emocional e cognitivo.

O uso excessivo do aparelho vocal, os movimentos repetitivos e a postura inadequada expressam o dispêndio físico dos docentes presenciais. Sendo assim, conjetura-se na presente tese, que o trabalho do professor, seja em ambiente presencial ou mediado pela Internet, apresenta custo humano negativo nas esferas física, emocional e cognitiva. O custo físico dos professores presenciais e dos que trabalham mediados pela Internet difere quanto ao uso excessivo da voz, uma vez que, no ambiente virtual, o aparelho vocal não é exigido com a freqüência do presencial, o que permite diminuir a incidência de doenças causadas pelo uso contínuo da voz. Todavia, o custo físico se assemelha quanto aos movimentos repetitivos e à postura inadequada.

Identifica-se que a não utilização da voz em ambiente virtual é compensada pelo aumento do uso dos braços, à medida que, para que ocorra a comunicação entre professor e aluno, faz-se necessária a comunicação escrita, e esta se realiza por meio da digitação. Sendo assim, pode-se inferir que há uma

intensificação dos movimentos repetitivos, podendo os professores virtuais ficarem, ainda mais, expostos a LER/Dort, já que, nas pesquisas com professores presenciais (Porto et al., 2004), estes são acometidos pelos distúrbios osteomusculares relacionados com o trabalho.

Quanto ao custo cognitivo dos professores presenciais e virtuais, identifica-se que há diferenças na origem desse custo, sobretudo pelas especificidades de cada contexto de trabalho. O custo cognitivo vivenciado pelos professores presenciais (Esteve, 1999; Fonseca, 2001; Sobrinho, 2002; Gomes, 2002; Leite, Figueiredo e Sol S/D) advém da ausência de capacitação para lidar com as novas demandas do próprio trabalho; a exigência de manter a disciplina entre os alunos; o volume de carga cognitiva, como preenchimento de diários e, ainda, o ritmo acelerado. Já os professores virtuais têm dispêndio cognitivo, fundamentalmente pelo não estabelecimento de rotinas; o trabalho por demanda; e a comunicação individualizada em função da distância física dos alunos.

Nesta tese, pode-se hipotetizar que os professores, sejam trabalhadores de ambientes presenciais ou de ambientes virtuais, vivenciam custo cognitivo, em termos de dispêndio mental, advindo da necessidade de aprendizagens constantes, de resolução de problemas e de tomada de decisão. No caso dos professores presenciais, este custo surge pelas novas demandas da sociedade contemporânea, que requer desses profissionais a busca permanente de formação para que possam dar conta das exigências educacionais. Da mesma forma, os professores virtuais, em função das características do contexto de trabalho, fundamentalmente, pelo uso de novas tecnologias da informação e comunicação e, também, pelo trabalho em demanda, vivenciam o custo cognitivo.

No contexto de trabalho dos professores, seja em ambiente presencial ou ambiente virtual, há exigências emocionais, uma vez que é essência do fazer docente o envolvimento afetivo para que o processo educativo possa ser efetivado. Entretanto, com o presente estudo, identifica-se que a origem do custo emocional do professor virtual é diferente do professor presencial. Neste, o custo emocional advém da exigência de manter a disciplina entre os alunos, das condições impróprias para o exercício do magistério, da excessiva pressão dos pais e da direção das escolas pela aprendizagem dos alunos, de salas de aulas inadequadas, e de cargas de trabalho que afetam a saúde e o desempenho do trabalho docente, conforme os autores

Codo & Menezes (1999); Fonseca (2001); Sobrinho (2002) e Araújo et al. (2005). Em contrapartida, conforme apresentado no gráfico 1, o custo emocional dos professores que trabalham com o ambiente virtual manifesta-se, particularmente, pela auto- exigência dos professores em manter proximidade com os alunos e pela necessidade de lidar com a diversidade do cotidiano do trabalho, pois são características da organização do trabalho dos docentes virtuais a distância física e o uso de ferramentas de comunicação para realização da mediação pedagógica.

Diante da análise do CHT dos professores virtuais, verifica-se que, mesmo com o alto dispêndio nas esferas física, cognitiva e emocional, imposto pelo contexto de trabalho, os docentes estudados têm conseguido geri-lo por meio de estratégias de mediação individual e coletiva, fundamentalmente, os custos cognitivo e emocional. Identifica-se que os professores já apresentam adoecimento físico. Desse modo, observa-se que as estratégias de mediação individual e coletiva não têm obtido sucesso na sua totalidade.

No próximo capítulo, a dinâmica do prazer-sofrimento vivenciado por esses trabalhadores, as estratégias de mediação do sofrimento e os danos físicos e psicossociais advindos das adversidades do contexto de trabalho serão apresentados e discutidos com base no referencial teórico.

CAPÍTULO 8

PRAZER, ESTRATÉGIAS DE MEDIAÇÃO DO SOFRIMENTO E