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“Singularizar o relacionamento luso-brasileiro é um imperativo da história, da política, da economia e da realidade social de ambos os países” 55.

No capítulo das relações bilaterais entre Portugal e o Brasil, há que assinalar no seu processo, oscilações resultantes das mudanças operadas ao nível de regimes políticos em diferentes épocas da conjuntura política quer regional, ao nível da América Latina, quer na América do Norte, especialmente nos EUA, quer ainda na arena internacional, com destaque para a Europa, mais concretamente para Portugal.

O cenário inicia logo após a independência do Brasil em 1822, proclamada pelo príncipe D. Pedro nas margens do Ipiranga e do seu reconhecimento em 1825, pela corte de Lisboa, através do Tratado de Paz e Aliança até 1922, que se dá um vazio político nas relações bilaterais com Portugal, devido a falta de instrumentos jurídico- diplomáticos, justificada por ressentimentos provocados por aquele ato de separação e de rebeldia por Portugal, velha “mãe-pátria”. Em grande parte esta situação foi derivada pelas próprias circunstâncias políticas conjunturais da época, tanto no plano político interno de Portugal, como no do Brasil e, ainda, no do contexto regional e internacional, mais vasto.

Sobre o assunto, debruçar-se-á, com ênfase, nas relações económicas que a seguir se aborda.

6.1. Relações económicas

“Uma vez superada a “década perdida”, ir-se-ia assistir a um salto qualitativo e

quantitativo no domínio das relações económicas luso-brasileiras”56

.

Assim, as duas últimas décadas e, especialmente, a década de noventa, foram particularmente proveitosas no estreitamento da malha de obrigações mútuas entre Portugal e o Brasil, em todas as áreas de interesse comum, como o comércio, o investimento, as finanças, a indústria, a agricultura, as pescas, a energia, o ambiente, a cultura, os transportes e comunicações, o turismo, a ciência e tecnologia, a segurança social, a extradição, matérias judicial e penal, o tráfico de estupefacientes e a diplomacia.

“Muitas destas áreas, especialmente aquelas com uma maior componente económica, seriam condensadas no Acordo-Quadro de Cooperação, firmado em 1991, entre Portugal e o Brasil, em Brasília, a 7 de maio, e apenas entrou em vigor em 7 de junho de 1995 (D.R. n.º153, S.ª S.-A,4/07/96), abrindo, assim, um vasto leque de oportunidades para um maior envolvimento e participação da sociedade civil e dos agentes do setor económico privado dos dois países no estreitamento das relações bilaterais” 57.

O Acordo-Quadro de Cooperação em referência, situa-se na perspectiva de “parceria”, de aproveitamento mútuo das potencialidades de ambos os países e de intensificação das relações bilaterais, determinando, deste modo, a realização de cimeiras anuais dos Chefes de Governo, as visitas governamentais e ministeriais recíprocas, os encontros entre os Ministros dos Negócios Estrangeiros em várias e distintas sedes, e a instituição de uma Comissão Ministerial de Cooperação Luso- Brasileira, presidida pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros dos dois países, a reunir anualmente e assessorada por subcomissões setoriais, de nível ministerial.

55 Idem, Ibidem, pág. 85 56 Idem, Ibidem, pág. 92 57 Idem, Ibidem, pág. 92

O Brasil torna-se, assim, no destino preferencial dos investimentos portugueses, no âmbito da estratégia de internacionalização da economia portuguesa, favorecida pelos instrumentos jurídico-diplomáticos bilaterais existentes, por um relacionamento a todos os níveis, mais próximo e por um ambiente cultural, social e económico conveniente. Nesse capítulo, merece destaque o reforço do investimento português em território brasileiro, verificado nos últimos anos e, em especial, nas áreas das novas tecnologias, é o mais fiel expoente do lugar que o Brasil ocupa na lista das prioridades externas portuguesas, quer a nível das políticas do Estado, quer nas estratégias do setor empresarial. Todavia, as habituais reservas brasileiras a um total desmantelamento do seu tradicional protecionismo, sobretudo dos setores mais à esquerda do hemiciclo parlamentar, têm entravado a ratificação do acordo bilateral para a promoção e proteção recíproca de investimentos, de 1994 58.

Mais, acresce que, “mediante esta estratégia, Portugal tem conseguido colmatar a escassa importância relativa das relações comerciais bilaterais, marcadas pelo défice crónico da balança comercial portuguesa e pela baixa competitividade das exportações portuguesas e pela elevada capacidade de penetração no mercado brasileiro de produtos originários de outros países, designadamente, europeus, tentando, assim, impor-se no terreno e inverter essa tendência” 59.

