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Aura, choque e experiência

No documento Dada e o riso (páginas 192-200)

3. O riso dos dadaístas e a indústria cultural

3.5. Aura, choque e experiência

Walter Benjamin na sua discussão sobre a obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica afirmou que as transformações sociais experimentadas por ela nas primeiras décadas do século XX poderiam ser entendidas através da idéia de perda da aura. Essas transformações podem ser atribuídas ao intenso e inovador desenvolvimento das técnicas de reprodução. Ele pensou a arte tomando como referência um tipo de relação entre a obra e seus receptores marcada, justamente, pela inacessibilidade. Aura foi definida pelo autor como uma manifestação extraordinária, que estaria longe e, ao mesmo tempo, seria algo bastante próximo, portanto, ela foi compreendida como “a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que esteja” (BENJAMIN, 1994, p. 170).

O conceito de aura estaria ligado, além disso, à categoria da singularidade e da autenticidade. Elas tornaram-se, no entanto, supérfluas diante de uma arte como, por exemplo, o cinema, que se apóia nos progressos da reprodução. A mudança das técnicas de reprodução, de acordo com Benjamin, transformaria também os modos de percepção e o próprio caráter da obra de arte. O tipo de recepção burguesa, essencialmente contemplativa e ritualística, cedeu o seu lugar para a recepção das massas, vista como algo racional, divertido e com muitas implicações de cunho político.

A arte autônoma, típica da sociedade burguesa, produziu um novo tipo de recepção, denominada de estética, ao libertar-se do ritual, convergindo, desse modo, para a transformação da idéia de aura na obra de arte. Tal periodização da arte apresentaria, segundo a interpretação de Bürger, algumas dificuldades, pois, ela pressupõe que a obra de arte aurática e a recepção individual formariam uma unidade. Porém, esta característica só aparece, de fato, naquela arte que conseguiu a autonomia. Deveríamos, portanto, considerar que a sua emancipação em relação ao sagrado foi alcançada pela burguesia porque alguns dos seus movimentos estéticos, como foi o caso, por exemplo, da arte pela arte, se verificou um regresso ao ritual ou ao caráter sagrado da arte. Ressalta-se que esse retorno não deve ser compreendido como um regresso à primitiva função desempenhada pela arte, afinal, ela já não se submete a um ritual eclesiástico que lhe pudesse conferir um valor de uso, mas, projeta-se como um ritual para o mundo exterior. Trata-se, assim, da passagem do valor de culto para o valor de exposição, pois, quanto mais “as obras de arte se emancipam do seu uso ritual, aumentam as ocasiões para que elas sejam expostas” (BENJAMIN, 1994, 173).

Por isso mesmo, Dada não atribuiu tanta importância à obra como valor mercantil, porém, ironizou esse traço por ressaltar a inutilidade dos objetos oferecidos para o público como alvo de uma profunda contemplação. Hugo Ball, Hans Arp, Tristan Tzara, Emmy Hennings, Richard Huelsenbeck, entre outros participantes do movimento em suas diferentes fases, recitavam, por exemplo, poesias que eram saladas de palavra que incluíam o ritmo africano, apóstrofes, obscenidades de todos os tipos, vários disparates e todos os desperdícios de linguagem que pudessem inventar para questionar o empobrecimento da linguagem mercantil. Huelsenbeck, por exemplo, criou uma dessas poesias, primordial, marcada por um ritmo forte e por uma visão artística selvagem e vital:

Sokobauno sokobauno sokobauno Schikaneder Schikaneder Schikaneder

as lixeiras estão engordando sokobauno sokobauno sokobauno os mortos saem delas coroas de tochas ao redor

da cabeça vejam os cavalos como se curvam sobre os ajuntadouros vejam os rios de parafina caindo dos cornos da lua vejam o lago Orizunde lendo jornal e comendo bife vejam a osteomalacia sokobauno sokobauno vejam a placenta gritando nas redes de borboletas dos colegiais sokobauno sokobauno

