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2 2 Avaliação institucional escolar: avaliação interna

O termo avaliação interna aparece na literatura, com frequência, associado à avaliação que é feita pelos próprios intervenientes na instituição em avaliação ou por entidades exteriores à instituição em análise, mas que actuam a pedido da mesma (Felip, 1993; Requena, 1995; Lafond 1999; Santos Guerra, 2003, entre outros)27, sendo, de uma

25 A temática dos exames nacionais aparece novamente reforçada, ainda que contestada por pais e professores, no XV e, numa política de continuidade, no XVI Governos Constitucionais.

26 A ideologia de mercado, no domínio da educação, associa-se à livre escolha individual, ou seja, ao poder dos pais decidirem o tipo de educação e de escola que pretendem para os seus filhos. Na óptica da livre escolha apresentada, coloca-se a questão da exposição da educação a princípios de competitividade, da diminuição do controlo governamental e do reconhecimento do direito dos pais interferirem nas decisões educativas. “Os pais, como consumidores, seriam, no plano político, as novas entidades perante as quais as escolas prestariam contas directamente, sem interferência do governo, do ministério da educação ou de outras entidades, detendo, consequentemente, um verdadeiro poder” (Carlos Estêvão, 1998a, pp. 67- 68).

27 Álvaro Marchesi, na tipologia que propõe (“avaliação interna” e “avaliação externa”), considera que: “a avaliação externa […] é a realizada por pessoas e equipas que não pertencem à escola, quera pedido da própria comunidade educativa, quer por ordem da administração educativa responsável” (Marchesi, 2002, p. 35).

maneira geral, entendido como sinónimo de auto-avaliação28. Contudo, Meuret (2002, p. 39) distingue avaliação interna de auto-avaliação, considerando auto-avaliação a avaliação que é “concebida e conduzida pelo estabelecimento de ensino para seu próprio uso […]”. Esta perspectiva de auto-avaliação, de acordo com a tipologia de Santos Guerra (2002a; 2002b), consubstancia-se no enfoque da avaliação de iniciativa interna

sem facilitadores externos29.

Meuret deixa claro que o que sustenta o entendimento da avaliação interna como auto-avaliação provém da entidade que toma a decisão sobre os processos de avaliação, como se depreende da nota do autor, que passamos a transcrever:

“A origem dos dados utilizados para a avaliação não importa para a definição. Uma auto-avaliação pode muito bem utilizar, entre outros, dados recebidos de escalões administrativos superiores. Inversamente, o facto de os actores de uma escola participarem na avaliação, serem interrogados, integrarem grupos de trabalho não é suficiente para fazer desse processo uma auto-avaliação. A definição aqui apresentada repousa sobre dois critérios políticos: quem decide sobre o conteúdo e a forma do processo de avaliação e quem interpreta os resultados para pronunciar um julgamento sobre a escola” (Meuret, 2002, p. 39).

Por sua vez, Casanova convoca outras nuances para o debate da temática da avaliação interna, centrando-se nas pessoas que, em cada caso, realizam a avaliação. De acordo com esta categorização, refere que estamos perante um processo de

auto-avaliação sempre que os mecanismos de avaliação interna envolvam uma parte

dos actores educativos e a avaliação incida sobre o trabalho por eles realizado; de

coavaliação quando os diferentes grupos da organização escolar avaliam o mesmo

aspecto e o resultado da avaliação emerge do contributo de cada grupo e, ainda, quando os grupos se avaliam mutuamente; e de hetero-avaliação sempre que uma categoria de actores internos avalia outra categoria de actores também internos, como, por exemplo, a avaliação que os professores fazem dos alunos (cf. Casanova, 1992, pp. 44-48 e 1997, pp. 85-89).

Por sua vez, Palma, ao analisar, também, a modalidade de avaliação interna, salienta que nem todas as formas de avaliação interna se traduzem em processos de auto-avaliação, no sentido em que a avaliação interna “pressupõe que a avaliação se

28 Jaap Scheerens apresenta uma perspectiva diferente de conceber a auto-avaliação, propondo também uma abordagem diferente dos tipos de autoavaliação das escolas (cf. Scheerens, 2004,pp. 102- 109). Por outro lado, para uma perspectiva comparada do modo de fazer auto-avaliação das escolas em diferentes países, ver Abel Rocha (1999, pp. 95-122). A este propósito, e como uma das muitas conclusões apresentadas, o autor assinala “a importância da criação de um clima de escola favorável à auto-avaliação, do envolvimento dos seus membros, e, em especial, dos seus líderes” (Rocha, 1999, p. 121).

29 Charles Hadji, na perspectiva do lugar do avaliador, introduz um novo dado para reflexão, ao afirmar que a “auto-avaliação é também uma hetero-avaliação, na medida em que o sujeito que avalia introduz uma distância entre o ‘eu’ que aprecia e o ‘eu próprio’ que é apreciado”; o mesmo sujeito constitui-se, simultaneamente, como avaliador e avaliado (Hadji, 1994, p. 53).

centre sobre os próprios actores que desenvolvem o referido processo ou sobre a organização de que fazem parte” (Palma, 2001, p. 36). Este autor propõe o conceito de

hetero-avaliação, à semelhança de Casanova (1992, p. 48), para as situações de

avaliação em que um grupo interno de actores avalia outro grupo interno de actores, referindo-se assim a situações pontuais de avaliação, e o conceito de auto-avaliação quando o processo de avaliação interna envolve a generalidade dos elementos da comunidade educativa (cf. Palma, 2001, p. 36).

