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1ª fase Auto-

3.2. O PRESENTE SUSPENSO

3.2.4. Bailarina-Coreógrafa Professora.

Com a reflexão sobre o meu passado na Dança, e sobre o reencontro comigo e com a Dança através do Yoga, pude ganhar mais consciência das razões que me trouxeram até este momento e que no meu entender justificam a minha investigação. Com esta pesquisa pretendo descobrir de que forma a prática do Yoga transformou a minha maneira de trabalhar na Dança, como bailarina, como professora, e principalmente como coreógrafa. Ainda antes de iniciar a pesquisa, sei que o Yoga me deu segurança para trabalhar sozinha. No passado, apesar de sempre ter sentido uma grande necessidade de ser autónoma e depender o menos possível dos outros, rodeei-me de alunos e das bailarinas dos meus grupos de dança, e com o passar dos anos convenci-me que não conseguia trabalhar sem ninguém. Sentia que a opinião dos outros era sempre mais importante do que a minha.

O Yoga permitiu-me ganhar confiança em mim própria e considerar que posso ser criativa e coreografar de forma mais autoral, alicerçada nas características do meu corpo, em vez de coreografar apenas com base em técnicas de dança pré-estabelecidas. A minha experiência na dança tinha sido mais como bailarina e como professora e nunca me considerei coreógrafa, no entanto, na minha função como professora, que conduziu à formação do grupo de dança, acabei por ter de fazer coreografia. Com a evolução da minha prática do Yoga comecei a tomar consciência e a valorizar a saúde e a singularidade dos corpos e do seu movimento, e a ver-me como bailarina-coreógrafa com capacidade de explorar o movimento do meu corpo e de aceitar a minha própria linguagem.

Por todas estas razões quis começar esta nova etapa da minha vida investindo mais na função de coreógrafa, e fazendo uma obra coreográfica solista autoral, que retratasse a minha vivência também com o Yoga. O meu objetivo último foi criar uma linguagem de movimento própria, na interseção entre a Dança e as técnicas corporais do Yoga, e desenvolver uma Técnica de Dança Pessoal que acima de tudo respeite o corpo e a criatividade de cada ser que a pratica, sendo também adequada à apresentação de futuras obras coreográficas.

Este doutoramento em Artes deu-me a oportunidade de fazer a pesquisa prática necessária para fazer esta transição de bailarina para bailarina-coreógrafa e criar a minha primeira obra coreográfica autoral. E considero que este é apenas o primeiro passo de um novo percurso que espero possa ainda ser longo, como bailarina, e como coreógrafa. Apesar de já não ser uma jovem em início de carreira, pretendo continuar a coreografar e a dançar, pois acredito que não tenho de parar por causa de limitações físicas associadas à idade. Com o Yoga aprendi que posso adaptar a Dança ao meu corpo, respeitando-o.

Como professora de Dança a minha ação também se alterou com a prática do Yoga. Antes de mais aprendi a valorizar as minhas qualidades pedagógicas e a perceber que somos sempre referências para os outros e que convém termos consciência do que fazemos, e de como o fazemos, e perceber se queremos ser boas ou más referências. No passado, com as minhas alunas e as minhas bailarinas, fui referência sem ter consciência disso e por isso nem me questionava se estava a ser um bom ou mau exemplo, apenas me limitava a ensinar passos de dança e coreografias. Não me via a mim própria como pessoa, como ser humano, não me dava existência. Dava mais existência às alunas e às bailarinas do que a mim própria, ao incentivá-las e encorajá-las a evoluir na Dança, mas também não as via como seres humanos, como indivíduos, cada uma com as suas características e mensagens próprias.

Com o Yoga, a minha maneira de dar aulas alterou-se, apesar de continuar a utilizar o estilo de ensino que sempre conheci como aluna de Ballet e que continuei como professora de Danças Espanholas: ensinar técnica e coreografias, onde o professor tem a função de mostrar e ensinar, e o aluno de copiar e reproduzir. Continuo a achar que há muito mérito em ensinar e aprender uma técnica específica de Dança ou coreografias, mas de preferência uma que respeite as características do corpo de cada um. Lentamente, comecei a ver as alunas como pessoas únicas, e não apenas como corpos mais altos ou mais baixos, ou mais gordos ou mais magros, ou mais graciosos ou mais desajeitados, ou com mais ou menos apetência para a Dança. Todos os corpos são diferentes e é por essa mesma razão que são todos especiais. Só precisamos de conhecer o nosso corpo e perceber qual a sua especialidade, e aceitá-la e valorizá-la. E valorizando o nosso corpo, valorizar todos os outros. Claro que a ênfase não pode ser ir só na direção da limitação do corpo, este também tem de aprender a sair das suas zonas de conforto e evoluir. E a Dança pode contribuir para essa evolução, mas sem destruir o corpo no processo.

No passado dava mais importância ao grupo de alunas do que à individualidade de cada uma. E talvez por isso fosse tão difícil para mim dar aulas a grupos reduzidos. Sempre tive necessidade de ter um número superior a 8 alunos por turma, e se a quantidade começasse a reduzir eu simplesmente fechava a turma, tentando integrar os alunos restantes noutras turmas em funcionamento. Praticar Yoga ajudou-me a lidar com a dinâmica diferente que se estabelece num grupo reduzido e com a minha dificuldade em relacionar-me mais diretamente com cada aluno neste contexto, pois comecei a estar mais sensível à individualidade de cada aluno. Em vez de sentir ansiedade com a perspetiva de dar uma aula a apenas 1 ou 2 alunos, aproveito a oportunidade para dar mais atenção às características únicas de cada um e personalizar o processo de ensino-aprendizagem e a transmissão de conhecimentos.