O padre fecha a bra-aguilha rataplan rataplan a Bra-aguilha e os pêlos lhe saem pe-pelas orelhas Do céu ca-cai a catapulta a catapulta e

a avó levanta o seio

sopramos a farinha da língua e gritamos e sai caminhando uma cabeça na cumeeira

dratcabeçagamemorto ibn bem zakalupp wauwoi zakalupp cóccix estalinhos

ó vísceras de padre transpiram odores do céu tumor na junta

azul sempre azul poeta das flores amarelece os chifres cerveja bar obibor

baumabor botschon ortischell seviglia o ca sa ca ca sa ca ca sa ca ca sa ca ca sa ca ca sa

cicuta em pele de purpurina intumesce em monhoquinhas

e o macaco (RICHTER, 1993, p. 19).

O mesmo procedimento de destruição também pode ser observado nos quadros dadaístas. Assim, Raoul Hausmann, Kurt Schwitters, Francis Picabia, George Grosz, por exemplo, agregaram botões, bilhetes e vários elementos considerados lixo na sociedade industrializada, para construir seus quadros, alcançando, desse modo, a destruição da aura nas suas produções. Trata-se, neste caso, de um ato deliberado e consciente dos produtores, ou seja, não se trata de uma alteração que resulta simplesmente de mudanças tecnológicas, porém, da mediação intencional do caráter da arte feita por toda uma geração de artistas. Por isso mesmo, os dadaístas forma considerados por Benjamin como precursores na medida em que sua criação exige meios que somente as novas tecnologias, como é o caso do cinema, podem satisfazer.

Dada procurou através dessas intervenções uma nova forma de recepção que não somente questionasse a submissão da obra de arte a interesses de rentabilidade, mas, também que recuperasse aquele poder crítico destruído em benefício de uma prática consumista que afetou as mais íntimas relações humanas. Dessa maneira, os novos meios técnicos possuem determinadas possibilidades, no entanto, o que o desenvolvimento dessas possibilidades permite ou como será utilizado depende do modo como serão aplicados, o que pode ser compreendido através das transformações nos modos de recepção e produção presentes no debate acerca das vanguardas históricas e, sobretudo, sobre o papel questionador exercido

pelos dadaístas. Por isso mesmo, o conceito elaborado por Bürger de instituição arte, referente às relações pelas quais passou a ser realizada, distribuída e recebida, deve ser considerada como um importante fator na interpretação do riso Dada.

Benjamin, portanto, através do conceito de aura consegue compreender o tipo de relação assumida entre o produtor e a sua obra no contexto do predomínio da instituição arte e do princípio de autonomia. Através da sua discussão compreendemos, além disso, que a obra de arte, por si mesma, não exerceria uma influência decisiva na sociedade, mas, que são as instituições, em que ela está inserida, o fator que determinaria como os seus efeitos agiriam decisivamente em certo contexto cultural. Finalmente tal discussão destacaria, como aconteceu com a idéia da aura no mundo do individualismo burguês, a relação social e histórica com os diferentes modos de recepção. O desenvolvimento tecnológico deveria ser considerado, portanto, como uma importante variável para entendermos as transformações culturais da sociedade como um todo e também como um elemento fundamental na ruptura promovida pelas vanguardas em relação a certos elementos do passado estético do ocidente europeu.

Não se trata de uma dedução de como seria o desenvolvimento da arte a partir das mudanças ocorridas nas técnicas de reprodução. Devemos, no entanto, procurar observar como a diferenciação do subsistema estético, como, por exemplo, aconteceu no caso do fenômeno da arte pela arte, relaciona-se com determinada característica ou tendência mais geral da sociedade burguesa para a progressiva divisão social do trabalho. Compreenderíamos, assim, essa concepção artística como uma resposta ao fato de que na sociedade burguesa desenvolvida o artista perdeu sua individualidade, pois, a diferenciação capitalista destrói qualquer possibilidade de uma produção verdadeiramente pessoal, ou seja, trata-se de perceber como a sua função social anterior, de artesão independente, cedeu lugar para a especialização. Afinal, a divisão afetou todos os âmbitos da sociedade e não somente o econômico como poderia parecer inicialmente.

