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Operetas e revistas

2.5 Associações Culturais

Em Campinas, as associações culturais desempenharam importante papel na construção das formas de sociabilidade e de identidade de grupos étnicos e sociais. No caso das sociedades fundadas pela elite, nos espaços onde desdobravam-se as circunstâncias sociais, estabeleciam-se também os laços relacionais e a demonstração de poder.

Algumas associações fizeram de seus salões bons espaços para a apreciação musical em forma de concertos, nos quais músicos concertistas e cantores apresentavam-se de maneira oportuna. A existência dessas salas de concerto em muito ajudaram a construir os parâmetros de apreciação musical e de valores artísticos de um seleto público. Junto ao universo das práticas musicais no âmbito do privado, os clubes musicais, formados destacadamente por mulheres, também funcionaram como pequenas instituições culturais, nas quais uniam-se o aprendizado e a expressão pública e personalizada do saber musical.

Clube Semanal

Fundado em 16 de julho de 1857, o Clube Semanal se constituiria, durante a segunda metade do século XIX, como a principal sociedade cultural da cidade, representativa da elite local. Obteve significativa evolução a partir de 1873, quando instalou-se em salão próprio para a realização de encontros sociais e dançantes. Três anos depois, com a compra de um piano Pleyel, o espaço ganhou também as características de uma sala de concerto (NOGUEIRA, 2001: 191).

Instrumentistas e cantores em passagem por Campinas poderiam encontrar no Clube Semanal um espaço ideal para apresentações e, de fato, a sociedade tornou-se importante cenário para o desenvolvimento da música vocal e instrumental na cidade, ampliando as possibilidades das experiências musicais na forma de concertos.

Ao aproximar-se o final do século, no entanto, a associação apresentou sintomas de decadência, como indicou Raphael Duarte. Por volta de 1900, o Clube encontrava-se com sua “glória eclipsada por motivos sem explicação” (DUARTE, 1905: 40). Nos anos anteriores, embora parecesse haver níveis de organização satisfatórios, com diretoria e regularidade de reuniões administrativas das quais estavam à frente representantes como Bento Quirino dos Santos, Antonio Álvares Lobo e Leopoldo Amaral, alguns efeitos de desaceleração nas atividades da associação fizeram-se sensíveis.

No mesmo ano de 1900, no entanto, novas resoluções indicavam um período de reformas no modelo associativo. Em uma reunião especial entre sócios e os acionistas proprietários do edifício-sede deliberou-se a fusão da sociedade recreativa e da associação, estabelecendo-se, então, novos estatutos, acordados com as exigências das associações recreativas reconhecidas por lei. Elegendo-se nova diretoria, sob a presidência de Antonio Lobo, foram autorizadas as necessárias reformas no prédio do Clube, para as quais colaborou com o valor de 5 contos de réis Bento Quirino dos Santos, fundador da sociedade e seu presidente por mais quarenta anos. Com reparos internos e externos, foram feitos melhoramentos na segurança do edifício, pintura e decoração do salão.

Por motivos desconhecidos, não foi possível identificar as atividades musicais ocorridas no Clube Semanal após esse momento de reorganização. Não se espera tratar-se de um período de nova ascensão da sociedade, uma vez que em 1916, sob outras circunstâncias, ocorreu sua união com outra associação, o Grêmio de Cultura Artística. São considerados a seguir, portanto, os registros musicais referentes aos anos 1890.

Passados os primeiros anos de recessão cultural observados no período de maior incidência da epidemia de febre amarela, parece haver a retomada da sociedade a partir de 1893, ao menos no que se refere aos concertos. No entanto, a realização desses programas musicais não se deram com grande regularidade no último decênio daquele século, havendo poucas ocorrências dessas ocasiões.

Como descrito no primeiro capítulo, em 1893 destacou-se o concerto dado pelo violinista Próspero Marsicano, em que foram tocadas peças para grupos de cordas e solos de violino acompanhado ao piano. Na execução de um repertório romântico, com Schubert e Chopin, tiveram participação professores e músicos locais, como Luiz Monteiro, Emigdio Ramos Junior, Emílio Steudel e José Ferreira Penna.

