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Avaliação da oralidade

Abordagem da oralidade na formação inicial de profissionais da educação: um estudo num segundo ciclo profissionalizante de Bolonha em Portugal

E) Materiais didáticos e recursos técnicos

3.4.2.4. Avaliação da oralidade

Numa perspectiva formativa, a avaliação é importante para o acompanhamento da aprendizagem dos alunos, assim como para a regulação das práticas de ensino do docente. No entanto, como sabemos, não é uma questão simples de abordar.

Em relação à oralidade, as práticas não são comuns (Monteiro et al., 2013) e poucos são os estudos científicos sobre esta temática. O certo é que trabalhar a orali- dade de forma sistemática (ou seja, com objetivos pré-definidos, estratégias didáticas planejadas, etc.) implica avaliação por parte do docente (heteroavaliação), do próprio aluno (autoavaliação) e pelos pares (coavaliação); sendo realizada com enfoques (diag- nóstica, formativa e somativa)(Luckesi, 1997; Méndez, 2002).

Considerando a relevância da avaliação para o ensino/aprendizagem da oralidade, nomeadamente quando é feito através de atividades de escuta e produção de textos orais, solicitamos às estudantes exemplos de critérios a serem considerados no processo avaliativo da oralidade (Ficha 2 – Questão 4).

Os critérios indicados contemplavam aspectos importantes do processo de ensino- aprendizagem da modalidade oral da língua, mas eram de ordens diferentes. É também de referir que umas contemplaram âmbitos mais diversos do que outras.

A seguir, apresentamos as respostas correspondentes a cada estudante: “A con- centração, o conteúdo, a entoação, o tom de voz, o vocabulário, a coerência, etc.” (A1); “Atenção, construção frásica, enquadramento, capacidade de se fazer ouvir, capacidade de escutar.”(A2); “Na minha opinião os critérios a ter em conta serão o interesse da criança, a atenção com que ouve, a forma como após ouvir o texto responde ou fala autonomamente sobre o texto, o expor as suas dúvidas” (A3); “A correta colocação de

voz; produção de um discurso correto; saber se comunicar; saber exprimir uma ideia; saber ouvir” (A4).

É de salientar que os critérios indicados abrangiam:

- Os aspectos sócio-discursivos, relacionados com questões de interação social (concentração, atenção, enquadramento, capacidade de se fazer ouvir, capacidade de escutar, interesse, a atenção com que ouve, a forma como após ouvir o texto responde ou fala autonomamente sobre este, a capacidade de expor as suas dúvidas, a produção de um discurso correto, saber se comunicar, saber exprimir uma ideia, saber ouvir);

- Os aspectos prosódicos, relacionados com o meio físico da expressão oral, ou seja, a fala (a entoação, o tom de voz, a correta colocação da voz);

- Os aspectos de textualidade, responsáveis pelo tecimento textual, ou seja, com questões de ordem estrutural e semântica relevantes para a construção do texto (con- teúdo, vocabulário, coerência, construção frásica).

No gráfico seguinte, apresentamos os resultados da categorização das respostas das alunas tendo em conta os aspectos citados:

Gráfico 2 – Representações das estudantes sobre aspectos da oralidade a serem avaliados

Observando o gráfico, podemos perceber as diferenças proporcionais entre as três categorias: os aspectos sócio-discursivos são bem mais mencionados do que os prosódicos e os de textualidade.

Embora saibamos da estreita imbricação entre os três, compreendemos a rele- vância da primeira categoria, sobretudo se pensarmos que estas futuras profissionais de Educação atuarão na Educação Pré-escolar e no 1º CEB. O que queremos afirmar, aqui, é que não se trata de uma questão de maior ou menor importância, mas da ne- cessidade inicial de fazer com que o aluno perceba os diversos contextos de fala de modo que, progressivamente, questões mais pontuais sobre o eixo de ensino passem a ser contempladas de forma sistemática.

