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PARTE II – A INDÚSTRIA BRASILEIRA DE CALÇADOS: AGLOMERAÇÕES DE PRODUTORES E

Capítulo 5 – Eficiência coletiva nas aglomerações de empresas de calçados na economia brasileira

5.4. Balanço da eficiência coletiva nas aglomerações de empresas de calçados no Brasil

A análise dos dois casos mais importantes de aglomeração de empresas produtoras de calçados no Brasil, a região do Vale do Sinos e a cidade de Franca, revela alguns pontos importantes para a compreensão das características e da dinâmica dessas estruturas produtivas localizadas.

Em ambos os casos, as economias externas que são geradas pela aglomeração das empresas representam de fato vantagens competitivas importantes para os produtores locais, já que eles têm acesso a produtos e serviços a

90 No levantamento realizado no referido trabalho (Suzigan e outros, 2000b), em uma pequena amostra de dez

custos bem menores do que se estivessem atuando isoladamente. Mais do que isso, os produtores têm acesso a tarefas e serviços específicos e diferenciados, decorrentes da acumulação de capacitações tácitas ao conjunto das firmas locais, que têm efeitos decisivos na construção de vantagens competitivas a partir da aglomeração das empresas.

Essas externalidades se manifestam de diversas formas, como pela existência de um contingente de trabalhadores com habilidades específicas no âmbito local, pela presença de um conjunto de empresas que atuam em indústrias correlatas e de apoio e pela facilidade de circulação das informações entre os produtores. Nos dois casos, mas especialmente no Vale do Sinos, todas essas características podem ser claramente percebidas.

Tais externalidades, todavia, possuem caráter incidental, sendo um resultado, diga-se, “natural” da aglomeração das empresas. Utilizando um termo de Krugman (1998), existem forças centrípetas de atração desses elementos para o âmbito do sistema produtivo local, que contribuem para o incremento de sua competitividade.

Além dessas economias externas incidentais, a aglomeração das empresas facilita e estimula o fomento de um processo de aprendizado de caráter local, a partir das interações que ocorrem entre os agentes. Na verdade, os agentes são capazes de construir códigos próprios de comunicação e canais específicos de informação que acabam por criar um processo local de aprendizado interativo. Nas aglomerações, há um maior escopo para o desenvolvimento de ações conjuntas deliberamente coletivas entre os agentes, seja de caráter bilateral ou multilateral.

A análise dos dois casos selecionados indica que existe um espaço importante de melhoria das condições competitivas das empresas locais, já que elas praticamente não se utilizam dessa possibilidade de potencializar os benefícios das aglomeração. São pouco relevantes dentro do sistema os casos de aproveitamento das externalidades por meio de ações conjuntas deliberadas.

No que se refere às ações conjuntas de caráter multilateral, percebe-se em ambos os casos a ausência de organismos capazes de coordenar tais ações conjuntas, visto que as associações de produtores existentes não têm, com uma exceção importante, conseguido cumprir esse papel. São poucas e isoladas as tentativas que têm sido estabelecidas de desenvolvimento dos produtores locais e de incremento da competitividade do conjunto do sistema.

No Vale do Sinos, a atuação da Abicalçados tem sido pouco produtiva na tarefa de promoção do conjunto dos produtores, restringindo-se basicamente à representação política das empresas locais. No caso de Franca, da mesma forma, o Sindifranca pouco tem feito na área da prestação de serviços ao conjunto das empresas. Aliás, em ambos os casos, foi questionada até a legitimidade desses organismos, havendo entre alguns agentes a percepção de que tais órgãos defendem apenas os interesses de algumas das empresas do cluster.

Já no que refere às ações de caráter bilateral, pode ser notado um avanço nas formas de relacionamento entre as empresas, especialmente das interações usuário-produtor. São diversas as experiências de empresas que

competitividade das empresas.

apontaram ter adotado, recentemente, estratégias que visavam a intensificação de suas relações com os fornecedores, com efeitos positivos para a competitividade da cadeia.