A divisão social do trabalho no capitalismo trouxe ainda, de acordo com Walter Benjamin, uma outra conseqüência crucial para o estudo das mudanças nas concepções artísticas das décadas iniciais do século XX, a progressiva diminuição da experiência dos indivíduos. A experiência que pode ser definida como um conjunto de percepções e reflexões assimiladas que são aplicadas e, se preciso for, retomadas na práxis vital. Esta diminuição constante não significa que o especialista não tenha mais percepção ou reflexão do real, porém, o ponto a ser destacado é que as suas experiências já não voltam a se aplicar à práxis vital como acontecia anteriormente.

Dada procurou devolver, nesse sentido, aquela experiência estética oposta à práxis vital, resultado da progressiva divisão do trabalho, à esfera das nossas relações práticas. Por isso mesmo, elegeram como princípio organizativo das suas intervenções tudo aquilo que mais provocava adversidade nesta sociedade baseada numa racionalidade que privilegiava somente os fins. Eles não se restringiram, exatamente como depois fizeram os surrealistas e a vanguarda russa posterior à Revolução de Outubro, a refutar apenas um ou outro processo artístico, os dadaístas buscaram, na verdade, destruir a totalidade da arte, realizando, assim, uma completa ruptura com a tradição. Todas as suas ações iconoclastas dirigiram-se contra a instituição arte e o papel desempenhado por ela na sociedade burguesa.

As intenções dadaístas fracassaram. O potencial destrutivo de um ready made como o A roda de bicicleta de Marcel Duchamp, por exemplo, foi completamente neutralizado pela indústria cultural. Muitos artistas das novas vanguardas da década de cinqüenta ou sessenta não pretendem mais destruir a instituição arte, suas formas de organização, museus e exposições, pelo contrário, desejam que a sua obra encontre um espaço nessa estrutura de poder e prestígio. Assim, proclamam os mesmos objetivos defendidos pelas vanguardas históricas, mas, já não têm a pretensão de integrar a arte na práxis vital. Esta mudança na

experiência do indivíduo pode ser constatada a partir da transformação do protesto vanguardista no seu contrário.

Dessa maneira, a experiência deveria ser considerada como um conceito importantíssimo para compreendermos melhor a posição do indivíduo frente à ideologia da sociedade industrial. Walter Benjamin, ao considerar a obra de Proust A la recherche du temps perdu, percebeu que os fatos da vida interior do homem só adquirem um caráter privado, quando diminui, devido a fatos externos, “a possibilidade de que sejam incorporados à sua experiência” (BENJAMIN, 2000, p. 40). A condição do artista, como um artesão no meio de uma sociedade dominada pela intensa divisão social do trabalho e a separação dos trabalhadores dos meios de produção, tornou a arte como experiência individual uma coisa singular e improvável de persistir frente aos processos instituídos pela indústria cultural.

A cultura pagou com muito sofrimento tudo o que deixou de fora. Por isso mesmo, a nossa consciência exerce, como iremos discutir nos parágrafos seguintes, a importante função de servir como proteção contra os estímulos, ou seja, quanto mais normal e habitual for o registro dos choques por parte da consciência, menos haverá a necessidade de temer que os mesmos tenham um efeito traumático sobre o indivíduo.

O desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, como o jornal, poderia ser considerado como um bom exemplo de um fato exterior de grande dimensão e fundamental para entendermos as transformações no caráter das experiências individuais, um indicativo da diminuição daquela possibilidade, ressaltado por Walter Benjamin, de incorporação da experiência pelo indivíduo. Podemos observar que um dos principais objetivos dos meios de comunicação promovidos pela indústria cultural consistiu na exclusão dos acontecimentos do âmbito no qual poderiam agir sobre a experiência do seu público. Assim, podemos notar que os princípios da imprensa moderna tais como a novidade, brevidade, inteligibilidade, paginação, estilo lingüístico e ausência de conexão entre notícias isoladas, contribuiriam muito para que se alcançasse tal efeito.

