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Avaliação institucional (meso) e a relação com a avaliação externa

CAPÍTULO I – AVALIAÇÃO: VELHAS E NOVAS CONTRADIÇÕES

1.2 Níveis da avaliação educacional do sistema educativo

1.2.2 Avaliação institucional (meso) e a relação com a avaliação externa

A avaliação institucional é nuance importante, em nossa visão, para a autonomia da escola e consequentemente do professor, na organização do trabalho pedagógico, sobretudo diante das medidas regulatórias preconizadas pelo Estado. Esse tipo de avaliação envolve um processo abrangente de participação de toda a comunidade escolar com vistas, segundo Freitas (et al., 2011, p.35), “[...] a negociar patamares adequados de aprimoramento, a partir dos problemas concretos vivenciados por ela” em uma avaliação interna sob sua responsabilidade e controle.

Assim como outros níveis da avaliação, a avaliação institucional é marcada por diferentes vertentes e interesses. Segundo Sander (2008), a avaliação institucional surgiu na educação brasileira inicialmente voltada para os programas de pós-graduação e, posteriormente, para a avaliação institucional do ensino de graduação. Associada a uma série de acontecimentos internacionais, como a agenda liberal impulsionada pelo Banco Mundial que influenciou decisivamente a Conferência Mundial de Educação para

Todos (JOMTIEN, 1990), a avaliação institucional, assim como a avaliação em larga escala, passa a ser destacada como um dos instrumentos para a execução do plano de ação quando “[...] os organismos internacionais e os governos nacionais passaram a recomendar a adoção de sistemas de gestão alicerçados nos conceitos clássicos de eficiência e eficácia técnica” (SANDER, 2008, p.12).

Gatti (2006) pondera que, de modo geral, na área de avaliação institucional em nível superior tem-se trabalhado com quatro tipos de modelos. Um é caracterizado como “descritivo”, por estar voltado à coleta de dados comumente realizada “[...] por meio de questionários, características das instituições, traçando-se o seu perfil, utilizando diferentes variáveis”; o segundo modelo seria o “descritivo-analítico”, no qual se “[...] procura comparar ou cruzar variáveis ligadas aos processos internos e aos produtos”; no terceiro – “reflexivo-interpretativo” –, se avança “[...] a partir de um fundamento descritivo e analítico, apresentam diferentes interpretações, traduzindo significados e relevâncias, com base em referentes sociocientífico e culturais” (nesse modelo se agregam “[...] formas diversificadas de coleta de dados como entrevistas – individuais ou coletivas; observação; grupos focais; estudos de caso, etc., contemplando os variados nichos organizacionais”); por fim, o quarto modelo, “reflexivo- participativo”, é voltado para as premissas e os modos de coleta da avaliação participativa e envolve, “[...] em situação de diálogo e reflexão contínuos, as formas e os processos de desenvolvimento das diversas atividades institucionais, os vários segmentos coparticipantes em diálogos reflexivo-interpretativos das representações e significados dessas ações, e de seu impacto percebido ou possível (GATTI, 2006, p.11). Para a autora, tais modelos não se excluem, mas se complementam. Na prática, os dois primeiros são os mais realizados, embora seja em relação aos dois últimos que se coadunam as posições de uma avaliação para a análise acerca de um cenário social mais amplo “[...] e o local em suas relações, e, de outro, as concepções sobre o papel da universidade nesse cenário, em um enfoque do que realmente é social e cientificamente significante, para além da numerologia instituída” (GATTI, 2006, p.11). Nesses termos, a avaliação de caráter participativo demanda no seu processo “[...] momentos de recuo crítico, uma reflexão menos apaixonada das práticas, com explicitação das contradições no nível das ações-reações” (Idem).

A avaliação institucional é assumida como instância mediadora da qualidade da escola pública (SORDI, 2009). De acordo com essa autora, a escola precisa da avaliação

para o autoconhecimento dela extraído para melhor se regular no processo de produção da qualidade social, sobretudo para enfrentar cenários regidos pela ética mercadológica. É no terreno da avaliação institucional que os professores devem se posicionar criticamente diante de uma avaliação como “[...] mero controle e instrumento constrangedor da democracia, da autonomia e da emancipação” (DIAS SOBRINHO; RISTOFF, 2002, p.12), haja vista que, no âmbito da avaliação institucional, a escola faz uso de todos os dados produzidos, inclusive da avaliação externa, para compreender a sua concretude e a complexidade da instituição escolar em sua totalidade. Nesse âmbito se constroem propostas voltadas para a qualidade social que, na visão se Dias Sobrinho (1996), envolve valores de pertinência, solidariedade, democracia, cidadania ativa, igualdade e justiça.

A educação como bem público reclama por controle social e assim construímos o entendimento de que a avaliação de uma escola, como instituição complexa e singular, não pode permanecer à deriva, dependendo de vontades individuais ou devaneios dos seus diferentes públicos. A avaliação da qualidade das escolas é questão imperativa em nosso tempo, fruto da crescente luta pela democratização do acesso ao ensino. Esse acesso não pode prescindir do compromisso com o direito das crianças e dos jovens aprenderem (SORDI, 2009, p.8).

Ainda segundo Sordi (2009), não podemos deixar de questionar sobre o que fazer com professores que não aceitam qualquer tipo de avaliação do seu trabalho. Para Dias Sobrinho (2002, p.58), controle e avaliação não se separam totalmente; a questão ética a resolver diz respeito à dosagem dos sentidos, e, caso predomine a mera fiscalização e coerção, o sentido formativo da avaliação é anulado: “[...] mais do que isso: o controle, quando se justifica, deve se exercer segundo uma criteriosa intenção educativa a constituir o sentido dominante num processo educativo, caso contrário, a avaliação será predominantemente coerção”, como no momento em que a avaliação se realiza de forma burocrática e com limitada participação.

