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PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 2 – O Papel da Atividade Física na Promoção da Saúde

2.2. Benefícios da Atividade Física e de Estilos de Vida Saudáveis

2.2.4. Atividade Física e Rendimento Escolar

Dada a importância da educação na integração na sociedade, uma das principais preocupações dos pais é com o aproveitamento escolar dos filhos e também a escolha das atividades lúdicas para que possam coexistir de forma integrada e complementar (De La Haye et al., 2014; Dessen & Polonia, 2007; Guerreiro, 2013; Kirby, Levin, & Inchley, 2011; Teedon et al., 2014).

A participação dos filhos em AF e/ou desportivas é muitas vezes vista pelos pais de forma ambígua. Por um lado, pode ser vista como um contributo positivo à performance escolar, através da motivação/satisfação, da promoção do trabalho em equipe e da autodisciplina, cujas vivências/competências são transponíveis para o ambiente escolar. Por outro lado, pode também ser encarada de uma forma negativa, uma vez que reduz o tempo disponível para estudar e aprender (Rees & Sabia, 2010).

Franz e Feresu (2013) analisaram a relação entre a AF e a composição corporal e o rendimento academico de 77 alunos em idades escolar nos Estados Unidos da America. Os autores referem que os alunos que praticam AF apresentam menor incidência de depressão e consumo de tabaco, melhor dieta alimentar e melhor gestão do stresse e uma relação mais próxima com os pais, ao passo que a redução da prática da AF revelou se como um fator de risco para o desenvolvimento de excesso de peso e obesidade. Concluiram também que alunos com índices de massa corporal normal (relação peso/altura) têm a média de notas mais elevadas. O autor ressalta a necessidade de intensificar as intervenções focadas na redução e prevenção da obesidade na população em idade escolar (Franz & Feresu, 2013). Um outro estudo de Bastos et al. (2015) que envolveu 490 alunos do 3º ciclo e ensino secundário em Portugal também evidênciou a relação entre a prática de AF e o peso normal, como uma influência positiva no rendimento escolar.

Evidências científicas baseadas em abordagens de neuroimagem, realizadas ao longo da última década, demonstraram a eficácia da AF na melhoria da saúde cognitiva ao longo da vida humana. O treino aeróbio poupa a perda de tecido cerebral inerente ao envelhecimento e melhora os aspetos funcionais relativos ao controlo da cognição. Indivíduos mais ativos ou mais aptos são capazes de alocar maiores recursos atencionais para o ambiente e são capazes de processar mais rapidamente informações. Estes dados

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são sugestivos de que a aptidão aeróbica aumenta as estratégias cognitivas, permitindo responder de forma eficaz a um desafio imposto com um melhor rendimento no desempenho da tarefa (Gomez-Pinilla & Hillman, 2013).

Uma vez que o cérebro humano não está totalmente desenvolvido até à terceira década de vida, a pré-adolescência é caracterizada por mudanças na estrutura e função cerebral subjacentes a aspetos da cognição, incluindo o controlo executivo (autorregulação comportamental: por exemplo, interromper uma atividade e passar para outra atividade, planear com antecedência, fazer mais de uma tarefa ao mesmo tempo, concentrar-se por longos períodos de tempo, e renunciar a recompensas imediatas) e memória relacional (por exemplo, identificar onde está um objeto). Investir em práticas de AF adequadas para desenvolver a aptidão física aeróbica na infância pode contribuir para promover a saúde física e cognitiva (Khan & Hillman, 2014)

A pesquisa sobre o comportamento do cérebro indica que o desenvolvimento cognitivo ocorre juntamente com o desenvolvimento motor. A prática de AF regular de intensidade moderada a vigorosa pode afetar positivamente a fisiologia do cerebro aumentando:

- O fluxo sanguíneo para o cérebro, o sangue fornece oxigénio e glicose, que o cérebro precisa para a execução de tarefas como a atenção e concentração mental;

- O fluxo sanguíneo para o hipocampo, a parte do cérebro responsável pela memória e aprendizagem;

- A produção e a liberação de neurotransmissores, especificamente dois neurotransmissores comuns - glutamato e ácido gama-aminobutírico, ou GABA. Essas hormonas são produzidas pelos neurónios e atuam nas sinapses, na comunicação entre essas células. Indiretamente, melhora o humor e o sono e reduz o stresse e a ansiedade (Centro de Controle e Prevenção de Doenças [CDC], 2010; Khan & Hillman, 2014).

Moore et al. investigaram a influência da aptidão cardiorrespiratória nos índices estratégicos, comportamentais e eletrofisiológicos da cognição aritmética em quarenta crianças pré-adolescentes (9 a 10 anos de idade). O estudo revela que a aptidão física influencia, positivamente, a codificação simbólica, a alocação de recursos atencionais e

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o processamento semântico durante as tarefas aritméticas, concluindo, assim que existe uma influência positiva da aptidão cardiorrespiratória na cognição aritmética.

Um outro estudo, desenvolvido por Pontifex et al. (2013), também avaliou o desempenho nas áreas de leitura e aritmética, em pré-adolescentes portadores de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Através de medições objetivas de avaliação da atenção, da neurofisiologia cerebral e do desempenho escolar, os autores verificaram que após uma única intervenção de 20 minutos de exercício, tanto crianças com déficit de atenção/hiperatividade como as crianças “saudáveis” apresentaram maior precisão de resposta e processamento relacionado com o estímulo. As crianças com déficit de atenção/hiperatividade exibiram também melhorias nos processos regulatórios, comparando atividades de prática de 20 minutos de exercício com uma duração semelhante de uma atividade de leitura. Além disso, um maior desempenho nas áreas de leitura e aritmética foram observados após o exercício em ambos os grupos. Os dados indicam que episódios únicos de exercício aeróbico moderadamente intenso podem ter implicações positivas em aspetos da função neurocognitiva e de controlo. Os autores concluem que o exercício melhora o desempenho comportamental, neurocognitivo e escolar em crianças com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade.

Estudos realizados em crianças pré-adolescentes mostram que as mais ativas apresentam padrões elevados e mais eficientes de atividade cerebral, e desempenho cognitivo e escolar superior. No caso dos adultos, os fisicamente mais ativos e com maior capacidade física, apresentam maior conectividade cerebral funcional e atividade cerebral mais eficiente e função executiva e de memória superior (Erickson, Hillman, & Kramer, 2015).

Outros estudos são unânimes em afirmar que a aptidão física pode impulsionar a aprendizagem e a memória das crianças (Raine et al., 2013) e sugerem que pais e formuladores de políticas públicas devem reduzir o tempo passado em frente aos ecrãs na vida das crianças para maximizar o efeito benéfico de hábitos saudáveis no desempenho escolar (Aguilar et al., 2015). Chamam também a atenção para a necessidade de se desenvolverem mais estudos epidemiológicos controlados e randomizados que poderão identificar a necessidade de uma melhor compreensão dos

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efeitos das políticas de saúde no ambiente escolar e subsequentes efeitos na aprendizagem dos jovens (Castelli et al., 2014).

As políticas públicas de saúde foram gradualmente integrando os resultados destas investigações e alertando para a necessidade crescente da adoção de estilos de vida saudáveis, nomeadamente a promoção da AF no âmbito da melhoria da saúde, do bem-estar, da qualidade de vida e envelhecimento saudável e da sua função social.

Bailey et al. (2013) introduziram um novo entendimento das relações entre a AF e os diferentes aspetos do desenvolvimento humano (emocional, financeiro, individual, intelectual, físico e social) que servirá de modelo teórico para a análise dos dados recolhidos na presente investigação.