Podemos notar, além disso, que o leitor, devido ao próprio desenvolvimento da tecnologia da dominação, teria sua imaginação paralisada e atrofiada. Sua capacidade de distanciamento crítico deixaria de existir e passaria a ser substituída pelas sensações expostas, criadas ou ampliadas visando atender aos interesses envolvidos nos empreendimentos de grandes tiragens diárias. A informação contida nos jornais ficaria excluída do campo da experiência porque ela não participaria mais da tradição do relato. A massa de assinantes destas grandes corporações já não possui algo de si para compartilhar com o próximo. Tudo o que restou ao indivíduo privado de suas experiências pessoais são emoções e sentimentos criadas, de acordo com interesses políticos e econômicos, para suscitar, como havíamos destacado anteriormente, a aparência de se estar sempre informado sobre o que acontece no mundo ou para criar uma diversão fácil que torne suportável, através inclusive do consumo do riso pasteurizado, a realidade social alienante. Esta substituição do antigo relato particular pela informação jornalística ágil e alegre refletiria, portanto, a própria regressão da experiência e da subjetividade.

Finalmente, ainda de acordo com a interpretação de Walter Benjamin, devemos ressaltar que uma das mais graves conseqüências do predomínio dos valores vinculados à indústria cultural seria o fato de que todas estas formas de comunicação se separaram da narração. A narração, uma das mais antigas formas de comunicação, diferencia-se da informação típica da nossa sociedade unidimensional por não visar o puro acontecimento em si, mas, incorporando-o à vida do narrador, proporcionando experiência aos que participam do relato. O narrador, desse modo, deixava sua marca pessoal em tudo àquilo que relatava e que se tornava, a partir de então, uma experiência vivenciada pelo grupo e um elemento importante para a continuidade da construção da sua identidade cultural.

O difícil aprendizado de receber continuamente o choque e o processo de inculcar o desejo de sempre consumi-lo até o ponto em que ele é transformado em algo essencial são convertidos, portanto, em regras básicas na socialização considerada adequada para o “bom cidadão” cumpridor dos seus deveres na sociedade unidimensional. Ela é facilitada por um treinamento no controle dos estímulos. Controle que pode chamar, em caso de necessidade, tanto o sonho como a lembrança em seu auxílio. O treinamento da consciência, como foi ressaltado anteriormente, serviria de proteção contra os estímulos. Quanto mais normal e habitual for o registro dos choques, menor a possibilidade de um efeito traumático por parte dos mesmos. Ao ser captado desta maneira pela consciência o fato se tornaria aquilo que chamamos de “experiência vivida”. Já a memória involuntária constitui-se somente daqueles acontecimentos que não tenham sido vividos expressa e conscientemente. O acontecimento produzido em série, para o consumo e deleite das massas, incorporado, aliás, diretamente ao inventário da lembrança consciente, tornar-se, assim, estéril para a experiência poética que necessita de outro tipo de experiência para se desenvolver plenamente.

A consciência do sujeito moderno deve estar continuamente alerta para captar os “interessantes” estímulos promovidos pela indústria cultural, assim, percebemos que os momentos de choque, mesmo quando consideramos alguma impressão isolada vivenciada pelo indivíduo, aumentaram com o avanço do domínio da sociedade unidimensional. Dessa forma, quando ela obtém êxito neste controle menos estímulos penetram na experiência e, em contrapartida, maior será a experiência vivida:

Quanto maior é a parte dos momentos de choque nas impressões isoladas; quanto mais a consciência deve estar continuamente alerta no interesse dos estímulos; quanto maior é o êxito com que ela opera; quanto menos estímulos penetram na experiência, tanto mais correspondem ao conceito de experiência vivida. A função peculiar da defesa em relação aos choques pode-se, certamente, definir como a tarefa de: marcar para o acontecimento, à custa da integridade de seu conteúdo, um lugar temporalmente exato, na consciência. Este seria o resultado último e maior da reflexão. Ela converteria o acontecimento em experiência vivida no caso do funcionamento frustrado da reflexão, produzir-se-ia o espanto, agradável ou (mais comumente) desagradável, que – segundo Freud – sanciona o fracasso da defesa contra os choques. Este elemento foi fixado por Baudeleire numa imagem crua. Fala de um duelo no qual o artista, antes de sucumbir, grita de espanto. Este duelo é o processo mesmo de criação. Portanto, Baudelaire colocou a experiência do choque no coração de seu trabalho artístico. Este testemunho de si mesmo é da maior importância. E é confirmado pelas declarações de muitos de seus contemporâneos. Embora a mercê do espanto, Baudelaire não deixava de provocá-lo. Vallès refere-se a seus excêntricos jogos fisionômicos; Pontmartin salienta a expressão contida de Baudelaire, num retrato de Nargeot; Claudel insiste no acento cortante que se servia na conversação; Gautier fala das ‘cesuras’ que Baudelaire gostava de imprimir às suas declamações; Nadar descreve seu abrupto andar. (BENJAMIN, 2000, p. 44).

