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Aspetos Orçamentais das Casas de Portugal

As Casas de Portugal contavam com uma verba financeira, dotada pelo Estado, através do Ministério que as superintendia. É possível identificar dois momentos marcantes nos orçamentos destas instituições. Um primeiro aponta para quando estas instituições se encontravam sob a dependência do MNE; e um segundo momento, quando transitaram para o SNI, a partir de 1953, e receberam um aumento significativo de dotação orçamental.

No que diz respeito ao financiamento das mesmas por parte do Estado, de 1931 até 1953, estas estruturas eram incluídas em rúbricas a cargo do MNE. De seguida, altura em que transitaram para o SNI, estas passariam a estar incluídas no Ministério das Finanças, até 1959; a partir desse ano, as verbas integravam os Encargos da Nação, até 1974346. No entanto, e no que diz respeito à sua distribuição pelas diversas cidades onde foram instaladas as Casas de Portugal, verifica-se que nem sempre esta distribuição de verba era equitativa. O Quadro 3.1., que de seguida se apresenta, retrata o valor atribuído a cada uma destas instituições.

Quadro 3.1. Análise comparativa dos orçamentos das Casas de Portugal em Londres, Paris e Nova Iorque (1931-1971) – a preços constantes de 1970

Paris Londres Nova Iorque

1931 259 146 0 1941 194 148 388 1951 220 300 865 1961 2299 2970 2490 1971 8669 11494 28901

(em milhares de escudos – 1.000$00)

Fonte: Orçamentos de Estado para os anos 1931 até 1971, Valério, Nuno (coord.) (2001), Estatísticas Históricas

Portuguesas (Volume 1), Lisboa, Edição do Instituto Nacional de Estatística.

É possível verificar que a Casa de Portugal em Nova Iorque recebia uma verba consideravelmente superior às restantes, especialmente a partir dos anos 50. Várias razões poderão ter dado origem a esta realidade. Em primeiro lugar, devemos considerar o âmbito geográfico de atuação, que incluía todo o território dos EUA e parte do Canadá. Em segundo lugar, o custo de vida era superior ao dos restantes países, especialmente no que dizia respeito

346 As Casas da Metrópole de Luanda e Lourenço Marques, estruturas similares às Casas de Portugal,

eram suportadas pelo Ministério do Ultramar. As Casas de Portugal em Nairobi e Dakar não teriam apoio anual monetário, inscrito em orçamento, por parte do Estado.

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a vencimentos a auferir pelos seus diretores e respetivos funcionários, sendo a sua dotação proporcional. Em terceiro lugar, é de realçar a importância da Casa de Portugal em Nova Iorque em comparação com as restantes, especialmente dedicada ao trabalho político e de propaganda e defesa do bom nome de Portugal no estrangeiro.

No que diz respeito às Casas de Portugal em Paris e Londres, é possível afirmar, a partir dos dados do quadro acima, que o orçamento para a despesa da Casa de Portugal em Paris, nos primeiros anos da sua existência, foi consideravelmente superior ao da Casa de Portugal em Londres. Entre as razões que podem ser debatidas para justificar esta diferença de valores, destacam-se as rendas de edifícios para albergar estas instituições, bem como despesas de manutenção, que variavam. A Casa de Portugal em Paris estava localizada num centro turístico de grande importância, junto à Ópera Garnier.

Ao proceder a uma análise geral da distribuição de verbas, verificámos um aumento gradual ao longo do período em análise, embora muito mais acentuado a partir dos anos 50, atingindo o seu ponto alto durante os anos 60, anos importantes no que diz respeito a movimentos de turistas internacionais, bem como de investimento por parte do Estado na imagem de Portugal no exterior, e à defesa da posição portuguesa em relação às colónias africanas e a sua respetiva aceitação internacional.

Ao analisar um orçamento enviado ao MNE e, posteriormente, ao SNI, verificámos que o mesmo se dividia em diversas rubricas. No que diz respeito a despesas com recursos humanos, as Casas de Portugal deveriam garantir o pagamento do vencimento do seu diretor, bem como do chefe de secção (turística ou comercial), caso os lugares fossem ocupados, bem como do dos secretários ou escriturários. O vencimento dos diretores diferia entre as várias Casas e estava dependente do custo de vida de cada país. Assim, o diretor da Casa de Portugal em Paris auferia, em média, um vencimento anual de 65.000$00, o diretor da Casa de Portugal em Londres recebia 70.000$00 e o diretor da Casa de Portugal em Nova Iorque recebia um vencimento correspondente a 100.000$00.347

No que diz respeito a despesas com material, esta rubrica referia-se, essencialmente, à aquisição de móveis e de máquinas de escrever, bem como de livros, publicações, revistas e respetivas encadernações. Alguns exemplos que podiam ser incluídos nas categorias de conservação incluíam reparações diversas de móveis, limpeza periódica das máquinas de escrever, e armazenamento e conservação de mostruários. Contavam-se entre as despesas elegíveis os materiais de consumo, impressos, envelopes, cartões e folhas de serviço.