Em novembro do mesmo ano, apresentou-se em concerto o casal italiano Felicina e Filippo Blesio. O mezzo-soprano, com formação em canto e piano pelo Conservatório de Milão, já cantara em companhias líricas nas principais cidades europeias, e seu esposo, violoncelista, fora discípulo do maestro Serati. O programa apresentado reunia peças para canto de estilo também romântico, ao lado de trios para violino, violoncelo e piano de Mendelsshon e Hummel, nos quais auxiliaram Sant’Anna Gomes e Emílio Steudel. Como de

costume, os dois músicos atuaram ainda no concerto de outra artista que visitou a cidade, o soprano Gaetanina Friggeri.

Os concertos identificados nos anos seguintes foram poucos, como o realizado em 1896 por artistas de uma companhia de zarzuelas que se encontrava no Teatro São Carlos. Nessa ocasião, foram beneficiados os cantores Tullio Campello e Mario Cavicchi, através da influência de Sant’Anna Gomes. Ao lado de árias e romanzas italianas, cujo predomínio ainda se estendia nos programas de concertos vocais, foram cantados trechos mais conhecidos de zarzuelas espanholas como La guerra santa e Los diamantes de la corona. Uma orquestra executou passagens de La Mascotta e El anillo de hierro.

Um destacado concerto deu-se em 1897 com a presença do violinista cubano Raphael Díaz Albertini (1857-1928), célebre em seu país e na Europa por conquistar o primeiro prêmio de violino do Conservatório de Paris. Entre peças cantadas pelo tenor português Joaquim Tavares, o virtuose apresentou-se com Martha, fantasia de outro famoso violinista cubano, José White, Noturno, Habanera e Fausto, de Pablo de Sarasate e As bruxas, de Paganini. Em suas habilidades e excelente técnica, o músico causou grande impressão sobre o público, ávido pela contemplação de execuções virtuosísticas e de grande apelo emotivo:

“Aqueles sons harmônicos e de notas dobradas iam se avolumando sob o arco, com sublime maestria, e como que se coadunando com o sentimento do artista. Torrentes de aplausos acolheram os últimos e expressivos acordes.” (Diário de Campinas, 21.09.1897)

Clube Livro Azul

Os salões da Casa Livro Azul, com seus pianos e objetos de arte, fizeram-se também espaços sociais e de atividades culturais, com sessões musicais e literárias. Seu proprietário Antonio Benedicto de Castro Mendes possuía notável perfil de articulador cultural, colaborando para as movimentações dessa natureza em seu próprio espaço. Um concerto ali organizado ao final de 1889, já descrito no primeiro capítulo, fez-se significativo pela inventividade de seu incentivador.

As ideias e conversações desenvolvidas durante as reuniões do Clube resultaram em um acontecimento artístico ao final de 1903. Incumbido de escrever algo a ser colocado na reunião próxima ao Natal, o literato Coelho Netto acabou por preparar um material que

ganhou, então, proporções cada vez maiores, até transformar-se em uma peça de natal, a Pastoral, composta da Anunciação, Visitação e Natal.

Na pauta, Francisco Braga, Alberto Nepomuceno, Henrique Oswald e Sant’Anna Gomes Coelho Netto em destaque. Fonte: Acervo Fotográfico do Centro de Memória da Unicamp

Conta Raphael Duarte que durante os ensaios dos artistas, as salas ficavam repletas de senhoras e cavalheiros, todas as noites. Eram ainda os ensaiadores um farmacêutico, um festejado pianista e um antigo professor alemão. O autor descreve ainda mais sobre os preparativos da peça e seus participantes, que agora a apresentariam no Teatro São Carlos:

Organizaram-se os corpos de coristas de ambos os sexos, nacionais e os associados alemães, do Club Concordia, orquestra de amadores sob regência muito competente de um saudoso musicista Olegário Ribeiro, amador distintíssimo, contando-se nela representantes de várias classes sociais, desde um estimado deputado federal (1º violino), até um modesto artífice (trombone). (DUARTE, 1905: 213)

Com a colaboração de quatro compositores, as partes musicais foram escritas por Sant’Anna Gomes – Prelúdio, Henrique Oswald – Anunciação, Francisco Braga – Visitação e Alberto Nepomuceno – Natal. Este compareceu à representação da peça no Teatro São Carlos

no dia 25 de dezembro, quando o recinto foi iluminado à luz elétrica pela própria Livro Azul, através de um gerador. Tomando o lugar cedido pelo maestro Olegário, Nepomuceno regeu a orquestra.

