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Focadas no planejamento

Abordagem da oralidade na formação inicial de profissionais da educação: um estudo num segundo ciclo profissionalizante de Bolonha em Portugal

A) Focadas no planejamento

Para a realização dos planejamentos, a docente e as estudantes usavam seus computadores pessoais, ou seja, a docente pegava uma versão inicial do planejamento, previamente elaborada pelas estudantes e, na medida em que fazia a leitura, pedia esclarecimentos, levantava questões para reflexão, conduzia a continuidade da produ- ção junto à estudante. Por conseguinte, o trabalho era realizado de forma colaborativa, admitindo ainda a participação das outras estudantes. Por fim, as estudantes ficavam de finalizar o material posteriormente.

Os planejamentos eram feitos considerando as diversas áreas de conhecimento trabalhadas com as crianças da Educação Pré-Escolar e os alunos do 1º CEB. Portanto, não eram apenas de Português, tão pouco voltados apenas para a oralidade. Tendo em conta o caráter transversal da língua portuguesa, observamos atentamente a produção do planejamento de todas as áreas.

Como exemplo prático do acompanhamento e da colaboração entre formador e estudante, podemos citar o planejamento feito por A2 para uma turma de 4º ano (cf. Anexo 7). É de referir que este planejamento (assim como a maioria dos outros) foi realizado a partir de material didático sugerido pela orientadora da escola (designada por professora cooperante).

De fato, em alguns casos, os planejamentos foram realizados a partir do material didático utilizado pela professora cooperante a partir, inclusive, das necessidades da mesma. De qualquer forma, acreditamos que o professor, independente de adotar manual didático, deve ser autor de suas próprias aulas. É por isso que as adaptações, ampliações ou reduções de materiais didáticos já prontos são normalmente realizadas. Essa ótica ficou evidente na sessão de PPS A1 quando, ao realizar a leitura da versão inicial do planejamento na área de Português de A2, a docente sentiu a necessidade de fazer relação da língua com os usos, pois o manual utilizado parecia ser estrutural e descontextualizado. Não estamos, aqui, afirmando que a docente acredite ser o tra- balho com estruturas não relevante. Mas ressaltamos que ela destaca para a aluna a necessidade de se estabelecer relações com as práticas de usos da língua de modo a não desconsiderar os contextos da interação (quem, quando, onde, para que, por que).

Nesse momento, a docente chamou atenção para o trabalho com gramática de modo que as futuras profissionais de educação percebessem a importância de saber para que se aprende a língua portuguesa. Em outras palavras, as reflexões sobre os padrões linguísticos são cruciais para que as pessoas se façam entender e entendam aos demais, de modo a interagir em sociedade. Ao fazer isso, a docente referiu um estudo científico (de Inês Sim-Sim), relacionando teoria e prática.

Ainda neste mesmo momento de orientação a A2, a docente perguntou à aluna o que era ‘referente’. O objetivo era ensiná-la, caso não soubesse, uma vez que o assunto aparecia no manual a ser utilizado.

No planejamento de A2, havia um diálogo; no entanto, a atividade não tinha foco em desenvolvimento de competências da oralidade. A docente, então, sugeriu que o diálogo não fosse realizado apenas de modo a contribuir para uma atividade futura de outro eixo do ensino do Português. Com base nisto, solicitou que a estudante pen- sasse na possibilidade de inserir, na lista de metas, alguma relacionada ao trabalho com o texto oral, a fim de que a oralidade pudesse ser explorada também como uma atividade-fim e não apenas como uma atividade-meio.

Outro exemplo de orientação que podemos citar refere-se ao planejamento de A4 de Português para um grupo de 4º ano (cf. Anexo 8).

Após a realização de uma atividade de ditado para desenvolvimento de habilidades relacionadas à pontuação, a estudante propunha contar os erros cometidos pelos alunos como forma de avaliação, embora a afirmasse ser formativa sua concepção de avalia- ção. Neste caso, questionamo-nos como a quantificação pode dar informações precisas ao professor sobre a aprendizagem dos alunos; se, por exemplo, os erros estiverem relacionados ao mesmo caso de uso ou não de vírgulas? Embora este não tenha sido o questionamento da docente, ela aproveitou o contexto para chamar a atenção para o fato de que avaliação não serve só para dar notas, não é só uma medida, não serve só para classificar. A ideia de mensuração, portanto, é posta em cheque. Dessa forma, a concepção de avaliação formativa é apresentada e defendida pela docente de PPS A1.

Em outro planejamento de A4 (cf. Anexo 8), a docente ressaltou a flexibilidade dos planejamentos, porque a estudante questionou se era necessário alterá-lo (reescrevê-lo) depois da aula, caso saísse algo diferente do planejado. Assim, fica claro que, embora seja provável a estudante ter pensado apenas na realização do documento como parte da UC de PPS A1, a docente aproximou às alunas do real objetivo do planejamento da ação didática, que é organizar as práticas a partir de opções (políticas e pedagógicas) comprometidas com o processo ensino-aprendizagem (Libâneo, 1999).

É válido destacar que, apesar da concepção de planejamento anteriormente referida, há momentos em que primeiro são pensadas atividades e depois as metas correspondentes. Referimos esta questão, pelo fato de observarmos que as sessões de planejamento não tinham como objetivo único contemplar as dificuldades didáti- cas das estudantes sobre o trabalho com conteúdos diversificados. Também era foco do momento o desenvolvimento da técnica de escrita de tal documento, tão comum, teoricamente, ao cotidiano do professorado.

Para nós, o estabelecimento dos objetivos do ensino está associado à seleção das metas e devem, portanto, ser elemento inicial a ser contemplado. Os procedimentos metodológicos para atingir a estas metas, ou seja, as atividades a serem realizadas, fariam parte de uma etapa posterior no processo do planejamento.

Acreditamos que esta sequência (meta à atividade) contribui para a não seleção aleatória de competências a serem desenvolvidas. Dessa forma, o planejamento de aula, além de convergir para planejamentos em longo prazo (planejamento por uni- dade, por bimestre, por semestre, por ano e/ou por ciclo), pode dialogar com outros planejamentos (da rede de ensino, do Ministério da Educação, etc.).

É importante destacar que isto não diminui as possibilidades de avanços para a formação das estudantes em PPS A1. O que se percebeu nas sessões é que houve espaço para momentos da relação entre teoria e prática, o que é, para nós, muito significativo. Principalmente porque é necessário ultrapassar uma perspectiva dicotômica da for- mação do professor em que, por um lado, há a prevalência de modelos acadêmicos, focados nos conhecimentos ‘fundamentais’ produzidos nas universidades, e, por ou- tro, a prevalência de modelos práticos, cujo foco é a aplicação de métodos na escola (Nóvoa, 1995).De acordo com Tardif (2012), um caminho para superar a dicotômia teoria-prática é considerar que o professor também é responsável pela construção de sabares a partir de suas experiências e vivências de sala de aula.

A adoção do que Nóvoa (1995) nomeia de modelos profissionais seria uma so- lução para maiores diálogos entre a universidade e a escola, uma vez que contempla práticas de formação-ação e formação-investigação. Isso é o que podemos observar na PPS A1, quando:

- A docente e as estudantes conjuntamente produziram e refletiram sobre planejamentos a serem aplicados nas escolas em que eram realizados os estágios;

- A docente oportunizou espaço para que as estudantes relatassem suas vivên- cias de sala de aula;

- A docente acompanhou as estagiárias nos estabelecimentos de ensino em que exerciam suas práticas pedagógicas.