Dias Sobrinho (1996, p.15) pondera que a avaliação institucional não é “[...] prioritariamente uma operação para equacionar tecnicamente as divergências, abafar as discordâncias, homogeneizar os interesses e camuflar as contradições através de ajustes e aplicações instrumentais”. Também não existe para compor um clima morno em que as respostas técnicas impedem que os questionamentos emirjam; por isso, não é a “[...] soma de pequenas análises isoladas” (Ibidem, p.21), e sim:

[...] uma construção coletiva de questionamentos, é uma resposta ao desejo de ruptura das inércias, é um pôr em movimento um conjunto articulado de estudos, análises, reflexões e juízos de valor que tenham alguma força de transformação qualitativa da instituição e do seu contexto, através da melhora dos seus processos e das relações psicossociais (DIAS SOBRINHO, 1996, p.21).

Na visão de Dias Sobrinho (1996, p.21), é necessário evitar o engessamento desse processo, “[...] tornando-o uma política estrita a serviço da administração”, mas também não se deve permitir o diletantismo, ou seja, “[...] o participacionismo irresponsável e descompromissado em relação às propostas e ao desenho em geral da avaliação e suas funções de melhoria”. A comunidade escolar deve assumir o seu protagonismo no processo decisório que afeta a instituição, especialmente na assinatura coletiva do Projeto Pedagógico como sua marca identitária, no qual as pessoas se vejam nele refletidas e que “[...] decidam participar com responsabilidade e compromisso social” (SORDI, 2009, p.4) da busca coletiva pela compreensão da realidade escolar e do compromisso com a sua transformação emancipatória.

Essa transformação demanda processos abrangentes e rigorosos de avaliação sobre a ação coletiva, crucial para a transparência da educação oferecida, ou seja, implica pensar em “[...] avaliar para tomar decisões de forma circunstanciada”, em sentidos “[...] mais amplos e complexos do que aqueles conduzidos ao exame do desempenho dos alunos, desconectados dos fatores associados que nele estão imbricados” (SORDI, 2009, p.5), ou mesmo como produto de avaliações fragmentadas e realizadas pelas instituições que se voltam a dados quantificáveis e colocam em segundo plano os processos e as relações.

Além disso, no âmbito da avaliação institucional é preciso analisar coletivamente as práticas da avaliação realizada pelo Estado e sobre como ela tem afetado o trabalho pedagógico – deve-se posicionar política e criticamente com base na concretude da sua realidade. Para Freitas (et al., 2011), essa avaliação é interna à escola e atua na mediação entre a avaliação da aprendizagem e a avaliação externa. Das três dimensões da avaliação educacional anunciadas, a institucional é a menos presente em nossa prática educacional na Educação Básica.

A avaliação institucional é central tanto no enfrentamento e na construção de práticas de avaliação da aprendizagem formativa, quanto para trazer à tona a

responsabilidade partilhada entre escola e Estado, no que concerne à educação realizada em diferentes realidades escolares em nosso país. Tal tipo de avaliação:

 Convoca o trabalho coletivo em um processo transparente que tem como referência o projeto pedagógico construído e concretizado por esse coletivo;  Envolve a construção comprometida de uma qualidade que depende tanto da

promoção de “[...] políticas atentas às necessidades da coletividade” quanto da ação de “[...] todos aqueles que, em diferentes funções, trabalham para a qualidade25 e a consolidação de boas práticas educativas” (BONDIOLI, 2004, p.2);

 Demanda, segundo essa autora, a construção de uma qualidade com significado

negociado (dedicamo-nos a esse tema no próximo capítulo), em uma espécie de “pacto”, com responsabilidades recíprocas em que a avaliação ajuda a compor (não sem conflitos) as múltiplas facetas e olhares sobre a escola concreta e as melhoras desejadas no nosso projeto educativo, as ações construídas e as que não foram possíveis de serem edificados, os problemas enfrentados e as novas ações necessárias desse coletivo. Essa qualidade exige uma “responsabilidade bilateral” da escola e do Estado.

Para Freitas (et al., 2011, p.36):

A avaliação institucional é um processo de apropriação da escola pelos seus atores, não na visão da “responsabilização” pelos resultados da escola como contraponto da desresponsabilização do Estado pela escola, mas no sentido de que seus atores têm um projeto e um compromisso social, em especial junto às classes populares e, portanto, necessitam deste seu compromisso, do compromisso do Estado com relação à educação. O apropriar-se dos problemas da escola inclui um apropriar-se para demandar do Estado as condições necessárias ao funcionamento dela. Mas inclui, igualmente, o compromisso dos que fazem a escola com os resultados dos seus alunos. A esse processo bilateral de responsabilização, chamamos “qualidade negociada”.

Contudo, a avaliação institucional ainda caminha lentamente no contexto da Educação Básica. Como salienta Sordi (2009, p.10), a ausência da avaliação institucional ou o “[...] silêncio sobre a caixa preta da escola tem autorizado” o Estado a formalizar “[...] exclusivamente a partir dos resultados dos alunos nos exames de proficiência” um veredito sobre a escola.

Desse modo, considerando a pluralidade de sentidos no tocante à avaliação e seus diferentes níveis é que compreendemos ser importante definir claramente seus fundamentos e marcos conceituais. No caso da avaliação institucional, esta tem um papel fundamental para a autonomia da escola, e é nesse nível que o coletivo da instituição escolar precisa analisar e se posicionar quanto à avaliação externa, além de elencar as reais condições de trabalho que a escola tem e, assim, assumir o seu papel de autoria na condução da avaliação interna, imbricado no projeto educativo escolar.