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Um Novo Ambiente de Trabalho: o Virtual

O MUNDO DO TRABALHO E A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

1.3. Reflexões sobre a Sociedade da Informação

1.3.2. Um Novo Ambiente de Trabalho: o Virtual

A combinação entre computador e telecomunicações, a partir do intenso

desenvolvimento tecnológico na segunda metade do século XX, gerou um novo espaço de trabalho. Esse novo ambiente é capaz de circular informações por meio de bits numa rapidez e flexibilidade nunca antes presenciadas. Na presente tese, esse novo ambiente é denominado virtual.

Lévy (1996) destaca algumas características desse ambiente, as quais permitem compreender o funcionamento desse novo espaço de trabalho. Para o autor, há significativas alterações nas concepções de espaço (desterritorialização) e tempo (mudança na percepção do aqui e agora). Segundo Lévy, não há mais limites de espaço, tudo pode ser compartilhado pelas redes de computadores, sem que os sujeitos tenham que se movimentar, ou seja, viajar de um lugar para outro. Em relação ao tempo, as distâncias para os usuários das redes de computadores significam cada vez menos. Pode-se citar, como exemplo, a gestão do capital, gerenciado por vinte e quatro horas. Conforme Castells (1999), pela primeira vez na história da humanidade, o capital funciona em tempo real. Aqueles que quiserem podem fazer transações comerciais a qualquer hora, em qualquer lugar, desde que tenham acesso à rede mundial de computadores.

Para Lévy (1996), uma empresa virtual utiliza, sobretudo, o teletrabalho. Isto implica a substituição da presença física dos trabalhadores nos mesmos locais pelo envolvimento numa

comunidade eletrônica, onde as relações de trabalho, bem como com clientes, passar a ser mediadas pelas modernas tecnologias.

Nesse novo ambiente de trabalho, observa-se que não há mais a presença do trabalhador em um lugar preciso, ele pode estar em qualquer lugar, a qualquer hora. Basta que ele se

organize, que gerencie o seu tempo para realizar suas atividades. Ainda para o autor, “Quando uma pessoa, uma coletividade, um ato, uma informação se virtualizam, eles se tornam ‘não-presentes’, se desterritorializam” (Lévy, 1996, p. 21).

O ambiente virtual surgido com a combinação do computador e as telecomunicações gerou o trabalho a distância ou o teletrabalho. Observa-se que essa forma de trabalho já é uma realidade no setor da economia que mais cresce na sociedade da informação, o de serviços. Mello (1999) considera esse tipo de trabalho uma alternativa para as empresas se tornarem mais competitivas e, ao mesmo tempo, acumular forças para enfrentar as pressões de um mercado altamente incerto e competitivo. O autor define o teletrabalho como um processo que tem como característica fundamental levar o trabalho até os funcionários, em vez de o funcionário ir ao trabalho. Portanto, é um trabalho flexível, já que o “teletrabalhador” tem horário e local flexíveis para

desenvolver as suas atividades.

Trope (1999) corrobora as idéias de Mello sobre esse novo espaço de trabalho. Acrescenta que, com a Internet, os milhões de computadores interligados possibilitam que

organizações comerciais, governamentais e tantas outras possam operar numa organização virtual. Para o autor, uma organização virtual tem parte dos seus funcionários trabalhando fora do escritório da empresa. De modo geral, a comunicação entre trabalhador e empresa se dá por meio de um computador pessoal conectado à Internet.

Segundo os estudos de Trope (1999), há pelo menos cinco tipos de trabalho a distância: a) o padrão mais comum de teletrabalho é quando o trabalhador faz as suas atividades em casa; b) o pendular, quando o trabalhador exerce em alguns dias suas atividades em casa e outros na sede da empresa; c) o escritório de vizinhança, no qual são oferecidos centros comuns de trabalho. Nesse caso, vários funcionários de empresas diferentes compartilham o mesmo espaço; d) o trabalho nômade, quando o trabalhador é itinerante; e) e os escritórios satélites, os quais

pertencem à empresa, mas se localizam fora da sede.

Essa nova forma de trabalho só se realiza por meio das ferramentas de informática e de telecomunicações – telemática –, as quais possibilitam a transmissão de dados a distância. Sem isso, o trabalho a distância em ambiente virtual não poderia se concretizar.

