• Nenhum resultado encontrado

As teorias neoinstitucionais no contexto brasileiro

63

64 Mainwaring (1999), Samuels (2003).

Entretanto, Argelina Figueiredo e Fernando Limongi (1995, 1999), com base em estudo sobre as votações empreendidas no Plenário da Câmara dos Deputados, verificaram a existência de disciplina partidária, de previsibilidade nas votações, e de poder de agenda do Executivo para pautar e aprovar suas propostas.

Eles concluíram que não se verificava indisciplina partidária suficiente para se conduzir a uma paralisia e que o Congresso Nacional não atuava como veto player institucional. Nas análises dos dados, o que se verificou foi um Poder Executivo forte e um Congresso disposto à cooperação e à votação disciplinada tal como se via na média de votação do Plenário de acordo com a liderança, que chegava a 89,4%

(FIGUEIREDO; LIMONGI, 1999, p. 20). As taxas de aprovação das matérias apresentadas pelo Executivo eram, portanto, elevadas.

Esse entendimento – de que o comportamento dos partidos é disciplinado, as decisões da Câmara dos Deputados são previsíveis e os deputados não tem o poder de fazer valer seus interesses particularistas ou clientelistas por meio da legislação – é compartilhada posteriormente por outros cientistas políticos brasileiros, como Pereira (2000), Lemos (2001), Amorim Neto e Santos (2002), Ricci (2003).

Esses estudos que analisaram o formato da organização dos trabalhos legislativos verificaram que o processo decisório é muito centralizado no Executivo e no papel das lideranças partidárias, o que desestimularia a produção de leis ordinárias com foco distributivista nas comissões permanentes9. Entretanto, Gustavo Müller (2005, p. 110), ao estudar os padrões de recrutamento para as comissões permanentes na Câmara dos Deputados, questiona a interpretação corrente de que as comissões desempenhariam um papel secundário em virtude dessa alta centralização do poder decisório no Plenário da Casa, uma vez que considera haver fortes indícios de que o processo legislativo brasileiro confere às comissões um papel relevante como centros decisórios.

De igual forma, no que tange à agenda legislativa, Ricci e Lemos

9 Na análise do processo orçamentário, também se verificou uma falta de paroquialismo, em especial nas emendas dos deputados (FIGUEIREDO; LIMONGI, 2002; 2005), em que se constatou que o lócus privilegiado é o Estado e não o município.

65 (2004, p. 110) argumentam que, “mesmo em um processo decisório altamente centralizado, acreditamos ser questionável a orientação da literatura que defende um papel secundário das comissões”, uma vez que existem “fortes indícios de que a dinâmica do law-making brasileiro atribui um papel relevante à atuação das comissões como centros decisórios”. Nascimento (2010, p. 308), por seu turno, expressa que as

“comissões podem ser elementos poderosos dentro de uma legislatura não somente por que eles monopolizam poderes de agenda (agenda power), mas também por que eles monopolizam informações e expertise”.

Com efeito, o trabalho de Ribeiral (1998), ao estudar a então Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (CCJR), observou que algumas comissões são mais relevantes do que outras na condução do processo legislativo.

Além do mais, verificou que a CCJR exercia o seu poder terminativo10, era extremamente produtiva, e, a despeito de haver uma considerável rotatividade de seus membros, propiciava a especialização interna. Além do mais, se conformava como relevante veto player institucional, em um ambiente em que os lobbies internos possuem um maior poder de barganha (RIBEIRAL, 1998, p. 77).

Ainda, Ribeiral (1998, p. 80) salientou que os modelos neoinstitucionais conseguem compreender partes do comportamento parlamentar.