Para considerarmos melhor as conseqüências inerentes a tal experiência de choque vamos imaginar um citadino que, como aparece nas intervenções dadaístas, deve enfrentar esse esquema de dominação através de novas tecnologias que se impõe a todos os indivíduos da sociedade unidimensional. Ele não poderá jamais estar perdido, pois, sua rotina é controlada minuciosamente, poderá, com toda a certeza, dispor de uma infinidade de diversões desenvolvidas para suas horas de lazer, mas, tal diversão também faz parte de um

esquema de manipulação, conseqüentemente, o riso deverá ser agora um produto consumido e fomentado pela indústria cultural.

As sensações de isolamento ou de solidão serão, portanto, cada vez mais comuns para todo o sujeito que está se debatendo continuamente nas vagas de uma multidão que o atrai e o repele simultaneamente. Não foi por um mero acaso que o tema da multidão tornou-se, durante o século XIX, um tema tão importante na literatura européia ocidental. O sujeito das grandes cidades, enquanto vítima e, ao mesmo tempo, participante da multidão, não poderia mais se apaixonar à primeira vista, porém, aprende a suportar a visão fugaz que nunca se repete. Ele aprende a conviver com a eterna despedida do rosto que desaparece no meio da massa indistinta. A certeza de nunca mais encontrá-lo que coincide com o momento de encanto da poesia moderna. Assim, o esquema do choque, segundo Benjamin, inclui também um esquema de pequenas catástrofes rotineiras.

A vida de conforto proporcionada pelo capitalismo tem como principal resultado a assimilação dos indivíduos aos mecanismos de controle social, todavia, acaba também por isolá-los completamente de outras formas de experiências, por isso mesmo, a necessidade constante de consumir o riso mercadoria: primeiro como uma maneira de amortecer os efeitos traumáticos do choque, em segundo lugar utilizando-o como um mecanismo que colabora no processo de conversão do choque em algo normal, corriqueiro e até mesmo uma forma de diversão vista, comumente, como algo prazeroso ou inocente.

A recepção de choques converteu-se, portanto, em uma regra de fundamental importância para a sobrevivência do indivíduo nas sociedades capitalistas desenvolvidas e, posteriormente, também nos países periféricos:

O conforto isola. Enquanto que, por um lado, assimila ao mecanismo seus usuários. Com a invenção do fósforo, em fins do século, começa uma série de inovações técnicas, que têm em comum o fato de substituir uma série complexa de operações por um gesto brusco. Esta evolução se produz em muitos campos; e torna-se evidente, por exemplo, no telefone, onde em lugar do movimento contínuo que era necessário para fazer rodar uma manivela nos aparelhos primitivos, aparece o ato de levantar o receptor. Entre os inúmeros atos de intercalar, arremessar, oprimir, etc, o ‘disparo’ do fotógrafo teve conseqüências particularmente graves. Bastava pressionar com um dedo, para fixar um acontecimento durante um período de tempo ilimitado. Esta máquina proporcionava, instantaneamente, por assim dizer, um choque póstumo. Juntamente com experiências táteis desta natureza, surgiram experiências óticas, como a produzida por anúncios em jornais e também pelo trânsito das grandes cidades. Mover-se através do trânsito, comporta para o indivíduo uma série de choques e colisões. Em pontos perigosos de cruzamento, fazem-no

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