Cena da Pastoral no Teatro São Carlos em 1903 Arquivo Fotográfico do Centro de Memória da Unicamp

Club Campineiro

Foi fundado em 2 de novembro de 1891, tendo como primeira sede o sobrado que pertencera ao Visconde de Indaiatuba18, alugado à sociedade pelos herdeiros de seu antigo

proprietário. Seu prédio próprio19, localizado ao lado da praça Bento Quirino, teve sua construção iniciada em 1913, mas retomada somente dez anos depois por falta de recursos. Após a obtenção destes através de doações e por outros meios, a nova sede foi inaugurada em 1925.

18 O antigo solar do Visconde de Indaiatuba localiza-se na esquina das atuais ruas Barão de Jaguara e General

Osório, reformado em 1994 após um incêndio. Foi tombado pelo CONDEPACC em 1988.

19 Este prédio localiza-se ao lado do Monumento a Carlos Gomes, e atualmente possui o nome de Jockey Club

Antigo solar do Visconde de Indaiatuba em 1900, sede do Club Campineiro até 1925.

Fonte: Lapa, José Roberto do Amaral. A cidade: os cantos e os antros. Campinas: Editora da Unicamp, 2008. p.121.

A sociedade destinava-se às tradicionais reuniões sociais entre seus membros e, ao menos durante o período aqui considerado, observa-se que promoveu concertos musicais importantes, com grande contribuição para a vida cultural local. Em março de 1899, por exemplo, apresentou-se no Club o pianista e compositor português Alfredo Napoleão (1852- 1917), irmão do também músico Arthur Napoleão. Em seu concerto, tocou a Sonata Opus 27 e a Sonata para piano e violino n.1 em Ré maior, de Beethoven, quatro peças de Chopin e, na segunda parte, sua própria Sonata em Sol maior e algumas peças individuais, além de outras de Raff e Liszt. Em 1904, ainda antes de se tornar uma das mais representativas pianistas brasileiras, assistiu-se ali a um concerto de Magdalena Tagliaferro (1893-1986). Aos 11 anos, manifestando sua precocidade musical, apresentou um variado programa com a participação de músicos locais em acompanhamento de cordas.

A presença de professores e instrumentistas da cidade em concertos de artistas visitantes tornara-se uma tradição. Na ausência de concertistas ou cantores vindos de fora, as reuniões musicais eram organizadas entre os melhores mestres de música locais, que poderiam oferecer bons programas, junto aos músicos profissionais ou amadores que ali viviam.

Um concerto artístico e literário no dia de natal daquele ano foi oferecido pela diretoria do Club aos sócios, reunindo Emílio Steudel e Luiz de Pádua, dois destacados professores de piano, e o maestro Sant’Anna Gomes. Somente as partes musicais já demonstraram um elaborado trabalho artístico desenvolvido pelos participantes. As partes do programa foram iniciadas com as aberturas de Egmont, de Beethoven e de Phèdre, de Massenet, pela orquestra. O Concerto em Sol maior de Beethoven foi tocado a dois pianos, por Jocelyna de Castro Mendes e Emílio Steudel e a senhora Ida Stott cantou a ária de Salomé da ópera Hérodiade, de Massenet. Um coro feminino com mais de 20 componentes ainda executou o Coro das Fiandeiras da ópera O Navio Fantasma (Der fliegende Holländer) de Richard Wagner.

Essas reuniões culturais eram demonstração do rico envolvimento entre amadores e profissionais no cultivo das práticas musicais, mantendo vivos, ao menos nos ambientes íntimos das associações, a efervescência e o entusiasmo pela música erudita e sua vivência coletiva, em seus processos de aprendizado pessoal e apreciação pública dos resultados alcançados. Campinas também nunca deixara de possuir figuras de referência em seu quadro musical, de modo que foi possível observar a continuidade de trajetórias representativas na arte da música na cidade.

Em grande parte, isso se deve à tradição do conhecimento e prática musicais presentes na sociedade campineira, entre as famílias de elite e também nas que guardavam fortes laços com a arte musical, como os Gomes. Ao mesmo tempo, como cidade de notável desenvolvimento e diversificação dos espaços e instituições culturais ou educacionais, Campinas atraiu vários professores e músicos para atuação profissional em seu meio.