Destacamos, mais uma vez, a relação entre as respostas dadas a esta questão da Ficha 2 (Questão 4) e as dadas a certas perguntas da Ficha 1 sobre o que se iria ensinar no âmbito da oralidade (Questões 4 e 5). Embora as estudantes tivessem

apresentado respostas breves e globais sobre o que ensinar, o mesmo não se repe- tiu em relação aos critérios a serem avaliados. Temos um indício, portanto, de que o planejamento (também relacionado à seleção dos conteúdos a serem ensinados e competências a serem desenvolvidas) não estava despertando, naquele momento, o olhar mais atento delas; o que não ocorreu com a avaliação. Foram, portanto, citados mais critérios avaliativos do que conteúdos a serem trabalhados e competências a serem desenvolvidas.

Entretanto, destacamos que não se pode avaliar o que não se trabalha. Acredi- tamos que para avaliar a oralidade estabelecendo previamente critérios, pensando em instrumentos avaliativos diferentes, é imprescindível o planejamento do trabalho sistemático a ser previamente realizado. Corroboramos Luckesi (1997, p. 165) quanto à interrelação didática entre o planejamento e a avaliação: “enquanto o planejamento traça previamente os caminhos, a avaliação subsidia os redirecionamentos que venham a se fazer necessários no percurso da ação”. Isso porque, continuando a citar este autor, “a avaliação é um ato de investigar a qualidade dos resultados intermediários ou finais de uma ação, subsidiando sempre sua melhora” (ibidem).

Os estudos têm demonstrado que a avaliação não costuma ser prática docente, quando oralidade é o eixo de ensino a ser considerado. No entanto, isso pode ser re- flexo de práticas não sistemáticas de ensino. Neste contexto, o planejamento é uma etapa importante para o processo de sistematização. Foi a partir desse pressuposto, então, que perguntamos às estudantes se elas acreditavam (Ficha 2, questão 2)serem as atividades de compreensão e produção dos textos orais objetos de reflexão prévia dos professores.

A1 afirmou que não havia planejamento e considerou que ele não era muito necessário para as atividades relacionadas com a oralidade, já que estas são espontâ- neas: “(…) porque nas atividades de escuta e produção de textos orais são atividades de caráter espontâneo. Natural que é produzido e adaptado na hora, não dá para se fazer um planeamento.”

Esse pensamento reflete a ideia de que a didática da oralidade não é importante. Trabalhar com o improviso não permite que o professor: selecione as competências e as habilidades a serem desenvolvidas, pense numa progressão de metas a serem es- colhidas, avalie se elas foram alcançadas e, principalmente, reflita sistematicamente sobre sua própria prática.

A4, embora tivesse opinião diferente de A1, acreditava que o planejamento das atividades de oralidade não fazia parte da rotina dos professores, dando explicação coerente para sua opinião: “(…) porque não há tanta valorização do trabalho na ora- lidade nas escolas, sendo tomado como um ato já ‘automático’”.

A3 afirmava que havia planejamento, mas apenas em algumas ocasiões: “(…) considero que algumas vezes isso acontece, mas penso que outras vezes não sejam planeados e decorram de maneira natural”.

Palavras presentes nas respostas das três estudantes – tais como “espontâneo”, “automático” e “natural” – convergem para uma perspectiva de ensino de língua materna em que a modalidade oral não tem espaço. Atividades que envolvam a oralidade e que não visem trabalhar a interpretação de textos orais, a reflexão sobre aspectos prototípicos da fala, a produção de textos orais diversificados, o estabelecimento de relações entre fala e escrita, a reflexão sobre a variação linguística, entre outros assuntos, podem até

contribuir para o desenvolvimento da competência comunicativa em textos orais. No entanto, o professor não terá como realizar o devido acompanhamento do processo.

Apesar de não referir se atividades de oralidade eram planejadas ou não pelos professores, A2 emitiu sua opinião sobre a importância do planejamento: “Da mesma forma que é necessário o planeamento por parte dos professores nas atividades de leitura, produção escrita e gramática também o é necessário nas atividades de escuta e produção de textos orais, na medida em que é necessário instruções para proceder aos mesmos, para não atuar erradamente.”

A comparação com os outros eixos, já presente na pergunta da ficha, é retomada, de modo que a oralidade é considerada, assim como a leitura, escrita e gramática, um importante eixo do ensino de língua materna e, por isso, digno de didatização sistemática.