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A rubrica referente a despesas de publicidade e propaganda contemplava valores a serem gastos em artigos para revistas e jornais de interesse para a Casa de Portugal, adquirindo ainda anúncios às diversas publicações. Ainda neste registo, custeava a impressão e reimpressão de material de propaganda e coordenava a sua distribuição. Finalmente, atribuía prémios e comprava livros para oferta a escolas de língua portuguesa, igrejas e associações, ou até a instituições culturais americanas.

Relativamente a gastos confidenciais ou reservados, tratava-se de uma despesa muito importante, nomeadamente para o orçamento americano. Podemos encontrar valores referentes a subvenções particulares a jornalistas e colaborações de jornais influentes no meio americano para publicação de artigos de redação, nomeadamente publicidade indireta referente ao turismo, produtos portugueses e, de uma maneira geral, propaganda de Portugal. Esta rubrica custeava também convites para fazer e distribuir pela Casa de Portugal nos diferentes meios oficiais, financeiros, jornalísticos e culturais. Incluía ainda a contabilização das despesas de viagens ou de transportes que o gerente era obrigado a fazer no exercício das suas funções. “Gastos confidenciais” é, pois, uma rubrica que diferencia o perfil político da Casa de Portugal em Nova Iorque em relação às restantes. Ela retrata o papel do que, hoje, designaríamos como atividades de lobbying, aproveitando o veículo da propaganda turística para ampliar uma ação de legitimação de Portugal e do seu governo no grande palco da política e da diplomacia internacional.

Outras despesas correntes estavam incluídas no orçamento como, por exemplo, a manutenção de equipamento (aluguer de vitrines), artigos para expediente, incluindo todo o material de escritório em geral, despesas de higiene, luz, água, limpeza, iluminação, desinfetantes, serviços de lavagem e enceramento de oleados. As despesas de comunicação resumiam-se a despesas de telégrafo, franquias postais e respetivas remessas, telegramas, telefone, transportes, nomeadamente transportes em serviço do pessoal, carretos de material e encargos de instalações, como, por exemplo, a renda do edifício onde se localizava a Casa de Portugal e, eventualmente, o aluguer de algum armazém e ainda seguro contra incêndios.

Nas figuras seguintes, apresentamos a evolução da despesa orçamental detalhada das Casas de Portugal em Londres, Paris e Nova Iorque. Não será analisado, desta forma gráfica, o caso da Casa de Portugal em Antuérpia, pelo facto de a dotação financeira ter sido igual ao longo dos seus quatros anos de existência, ou seja, de 60.000$00 anuais, e pelo facto de as características da mesma serem divergentes relativamente aos restantes casos estudados nesta dissertação.

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Fontes: Orçamentos de Estado para os anos de 1931 até 1971; Valério, Nuno (coord.) (2001), Estatísticas Históricas Portuguesas (Volume 1), Lisboa, Edição do Instituto Nacional de Estatística.

Figura 3.1. Evolução da despesa orçamentada da Casa de Portugal em Paris, a preços constantes de 1970

Fontes: Orçamentos de Estado para os anos de 1931 até 1971; Valério, Nuno (coord.) (2001), Estatísticas

Históricas Portuguesas (Volume 1), Lisboa, Edição do Instituto Nacional de Estatística.

Figura 3.2. Evolução da despesa orçamentada da Casa de Portugal em Londres, a preços constantes de 1970 0 1 000 2 000 3 000 4 000 5 000 6 000 7 000 8 000 9 000 10 000 1931 1941 1951 1961 1971 d es p es as em 1000 e scu d o s 0 2 000 4 000 6 000 8 000 10 000 12 000 14 000 1931 1941 1951 1961 1971 de sp esa s o rç am ent ad as e m 1000 esc ud o s

163 Fontes: Orçamentos de Estado para os anos de 1931 até 1971; Valério, Nuno (coord.) (2001), Estatísticas

Históricas Portuguesas (Volume 1), Lisboa, Edição do Instituto Nacional de Estatística.

Figura 3.3. Evolução da despesa orçamentada da Casa de Portugal em Nova Iorque, a preços constantes de 1970

Em relação às despesas da Casa de Portugal em Paris, a dotação orçamental registou um salto a partir da década de 1950, altura em que muda o enquadramento institucional das Casas de Portugal348. De acordo com os orçamentos encontrados no Fundo Arquivístico do SNI, era

fundamental levar a cabo a política de promoção de Portugal através da sua cultura popular e belezas naturais, como, por exemplo, empréstimo de fatos típicos regionais da Nazaré, despacho de flores da Madeira, fornecimento da revista Indústria do Norte, estampas litografadas, guias e publicações turísticas, guia turístico Portugal Welcomes You, filmes sobre aspetos da ilha da Madeira, livros relacionados com o azulejo em Portugal, fotografias de monumentos, mapas das estradas de Portugal, reprodução em gesso do busto de Oliveira Salazar, fornecimento de redes de pesca, revista Comércio Externo, compras de pautas alfandegárias, livro Os Primitivos Portugueses, livros sobre História de Portugal, livro sobre fabricantes e exportadores de Portugal, gravações de música portuguesa e Anuário do Turismo Português349.