Ormeno Gomes, filho dos músicos Joaquina Gomes e Emílio Henking, tornou-se um dos herdeiros musicais da família Gomes e do universo artístico de Campinas, especializando-se no ofício da composição. Em maio de 1907, antes de retirar-se para Itália, onde estudaria, apresentou-se durante um sarau no Club Campineiro com sua 3ª Gavotta intitulada Graciosa, para piano, flauta e instrumento de corda. Em Florença, publicou suas gavotas, valsas e mazurcas, e dedicou sua 5ª Gavotta à princesa Mafalda de Saboia (MENDES, 1969).

Poucos dias depois, deu-se um concerto com a presença de outro músico campineiro, este em mais avançada fase de desenvolvimento artístico. O violinista Francisco

Chiaffitelli foi vencedor do 1º Prêmio de Violino do Real Conservatório de Bruxelas e já havia se apresentado em diversas cidades europeias e sul-americanas. Nessa ocasião apresentou, entre outras peças, Zapateado e Zigeunerweisen, composições de passagens virtuosísticas do espanhol Pablo de Sarasate, e Zamacueca, do cubano José White, acompanhado ao piano por sua esposa Orminda Teixeira Chiaffitelli.

Sabe-se que a também notável violinista Paulina d’Ambrosio (1890-1976), natural de São Paulo, apresentou-se ali em 1908. Como Chiaffitelli, estudou no conservatório belga, onde também conquistou o mesmo prêmio, e tornou-se professora de violino no Instituto Nacional de Música, no Rio de Janeiro. Atuou por algum tempo ao lado de Maria Amélia de Rezende Martins e Alfredo Gomes, músicos naturais de Campinas.

Em 1910, dois outros músicos brasileiros fizeram-se presentes na cidade – o pianista e compositor Joaquim Antonio Barrozo Netto (1881-1941) e o violinista Humberto Milano (1878-1933), ambos do Rio de Janeiro. Seguindo a tradição do repertório romântico da música camerística, o concerto fez-se importante pela presença das obras de alguns autores brasileiros. De Leopoldo Miguez (1850-1902), foram tocadas a Sonata para piano e violino, Noturno, e Scherzetto. De Francisco Braga, Air de ballet, de Henrique Oswald, Berceuse, além de composições do próprio Barrozo Netto, com a Segunda valsa capricho, para piano, e Nostalgia. Suas canções Adeus!, Dorme e Cantiga foram cantadas pela amadora Rosaura de Lemos.

As peças líricas executadas nesse concerto são exemplo da produção ascendente de música de câmera brasileira, durante as últimas décadas do século XIX. Embora o campineiro Sant’Anna Gomes seja também um representante desse movimento, suas composições só eram ali executadas, quase sempre, por seu próprio conjunto de cordas. Os compositores nacionais representados nesse concerto, ainda que de produção sob os moldes europeus, ocuparam um lugar poucas vezes concedido pelos concertistas em seus programas musicais, nos quais imperavam os mais tradicionais autores do romantismo, como Schumann, Brahms, Chopin, Mendelsshon, Liszt e Beethoven.

Os quatro últimos compositores, por exemplo, figuraram no programa do pianista cego Rodolfo Moriconi, em 1912. Alfredo Andrade, violoncelista brasileiro, também deu um concerto com autores românticos, com Chopin, Popper, Schumann, Brahms, Arthur Napoleão e Fischer. Nas apresentações vocais, por sua vez, os trechos operísticos ainda predominavam,

como se registrou do concerto do tenor Santino Giannattasio e do barítono Ernesto de Marco, pois apresentaram passagens de Verdi, Puccini, Bizet, Rossini e Thomas. Foi cantada ao menos a canção Ideale, de Francesco Paolo Tosti (1846-1916).

O repertório para violino também revelava as especificidades e tendências de estilo, segundo as características dos concertistas do período. Emilia Frassinesi, violinista italiana, apresentara-se na cidade anos antes no Teatro São Carlos durante um espetáculo de sua irmã Fátima Miris, famosa transformista cujo nome real era Maria Frassinesi. Em janeiro de 1913, veio novamente à cidade, dando um concerto no Club Campineiro acompanhada ao piano por Luciano Gallet.