Assim, o modelo partidário consegue explicar as interferências das lideranças no comportamento e na rotatividade dos membros da CCJR, uma vez que os líderes podem substituir a qualquer tempo seus membros na comissão, levando-os a se comportarem em consonância com os anseios de sua bancada11. O modelo distributivo revela o comportamento dos congressistas ao se observar o interesse do parlamentar em relatorias de projetos de decreto legislativo voltados para concessão

10 o poder terminativo é o poder outorgado às Comissões de Constituição e Justiça e de Cidadania e de Finanças e Tributação quando examinam os aspectos de constitucionalidade e juridicidade ou adequação financeira e orçamentária das proposições, respectivamente. Essas comissões apresentam parecer terminativo sobre os aspectos citados, podendo, caso não se verifique a existência dos pressupostos de constitucionalidade e juridicidade ou adequação financeira ou orçamentária, encerrar a tramitação dessas proposições, salvo recurso ao Plenário para que ele decida, definitivamente, em apreciação preliminar , sobre a admissibilidade da matéria.

11 “O modelo partidário permite explicar os objetivos da interferência das lideranças no comportamento e na rotatividade dos deputados da Comissão de Constituição e Justiça. Como regimentalmente, possuem a prerrogativa de substituição do membro titular, em qualquer momento da legislatura interna da comissão, esse recurso é utilizado estrategicamente pelas lideranças partidárias com o objetivo de constranger o comportamento do legislador com relação aos interesses da bancada.”

(RIBEIRAL, 1998, p. 80).

66 de recursos à municípios ou regiões geográficas de sua circunscrição eleitoral. E o modelo informacional, ao se perscrutar o estabelecimento de incentivos para a especialização dos parlamentares nas comissões, gerando benefícios para a busca de informação e especialização para o uso estratégico na arena política.

Pereira e Mueller (2000, p. 62), após análise empírica sobre as comissões permanentes da Câmara dos Deputados, constataram que, apesar das relevantes diferenças existentes entre as instituições políticas brasileiras e as norte-americanas, os modelos neoinstitucionalistas podem ser aplicados para entender as instituições e os atores políticos do Brasil e suas relações.

Os referidos autores conseguiram demonstrar ainda que, quanto mais extremadas forem as preferências de uma determinada comissão, maior a probabilidade de ocorrer um pedido de urgência, retirando a competência do colegiado de apreciar alguma proposição. Isso ocorre porque quanto maior for a distância entre as preferências medianas da comissão e as do plenário, menos informação será revelada pelo colegiado, de forma que haverá uma maior probabilidade do custo de espera ser maior do que o ganho informacional. Por outro lado, as comissões mais representativas do plenário teriam uma maior probabilidade de reduzir a incerteza, havendo, portanto, uma menor chance de ter proposições de sua alçada com pedidos de urgência (PEREIRA; MUELLER, 2000).

Outros estudos também analisaram comissões permanentes sob a ótica neoinstitucional, como o de Paolo Ricci e Leany Lemos (2004), sobre a produção legislativa e preferências eleitorais na então Comissão de Agricultura e Política Rural (CAPR), e o de Simone Diniz (1999), sobre o funcionamento da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP).

Dessa forma, conforme pode se depreender dos trabalhos acima elencados, há diversos autores que, fazendo uso dos modelos neoinstitucionalistas, analisaram o Congresso Nacional brasileiro e, mais especificamente, a Câmara dos Deputados no que concerne ao funcionamento de suas instituições, a organização de seus trabalhos legislativos, o processo decisório em seu interior, sua relação com o Executivo, a conexão eleitoral de seus membros. No entanto, há poucos estudos ainda que analisaram de forma mais abrangente o seu sistema de comissões como

67 um todo por meio do neoinstitucionalismo. Os trabalhos de Ribeiral (1998), Diniz (1999), Ricci e Lemos (2004), como exemplo, se detiveram ao estudo de caso de uma comissão específica.

É nesse contexto que o presente trabalho visa realizar uma análise do sistema de comissões permanentes da Câmara dos Deputados com o objetivo de buscar entender a dinâmica interna do legislativo federal, investigar o processo de tomada de decisões no seio do Poder Legislativo, além de auxiliar na obtenção de um entendimento mais robusto de como atuam as diversas instâncias internas do Legislativo, principalmente as comissões permanentes, e como se dá a interação delas com os partidos, o Executivo, o Plenário e os agentes externos à Casa.

68