348 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Fundo SNI, Caixa 525, Correspondência Casa de

Portugal em Paris, Relatório de Despesas da Casa de Portugal em Paris.

349 Idem. 0 5 000 10 000 15 000 20 000 25 000 30 000 35 000 1931 1941 1951 1961 1971 de sp esa s o rç am ent ad as e m 1000 esc ud o s

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Relativamente às várias rubricas inscritas em orçamento, tal como as restantes Casas de Portugal, estas dividem-se em despesas com pessoal (pessoal assalariado, despesas de representação, outras despesas com pessoal), despesas com material (aquisição de móveis, conservação e aproveitamento de material), pagamento em serviços e diversos encargos (despesas de higiene, despesas de comunicação, encargos das instalações), pagamentos de serviços e diversos encargos (publicidade e propaganda turística, publicidade e propaganda comercial, manutenção da sala de exposições, participação em feiras regionais)350.

Relativamente à Casa de Portugal em Nova Iorque, aqui registamos uma evolução mais singela até aos anos 50 e, a partir desse momento, um aumento significativo de gastos por parte desta instituição. Para além das despesas habituais inerentes às Casas de Portugal acima detalhadas, realçamos outras, de interesse, e que diferenciam esta Casa das restantes. Neste caso em particular, as despesas de representação eram fundamentais para possibilitar a criação de relações de amizade entre o povo americano e o português. Embora esta incumbência fosse exigida a todos os centros, foi no caso de Nova Iorque que se verificou uma atenção maior para esta estratégia. Deste modo, eram consideradas despesas com “receções de pessoas de posição em serviço oficial que por aqui passaram e que foi conveniente convidar para pôr em contacto com importantes elementos americanos”351.

Ainda no que diz respeito às relações luso-americanas, era compromisso desta Casa publicar anúncios durante o ano e em cada um dos quatro jornais de língua portuguesa, de New Bedford, Massachusetts, Nova Iorque, Newark (New Jersey) e Oakland (Califórnia)352. Estes contratos eram oferecidos na condição de serem aceites, exclusivamente, sob um aspeto de transação comercial destinada a utilizar o poder de divulgação da imprensa junto da colónia e contribuiu para estabelecer uma atmosfera de amizade. Para além destas despesas referidas, destaca-se ainda o Programa Luso-Americano, que contava com um conjunto de atividades junto da comunidade portuguesa residente nos EUA. Despesas como o apoio a festas populares, a construção de novas igrejas e a criação de escolas de português destacam-se nos valores gastos nesta rubrica do orçamento. As funções suplementares políticas e de lobbying desta delegação

350 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Fundo SNI, Caixa 525, Correspondência Casa de

Portugal em Paris. Proposta de orçamento para o ano de 1958.

351Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Fundo SNI, Caixa 1641, Processo Casa de Portugal

em Nova Iorque.

352 Diário de Notícias de New Bedford, Jornal diário, 4.000 assinantes; Luso-Americano de Newark,

Semanário, 3.500 assinantes; Lucta, de Nova Iorque, Semanário, 5.000 assinantes; Jornal Português de Oakland, Califórnia, 5.000 assinantes.

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explicam, em parte, que, na viragem para os anos 70, a casa de Portugal em Nova Iorque esteja a gastar, anualmente, o dobro da casa de Londres e o triplo da casa de Paris.

No que diz respeito às receitas de cada uma das Casas de Portugal, estas também alteravam de acordo com cada país. Para além da dotação concebida pelo Estado português, as Casas de Portugal em Paris e em Londres contavam ainda com subsídios das diversas empresas e entidades interessadas no seu funcionamento, bem como a retribuição dos serviços prestados pela Casa de Portugal nas exposições e produtos, a par das comissões que viessem a ser estabelecidas nas transações em que tivesse de intervir353.

No caso de Antuérpia, esta Casa só esteve em funcionamento durante quatro anos e contava sempre com a mesma verba, no valor de 60.000$00. A razão deste baixo valor deve-se ao facto de esta Casa ter uma estrutura de financiamento e de gestão diferente das Casas congéneres, pois previa-se o pagamento de quotas de sócios, algo que não acontecia com as restantes. As receitas da Casa de Portugal em Antuérpia eram constituídas por: quotas dos sócios; donativos provenientes dos sócios ou de qualquer outra origem; produto das assinaturas e anúncios do Boletim, a publicar; rendimento dos seus capitais; outras receitas eventuais; e subvenção dos organismos não oficiais interessados na ação das casas de Portugal354.

Em conclusão, a análise aqui detalhada retrata, efetivamente, que a dotação orçamental para Nova Iorque se destaca das restantes, o que representa um maior alcance nas atividades de promoção política, a atenção e acompanhamento da comunidade emigrante portuguesa e uma cobertura extensiva da promoção de Portugal em todo o território americano.

353 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 19:333, Ministério dos Negócios Estrangeiros, 10 de fevereiro

de 1931.

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