Ao lado de peças de Sarasate e Paganini, onipresentes em concertos de violino, Frassinesi executou o Concerto em Mi menor Opus 64, a Sonata em Dó menor, de Grieg e um Noturno de Chopin. Comparando-se com o concerto dado em 1917 pelos irmãos Alfredo e Armando Belardi, violinista e violoncelista, encontram-se novamente as obras de Paganini, assim como Wieniawsky. Sarasate, por sua vez, aparecera no repertório de Chiaffitelli, anos antes. Violinistas que visitaram a cidade em outros espaços também trouxeram peças desses três compositores.

Um esperado concerto deu-se no ano seguinte, com a pianista Guiomar Novaes (1894-1979), que retornava à cidade em sua fase adulta, uma vez que havia se apresentado ali em 1905, quando algumas crianças puderam tomar parte em seu concerto. Natural da cidade paulista de São João da Boa Vista, tornou-se ainda em sua juventude uma destacada referência no meio musical internacional. Após seus estudos no Conservatório Musical de São Paulo sob as orientações de Luigi Chiaffarelli, foi admitida no Conservatório de Paris depois de um disputado concurso, no qual alcançou a primeira colocação. Novaes apresentou-se em Campinas em abril de 1914, ano em que deixou a Europa pelo início da Primeira Guerra. Nesse tempo já possuía grande reconhecimento, e seu recital foi antecedido de grandes preparações por parte de um grupo de mulheres, reunidas para suas comissões de organização nos salões da Casa Livro Azul.

Entre as moças, provavelmente estudantes de música, encontrava-se Maria Amélia de Rezende Martins, neta do Barão Geraldo de Rezende e que se tornou uma pianista profissional. Também se achava ali Olga Pedrário, que desenvolveu carreira como pianista e compositora. No salão nobre do Club, Guiomar Novaes deu ao público um grande concerto,

com peças de elevada dificuldade técnica, como a complexa composição de Liszt executada ao final, causando profunda impressão sobre o auditório:

Bach - Busoni – Chaconne

Chopin – Sonata em Si menor, Opus 58 Brahms – Capriccio em Si menor.

Moszkowsky – Estudo de concerto Les vagues Zanella – Minuetto

Liszt – Rapsódia Húngara n.2

A aguardada presença da pianista e sua representação como destacada pianista evidenciava um importante aspecto da cultura musical do período – a relevância da figura feminina no cultivo da arte musical das elites. Nas práticas da cultura privada, com a inserção do piano como ícone cultural de posição central nos ambientes familiares e sociais durante o século XIX, as mulheres associaram-se fortemente aos hábitos musicais através do conhecimento da arte pianística e vocal. Firmando-se ideologicamente como cultura de classe, as práticas musicais do universo feminino traduziram-se como distinção e valorização pessoal em sua sociedade.

Tais características da formação cultural feminina ainda manifestavam-se pelo início do século XX, como se percebe pelo envolvimento e presença das mulheres nos programas musicais descritos. Embora amadoras em sua maioria, é visível o elevado nível de desenvolvimento musical que alcançavam e, de fato, parecem responder por grande parte das movimentações culturais da cidade. Ainda que sob a perspectiva das questões morais e sociais que as envolviam em tempos de predomínio do conservadorismo, deve-se ressaltar o enriquecimento que proporcionavam à vida musical através das práticas e conhecimentos artísticos que possuíam.

Guiomar Novaes cercada pela comissão de jovens mulheres, por ocasião de seu concerto em 1914 no Club Campineiro.

Revista A Cigarra, edição de maio de 1914. Acervo digital do Arquivo do Estado de São Paulo

Vincenzo Cernicchiaro (1858-1928), violinista, compositor, professor e musicólogo italiano radicado no Brasil, foi mais um dos músicos atuantes no universo musical carioca a se apresentar em Campinas. Seu concerto deu-se em 1917, com a pianista Maria Lina Jacobina, apresentando obras do violinista tcheco Ferdinand Laub (1832-1875), Chopin, Wieniawsky e Camille Saint-Saëns. Deste apresentou a Sonata n.1 Opus 75 para violino e piano, a mesma que tocou com o próprio compositor em 1899, quando da primeira apresentação dessa peça no Brasil, no Teatro São Pedro de Alcântara. Cernicchiaro também