Portanto, a análise dos dois casos selecionados de aglomeração de empresas indica que é possível verificar eficiência coletiva em ambas as estruturas. Porém, nos dois casos, observa-se a existência de eficiência coletiva não- planejada nos termos definidos por Schmitz e sua equipe, uma vez que tal fenômeno, embora decorra de externalidades positivas ao âmbito local, é de caráter puramente incidental. O maior escopo para ações conjuntas deliberadas proporcionado pela aglomeração dos produtores, tem sido pouco aproveitado pelos agentes.

De todo modo, não se pode negar a existência de alguns ganhos competitivos importantes para os produtores locais, associados à aglomeração das empresas. Resta indagar até que ponto os produtores locais são capazes de se apropriar, mesmo que de modo assimétrico, dessas vantagens decorrentes da concentração geográfica das empresas.

Capítulo 6 – A participação das empresas brasileiras de calçados nas

cadeias produtivas globais do setor

Para finalizar a proposta apresentada e desenvolvida neste trabalho, é necessário investigar a forma de inserção dos produtores calçadistas brasileiros nas cadeias produtivas globais do setor.

Como já foi apontado, o caso da indústria calçadista brasileira se mostra bastante interessante para a análise dessa questão. Isso porque a distribuição espacial dos produtores de calçados aponta para a existência de pelo menos duas aglomerações setoriais bastante importantes, a região do Vale do Sinos e a cidade de Franca, cujas características principais foram apresentadas no capítulo anterior.

A existência desses sistemas produtivos localizados é capaz de gerar economias externas, incidentais ou decorrentes de ações conjuntas deliberadas entre os produtores, que contribuem significativamente para o incremento de sua competitividade. Mesmo que, no caso da indústria calçadista brasileira, ainda exista um elevado escopo para o aproveitamento dos benefícios da aglomeração das empresas, as economias externas existentes (incidentais) se transformam em ganhos importantes para a competitividade dos produtores locais. Como foi apontado no capítulo anterior, há nas experiências brasileiras grande resistência ao aproveitamento de ações conjuntas deliberadas, ainda que essas pudessem contribuir para elevar ainda mais a competitividade das empresas participantes do processo.

A partir dessa conclusão, é preciso investigar se esses benefícios que são gerados pela aglomeração dos produtores estão permanecendo nas mãos das empresas pertencentes aos sistemas locais, mesmo que de modo assimétrico, ou se estão sendo apropriados por outros agentes que participam da cadeia de suprimentos do setor. No caso da indústria calçadista brasileira, os agentes estrangeiros ligados ao capital comercial internacional.

Para a realização dessa investigação, o instrumento utilizado neste trabalho é a formação das cadeias produtivas globais como apresentado por Gereffi e sua equipe, conforme foi discutido anteriormente.

Todavia, deve-se ressaltar a existência de duas formas possíveis de análise da capacidade de apropriação dos benefícios da aglomeração das empresas calçadistas no Brasil. Uma delas é a participação dos produtores brasileiros no mercado internacional, já que o setor apresenta um coeficiente de abertura da ordem de 25%. Isso confere ao Brasil uma posição de destaque no mercado internacional de calçados, configurando-se como o terceiro maior produtor mundial desse produto.

A segunda é centrada nos produtores que atuam no mercado doméstico. As empresas brasileiras são detentoras de marcas importantes e controlam os canais de comercialização e distribuição, o que lhes confere maior capacidade de se apropriar dos benefícios gerados ao longo do processo de produção e comercialização das mercadorias, estando aí incluídas as externalidades positivas, incidentais ou não, decorrentes da aglomeração dos produtores. Neste caso, obviamente, não se trata de cadeia global, posto que ela se conforma no mercado doméstico brasileiro e, em menores proporções, nas vendas externas para países sul-americanos.

As próximas seções têm o objetivo de discutir essas questões, agregando elementos que permitam melhor compreender a inserção dos produtores brasileiros na cadeia produtiva global do setor. Além disso, é preciso ressaltar a diferença que é verificada no comportamento das empresas que atuam no mercado doméstico, já que elas são capazes, ao contrário do que ocorre no mercado internacional, de deter ativos essenciais que lhes garantem vantagens competitivas importantes.

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