Independentemente do local e da hora em que o trabalho se realize, o ambiente virtual possibilita maior flexibilidade para o trabalhador organizar o seu tempo e o seu espaço de trabalho. No entanto, esse tipo de trabalho pode apresentar problemas para os trabalhadores. Segundo Trope, a dispersão geográfica dos funcionários de uma organização virtual pode levá-los a sofrer pela falta de socialização, pois neste tipo de organização o compartilhamento de afetividade diminui. Para Trope (1999, p. 30), “O teletrabalhador enxerga o mundo a partir de uma fresta redutora: o monitor do seu computador. Ele passa dias em frente ao monitor. O termo teleneurose surge para identificar essa situação característica do teletrabalhador”.

Percebe-se que o trabalho a distância – em que pesem as vantagens de organização do tempo e do espaço de trabalho, ou seja, a flexibilidade, a qual traz satisfação aos trabalhadores, uma vez que rompe com a estrutura rígida de organização do trabalho presente no contexto

organizacional taylorista – gera outros problemas advindos do novo paradigma tecnológico. De fato, o trabalhar sozinho, a falta de interação com os colegas presencialmente, apesar de existirem

possibilidades de trocas a distância, pois pode-se compartilhar angústias por meio das ferramentas de comunicação (e-mail, fórum, chat, listas de discussão), apresenta outros problemas que precisam ser enfrentados no novo contexto de organização do trabalho.

A afetividade presencial pode ser substituída pela afetividade a distância, a partir do compartilhamento de mensagens eletrônicas ou mesmo pelo debate síncrono nas salas de bate-papo. Mas isso não consegue substituir o sorriso, a alegria do encontro, o debate coletivo do “saber fazer” no trabalho presencial.

Mesmo com os novos problemas surgidos em decorrência do novo espaço de trabalho, Trope considera que no trabalho a distância há a possibilidade de o trabalhador ou o teletrabalhador dominar o trabalho “ao invés de ser dominado por ele” (Trope, 1999, p. 36).

Sennett (2002), crítico do novo paradigma tecnológico e suas conseqüências no mundo do trabalho, considera que o novo capitalismo tornou-se um sistema ainda mais complexo, uma vez que todo o processo de poder é, hoje, mais ilegível. Segundo o autor, o discurso da flexibilidade aparece em oposição às estruturas rígidas das organizações tayloristas. Esse discurso não criou condições de libertar o trabalhador do controle característico de uma organização taylorista, mas submeteu os sujeitos trabalhadores a novas estruturas de poder e controle. O novo sistema de poder, segundo o autor, esconde-se no discurso da flexibilidade a partir de três elementos: a) um processo de reivenção descontínua de instituições; b) a especialização flexível do processo de produção; c) forte concentração de poder sem centralização (Sennett, 2002, p. 54).

Neste sentido, apesar da flexibilidade do trabalhador em controlar o tempo e espaço de trabalho, não “há maior controle sobre o processo de trabalho em si” (Sennett, 2002, p. 68). O fato de o trabalho ser descentralizado não quer dizer que não haja controle sobre os trabalhadores. O desenvolvimento da informática possibilitou a criação de programas de computadores que controlam o trabalho a distância. Há programas que registram o tempo de conexão do trabalhador no sistema em que desenvolve as suas atividades. Pode-se citar, como exemplo, o caso da educação a distância que utiliza a mídia Internet. O professor, por meio de uma senha, acessa um ambiente de ensino e

aprendizagem. O suporte técnico ou o gestor desse ambiente tem acesso à navegação feita pelo professor. Portanto, o professor pode fazer o trabalho em qualquer lugar e em qualquer hora, mas o escritório central saberá qual foi todo o percurso de trabalho desse profissional.

De todo modo, como o processo de trabalho a distância é algo novo, tendo em vista que as tecnologias interativas também o são , ainda não se pode definir os males desse novo contexto de trabalho aos sujeitos trabalhadores. A presente pesquisa, ao estudar o trabalho dos professores em ambiente virtual, tendo como referenciais teóricos duas abordagens sobre a saúde no trabalho,

contribuirá peremptoriamente para compreender esse novo contexto de trabalho e suas implicações à saúde dos trabalhadores.