Na perspectiva de Rocha, auto-avaliação ou avaliação interna é o “conjunto de informações de desempenho escolar relativas quer ao desenrolar da acção educativa, quer aos seus resultados, no quadro de procedimentos internos levados a cabo pelos estabelecimentos de ensino” (Rocha, 1999, p.13).

A auto-avaliação, por um lado, é “entendida como um mecanismo a partir do qual a instituição entra num processo de reflexão e auto-análise, se converte num processo educativo da própria instituição e dos seus membros” (Rodríguez Rodríguez & Calatayuda Becerra, 2001, p. 83) e, por outro lado, a auto-avaliação reflecte, em última instância, as ideologias subjacentes:

“A avaliação que uma instituição realiza a si mesma reflecte o que a instituição considera importante, aquele ou aqueles que controlam os processos e quem toma decisões acerca das finalidades, dos métodos, dos sistemas de organização ou outros aspectos” (Gairín Sallán, 2002, p. 120).

Retomando a perspectiva de auto-avaliação e a tipologia de Santos Guerra (2002a e 2002b), no enfoque de avaliação de iniciativa interna com facilitadores

externos, a organização educativa, sempre que o entender, solicitará a colaboração de

entidades externas (nomeadamente a comunidade académica), no sentido das mesmas emitirem uma opinião mais rigorosa e fundamentada da unidade em análise. Esta modalidade de avaliação tem a sua génese na própria comunidade educativa, sendo encarada como desejada, assumida e benéfica, tornando-se ainda mais frutífera para a melhoria da qualidade educativa (cf. Santos Guerra, 2002a, pp. 17-18 e 2002b, p. 277).

Abordamos agora uma perspectiva em que os actores educativos, no sistema educativo português, formalizam os processos de auto-avaliação, os quais aparecem sustentados num enquadramento legal que os remete, desde logo, para processos impostos e, obviamente, obrigatórios30.

30 Neste sentido,José Palma (2001, p. 39) e Dinis Meuret (2002, p. 46) alertam para o que se passa, por exemplo, em Inglaterra, onde as escolas são induzidas, pelos próprios serviços de inspecção, a desenvolverem processos de auto-avaliação

Como refere Requena, a avaliação efectuada pelos actores da própria instituição não significa necessariamente que a iniciativa tenha partido da instituição. A iniciativa pode ser promovida tanto por entidades internas como por entidades externas à instituição educativa (cf. Requena, 1995, p. 78).

A referência, ainda que do ponto de vista teórico, à auto-avaliação das escolas do ensino básico e secundário é recente. Encontramos as primeiras referências no Decreto- Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, que inclui nas competências da Assembleia “apreciar os resultados do processo de avaliação interna da escola” (Diário da República, n.º 102, I Série A, artigo 10.º, ponto 1, alínea i) e, posteriormente, na Lei n.º 31/2002, de 20 de Dezembro, que regulamenta o sistema de avaliação da educação e do ensino não superior, determinando: “a auto-avaliação tem carácter obrigatório, desenvolve-se em permanência, conta com o apoio da administração educativa e assenta nos termos de análise seguintes [...]” (Diário da República, n.º 294, I Série A, capítulo II, artigo 6.º)31.

O carácter de obrigatoriedade da realização da auto-avaliação, presente nos diplomas legais que referimos, leva Libório a referir:

“Relativamente aos processos de auto-avaliação impostos receamos que se venham a traduzir em processos ritualizados, rotineiros, cujo principal objectivo seja a prestação de contas traduzida num relatório final, para enviar para os órgãos e entidades a quem compete dele tomarem conhecimento. […]. Este tipo de auto-avaliação poderá traduzir-se apenas em mudanças ritualizadas e não em mudanças conducentes à melhoria da escola, pois, neste caso, as organizações escolares são impelidas à conformidade com as regras impostas pela administração central, resultando a sua legitimidade, sobretudo, dessa conformidade” (Libório, 2004, pp. 106 - 107).

Por causa, talvez, do carácter de imposição dos processos de auto-avaliação e dos constrangimentos associados aos mesmos, assistimos à ausência de uma cultura de auto-avaliação que leva Almerindo Afonso (2001, p. 25) a salientar que “não há em Portugal qualquer tradição de auto-avaliação das escolas do ensino básico e secundário que possa servir de referência aos actores educativos que se mostrem interessados em constituí-la quer antídoto à avaliação externa, quer como forma de resistência, quer, ainda, como forma de avaliação complementar ou compensatória”.

com base em indicadores e critérios semelhantes aos usados nos processos de avaliação externa e logo idênticos para todos os estabelecimentos de ensino, podendo-se entender este processo como uma forma das escolas se prepararem para as inspecções a que venham a ser sujeitas. Este princípio é também partilhado por Maria José Rau, Secretária de Estado da Administração Educativa, do XIV Governo Constitucional, ao afirmar que uma escola autónoma é capaz de proceder à sua auto-avaliação desde que para tal lhe seja fornecido “um bom instrumento de trabalho” (M.ª Canário & Ramos, 2001, p. 33).

31 Ainda que os processos de auto-avaliação aqui indicados não se enquadrem nos propostos por Antonia Casanova (1992, p. 47) e José Palma (2001, p. 36), constituir-se-ia matéria de interesse investigativo relevante perceber, três anos depois da publicação da Lei em referência, de que forma a mesma foi entendida quer pelos órgãos de gestão, quer pelos diferentes actores educativos; de que forma a Lei está a ser aplicada e que mais-valias trouxe para os estabelecimentos de ensino.

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