É de realçar, por outro lado, que, com base no Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, a intensificação das relações bilaterais entre Portugal e o Brasil tem por base num conjunto de princípios e de objetivos, que se encontram sintetizados do seguinte modo: “1. O desenvolvimento económico, social e cultural alicerçado no respeito dos direitos e liberdades fundamentais, enunciados na Declaração Universal dos Direitos do Homem, no princípio da organização democrática da sociedade e do Estado, e na busca de uma maior e mais ampla justiça social; 2. O estreitamento dos vínculos entre os dois povos com vista à garantia da paz e do progresso nas relações internacionais, à luz dos objetivos e princípios consagrados na Carta das Nações Unidas: 3. A consolidação da comunidade dos países de língua portuguesa, em que Portugal e Brasil se integram, como instrumento fundamental na prossecução de interesses comuns; 4. A participação de Portugal e do Brasil em processo de integração regional, como a União Europeia e o MERCOSUL, almejando permitir a aproximação entre a Europa e a América Latina para a intensificação das suas relações” 60.

Por outro lado, deve sublinhar-se que para Portugal, o Brasil representa uma prioridade política, não apenas de um ponto de vista bilateral, que tem a ver com todo o acervo histórico e cultural comum, mas, também, pelo seu peso específico, enquanto país lusófono, na afirmação de uma identidade lusófona no mundo, que importa reforçar mediante uma adequada conjugação de esforços e uma vontade inequívoca para tal fim”. Ao passo que: “Para o Brasil, Portugal representa o vínculo mais próximo e direto com uma das regiões mais ricas e avançadas do planeta – a União Europeia – e o berço de uma civilização partilhada, cujo fator cultural comum e predominante – a língua portuguesa – serve de elemento simultaneamente estrutural e estruturante da sociedade brasileira e, bem assim, de instrumento singularizante e diferenciador face ao ambiente sub-regional hispânico, de tendências hegemónicas 61.

Relativamente ao acervo histórico e cultural comum, vale a pena recordar Carmen Lúcia Tindó Ribeiro Secco: “Os laços identitários com a “pátria colonizadora” se

58 Idem, Ibidem, pág. 93 59 Idem, Ibidem, pág. 93 60 Idem, Ibidem, pág. 94 61 Idem, Ibidem, pág. 95

esgarçaram e o idioma imposto adquiriu diferenciadas faces. Alguns elos permaneceram, ainda que dispersos; outros se desmancharam no tempo. A língua portuguesa, tendo atravessado o Atlântico, aportou no Brasil, recebendo novos saberes, musicalidades, acentos;…” 62.

Finalmente, é imprescindível destacar que no âmbito da implementação do Plano de Ação de Brasília para a Promoção, a Difusão e a Projeção da Língua Portuguesa, simplesmente designado por Plano de Ação de Brasília, na XVI Reunião Ordinária do Conselho de Ministros da CPLP (Luanda 2011), os Ministros realçaram a importância de se continuar a impulsionar a sua materialização, visando consolidar o português como língua oficial ou de trabalho nas Organizações Internacionais, concretamente naquelas onde está representada a CPLP. Nesta óptica, entre outros assuntos, instaram as competentes entidades dos Estados-membros e da CPLP:

“- a uma persistente concertação da ação política para a introdução do português como “língua de documentação” das Nações Unidas, através da publicação sistemática em português e de documentos da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança, da Conferência Geral da UNESCO e das Agências, Fundos e Programas das Nações Unidas”. E ainda: “- à criação de um corpo de tradutores especializados em português no âmbito do Secretariado das Nações Unidas, cujo funcionamento seria financiado, parcial ou integralmente, por contribuições dos Estados-membros da CPLP…” 63.

6.2. Relações diplomáticas

As relações diplomáticas bilaterais entre Portugal e o Brasil se estabelecem e se consolidam na linha de orientação baseada na irmandade lusófona e, se quisermos, da língua portuguesa.

“… no plano internacional, está já em pleno desenvolvimento a diplomacia multilateral, com sede e púlpito na Sociedade das Nações, assinala a consciencialização política das autoridades de ambos os países sobre a importância da língua, como veículo de afirmação dos pequenos Estados, numa arena onde a

igualdade apenas tem tradução formal” 64.